Bagdad: a grande ruína
MINORIA(S): Animais Pontuação: 3 | Sentimento 0.8
DATA: 2010-08-25
SUMÁRIO: A erva cresce por toda a parte, mesmo sem água. Os animais encontram onde beber. Um país arrasado, uma cidade destruída por bombas e depois por explosões, bombas humanas sem fim. Gente ameaçada de morte. Gente com fome e sem dinheiro para a renda. Sem desistir. Al-Rasheed é o maior campo de deslocados do Iraque. Está cheio de gente que recusou morrer.
TEXTO: Theba nasceu há 20 dias. Está ao colo da mãe, Rajah, que nasceu há 18 anos. Theba está na sala da casa da avó, Salwa Lifain, que vive no Al-Rasheed, antigo quartel, hoje o maior campo de deslocados internos do Iraque, país com pelo menos 2, 8 milhões de deslocados. Theba é o mais novo habitante de Al-Rasheed. A mãe de Theba vive com o pai do bebé e com os pais dele e os irmãos numa casa na mesma rua. Agora está em casa de Salwa, que quando as iraquianas têm filhos vão para perto das mães, no Al-Rasheed ou em qualquer lugar. O marido de Rajah "vendia garrafas de água na Praça al-Andaluz, mas a polícia correu com ele porque ele não tinha autorização", conta a jovem mãe. "O pai e dois dos irmãos têm trabalho na construção. Antes viviam numa casa alugada em Nova Bagdad, mas as rendas subiram. "Salwa veio com a família há três anos, depois de perder o marido, que como não trabalhava para o Governo não lhe deixou pensão. Talvez haja alguma pensão para Salwa mas se há ela nunca descobriu. Já tentou, até foi a um gabinete do município de Bagdad que se ocupa de órfãos e viúvas, "e eles não nos deram nada". Depois, regressou. Ou era preciso levar mais documentos ou então já era demasiado tarde para fazer o pedido. Das duas uma, ela não voltou. Quando o marido de Salwa morreu, "de ataque do coração", ela ficou sem poder pagar a renda da casa alugada em Sadr City, o grande subúrbio xiita de Bagdad. Oitenta mil dinares por mês. E ela na rua com os filhos todos, quatro. Despejados. Depois, veio ao Al-Rasheed e uma família vendeu-lhe esta casa, que no Al-Rasheed já não há espaços livres e até se vendem casas, espaços para ocupar e para viver. A seguir, Salwa foi buscar os móveis e as roupas que deixara na rua e trouxe tudo. Pagou 750 mil dinares à família que aqui vivia e aqui ficou. "Comprei o telhado e as portas. Arranjei o que era preciso. "No Al-Rasheed vivem 350 famílias, mais de 1500 pessoas, registadas por Abu Mohammed, responsável pela segurança a quem o Governo paga para viver no Al-Rasheed, assegurar que ninguém faz mal a ninguém e registar as famílias que aqui vivem, as mortes e os nascimentos, os que partem e os recém-chegados. É isso que o Governo faz pelo Al-Rasheed. Isso e ameaçar despejar as famílias que aqui vivem, ocupas, todas ocupas. Também há polícias no Al-Rasheed, trabalham para Abu Mohammed e passam o dia numa casinha que deve ter sido posto de controlo e vigia e continua a ser. Fica para lá da casa de Salwa, onde o campo devia realmente começar, só que o campo cresceu e agora há uma rua antes deste posto, a rua onde vivem Salwa e Rajah, em casas rodeadas por muros feitos de pneus e pedaços de chapa de carros e de outros objectos que há no lixo e no Al-Rasheed. A rua delas tem uma fila com dez casas. "O campo foi ocupado em 2003. Entretanto, algumas pessoas conseguiram sair e venderam as casas onde viviam. Já não há espaço. As pessoas compram estas casas a pensar que gastam menos do que a construir", explica Hussein, um jovem que vive na mesma fila de casas. É um dos autodenominados faz-tudo do Al-Rasheed. Faz puxadas de electricidade, faz desvios dos canos de água, faz o que for preciso. Quando Salwa se mudou para o Al-Rasheed começou a vender gasolina na rua, para dar de comer aos filhos. Os filhos cresceram. Ridha tem dez anos e Hassan tem 13 e já não a deixam vender gasolina na beira da estrada. "Quando ficaram mais crescidos disseram-me para ficar em casa e foram eles trabalhar. "Agora, são eles que se põem a caminho, vendem pacotes de lenços no meio da estrada, entre os carros, entre o trânsito, de manhã e depois de novo à tarde. Há muitas crianças a vender pacotes de lenços no trânsito de Bagdad e de outras cidades do Iraque. Ganhem o que ganharem é esse o rendimento da família, é com isso que a mãe e eles e a irmã mais nova, Hanabi, sete anos, comem ou deixam de comer.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave campo ataque