Uniões gays: "O Brasil acordou mais livre e mais democrático"
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 Homossexuais Pontuação: 16 | Sentimento 0.222
DATA: 2011-05-11
SUMÁRIO: Há o Brasil da rua e o Brasil de casa. No Brasil da rua, gay até pode ser ídolo. Mas no Brasil de casa, pode ser chamado "veado" e levar pancada. "É muito frequente um pai dizer: "Prefiro ter um filho morto do que um filho veado"", resume a cientista social Sílvia Ramos, 56 anos, mostrando gráficos de um estudo feito em 2006: mais de metade dos gays sofreram agressão verbal ou física e mais de metade dos transsexuais sofreram violência física.
TEXTO: Estamos no centro do Rio de Janeiro, no gabinete de pesquisa da Universidade Cândido Mendes onde Sílvia é investigadora, e ela tem boas razões para crer que esta "esquizofrenia" do Brasil agora pode diminuir. Porque na quinta-feira, dia 5, o Supremo Tribunal Federal reconheceu, por unanimidade, a união estável entre casais do mesmo sexo como entidade familiar. Uma decisão histórica que fará com que as regras das relações estáveis entre homens e mulheres sejam aplicadas aos casais homossexuais, suprindo assim um longo vazio legislativo. Ao concluir a votação, o presidente do Supremo, Cezar Peluso, desafiou mesmo os deputados da nação: "O Poder Legislativo, a partir de hoje, tem de se expor e regulamentar as situações em que a aplicação da decisão seja justificada. Há, portanto, uma convocação em relação ao Poder Legislativo para que assuma essa tarefa que até agora não se sentiu muito propenso a exercer". Desde 1995 que uma proposta para reconhecimento dos direitos de casais gay estava à espera no Congresso. E nada aconteceu, apesar dos homossexuais serem "demonizados" por pastores, agredidos por skinheads e por vezes mortos - no país do samba e do Carnaval, todas as grandes cidades têm casos de travestis brutalmente assassinados. A mentira"O Brasil é uma grande mentira", diz o escritor João Silvério Trevisan, 66 anos, pioneiro dos direitos gays, ao telefone, de São Paulo. "O Carnaval é um símbolo clássico do que é o Brasil: o país da máscara. A bissexualidade é um exemplo: uma falsa bissexualidade, sobretudo de homens que se escondem atrás de casamentos. Isto tem a ver com o jeitinho brasileiro. É um país que se move por factos consumados, não por projectos políticos. Por isso, digo que há muito tempo não tinha orgulho assim do Brasil. "Como teve com a decisão do Supremo. "O que os nossos intelectuais de esquerda não fazem, os ministros do Supremo fizeram. Deram uma aula não só para o Congresso como para a nossa intelectualidade chamada progressista. "Os (des)encontros entre activismo gay e esquerda vêm da ditadura, nos anos 70. Trevisan viveu nos Estados Unidos, "em exílio voluntário entre 1973 e 1975, porque o clima aqui estava irrespirável", e lá contactou com os movimentos cívicos. "Quando voltei decidi iniciar um movimento pelos homossexuais. É a pré-história da coisa. " Fundou a organização SOMOS e o jornal O Lampião da Esquina, que a censura acusou de atentado à moral. "Fomos fichados na polícia. Éramos vistos pela ditadura como parte da esquerda. Nós éramos parte da esquerda, mas a esquerda não era parte da gente! Era muito machista, muito ortodoxa, achava que rompíamos a unidade da luta proletária. As lutas feministas, dos negros, dos homossexuais eram vistas como menores. "Ponta-de-lançaE depois, já em plena democracia, os direitos dos homossexuais não se tornaram prioritários. "Temos uma bancada evangélica e católica no Congresso que envia constantes recados de que não passaremos por eles. Não acham que tenhamos direitos. Negros e mulheres, tudo bem, homossexuais não. Apesar de dizerem que não aceitam o pecado mas aceitam o pecador, já tivemos no Brasil um grupo evagélico, Moses, para tratamento de homossexuais, que eram internados supostamente de forma voluntária. "Quando o Conselho Federal de Psicólogos proibiu os clínicos de tratarem a homossexualidade como doença, psicólogos evangélicos chegaram a mover processos, lembra este activista. E há muitos exemplos da "dedicação obsessiva com que a bancada religiosa reproduz os sermões das igrejas". "É incorrecto dizer que a situação se deve exclusivamente a essa bancada. Faz parte do movimento de direita e conservador que continua a existir no Brasil. Temos muitos partidos de direita. Mas a bancada religiosa no Congresso será a ponta-de-lança. "
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave direitos homens tribunal doença sexo mulheres gay