Cameron espera pela sua hora, numa campanha até ao fim
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DATA: 2010-05-06
SUMÁRIO: Mudança. O slogan que levou Barack Obama à Casa Branca faz-se ouvir agora no Reino Unido. Após treze anos de Governo trabalhista, David Cameron deverá carimbar hoje o regresso dos conservadores ao poder. As condições em que entrará em Downing Street são ainda uma incógnita - as sondagens e quase um quarto de indecisos recomendam prudência - e o veredicto final está nas mãos de algumas centenas de milhares de eleitores, os que vivem nos círculos sem uma tendência de voto definida (os marginals).
TEXTO: "É mais do que tempo de mudar. Os trabalhistas têm de ceder o lugar e dar aos outros a hipótese de resolver os problemas do país", diz ao PÚBLICO Chuck Ozoka, um jovem executivo que veio em trabalho a Westminster North. O círculo, no Norte de Londres, é um dos prioritários para os conservadores na área metropolitana - arrebatá-lo aos trabalhistas é essencial para conseguir maioria absoluta na Câmara dos Comuns. No sistema eleitoral britânico, a vitória é decidida rua a rua, bairro a bairro. Os 650 deputados são eleitos por maioria simples, em círculos uninominais, e se a maioria não deverá mudar de cor, noutros a luta é feroz. "Está toda a gente na rua em campanha. Vai ser assim até ao fim", responde a assessora de Joanne Cash, na sede da campanha conservadora, quase deserta na manhã de ontem. Cash é o protótipo dos candidatos escolhidos para mudar a tradicional imagem dos tories: advogada de sucesso, nascida numa família modesta da Irlanda do Norte, pela primeira vez candidata a um Parlamento que Cameron quer "limpar do escândalo das despesas". "Ela vive aqui, conhece bem a zona e foi muito prestável quando precisei", sublinha Michelle Murphy enquanto passeia o cão, ao início de uma rua dominada por mansões vitorianas e carros de alta cilindrada. A última revisão de fronteiras eleitorais incluiu alguns dos quarteirões mais prósperos de Londres neste círculo, tornando mais escassa a maioria dos trabalhistas. Segundo as sondagens locais, serão os tories que esta noite festejarão em Westminster North. Em luta pela maioriaSão ao todo 116 os lugares que separam os conservadores da maioria absoluta. Para a garantir, precisam da maior flutuação de votos a seu favor desde 1945 (maior ainda do que aquela que em 1974 levou Margaret Thatcher ao poder) e a campanha não correu da melhor forma a David Cameron. Os debates televisivos deram protagonismo a Nick Clegg e os Liberais Democratas ganharam uma força que não era previsível, o que tornou mais difícil um bom resultado dos conservadores nas marginals detidas pelos lib-dem no Sudoeste, obrigando-os a procurar novas frentes de batalha. A escolha recaiu sobre o Leste de Inglaterra, onde o desacerto da campanha de Gordon Brown e o entusiasmo gerado por Clegg abriram brechas no eleitorado trabalhista, tornando mais acessíveis círculos até há pouco tempo considerados seguros. Foi lá que David Cameron passou boa parte das últimas 36 horas de campanha. Numa maratona que começou terça-feira em Londres e só terminou ontem à noite, num comício em Bristol, o líder conservador visitou mercados, lotas e quartéis de bombeiros. Um esforço final para convencer os indecisos que, segundo as sondagens, são ainda um terço dos 45 milhões de eleitores. "Estas eleições são as mais importantes numa geração", disse. As sondagens divulgadas quarta-feira (a lei impede a sua divulgação no dia anterior às eleições) confirmam a clara vantagem dos conservadores nas intenções de voto a nível nacional, mas sem maioria absoluta. E o inquérito diário do YouGov para o Sun admitia mesmo que o Labour, em aparente recuperação nos últimos dias, possa eleger mais deputados. É contra este cenário de incerteza, que o Reino Unido não conhece desde 1974, que David Cameron remou nos últimos dias, insistindo que o país precisa de "um governo forte". Recusou falar na eventual necessidade de uma coligação com os lib-dem e, segundo a BBC, terá tentado, sem sucesso, convencer um grupo de empresários a assinar uma carta alertando para os riscos de um Parlamento dividido. Uma boa notícia para os conservadores poderá vir da Irlanda do Norte. O Daily Telegraph noticiou que o Partido Democrático Unionista (DUP) está disponível para juntar os seus dez deputados à maioria, se Cameron não reduzir este ano o investimento na província. Hammersmith ainda hesitaO dia não foi muito diferente para Nick Clegg e Gordon Brown, que atravessaram o país de autocarro e avião. Em Durham, um círculo até há semanas certo para os trabalhistas, Clegg insistiu que estas legislativas podem deixar irreconhecível a política britânica, bipartidária por tradição. "Pode ser uma pequena cruz [no boletim], mas será um grande passo para um país mais justo", disse, parafraseando o astronauta Neil Armstrong. E o primeiro-ministro, reanimado pelos números do YouGov, disse estar "determinado" a desmentir as sondagens. "Este não é o momento dos conservadores", disse, pedindo total mobilização dos apoiantes. Um apelo com eco em Hammersmith, outro dos círculos londrinos de resultado incerto. "Levem todos os panfletos que conseguirem entregar", lia-se numa das paredes da sede de campanha de Andy Slaughter, o deputado trabalhista que luta pela reeleição contra Sean Bailey, um jovem negro proposto pelos tories. "Isto é absolutamente taco a taco", disse Slaughter ao PÚBLICO, apesar de admitir que o adversário leva vantagem nos recursos financeiros. "Lord Aschroft [principal doador dos tories] investiu aqui 200 mil libras. "Escassas dezenas de metros separam as duas sedes de campanha. Mas a porta de Bailey está fechada - o candidato saiu em campanha. "Ele tem trabalhado muito. Não há dia em que não haja um panfleto novo na caixa de correio", explica Barbara Phillips, que se inclui no rol de eleitores ainda indecisa. "Vou votar, sempre votei, mas ainda estou hesitante. " O período de reflexão termina hoje. As urnas das mais imprevisíveis eleições britânicas das últimas três décadas fecham às 22h00.
REFERÊNCIAS: