"Vivemos na Síria um reino de silêncio"
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.136
DATA: 2011-03-02
SUMÁRIO: Uma vigília solidária com o Egipto levou à detenção de uma das mais importantes dissidentes em Damasco. Na esquadra, Suhair Atassi foi agredida e ameaçada de morte. O regime "não suportou a luz das velas de uma concentração pacífica", diz ela ao P2, muito menos irá tolerar uma manifestação, no dia 15, para derrubar o Presidente Bashar al-Assad.
TEXTO: Sou presidente do Fórum Jamal Atassi, grupo que existe apenas no Facebook, depois de nos ter sido negada existência real e legal. O fórum reclama reformas políticas na Síria e o fim das leis de emergência que suspendem os nossos direitos constitucionais desde 1963. Não é fácil ser uma activista na Síria. Neste reino de silêncio, as autoridades não suportaram sequer a luz das velas de uma concentração solidária e simbólica, como a que um grupo de homens e mulheres tentou organizar, a partir 29 de Janeiro, em apoio dos egípcios livres. E que dizer dos "dias de ira"? Na Síria existe uma dupla aterradora: por um lado, a fúria contida, que advém da deterioração das condições de vida, da corrupção, do monopólio, para não falar da repressão das liberdades, das bocas amordaçadas, dos despedimentos laborais, da proibição de viajar para o estrangeiro, apenas por divergência de opinião quanto ao regime; por outro, o medo das medidas de punição dos que se atrevem a contestar, medidas que variam entre perseguições e convocações aos serviços de segurança, interrogatórios, pressões exercidas sobre familiares, detenção durante anos e anos, com acusações forjadas à luz de um Estado de emergência que desgastou o país e de um sistema judicial nada independente, que se submete aos órgãos de segurança. Há uma fúria oculta que ferve no peito. Um gemido abafado. Um pavor cujas paredes alguns tentam quebrar. Foi o que aconteceu e o que acontece todos os dias. O que se passou a 4 e 5 de Fevereiro deste ano com apelos feitos através do Facebook para concentrações pacíficas? Fomos chamados para "um dia de fúria" por pessoas que, na sua maioria, vivem fora da Síria. Mas suportarão os que estão dentro do país que seja quebrada de uma só vez as barreiras de silêncio e de medo que se acumularam ao longo de anos, de décadas? As ruas fervilharam naqueles dois dias - mas fervilharam com elementos das forças de segurança, de todos os ramos. Elementos que, com uma violência brutal, lidaram com uma concentração de velas em solidariedade com egípcios livres. Circula agora uma nova petição no Facebook para uma "revolução síria" contra o regime e um novo "dia de fúria", mas não passa, mais uma vez, de um convite virtual sem raízes sólidas na realidade do dia-a-dia sírio. Estes apelos virtuais não vão conseguir acender a chama da mudança que irá inspirar os sírios na busca de uma mudança genuína. A verdadeira chama estará, provavelmente, noutro lugar. Por exemplo, numa manifestação espontânea, como a de 17 de Fevereiro, depois de a polícia ter espancado um empresário local. Nessa manifestação, as pessoas gritavam: "O povo sírio não será humilhado", "Vergonha, vergonha" e "Porquê, porquê?". O ministro do Interior interveio rapidamente, para controlar a situação e impedir uma escalada maior. Esta chama também pode surgir do efeito cumulativo da solidariedade expressa ao povo líbio, a 22 e 23 de Fevereiro. Nessa altura, activistas foram atacados, verbal e fisicamente. As pessoas gritavam insultos: "É traidor o que reprime o seu povo. " Alguns activistas foram detidos e admoestados para não se envolverem em futuras manifestações. Posteriormente foram libertados. Intifada da cidadaniaCreio, sinceramente, que estamos a testemunhar os primeiros passos para quebrar a barreira do medo que se apoderou de todos os aspectos da nossa vida. A Intifada do Egipto e, antes dela, a da Tunísia, trouxe esperança a todos os que sofrem sob o jugo de regimes autoritários, despóticos e corruptos, que monopolizam a política e as riquezas do país. A Intifada no Egipto e na Tunísia revelou que a aspiração à liberdade necessita de uma acção positiva em vez da passividade do espectador que cede diante de políticas repressivas por temer o desconhecido - que, contudo, jamais será pior do que a presente situação.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave direitos homens violência concentração medo mulheres vergonha