Silves aprendeu com as mortes dos primeiros linces-ibéricos
MINORIA(S): Animais Pontuação: 12 | Sentimento 0.25
DATA: 2010-06-20
SUMÁRIO: O que se esconde para lá dos portões do Centro Nacional de Reprodução em Cativeiro para o Lince-Ibérico (CNRLI), na Herdade das Santinhas em Silves, é a luta pela sobrevivência da espécie de felino mais ameaçada do planeta, o Lynx pardinus. Passados seis meses de trabalho, Silves aprendeu a ganhar e a perder as suas primeiras crias de lince-ibérico.
TEXTO: O desafio conservacionista começou na tarde de 26 de Outubro, quando Azahar, fêmea com cinco anos, chegou do Zoobotânico de Jerez de la Frontera e inaugurou os cercados daquele centro, uma das peças do Plano de Acção para a Conservação do Lince-Ibérico em Portugal (2008-2012). Até 1 de Dezembro, chegaram os restantes 15 linces, de forma faseada. "Estes meses correram bem e todos os linces se adaptaram rapidamente à situação", contou Rodrigo Serra, director do centro. "No espaço de 15 dias a um mês, os animais já encaravam os tratadores como aliados". Hoje, passados mais de seis meses da chegada de Azahar, os 16 linces "apresentam todo o espectro de comportamentos naturais, a julgar pela forma como usam os cercados", acrescentou. Nada mais seria de esperar para o ano de arranque em Silves do que uma boa adaptação dos animais. Acontece que o felino das barbas e dos pêlos em forma de pincel na ponta das orelhas surpreendeu a equipa do centro. Da primeira tentativa de reprodução em Silves e dos quatro casais escolhidos - Azahar e Drago, Erica e Enebro, Era e Calabacín e Espiga e Daman - nasceram duas crias, a 4 de Abril. "Esta foi a terceira vez que Azahar engravidou, mas, pela primeira vez, conseguiu levar a gravidez até ao fim", sublinhou Rodrigo Serra. "Ficámos muito entusiasmados. Foi a primeira reprodução comprovada em Portugal nos últimos 30 anos". Mas Abril não trouxe só alegrias. Nesse mesmo mês, a equipa de técnicos de Silves viu-se obrigada a saber como ultrapassar a perda destes animais. A primeira cria morreu a 11 de Abril e a segunda a 18 de Abril. De acordo com os resultados das autópsias realizadas no Centro de Análises e Diagnóstico de Málaga, em Espanha - centro que realiza as autópsias dos linces que morrem em cativeiro -, as crias estavam bem formadas e com as proporções correctas, mas "nasceram com problemas congénitos incompatíveis com a vida", explicou Serra. "Por aquilo que percebíamos através das câmaras de vigilância, as crias estavam a mamar. Mas, quando morreram, tinham um terço do peso que seria normal". A primeira cria morreu com 117 gramas, quando devia ter 382 gramas; a segunda tinha 144 gramas, em vez de algo entre 560 e 520 gramas. Apesar de apresentar um "comportamento exemplar", a progenitora Azahar, com 8, 5 quilos, nunca duplicou a quantidade de alimento ingerida diariamente, como seria normal. "Ao contrário do que acontece com os outros animais, a Azahar tinha comida disponível durante todo o dia, e de diferentes variedades. Mas enquanto esteve grávida comeu sempre o mesmo, o que não era suficiente". Crias não tinham hipóteseDevido ao nanismo e ao mau desenvolvimento fetal congénito - uma das crias apresentava má formação da tiróide, responsável pela hormona do crescimento -, as crias estavam mais fragilizadas, menos imunes e mais atreitas a complicações. À segunda cria foi diagnosticada uma ruptura de intestino. Mas, para ambas, a gota de água terá sido uma infecção bacteriana aguda. "Nenhuma tinha hipóteses de sobrevivência, nem mesmo se fosse alimentada à mão", disse Rodrigo Serra. Na verdade, os dois primeiros meses de vida das crias são cruciais. No ano passado, 40 por cento das crias que nasceram em cativeiro em Espanha morreram nesse espaço de tempo. De 28 animais, sobreviveram apenas 17. Os técnicos do centro estão agora a estudar a compatibilidade genética dos progenitores. "Foi uma surpresa muito grande", comentou Rodrigo Serra, referindo que tudo foi feito pelas crias. "Assim que nos apercebemos de problemas, entrámos imediatamente em contacto com o centro de El Acebuche, em Doñana (Espanha)". Segundo o responsável, ainda que a intervenção dos técnicos nos cercados seja reduzida ao essencial, para não perturbar os animais, quando se aperceberam de problemas com a segunda cria, tomaram a opção de agir. "Decidimos intervir com a segunda cria quando nos apercebemos que esta estava a perder actividade. Entrámos no cercado e retirámo-la. Mas acabou por morrer passadas duas horas. Não havia nada a fazer". "O impacto na equipa técnica e nos funcionários foi grande", admite. "Mas conseguimos refrear o desespero esforçando-nos por lembrar as coisas boas que já conseguimos alcançar". Hoje, a "equipa continua coesa", a trabalhar nos detalhes e já está a preparar a próxima época de cria. "Estamos lançadíssimos para a época de reprodução de 2010/2011", garantiu.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave cativeiro