Kuwait: Demasiado pequenos e demasiado ricos para tamanha tragédia
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.041
DATA: 2010-08-02
SUMÁRIO: Tanques, muitos tanques, a fazer barulho como muitos tanques juntos fazem. Setecentos tanques são muitos tanques. Cem mil soldados são muitos soldados. Avançam pelo deserto e depressa alcançam a cidade que é já ali. Junto ao mar, avistam as torres de quase 200 metros de altura que é preciso ocupar. Mais a leste, o palácio do emir que devem cercar e invadir. Disparos. Gritos. Luzes brilhantes. Explosões. Ainda é de noite. Há quem continue a dormir. Quem acorda julga que o mundo enlouqueceu e grita. Gente morta nas ruas. Gente que não entende o que se passa. Gente que foge e gente que leva às mãos à cabeça.
TEXTO: "Na madrugada de dia 2 de Agosto de 1990, o Exército de Saddam Hussein invadiu o Kuwait. . . "A sala está completamente escura e é no escuro que a narração começa, em inglês. Depois acendem-se maquetas que a seguir se apagam para que outras se iluminem. As primeiras horas, o primeiro dia, os dias e os meses seguintes. O emir Sheikh Jaber al-Sabah fugiu. A maioria dos soldados também. Ficou a "resistência heróica" e houve noites em que kuwaitianos subiram aos telhados para gritar "Allah-u-Akbar!" (Alá é Grande) e então os "iraquianos enfurecidos" entraram nas casas e "mataram e violaram". Está tudo lá: invasão e ocupação do Kuwait em miniatura. As casas, as pessoas, os telhados, os iraquianos de arma em punho. A banda sonora não deixa nada de fora, nem o choro, nem os bombardeamentos, nem os gritos de "Allah-u-Akbar!""Agora posso emocionar-me", diz Reem, e Sara acena como que a dizer que o aviso da amiga também se lhe aplica. Reem e Sara são as nossas guias no museu House of National Memorial do Kuwait. Adolescentes com ar de meninas, riem muito e por vezes parecem agitadas, falam mais depressa e repetem informações. É difícil perceber se estão nervosas por se estarem a estrear como guias ou porque ainda lhes é difícil atravessar a sala que reconstitui uma guerra que acabou antes de elas nascerem. Depois da invasão veio a ocupação, que se prolongou como se nunca fosse acabar. A seguir vieram os bombardeamentos dos Aliados e os iraquianos incendiaram poços de petróleo e destruíram o que ainda não tinham pilhado. No museu diz-se que os poços eram 734. Eram mais de 600. Muitos, em qualquer dos casos. Sara: "Os meus pais diziam que o Kuwait esteve no escuro durante oito meses. Depois vim cá e vi as fotografias. "OK, é isto. " Percebi o que era viver no escuro. "Este é também um museu de homenagens aos resistentes que não sobreviveram e a todos os que vieram ajudar. Na operação Tempestade do Deserto participaram 34 países e todos têm direito ao seu pedaço de parede. Há uma foto do Presidente Bush pai no encontro em que disse ao emir Sabah: "A próxima vez que nos encontrarmos será no Kuwait libertado". Reem: "Adoro esta frase. "Incubadoras com NenucosA guerra é inimiga da verdade. No museu que Khalaf al-Enezy abriu em 1997, apresentam-se como informações factos comprovados e outros desmentidos, como os bebés arrancados das incubadoras pelos soldados de Saddam. Incubadoras com bebés Nenucos. "Esta parte impressiona-me muito", diz Reem. Reem e Sara fazem ambas 18 anos em Agosto. Passaram o mês de Julho como voluntárias na House of National Memorial, entre três dezenas de jovens. Preparar as comemorações que hoje assinalam os 20 anos da invasão foi a principal tarefa: organizar uma cerimónia com discursos, fazer convites, manter os jornalistas informados. Nada que se compare com o que se vive na cidade a cada 26 de Fevereiro, Dia da Libertação. "Nessa altura é que têm de vir cá. Há fogo-de-artifício e festa por todo o lado. Ficamos loucos", garante Sara. Reem e Sara decidiram passar o último Verão antes da universidade no museu fundado por Khalaf al-Enezy. "Nós nascemos logo a seguir, quando os nossos pais ainda tinham tudo muito fresco. Os meus irmãos mais novos conhecem os factos, mas provavelmente vão ter uma relação diferente com os acontecimentos", diz Sara. Hoje há 2, 7 milhões de habitantes no Kuwait, mas kuwaitianos são pouco mais de um milhão, 45 por cento da população. Há 20 anos, os kuwaitianos eram 600 mil. Mil morreram. Metade fugiu do país e todos foram de alguma forma afectados pelo conflito. Reem: "A minha mãe era rebelde. Cuspiu num soldado iraquiano. Insultava o Saddam à frente deles. O meu pai era militar e foi para a Arábia Saudita. Voltou com os outros, em Fevereiro. "
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave guerra