Faria de Oliveira: "A solução do BPN compete ao Governo e não à CGD decidir"
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento -0.25
DATA: 2011-01-10
SUMÁRIO: A CGD está a dinamizar a criação de um mega fundo, que não terá menos de mil milhões de euros, para ajudar a capitalizar as empresas portuguesas, revelou Faria de Oliveira, presidente do banco público, cujo mandato à frente da administração terminou em Dezembro.
TEXTO: O banqueiro mostrou-se disponível para continuar em funções, se a tutela assim entender. Em entrevista ao PÚBLICO defende que, em vésperas da realização dos novos testes de stress, o aumento de capital anunciado no último dia de 2010, veio dar conforto aos rácios de capital da CGD que “estão hoje [Tier 1 de nove por cento] melhor do que em 2007”. Faria de Oliveira lembrou que entre 2005 e 2009 ao grupo preservou a liderança do sector, tendo entregue mesmo ao Estado cerca de dois mil milhões de euros. E deixou o aviso: as famílias vão ver as prestações das casas subirem e o seu nível de vida baixar. “Em economia não há milagres. ” Faria de Oliveira aconselhou os portugueses a pouparem e a comprarem produtos nacionais. Sobre as críticas de Cavaco Silva [de que é apoiante] à gestão da CGD, no BPN, defende que o banco apenas cumpriu as orientações do Governo. Faria de Oliveira – Como é que avalia as críticas de Cavaco Silva à gestão do Banco Português de Negócios (BPN) liderada pela CGD?PÚBLICO – Não faço, nem devo mesmo fazer, comentários de natureza política. Falo numa posição institucional e apenas posso dizer que da nossa análise, a CGD cumpriu o mandato cometido pelo Estado em termos da gestão do BPN. O mandato tinha vários elementos em causa. Primeiro era fazer um levantamento exacto da situação do BPN. o que levou logo a constatar que os últimos elementos de Agosto de 2008, estavam muito aquém da auditoria realizada pela Deloitte. De facto foi possível constatar que o total de imparidades e de factores contingentes em relação às contas de 2008 se situavam em 1, 988 mil milhões de euros e não em 1, 248 mil milhões de euros, que era número que existia à data da nacionalização. E constatou-se ainda que o BPN revelava uma posição económica financeira caracterizada por capitais negativos superiores a 1, 6 mil milhões de euros [hoje são de dois mil milhões de euros]. Mas de críticas de Cavaco Silva não tiveram a ver com o diagnóstico feito pelo CGD, mas pelo facto do dossier estar a demorar muito tempo a ser encerrado com prejuízo para o erário público. Não acha que a privatização do BPN foi realizada no timing errado, apesar de terem existido avisos nesse sentido?Os timings não foram definidos pela CGD que não tem detém as acções do BPN. No que configurava um banco tecnicamente falido, a CGD fez a avaliação das alternativas estratégicas, definiu um conceito estratégico e operacional, o seu plano de implementação e reestruturação. E participou activamente na elaboração do seu plano de privatização juntamente com os consultores nomeados pelo governo, procurando ainda cumprir os prazos que lhe tinham sido fixados na apresentação dos diferentes documentos. Faz parte da comissão de honra da reeleição de Cavaco Silva, mantém a sua confiança no actual Presidente da República?Como Presidente da CGD, e como expresso num comunicado da CGD, considero injustas as críticas. Porventura infelizes. Mas todos sabem que faço parte da Comissão de Honra da sua candidatura. Obviamente votarei Cavaco e confia nele. A necessidade de Sócrates anunciar que vai por o BPN no mercado revela um complexo em relação ao PREC [nacionalizações de 1975]? Quando o processo de privatização foi decidido estávamos a sair do final do período da crise económico financeira derivada da crise de subprime. Acontece que em Maio e Junho [2010], apareceu a crise da divida soberana, que coincidiu com a finalização dos documentos para a privatização do BPN que foram lançados no final de Junho e, portanto, acabou na realidade por haver uma coincidência do processo de privatização do BPN com um dos momentos mais difíceis porque passava o sistema financeiro português o que afastou o interesse dos investidores. Os grupos que levantaram o caderno de encargos alegam que o modelo de privatização estava mal concebido. Foi a CGD que o propôs?Não. A CGD apresentou ao Governo as diferentes alternativas de privatização do BPN e participou com os consultores e a Direcção Geral do Tesouro na elaboração do caderno de encargos. Mas não competia à CGD, que não é o accionista, a escolha do modelo de privatização. Opôs-se à integração do BPN na CGD. Hoje mantém essa posição?A integração do BPN na CGD pode ser feita. Devo sublinhar que a rede do BPN é praticamente coincidente com a da CGD. Algumas, poucas, poderiam ter interesse para a CGD. Mas os serviços centrais do BPN seriam redundantes em relação aos da CGD. E o processo de integração do BPN na CGD conduziria à integração no balanço da CGD de um conjunto vasto de imparidades que afectariam o resultado da CGD. Qual é então a solução?Compete ao governo e não à CGD decidir. A CGD neste trabalho de assegurar a gestão do BPN e de assessorar o governo apresentou, já depois de ter falhado a privatização, e como devia ter feito, algumas alternativas. Mas compete ao Governo revelá-las, não à CGD. O Governo já comunicou à CGD como vai resolver o dossier?Penso que o Governo irá muito brevemente anunciar. Mas gostaria de dizer que durante este período, e não obstante o banco estar com capitais próprios negativos, e de todo o ruído que se fez à sua volta, o que conduziu a uma saída de depósitos significativa, o BPN aumentou o número de clientes. E, dentro do possível, a gestão procurou limitar a saída de depósitos e gerir com todo o rigor a capacidade de funding. Fernando Ulrich já veio perguntar se os depósitos que saíram do BPN desde a nacionalização [quase três mil milhões de euros] foram para a CGD. Qual é a resposta?Só os clientes do BPN podem dar esclarecimentos. A CGD nunca deu nenhum tipo de recomendação aos clientes do BPN para se mudarem para a CGD. O BPN na situação em que está não consegue obter funding e a CGD tem estado a financiar a sua actividade, com empréstimos que gozam da garantia do Estado. Com garantias reais?Neste momento os activos estão avaliados pelos auditores. Há imparidades, mas com uma capacidade de valorização com o tempo e em função da evolução dos mercados. A tendência é valorizar porque neste momento estamos numa perspectiva muito negativa, mas só o futuro o dirá. Está confiante que haverá uma solução rápida para o BPN dado que este não pode funcionar com uma situação líquida negativa?A grande esperança era a privatização, tendo esta falhado terá de haver uma solução rápida. A quem interessa o BPN?Aos bancos “entrantes” ou aos bancos nacionais que queiram aumentar a rede, mas aqui jogam as condições do caderno de encargos que não são as mais favoráveis. O aumento de capital da CGD realizado no último dia do ano, está relacionado com os financiamentos ao BPN?Não. Um aumento de capital deve considerar-se muito bem-vindo. Acontece que o sistema bancário português neste momento tem grande dificuldade de obter funding no exterior, pois foi vítima da redução de rating que acompanhou a redução do rating da República. E deve tentar demonstrar perante os mercados a sua solidez que embora seja conhecida, quanto mais reforçada for, melhor será. Era muito importante que os bancos portugueses aparecessem ao mercado com rácios de solidez acima da média da banca europeia. Estamos em vésperas de novos testes de stress mais rigorosos. O aumento de capital procura acautelar o bom desempenho da CGD?Precisamente. Portanto este aumento de capital é muito importante desde logo para reforçar os rácios de capital do maior banco português, uma referência e de uma enorme importância para o sistema. Por outro lado, o aumento contribui para que a CGD continue a cumprir a sua missão de financiar a economia portuguesa. A CGD tem vindo a reduzir a sua rentabilidade por força do que tem sido referido e, no contexto de apreciação, por parte das agências de rating, é importante demonstrar que a solidez da CGD se mantém. Neste momento os capitais próprios da CGD aumentaram oito por cento em relação ao ano passado, pelo que se reforçaram fortemente. E vamos apresentar um Tier 1 perto de nove por cento. A CGD apesar de toda a crise dos últimos três anos, está melhor em