M.I.A. levou músicas do nosso mundo ao Sudoeste
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-08-06
SUMÁRIO: M.I.A. foi imperial, Bomba Estéreo a surpresa, Flaming Lips a semi-decepção. Foi assim a segunda noite do Sudoeste, o festival onde o público parece estar ausente a maior parte do tempo. Ontem foram 30 mil.
TEXTO: São seis da tarde numa qualquer grande metrópole Ocidental, ouvem-se buzinas de carros, sirenes, pessoas projectam a voz na rua tentando suplantar o ruído, imagens publicitárias passam por nós como se fossem jogos-vídeo, mulheres de burca cruzam-se com outras de mala Louis Vuitton a tiracolo, um rodopio de sons instala-se no corpo, entra-se num café para relaxar e a TV está ligada na mais recente guerra inventada pelos homens. Era meia-noite e meia, no Festival Sudoeste, e foi isto que se ouviu no espectáculo da britânica M. I. A. . Há uns anos alguém pensou na designação “músicas do mundo” para classificar as músicas não Ocidentais. Mas o que é a “música Ocidental” – qualquer música, de qualquer origem – senão um tráfico constante de influências que, nós, desejosos de ordenar o mundo tentamos decifrar, mas na verdade ininteligíveis. O concerto de M. I. A. foi isso, uma negociação constante entre formas (baile funk, kuduro, dubstep, electrónicas, restos de hip-hop e de rock), amálgama não hierarquizada de Ocidente, Oriente, Brasil ou África, mas cujo resultado final, ao vivo, não é a comum canção pop-rock, estruturada como há cinquenta anos andamos a ouvir. É outra coisa. Massa timbrada. Som robusto, de grande fisicalidade, que sobressalta e faz vibrar. Há cinco anos os franceses Daft Punk mostraram que era possível, naquele local, criar um espectáculo mais vigoroso que qualquer trivial concerto rock, apenas com um som potente e um jogo de luzes eficaz. M. I. A. ainda não está lá mas quase. Fá-lo com uma DJ, uma acompanhante vocal, dois bailarinos que parecem de borracha, três cantoras de apoio envergando burca, um arsenal visual com lasers que mais parece retirado de um qualquer jogo-vídeo e uma música onde os traços das canções são constantemente recriados por alarmes, explosões, caos, vida. Não foi um espectáculo constante. Existiram algumas quebras de intensidade e a primeira saída de palco da cantora parece ter sido provocada por algum agastamento por problemas técnicos, não perceptíveis, mas nada que fizesse perigar uma sessão de música convulsa. Depois de sair, regressou para as três últimas – “Teqkilla”, com membros da assistência a serem convidados a subir ao palco para um brinde; o sucesso global “Paper planes”; e o desvario final com o frenesim rítmico de “Born free”. Antes tinha passado em revista o seu percurso, com temas como “Galang”, “Bucky done gun”, “Bird flu” ou “Bamboo banga”, entrecortados por gritos de incentivo ao público – “façam barulho”, disse inúmeras vezes, uma expressão aprendida com os cúmplices Buraka Som Sistema – e interagindo com ele, sendo transportada pelo ar ou subindo várias vezes às grades. Foi merecidamente o concerto mais festejado pelas 30 mil pessoas presentes, mas para níveis do Sudoeste. Ou seja, existiu euforia. Mas controlada. O público é misterioso, passa o tempo disperso, falando com os parceiros dos lado, como se constatou no concerto dos americanos Flaming Lips, uma autêntica ópera rock no meio da planície, recebida com indiferença. Wayne Coyne bem se esforçou por abanar a plateia, naquele seu registo entre o sarcástico e o autêntico, mas sem grandes resultados. E teoricamente, dir-se-ia um concerto talhado para agradar. Grande aparato cénico, o cantor rebolando dentro de um balão gigante plateia adentro, confetis, megafones, bailarinos, um homem vestido de urso e dois grupos de adolescentes nas pontas do palco que se manifestavam a compasso. Mas não funcionou. A apatia do público não ajudou, mas o rock psicadélico do grupo foi quase sempre requentado e sem nervo. A última canção, “Do you realize?”, acabou por ser o momento grande de um concerto que acabou por não cumprir com as expectativas.
REFERÊNCIAS: