Blair diz que Brown foi o "desastre" político que ele previu mas não conseguiu evitar
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento -0.25
DATA: 2010-09-02
SUMÁRIO: Uma outra parceria, não menos inédita, está agora no poder em Londres e dois irmãos disputam entre si o trono dos trabalhistas, mas é ainda o jogo de forças entre os dois titãs políticos da última década e meia que continua a fascinar os britânicos. Tony Blair, remetido ao silêncio durante três anos, provou-o ontem ao levantar finalmente a cortina sobre a sua relação "quase impossível" com Gordon Brown - um político "brilhante" a quem faltava "inteligência emocional" e que foi na chefia do Governo "o desastre" que o seu sucessor diz ter previsto.
TEXTO: Há muito mais em Tony Blair - A Journey (Uma Viagem, um título mais modesto do que a versão pré-anunciada de Tony Blair - A Viagem) do que o ajustar de contas que ontem encheu as manchetes dos jornais e das televisões. Há o Iraque e a defesa de uma decisão que marcou o seu legado como primeiro-ministro; revelações como a de que bebia "perto do limite" e que isso o ajudava a lidar com o stress; revelações sobre os bastidores do poder e uma avaliação orgulhosa de um "grande governo reformista". Mas nada é tão forte como as palavras que dedica ao seu ex-ministro das Finanças e ao conflito surdo que mantiveram durante anos. "As memórias de Tony Blair fazem-me lembrar a extraordinária entrevista da princesa Diana ao [programa] Panorama. Confirmam que aquilo que foi noticiado sobre o que acontecia nos bastidores era apenas metade da história", escreveu no seu blogue o editor de política da BBC, Nick Robinson. Uma das histórias nunca contadas é a da suposta chantagem feita em Março de 2006, na "mais feia das reuniões" entre os dois: Blair conta que Brown terá ameaçado explorar o escândalo que na altura ensombrava o Governo (a troca de lugares na Câmara dos Lordes por doações ao Labour) se Blair não travasse a reforma do sistema de pensões - o que acabou por suceder. "Não vale a pena negar, nos últimos tempos as coisas foram extremamente difíceis", admitiu o ex-primeiro-ministro, na entrevista que a BBC fez coincidir com o lançamento das memórias. Brown era então um "tipo estranho", "por vezes enlouquecedor", que conspirava para conseguir o lugar que Blair prometera ceder-lhe. Só que era já claro que os dois "não estavam a trabalhar na mesma agenda" e que Brown funcionava como "travão" às reformas do Governo. Então por que nunca o demitiu? Blair tem duas respostas, uma estratégica a outra política: "Era melhor mantê-lo perto e controlado do que deixá-lo partir " e, por mais conflitos que houvesse, "a verdade é que, sempre que pensei substituí-lo, concluí que ele era o melhor para o lugar". A passagem de testemunho aconteceu em Junho de 2007 - "teria sido impossível evitá-la" - mas, no mais cru ataque ao seu sucessor, Blair disse ao Guardian ter sempre sabido que os três anos seguintes seriam "um desastre". Não só porque ao novo primeiro-ministro faltava a "inteligência emocional", mas também porque o "Labour só venceu enquanto foi New Labour" e Brown esqueceu-se disso. Sem remorsosMais emocional é o capítulo sobre guerra do Iraque. Um dia depois do fim das operações de combate americanas no país, Blair admite que falhou "ao não prever o papel da Al-Qaeda e do Irão" no período que se seguiu à invasão e admite a sua "angústia" em relação à perda de vidas humanas. Diz também "lamentar profundamente" o sofrimento das famílias dos militares mortos, mas acrescenta: "Não posso ter remorsos sobre a decisão de avançar para a guerra. " Insiste que, apesar de não terem sido encontradas armas químicas ou biológicas, Saddam Hussein "mantinha a intenção de as desenvolver" e, por isso, a invasão foi justificada. Blair também não escapa à polémica quando fala sobre o futuro do Labour. Nem no livro, nem nas duas entrevistas que gravou antes de partir para Washington, diz quem apoia na corrida à liderança. Mas deixa clara a sua preferência por David Miliband - o mais New Labour dos candidatos - quando critica os que, como Ed Miliband, tentam encostar o partido à esquerda. Numa das declarações que mais impacto terão na campanha, Blair avisa que se o Labour não quer perder as próximas eleições tem de manter-se como uma "força progressista" e voltar a ocupar o centro. Martin Kettle, o jornalista que o entrevistou para o Guardian, diz não ter a certeza de que Blair tenha estado, como ele alega, três anos longe da política britânica, mas que com este livro "ele está definitivamente de volta".
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave guerra ataque princesa chantagem