The xx, tão leves, tão intensos
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 2 | Sentimento 0.300
DATA: 2010-05-26
SUMÁRIO: The xxLisboa, Aula Magna.3ª feira, 22h.Lotação esgotada.(4estrelas em 5)
TEXTO: Há duas semanas naquele mesmo espaço, o veterano Gil Scott-Heron, autor de um dos álbuns mais marcantes dos últimos meses (“I’m New Here”) havia dado um concerto algo decepcionante. Não é um facto de hoje, mas às vezes, afogados na expectativa, tendemos a esquecê-lo – nem sempre os autores dos melhores discos são os melhores em palco. Confessamos que em relação aos ingleses The xx íamos com algum receio. Havia demasiada expectativa no ar (os bilhetes para o concerto esgotaram há meses, mal foram postos à venda). A música do agora trio vive de uma justeza de elementos e de uma solenidade que em palco podia não funcionar. E os membros do grupo, com pouco mais de 20 anos, parecem demasiado metidos consigo próprios, o que não é um problema em si – “os tímidos são sempre os piores”, já dizia o realizador Martin Scorcese – mas por vezes gera bloqueios de comunicação. Nada disto sucedeu. Em Setembro quando foi editado o seu álbum homónimo, dizíamos que não são os melhores cantores, nem os intrumentistas mais dotados, mas sabiam manipular o espaço, provocar momentos de tensão e distensão, criando canções que não se ouvem apenas, absorvem-se, flutuantes e livres. Foi isso que aconteceu, num concerto magnífico, como a música do grupo, de uma leveza intensa. Em primeiro lugar, uma palavra para o som, tantas vezes mal tratado em palcos portugueses: com nitidez, puxando pelos graves – na linha da escola dubstep, o género musical britânico – e contaminando, quente, todos os recantos da sala, fazendo estremecer o chão e todos os corpos. Em segundo lugar, o lado cénico. Na interpretação da primeira canção, “Intro”, o trio surge por detrás de uma tela branca, recortando os músicos em sombras chinesas. Ao longo do concerto, no centro, por vezes iluminam-se com intensidade as letras (xx) que dão nome ao grupo, quase sempre sobre um fundo negro. Já no final, o fundo do palco cobre-se de estrelas. Quase não se dá pelo trabalho cénico. Não há o barroquismo de tantos concertos pop. Mas o rigor com que é utilizado é central na criação do ambiente global, marcando os tempos e temperatura do concerto. Por último, há a música. Algumas canções não distam muito daquilo que se pode ouvir no único álbum do grupo (“xx”), com os elementos (voz, guitarra, baixo e ritmo) parecendo ter vida própria, cada um a seu canto, para se alojarem, finalmente, no mesmo corpo sonoro, misto de pop vulnerável, electrónica sonâmbula e dubstep caloroso. É isso que acontece com “VCR”, “Crystalised” ou “Islands”. Noutras canções, a espaços, como “Infinity”, o trio consegue surpreender. Há um som de guitarra que se prolonga, uma caixa de ritmos que procura novas variações ou uma linha de baixo que em vez de marcar a repetição rítmica, procura ângulos de ruptura. As vozes de Romy Croft, principalmente ela, e de Oliver Sim, por vezes substituem o laconismo, aquela forma própria de dizer as palavras, por momentos de maior fervor. Depois há ainda a relação entre os músicos, especialmente Romy e Oliver, criando para si um lugar de privacidade, mas percebendo-se a cumplicidade. Ele mais extrovertido, sorrindo, arriscando palavras em português, movendo-se com dinamismo comedido. Ela estática, compenetrada, mas dando-nos os melhores momentos da noite, naquela guitarra, narcótica, delicada, imensamente leve. Não foi longo. Não podia ser. Tocaram as canções do álbum e mais uma versão (“Do you mind?” de Kyla). Regressaram uma vez, com “Stars”. O público queria mais. Mas depois as luzes acenderam-se e a realidade voltou a ser real.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave escola negro género corpo