Afeganistão vai a votos... apesar de tudo
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DATA: 2010-09-18
SUMÁRIO: Violência deverá manter muitos eleitores afastados das mesas de voto. E ninguém garante que fraudes de 2009 não voltem a repetir-se.
TEXTO: Bilal Ahmad, de 25 anos, decidiu que não vai votar. "Quem é que se atreve? O Governo não nos consegue proteger", lamentou o jovem de Kandahar, contando que um funcionário eleitoral foi sequestrado pelos taliban e enforcado numa árvore do vale de Arghandab, nos arredores da grande cidade do Sul do Afeganistão. Malik Nazir Gul queria votar, mas hoje não vai percorrer a hora de caminho até à cidade mais próxima. Ele e outros anciãos da aldeia de Sarkand, na fronteira com o Paquistão, até se ofereceram para guardar a mesa de voto, mas a Comissão Eleitoral decidiu que não era seguro levar a urna até ali. No dia em que o Afeganistão elege, apenas pela segunda vez, o seu Parlamento por sufrágio universal, histórias como as de Ahmad e Gul, contadas pela AFP e o Washington Post, repetem-se aos milhares pelo país. Sobretudo no Sul e Leste, terreno que é ainda dos taliban, mas também no Norte, em regiões até há pouco tempo consideradas seguras. Tal como no ano passado, os fundamentalistas puseram em marcha uma campanha de intimidação e prometeram atacar sem clemência a votação. "O emirado islâmico tomou determinadas medidas para fazer fracassar este processo americano", anunciou Zabihullah Mujahid, que se diz porta-voz do comando taliban. Ameaças que não são vãs. As presidenciais de 2009 foram o dia com mais ataques dos últimos anos e a violência não parou de aumentar desde então - 2010 prepara-se para ser o ano com mais baixas civis e militares desde a queda dos taliban. Uma violência que muitos dos mais de 2500 candidatos sentiram de perto. A Fundação para as Eleições Livres no Afeganistão (FEFA), principal grupo de observadores locais, contabilizou centenas de incidentes, quatro candidatos mortos e dezenas de outros forçados a desistir. Em muitas províncias, não houve comícios, apenas pequenas reuniões em casas particulares. "Não podíamos ter pior altura para tentar conseguir um bom resultado", admitiu à AFP Staffan di Mistura, o alto-representante da ONU no Afeganistão, para quem a simples realização do escrutínio é "já um milagre". A ONU é a primeira a admitir que o dia de hoje será violento. Esta semana retirou do Afeganistão 300 funcionários (um terço do seu staff internacional) e deu ordens aos que ficaram e não estão directamente envolvidos nas eleições para não saírem de casa até segunda-feira. "Não é uma evacuação [. . . ], mas seria ingénuo não tomar precauções, uma vez que somos um dos alvos", disse ao Guardian. Outras organizações seguiram-lhe o exemplo, optando por reduzir ou mesmo abdicar de enviar observadores, engrossando os receios de que se voltará a repetir o fiasco das presidenciais, manchadas por fraudes maciças. A ONU e sobretudo o Governo afegão insistem que no último ano foram feitos vários progressos, mas as expectativas são muito baixas. Avanços e recuos"Vai haver muitas fraudes nestas e noutras eleições, se Alá assim quiser", ironizou o juiz sul-africano Johann Kriegler, um dos dois estrangeiros que integram a Comissão de Queixas Eleitorais (ECC), que tem por missão avaliar as queixas. "Não acreditamos que esta seja uma eleição justa e transparente. Acreditamos que será apenas uma eleição aceitável", disse ao Washington Post Haroun Mir, director do Centro de Investigação e Estudos Políticos do Afeganistão, um think tank habitualmente crítico de Karzai. Vários diplomatas ocidentais admitem que há problemas, mas argumentam que, se houver menos fraudes do que em 2009, será já um sucesso importante para o país - "Isto não é a Suíça", disse um deles ao LA Times. Um relatório divulgado em Agosto pelo inspector especial norte-americano para a Reconstrução do Afeganistão concluiu que a logística foi melhorada: a lista das mesas de voto foi conhecida com um mês de antecedência e foram adoptados procedimentos simples para dificultar as fraudes, como o de plastificar as folhas onde são escritos os resultados.
REFERÊNCIAS:
Entidades ONU