As pessoas vão perguntar: "Meu, o que é que ele sabe de política?"
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Migrantes Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-08-06
SUMÁRIO: "Não podia continuar só a cantar canções", justificou-se o cantor e produtor musical Wyclef Jean, estrela pop internacional e vencedor de três Grammy, que ontem, se tudo correu como estava anunciado, terá ido ao programa de Larry King, na CNN, oficializar a sua candidatura à Presidência do Haiti - o país de onde saiu aos nove anos de idade, que é o mais pobre do hemisfério ocidental e cuja capital, Port-au-Prince, foi arrasada por um violento tremor de terra a 12 de Janeiro.
TEXTO: "Fui intimado a concorrer", explicou ao The New York Times o músico cuja fama há vários anos alimentava especulações de "presidenciável". Uma hipótese que ele, na verdade, não desdenhava, mas que não fazia parte dos seus planos imediatos: "Talvez tivesse esperado mais uns dez anos antes de me meter nisto", confessou. Mas pode ser eleito já a 28 de Novembro (se a votação acontecer na data prevista, o que não é por enquanto garantido). "Não sou eu que me estou a lançar, são as pessoas que me estão a empurrar", continuou, referindo-se aos apelos da juventude, que "sente que não há um futuro para o país". "Eu não quero ser aquela pessoa que, perante a devastação do país que amo, se limita a cantar canções", sublinhou. "As 250 mil pessoas que morreram no terramoto são a razão pela qual eu acho que me devo envolver", disse ontem de manhã no programa Bonjour Haiti da rádio Tropic. Jean admite que "as pessoas vão perguntar: "Meu, o que é que ele sabe de política?"" - e ele responde: "Nada" -, mas considera-se um "líder natural" e promete rodear-se dos maiores especialistas mundiais para resolver os complicados problemas e desafios que o Haiti enfrenta. A sua candidatura já está a gerar entusiasmo no país, onde metade da população tem menos de 26 anos de idade. Wyclef Jean goza de enorme popularidade entre a juventude, mas não só. "Ele fala do coração. Se ele diz que vai fazer alguma coisa, nós confiamos nele. Estamos fartos de pessoas que fazem promessas e não cumprem. Além de que ele já tem todo o dinheiro que precisa e por isso não vai roubar o nosso, como fizeram os outros", contentava-se Lindo Joseph, de 36 anos, citada pelo The New York Times. Se for eleito, e cumprir aquilo que prometeu numa das canções do seu álbum de 2004 Bem-vindos ao Haiti, Wyclef não vai gastar milhões em guerras: vai usar esse dinheiro para dar de comer aos pobres - 80 por cento da população de 10 milhões de habitantes, segundo as estimativas oficiais, vive na pobreza abjecta, com menos de dois dólares por dia (1, 5 euros) e dependente da ajuda humanitária. Carlos Seiglie, um especialista da universidade norte-americana de Rutgers, não se surpreenderá se Jean vencer as eleições. "Coisas mais estranhas já aconteceram. Há uma certa elite política no Haiti que vai estar contra ele, mas isso até funciona a seu favor", considera. Camille Chalmers, que dirige a Plataforma Haitiana para o Desenvolvimento Alternativo, lê na candidatura do cantor a prova da falência da política no país. "É uma catástrofe e um reflexo da debilidade da classe política do Haiti quando o sistema fica à mercê de uma pessoa mediática que aterra aqui vinda do estrangeiro", comentou ao The New York Times. O músico tem até sábado à meia-noite para fornecer os documentos exigidos pelo Gabinete Eleitoral Nacional do Haiti, cujo conselho tem depois uma semana para avaliar as candidaturas e determinar a elegibilidade dos seus proponentes. Segundo a lei, os candidatos têm de ser naturais do Haiti, têm que aí ter vivido por pelo menos cinco anos consecutivos e têm de ser proprietários de terra no país. Nascido em Croix des Bousquets, um subúrbio da capital, Wyclef Jean escapou com os pais e os irmãos da pobreza do Haiti aos nove anos de idade, seguindo a rota da imigração daquele país para os Estados Unidos, onde vive. Com 15 anos, juntou-se ao primo Prakazrel "Pras" Michel e à sua colega de turma Lauryn Hill no grupo de rap The Tranzlator Crew. Três anos mais tarde, os três criaram o seu próprio projecto, baptizado com o nome The Fugees, o calão por que eram conhecidos os refugiados haitianos. Em 1996 o grupo dissolveu-se e Wyclef iniciou uma carreira a solo.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave lei imigração ajuda pobreza humanitária