Comunidade cigana denuncia discriminação e ameaça fazer uma concentração nacional
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DATA: 2010-07-15
SUMÁRIO: A Câmara de Beja construiu um muro à volta do bairro, que ficou transformado num gueto. Uma ONG europeia fala em segregação e critica as condições "deploráveis" daquele espaço.
TEXTO: As condições "deploráveis" em que moram as famílias ciganas que, desde 2006, vivem no Bairro das Pedreiras, em Beja, deram origem a uma queixa contra Portugal. A denúncia foi apresentada em Abril, pelo European Roma Rights Centre (ERRC) junto do Comité Europeu dos Direitos Sociais (CEDS). A União Romani Portuguesa, que representa as comunidades ciganas, ameaça com uma concentração nacional às portas de Beja, caso a autarquia não resolva vários problemas, a começar por um muro construído pela câmara e que acaba por isolar o bairro do resto. As autoridades nacionais são acusadas de casos de segregação, da baixa qualidade das habitações e da falta de acesso a serviços básicos de saúde e educação. Mais grave ainda é a construção de um muro de 2, 5 metros de altura que, num dos lados, esconde este bairro marcado pela polémica desde que, em 2005, foi apresentado como projecto. O muro, afirma o ERRC - uma organização não-governamental que combate a discriminação de comunidades ciganas na Europa - é um claro exemplo de "exclusão e discriminação social". A queixa feita em Abril pode chegar ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. "Diga lá se isto não parece uma cadeia", denuncia um dos residentes à reportagem do PÚBLICO. "Tantos anos a lutar contra o muro de Berlim e temos um muro em Beja", acentua o presidente da União Romani, Vítor Marques, criticando a forma como se tenta "isolar uma população" como se "sofresse de lepra ou de outra doença contagiosa". O projecto de "reinserção social" dinamizado pela Câmara de Beja, para instalar 53 famílias ciganas que residiam no bairro de lata nos arredores daquela cidade, não cumpriu o objectivo de "integrar aquelas famílias sem ofender a sua cultura", observa Vítor Marques. "Estamos perante um caso evidente em que soluções remediadas degeneraram em situações xenófobas. " "Queremos evitar a todo o custo o conflito social, quando sabemos que são outros a promovê-lo". Mas "se as coisas não arrepiarem caminho faremos uma concentração nacional em Beja da comunidade cigana", adverte. As famílias que ali vivem foram instaladas nas traseiras do parque de materiais da Câmara de Beja e junto ao canil/gatil municipal. O amor e os ratos"As reclamações são mais que muitas, mas a câmara não lhe dá sequência" queixa-se Armando Marques, pai de nove filhos e que tem ainda a seu cargo a sogra com 90 anos. Outro problema grave é que "os ratos são tantos que davam para encher um camião", insurge-se, agastada, Nazaré Reis, enquanto o PÚBLICO visita a sua habitação, exígua para uma família com cinco crianças. No único quarto que a casa dispõe, amontoam-se as "camas" - um eufemismo para os cobertores que, à noite, são estendidos no chão. As 53 habitações do bairro onde vivem cerca de 400 pessoas têm todas a mesma configuração e o mesmo número de divisões: um quarto, uma casa de banho e uma sala. É neste espaço com cerca de 50 metros quadrados de área que se amontoam agregados familiares com oito, nove e até 12 elementos. Em Maio, a câmara ordenou o desmantelamento, com apoio das forças policiais, de pequenos anexos e barracas construídos pelos moradores para alojar pessoas e animais. Armando Marques já foi obrigado a facultar o quarto a um dos filhos que casou recentemente, e colocou a sogra a dormir numa tenda que ergueu junto à residência, contrariando desta forma a orientação do município que proíbe este tipo de soluções, "Não tenho outra solução. Jogamos os moços fora?", pergunta, antes de um último desabafo: "As condições a que nos obrigam a viver não nos deixam ter intimidade. Para fazer amor com a mulher tenho de ir para o campo. "
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave direitos cultura exclusão campo concentração tribunal educação mulher homem comunidade social doença discriminação canil