Um patriarca da estabilidade, intelectual reconhecido, um homem cansado do cargo
MINORIA(S): Migrantes Pontuação: 6 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento -0.05
DATA: 2011-02-28
SUMÁRIO: Ninguém poupa elogios. Alguns apontam críticas e dizem que deixou arrefecer o entusiasmo inicial. Todos reconhecem o perfil de intelectual que, desde a posse do cargo de patriarca de Lisboa, em 1998, o destaca como referência da Igreja Católica em Portugal - e do próprio país. Identificado com um estilo afável e apaziguador, de discurso fluente e civilizado, foi sempre chamado a resolver crises. Acabou por ser o patriarca da estabilidade, pragmático, mas também - notam alguns - não arriscou demasiado. E que por vezes aparenta cansaço do cargo, mesmo estando "bem de saúde".
TEXTO: Aos 75 anos, feitos ontem, D. José Policarpo goza, como poucos, de uma imagem positiva na sociedade. Já na Igreja, algumas das suas opções (ou a falta delas) são criticadas. Nascido em Alvorninha (Caldas da Rainha), a 26 de Fevereiro de 1936, José da Cruz Policarpo foi ordenado em Agosto de 1961 - os 50 anos são assinalados, até Outubro, com várias iniciativas. Aos 75 anos, a regra obriga a apresentar ao Papa o pedido de resignação - o que fez dia 18. O patriarca chegou e venceu: está à vontade em público, por contraste com o antecessor, o cardeal António Ribeiro; dá entrevistas a meios de comunicação - ainda no último Natal foi entrevistado por quatro meios diferentes; chama para chefe de gabinete o padre Agostinho Jardim Gonçalves, antes afastado; preside ao casamento dos padres Felicidade Alves e Abílio Cardoso, que tinham saído em litígio com o cardeal Cerejeira. Ao mesmo tempo, D. José promove uma série de encontros com políticos, economistas, ambientalistas, editores e especialistas em imigração. Troca cartas no Diário de Notícias com Eduardo Prado Coelho, editadas em Diálogos Sobre a Fé. Mantém um programa na Rádio Renascença com Jorge Sampaio e Pinto Balsemão. No seu mandato de presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) negoceia-se a nova Concordata entre Portugal e a Santa Sé. Como patriarca, é um dos líderes do ICNE, o Congresso Internacional para a Nova Evangelização (com os cardeais de Paris, Bruxelas, Budapeste e Viena). Convida a Comunidade de Santo Egídio a promover em 2000 o seu encontro anual inter-religioso em Lisboa; e, em 2004, a comunidade monástica de Taizé (França) é convidada a promover na capital o seu encontro europeu de jovens. O vulto de pensador destaca-se, mesmo entre a maior parte dos bispos: "Chega a patriarca depois de um currículo académico notável", diz o cónego Carlos Paes, de 72 anos, pároco de São João de Deus, em Lisboa, uma das duas dezenas de pessoas com quem o PÚBLICO falou para este balanço sobre a acção de D. José. Mas não só. Peter Stilwell, director da Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa (FT/UCP) recorda as crises que Policarpo, ainda padre e, depois, já bispo auxiliar de Lisboa, foi chamado a resolver. A primeira foi em 1972, como reitor do Seminário dos Olivais, depois de vários padres da anterior direcção terem abandonado o sacerdócio - o seminário ficara reduzido a 11 alunos. Entre 1974 e 1980 e de novo entre 1985 e 1988 foi director da Faculdade de Teologia. Depois, já bispo auxiliar, foi reitor da UCP e, ainda, presidente da TVI, para o projecto da "televisão da Igreja" - mas pelo menos este último, dizem vozes mais críticas, correu mal: D. José não tinha muita disponibilidade para a gestão económica de instituições. Mesmo assim, ganhou o seu "estilo apaziguador, fluente, civilizado", como define Peter Stilwell. Falta criatividadeVem dessa falta de gosto para finanças outra observação que alguns fazem sobre o actual momento: muitas decisões são entregues ao ecónomo do patriarcado. Mas este, o padre Álvaro Bizarro, critica, por exemplo, gastos com iniciativas no campo da cultura e comunicação social, duas opções de D. José. O ecónomo também não gostou que o patriarca inaugurasse o monumento (pago pelo patriarcado), no Largo de São Domingos, evocativo do massacre dos judeus em 1506. Críticas feitas pelo menos numa reunião com muitos padres e o próprio patriarca, mas que este não contestou. O PÚBLICO procurou várias vezes falar com o cónego Bizarro, sem sucesso. Um dos padres diz, sem referir nomes concretos: "O patriarca deixou-se rodear por colaboradores mais executivos que pastorais. Na cúria, falta criatividade e há muitos traços de carreirismo. Alguns dos mais válidos não estão nos serviços centrais. "
REFERÊNCIAS: