C"est l"humour luso-francês, pá!
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 Migrantes Pontuação: 9 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-11-24
SUMÁRIO: António é emigrante em França. Tem bigode, sobrancelhas espessas, mastiga um palito, coça o peito peludo, diz asneiras. António é a personagem criada por Rodolfo Ferreira Ribeiro - um luso-descendente nascido em Paris cujos pais emigraram para França na década de 1970 - e faz humor com os estereótipos da emigração lusa. Mas não está sozinho. Há mais como ele.
TEXTO: Quem fizer uma pesquisa no YouTube por Ro et Cut dá de caras com esta dupla - composta por Rodolfo e Mohamed Ould Bouzid - que mais parece saída de um filme neo-realista que deu para o torto. Está tudo lá, a atingir-nos em cheio como um garrafão de cinco litros. As barrigas salientes, o futebol como fé, a religião como desporto, o machismo, o "deixa-andar-que depois-logo-se-vê", a boa pinga, os almoços de rebentar pelas costuras, a pronúncia macarrónica, as mulheres de buços fartos e, sim, uma e outra vez, os palavrões. Este tipo de humor-implosão - o humor feito a partir de dentro de uma comunidade - faz furor. Sobretudo na Internet. A dupla Ro et Cut transformou-se num fenómeno sério de popularidade online. Os emigrantes portugueses em França - mais de meio milhão de pessoas - riem-se com os estereótipos dos emigrantes de primeira geração. Daqueles que chegaram com uma mala de cartão, assentaram arraias na periferia e deitaram mãos à obra. O humor feito pela segunda geração de uma comunidade de emigrantes não é novidade. Fenómeno semelhante aconteceu no Reino Unido com os filhos de indianos que rumaram ao país em busca de uma vida melhor. Séries como Goodness Gracious Me e The Kumars at No. 42 (ambas da BBC) tratavam desse desajustamento entre gerações. A guerra entre o inglês e o hindi, entre os jeans e os saris, entre o fish&chips e as chamuças. Estar no cruzamento de duas culturas é estar no epicentro dos choques, da estranheza e de todo o humor que isso gera. Todos conhecem AntónioRodolfo Ferreira Ribeiro, 26 anos, diz ao P2 que a sua inspiração está nas pessoas e situações que o rodeiam. "Gosto do humor que trata do quotidiano. A vida das pessoas é apaixonante e, para os humoristas, é uma fonte de inspiração inesgotável. "Rodolfo voltou-se para o que rodeava, para a sua própria família, e transformou as suas características em material humorístico. "As minhas paródias resumem uma parte da minha vida que eu transformo em sketches, como por exemplo o regresso a Portugal nas férias do Verão. A personagem do António é familiar a todos. Toda a gente conhece um António à sua volta. "Rodolfo insiste, porém, que está empenhado em inovar estas caricaturas e "trazer novas ideias para o circuito do humor". Lionel [assim mesmo, com um i] Cecílio, também ele luso-descendente, actor e que teve em cena o espectáculo Suite Royale 2026, no qual parodiava as suas raízes portuguesas, confirma que também se inspirou em quem o rodeia: "Comecei a imitar as pessoas que estavam à minha volta - as tias, os avós. . . - e a transformar em gozo as situações e as pessoas que tinham valor para mim. Se eu gozasse com pessoas de quem não gosto, isso seria apenas maldade. Não teria piada. "O seu humor é, por isso, uma homenagem às pessoas de quem gosta. E mais: gozar com os portugueses é, no fundo, gozar consigo próprio. "A autocrítica é a base indispensável de um humor saudável", diz. E afinal quais são as características com que gozam os filhos dos emigrantes? Carlos Pereira, director do Luso-Jornal e espectador atento destas novas formas de humor em que a comunidade portuguesa se vê retratada, explica ao P2 que há sempre características constantes nestes exercícios de autocrítica. "O machismo, as asneiradas, o facto de os portugueses serem barulhentos, a religiosidade, as mulheres peludas. . . "A mistura do francês e do português - unanimemente considerado pelos humoristas como uma terceira língua, o frantuguês - é outro ingrediente sempre presente. "Todos já ouviram frases do género: "Vou meter ça na poubelle do lixo e après já volto tout de suite". . . ", ilustra Lionel.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave guerra comunidade género mulheres