termos de solidez do que em 2007. A banca nacional tem condições para passar no exame dos novos testes de stress?Estou certo que sim. Os rácios já incluem a exposição à divida pública europeia?Sim. E isso é muito relevante pois permite que o BCE e as agências de rating possuam uma imagem diferente, permitindo aos mercados fazerem uma apreciação mais correcta, não apenas da situação económica do país, mas da banca portuguesa. Quanto maior forem os rácios de capital, melhor será apreciação que se faz da situação da CGD. Nesta fase de dificuldades de liquidez, temos estado a realizar um conjunto de encontros em vários países, que vão passam pelos do médio oriente e do extremo oriente. O objectivo é obviamente apresentar uma CGD forte. Esta semana saíram notícias sobre a venda da posição da italiana Eni na Galp à brasileira Petrobras, o que poderia passar pelo reforço da CGD na petrolífera. Confirma?Não temos informação acerca de negociação. A CGD está disponível para reforçar?Nesta matéria a CGD age em conformidade com a decisão do accionista. Mas obviamente este não é o momento para reforçarmos. E sinto-me satisfeito com a posição que temos na Galp (um por cento com direitos especiais acordados estatutariamente). O seu mandato à frente da CGD terminou a 30 de Dezembro. Já conversou com a tutela?Não. Está disponível para ficar?Se o accionista entender que o melhor para a instituição é a manter o actual CA, estarei pelo menos aberto a ponderar a minha continuidade. Cumpriu os grandes objectivos do seu mandato?No actual contexto, e com todas as dificuldades, sinto-me muito bem com o que foi alcançado. Pode avaliar a sua liderança?Começando pelos aspectos menos conseguidos, daquilo que eu considerava serem as prioridades estratégicas deste conselho de administração. Não ter conseguido concretizar neste mandato o IPO (dispersão de parte do capital em bolsa) da seguradora, como proposto logo no início do mandato, o que teria libertado recursos muito importantes para as necessidades de financiamento da economia, foi uma delas. A segunda prioridade tinha que ver com a criação da holding das participações estratégica o que teria permitido à CGD retirar do seu balanço as participações estratégicas, facto que nos tem penalizado pois temos de registar imparidades em relações a essas participações, que no total ascendem a 1, 235 mil milhões de euros. Já disse que lamentava não ter conseguido adquirir um banco em Espanha. Continua com esse sentimento?Sim, tínhamos um objectivo de fazer crescer um banco em Espanha, porque 30 por cento das exportações portuguesas se destinam a Espanha e 30 por cento das importações vem daí. E, portanto, surge como natural haver um banco português que apoie os empresários nacionais que trabalham em Espanha. Com excepção do BES em Espanha, mais orientada para outros segmentos, a CGD é a única que tem um pequeno banco, mas precisa de ganhar escala para ganhar imagem e poder enfrentar grande concorrência. E a operação não chega para captar depósitos, daí estar muito ligada à CGD em termos de funding. Só um aumento de dimensão permitirá uma maior autonomia. Tem pena de não ter adquirido um banco em Espanha, ou acabou por ser bom para a CGD não ter feito negócio, tendo em conta os problemas que o sector bancário espanhol revelou e que continua a enfrentar?A crise que se passou em Espanha acabou, provavelmente, por ser boa conselheira. E nós temos de saber escolher a ocasião. E não encontrámos neste período o momento para fazer a operação. Mas no futuro penso que será algo desejável. A crise veio provar que Portugal deve apostar na diversificação das exportações e importações?É verdade, mas os países vizinhos são sempre os maiores parceiros. Mas não podem ser dominantes. Agora, e relativamente ao negócio e à actividade comercial, a CGD teve um excelente desempenho. O que tem também a ver com a redução de rentabilidade, o que foi feito num contexto em que os aumentos de spreads foram sempre muito contidos, para apoiar a economia. Outra questão fundamental, e que era um dos nossos objectivos, passava por assegurar o crescimento do crédito às PME, que cresceu neste período 18 por cento. E ainda aumentar as operações de capital de risco, para permitir a capitalização das empresas, que registaram um aumento de 25 por cento. Aumentar a contribuição do negócio internacional para os resultados da CGD foi conseguida, pois cresceu 300 por cento em termos relativos e oito por cento em termos absolutos. Mas os lucros da CGD nos últimos anos têm caído?O objectivo de ter os melhores resultados líquidos do sector não foi alcançado. E porquê? Ter lucro não é um objectivo em si. O primeiro de todos os objectivos e a solidez [nos últimos três anos a CGD recebeu vários aumentos de capital], seguido do crescimento, da rentabilidade, da eficiência do serviço, responsabilidade social. O melhor resultado operacional da CGD de sempre foi em 2008. Ainda assim os objectivos relacionados com o negócio doméstico, e todos definidos pelo accionista, foram cumpridos. A liderança entre os cinco maiores bancos em activo líquido, foi reforçada. A captação dos recursos, foi reforçada. Ser o primeiro em crédito hipotecário, foi mantido. E a liderança da quota no mercado de seguros, aumentou. E ainda dentro da gestão da CGD, que foi gerida com grande contenção de custos, há a componente internacional onde temos tido grande sucesso. A actividade do Brasil é uma prova, pois as maiores empresas brasileiras já operam com a CGD. E não podemos crescer muito mais no Brasil, pois precisamos de injectar fundos, e nós precisamos de preservar a liquidez interna. E há Angola, onde temos uma operação mais pequena onde temos 24 por cento, mas vamos comprar a restante parte ao Santander com quem iremos trabalhar porque é um bom parceiro. Como vão ser os lucros da CGD em 2010?Serão ligeiramente inferiores aos obtidos em 2009 [276 milhões de euros]. Mas ficarão acima dos 250 milhões de euros?É pouco provável. Mas não consigo dizer porque as contas não estão fechadas. Qual o montante de dividendos que a CGD vai entregar em 2010 ao Estado?As contas não estão fechadas, mas aproveito para lembrar, algo que a grande maioria ignora, é que a CGD apresentou lucros consolidados entre 2005 e 2009 de 2, 865 mil milhões de euros, o maior de todos. Entregou dividendos ao accionista Estado de 1, 265 mil milhões de euros. E apurou um IRC pago de 732, 9 milhões de euros. Ou seja: a CGD entregou ao Estado cerca de dois mil milhões de euros. E porque é que os resultados caíram: as imparidades de títulos de participações, seguros e fundos da CGD nos três anos foram 1, 260 mil milhões de euros. Houve ainda a queda da Euribor que passou de mais de quatro por cento para um por cento, o que se reflectiu na queda da margem financeira. A CGD foi criticada por ter dado muito crédito, no mandato anterior ao seu, a grandes clientes com base em títulos cotados, ficando à mercê da volatilidade das bolsas. Nesse segmento, qual o montante das imparidades?Houve algumas imparidades nesse domínio, mas não sei qual o montante total, apenas sei que se tem vindo a pedir aos clientes o reforço de garantias por parte das entidades a quem foram feitos os financiamentos. Os spreads [diferença entre a taxa de juros que as instituições pagam na captação do dinheiro e a que cobram dos clientes] na banca vão continuar a aumentar?Enquanto a actual situação se mantiver sim. Prevê subida da Euribor (juros) nos próximos meses?Este ano sim. As famílias devem preparar-se para um aumento das prestações do crédito à habitação. Portanto está a aconselhar os portugueses a pouparem. . . . . . poupança, poupança. . . . . . e o nível de vida vai continuar a baixar?Sim. Em economia não há milagres. Como está a proposta de alteração do modelo de governação da CGD?Na CGD não faz sentido adoptar um modelo dualista. A CGD, por ter um só accionista, tem naturalmente o modelo monista [chairman e o CEO acumulam] como mais adequado. Agora o que se pode fazer, mas essa é tarefa do accionista, e em função de comentários das agências de rating ao modelo de governação da CGD, e penso que se justificaria, era a criação de quatro administradores não executivos para liderar certos tipos de comité: de auditoria, risco, vencimentos, governação. Quais devem ser os desafios da CGD no próximo mandato?Os grandes desafios da CGD estão integrados nos grandes desafios de Portugal: saneamento das finanças públicas, crescimento económico, reformas estruturais e poupança. Para todos estes factores é necessário um sistema financeiro sólido e o papel da CGD e dos bancos em geral é muito importante. Nomeadamente ao nível do crescimento económico para evitar uma forte recessão. E não há milagres em economia e, no caso concreto do momento presente, só temos duas vias para o crescimento económico: aumentar e diversificar as exportações, dar preferência aos produtos portugueses. Foi ministro de Cavaco Silva e presidente de um banco. Ao longo das últimas duas décadas, as elites políticas e económicas nacionais contribuíram com as suas decisões e opiniões para o desmantelamento dos sectores produtivos, alegando sempre que o que interessava era o preço. Não é estranho que venham agora manifestar preocupação com a situação?Tem toda a razão. Mas essa era a óptica da defesa do consumidor. Agora vem a segunda óptica pois estamos num momento de emergência e há que reduzir as importações, garantir emprego e fazer com que as empresas funcionem. Este devia ser um grande movimento nacional, mas há dificuldades pois fazemos parte da UE, e não se pode fazer uma campanha a dizer compre português. Tem é que existir uma sensibilização das pessoas. Tendo em conta que a CGD é uma empresa pública, de que modo pode contribuir para o desenvolvimento do país?No futuro entre outras coisas a CGD tem que apostar fortemente no apoio às exportações, e apostar na reestruturação corporativa, que é um elemento chave com dois objectivos: imunizar o banco da volatilidade dos mercados, isto é, retirar do balanço os activos sujeitos a volatilidade, centrar o banco na actividade bancária e separar as restantes áreas que hoje fazem parte do grupo e preparar a privatização parcial dos seguros e encontrar uma parceria para a área da saúde. A venda da EDP [passagem para o Tesouro] já faz parte deste tipo de actuação. Sendo Portugal uma pequena economia aberta, e periférica, o modelo de desenvolvimento deve estar sustentado em que sectores?Serviços ligados ao turismo, conteúdos, saúde, terceira idade, educação, desenvolvimento das tecnologias limpas. O que vai ao arrepio do que defendeu, que há que apostar no sector produtivo/industrial?Não. Porque junto a isto deve haver uma aposta na logística, portos e aeroportos, e nas indústrias, em clusters onde Portugal é forte, nas madeiras e cortiças e no mar que tem recursos brutais em toda as áreas (estaleiros e pesca). O futuro deveria ser muito levado a pensar numa nova narrativa para Portugal: pensar no que queremos ser e apostar nisso. Sigo o Ernâni Lopes de alma e coração. Mas as empresas estão descapitalizadas e a liquidez na banca é reduzida?Sim, e nada vai funcionar se não houver capitalização das empresas. Este é um factor determinante: melhorar os rácios de autonomia financeira das empresas porque num momento de dificuldade de acesso ao crédito isto é vital. Tendo em conta que o país sofreu em 1974 uma brutal interrupção da acumulação de capital qual é a solução?Estou a procurar dinamizar um mega fundo para a capitalização das empresas. Quando digo dinamizar, quero dizer que a CGD participará, pois sozinha não tem condições para o fazer. Mas este mega fundo terá característica muito importante: vamos tentar atrair os outros bancos nacionais, que tal como nós estão interessados em apoiar as empresas, fundos internacionais e outras instituições ligadas ao empreendedorismo e ao capital de risco. Norte-americanos, árabes, alemães, italianos, brasileiros. A banca portuguesa teria o controlo do fundo?É mais importante ter a gestão do que o controlo, embora não me importe de ter a gestão partilhada com esses investidores internacionais, o que dá credibilidade e segurança às empresas portuguesas. Mas tem tido reuniões para pôr em marcha o projecto?Neste momento é uma ideia em andamento. Está a ser, por incumbência do conselho de administração da CGD, comandada pela Caixa BI [por Jorge Tomé]. Já falou com os outros bancos portugueses?Ainda não falei com muitos. Qual será a ordem de grandeza do fundo?No mínimo de mil milhões de euros, isto para começar. Mas por enquanto estamos a mobilizar esforços nesse sentido. E se conseguíssemos seria uma ajuda enorme à economia portuguesa. Até Abril a banca portuguesa terá de ir levantar fundos ao mercado de 15 mil milhões de euros. Há condições para o fazer?O sinal de que se cumpriu a meta orçamental de 2010 é muito bom. Importa que a execução orçamental nos primeiros três meses de 20011 seja também positiva. E os 15 mil milhões de euros no contexto internacional são pouca coisa. Mas estamos todos a procurar mudar a percepção dos mercados acerca de Portugal. A manter-se o bom comportamento das exportações, um desempenho razoável do crescimento económico, algum aumento da poupança, a par da apresentação de uma estratégia consistente para o crescimento económico a médio e longo prazo, serão contributos essenciais para readquirir a confiança dos mercados. E penso que seria de toda a conveniência reforçar os esforços que têm sido feitos ao nível da informação da situação real da nossa economia – temos problemas, mas também temos muitos êxitos – junto dos investidores, dos bancos, dos responsáveis editoriais da imprensa económica internacional (Alemanha, Reino Unido, França, Espanha, Holanda, EUA, Hong Kong, Médio Oriente, China, Índia, Japão, Brasil…). Tenho esperança que consigamos superar a desconfiança. Acredita na execução orçamental (em 2010 parece poder ser conseguida) em 2011?Tem de acontecer. Infelizmente o esforço de contenção orçamental que nos é exigido é violentíssimo. Depois de ter incentivado todos os Estados Membros a apoiar as economias para evitar a depressão e sair mais depressa da recessão motivada pela crise de 2007-2009, aumentando para o efeito a despesa pública e os défices orçamentais, pretende-se realizar uma redução da despesa e do défice, interno e externo, num curtíssimo espaço de tempo. Conciliar deleveraging e crescimento é tremendamente difícil. Deveria ser concedido mais tempo para realizar o ajustamento. Mas como não foi ainda possível obter consensos e políticas para isso no seio da EU, resta-nos superar-nos e cumprir. Pelo volume de dívida que Portugal tem no BCE, o futuro deixou de estar nas nossas mãos. A intervenção da UE/ FMI ainda é evitável?Desejavelmente, deveremos tudo fazer para resolvermos nós próprios os nossos problemas, sem esquecer que estamos inseridos numa zona que ela própria tem de defender os seus interesses comuns. A situação tem de servir para reforçar a coesão quer da Zona Euro, quer na própria construção europeia. O BCE tem tido uma acção impecável para criar condições para superar problemas muito difíceis O trabalho principal é nosso, mas deveríamos contar com o apoio solidário dos nossos parceiros da área do Euro, tal como Portugal tem sido solidário. É do interesse de todos. Nos últimos dias as autoridades europeias enviaram sinais de que se preparam para intervir em Portugal, nomeadamente para evitar a contaminação de Espanha. . . A situação de Portugal não pode ser comparada à da Grécia e à da Irlanda. Portugal tem de ser encarado como uma economia que tem, sem dúvida, problemas, mas que tem tido uma resiliência económica e da banca muito positiva, havendo outros países como a Bélgica, Itália ou Espanha que também têm problemas. Portugal, com uma estratégia de suporte ao crescimento económico, assente numa primeira fase nas exportações, na preferência pelos produtos nacionais e na capitalização das empresas, e, numa 2ª fase, pelo ajustamento do nosso modelo de crescimento, apostando nos bens transaccionáveis, na inovação, na melhoria da competitividade e focando-nos nos clusters onde somos fortes (insisto numa Florida da Europa “acrescentada”) podemos mudar o país num futuro aceitável. Mas façam-se as reformas estruturais. A vinda do FMI não ajudaria, pelo menos, a controlar a promiscuidade entre o poder político, governo e grandes partidos, e os agentes económicos?Portugal tem séculos de história e sempre soube encontrar os caminhos e superar os momentos mais difíceis. Temos outra vez de o fazer por vontade e determinação própria. Portugal precisa de um Governo de salvação nacional?Precisa de estabilidade política. De condições de governabilidade. A celebração de acordos de regime ou de outro tipo poderão contribuir para tal.
REFERÊNCIAS:
Entidades EUA UE FMI