Sá Carneiro: "Não foi a figura pacificadora em que o tentam transformar"
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento -0.25
DATA: 2010-11-06
SUMÁRIO: Foi um individualista, pugnou pelas suas ideias, resistiu às oposições internas e externas e dispôs-se a abdicar de tudo por amor. 30 anos depois da trágica morte de Francisco Sá Carneiro, o jornalista Miguel Pinheiro apresenta uma biografia do fundador do PSD.
TEXTO: Provavelmente não há ninguém neste país com mais de 35 anos que não se recorde do dia em que Francisco Sá Carneiro morreu, a 4 de Dezembro de 1980, vítima de um atentado. O avião transportava também Snu Abecassis, Adelino Amaro da Costa e a mulher, Manuela, e António Patrício Gouveia. Foi um dia de comoção nacional. Miguel Pinheiro, então com seis anos, guarda algumas imagens vagas - os pais a correrem para a televisão, o país em estado de choque, pesaroso, com a morte trágica e abrupta do primeiro-ministro, então com 46 anos. Três décadas depois, Miguel Pinheiro, jornalista e director da revista Sábado, é o autor de uma biografia de Sá Carneiro, editada pela Esfera dos Livros, que será lançada na quinta-feira, na Fnac do Chiado, em Lisboa, com apresentação do historiador Rui Ramos. As pouco mais de 700 páginas de Sá Carneiro são o resultado de cinco anos de investigação que lhe forneceram informação suficiente para escrever mais um volume. Mas Pinheiro optou apenas por um, biografando o fundador do PSD com o "distanciamento" e a "frieza" necessários para expurgar quaisquer indícios hagiográficos. "Há um mito gigantesco à volta dele. Não seria justo escrever um livro que mostrasse uma imagem de pureza, que é irreal", disse ao P2. Mesmo as constantes premonições de Sá Carneiro sobre a sua morte (dizia saber que iria morrer cedo, de forma violenta) poderiam afigurar-se uma tentação, mas isso "seria muito fácil, bastava escrever tudo da frente para trás". O autor quis antes mostrar as regras do jogo político do período pós-25 de Abril, sem parcimónia, revelando "alguém que também errou muitas vezes e usou tácticas questionáveis". Subsistia, porém, um receio: que do vasto número de entrevistas que realizou (76, feitas a amigos, familiares, detractores e companheiros do PSD) surgisse uma "visão mitificada". Teve uma surpresa: "A maioria já consegue olhar com distanciamento, fazendo até a análise dos seus próprios erros e dos seus tacticismos. " As entrevistas foram um manancial valioso de informação, mas também a consulta de diversos arquivos, entre os quais o que Conceição Monteiro, antiga secretária de Sá Carneiro, ainda guarda, e aquele que ela doou ao historiador José Pacheco Pereira. Muitos documentos e registos áudio deste arquivo pessoal são neste livro publicados pela primeira vez. O acesso a esta documentação, mas também a audição de muitas horas de reuniões, a leitura de correspondência, as informações dadas pelos entrevistados ou as notas manuscritas de Sá Carneiro, permitiu a Pinheiro reproduzir uma série de diálogos, referenciados nas notas finais. Um dos mais marcantes aconteceu nos primeiros dias de Janeiro de 76, quando, à mesa do restaurante Tavares, em Lisboa, Natália Correia garantiu a Sá Carneiro que Snu Abecassis era "a mulher da sua vida":"- Natália, que tal é a nossa editora [Snu era a responsável pela Publicações D. Quixote]. Você conhece-a bem e. . . - É melhor não querer saber como ela é. É uma princesa nórdica que jaz adormecida num esquife de gelo à espera que venha o príncipe encantado dar-lhe o beijo de fogo. Esse príncipe encantado é você. Porque ela é a mulher da sua vida. Corra para ela! Telefone-lhe e convide-a. ""Ânsia de andar depressa"Em 1990, dez anos depois da morte de Sá Carneiro, Vasco Pulido Valente, que foi seu secretário de Estado adjunto e da Cultura no Governo AD, escreveu, num texto intitulado Sá Carneiro: os últimos anos (publicado na revista dominical do PÚBLICO), que o fundador do PSD "viveu (e vive) muito mais na imaginação do que na realidade".
REFERÊNCIAS: