Para quem são as "barrigas de aluguer"?
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 3 | Sentimento 0.0
DATA: 2011-02-27
SUMÁRIO: As leis são feitas para pessoas mas, quando a Assembleia da República discutir a maternidade de substituição, os deputados poderão não saber de quem estão falar. São homens e mulheres que escondem o desejo de ter um filho como se planeassem um crime e que aprenderam a calar-se para não se sentirem julgados. Fazem-no tão bem ou tão mal que vivem entre nós e não damos por eles.
TEXTO: Manuel liga para o número de telemóvel que lhe foi dado por um médico, que serviu de intermediário. Ele conhece o nome da jornalista a quem está a telefonar, mas ela não sabe o seu nome. Foi o combinado. No primeiro telefonema, diz que não decidiu ainda, se aceitará dar o seu testemunho. "A maior parte das pessoas não entende isto, nem sei se vale a pena explicar. "Mais tarde, depois de vários contactos, há-de dizer: "Em Portugal, a barriga de aluguer é crime, sabia? Punível com pena de prisão. E é muito estranho estar a assumir em voz alta que a única maneira de eu e a minha mulher termos um filho é irmos ao estrangeiro fazer uma coisa que aqui me levaria à cadeia. " Ele está sentado num canto do sofá; Paula, a mulher, no outro. Ela quase não fala; ele mostra-se racional, metódico, aparentemente frio na forma como antecipa, num discurso lógico, a desilusão. (Ver depoimentos completos na página 6)Leu as notícias sobre a posição do Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida, que recomenda à Assembleia da República a legalização, nalguns casos, da maternidade de substituição. Mas não quer criar expectativas sobre o "tremendo avanço que isso representaria". Hoje, a chamada "barriga de aluguer" é liminarmente proibida em Portugal. A lei diz que mãe é quem dá à luz; e também que "quem concretizar contratos de maternidade de substituição a título oneroso será punido com pena de prisão até dois anos ou pena de multa até 240 dias". Se a Assembleia da República aceitar as sugestões e alterar a legislação em vigor, haverá uma aberta. Continuará a não ser permitido qualquer pagamento, mas uma mulher que não tenha útero devido a um acidente ou a uma doença oncológica ou cujo útero não tenha dimensões ou outras características que permitam uma gravidez, poderá vir a celebrar de um negócio jurídico de maternidade de substituição. O procedimento é muito simples: os óvulos e os espermatozóides do casal são fertilizados in vitro; no momento da transferência dos embriões, estes são colocados no útero de uma segunda mulher, amiga ou familiar. Se a lei for integralmente cumprida, quando nascer, a criança será filha do casal, dos pontos de vista biológico e legal. "Só quem lida com estas pessoas pode ter ideia do que isto significa. Mas pode-se sempre tentar imaginar a frustração e o sofrimento daqueles para quem esta é a única possibilidade de ter um filho", diz Vladimiro Silva, consultor da Direcção-Geral da Saúde para questões da procriação medicamente assistida e administrador de uma clínica, a Ferticentro, onde aquelas técnicas são aplicadas. Este médico não sabe quantas pessoas poderão vir a beneficiar da alteração da lei. Aparentemente são poucas, mas a maior parte não procura as clínicas, por saber que a maternidade de substituição é ilegal. Outros fazem-no para se certificarem de que, para terem o seu filho genético, terão de se deslocar aos chamados paraísos reprodutivos. "Basta ir à Internet: nos EUA há empresas mediadoras e gabinetes de advogados que tratam da escolha do Estado cuja lei melhor se adequa a cada situação, que fazem seguros de saúde para a mãe de substituição e que asseguram que não há problemas com a entrada da criança no país de origem dos pais biológicos. O casal não gasta menos de 100 mil euros", avalia Vladimiro Silva. Quem tem menos posses, diz, pode recorrer à Índia ou à Ucrânia, "onde o processo fica muito mais barato (cerca de 15 mil euros), mas a possibilidade de algo correr mal é muito maior". Vladimiro Silva diz não saber indicar quem tenha passado por aquele processo. Na verdade, já é difícil arranjar quem admita ter pensado nele.
REFERÊNCIAS:
Entidades EUA