Lucian Freud - Corpo a corpo com a carne
MINORIA(S): Animais Pontuação: 5 | Sentimento 0.0
DATA: 2011-07-22
SUMÁRIO: Aos 88 anos, atingiu o estatuto de "maior pintor inglês vivo". Lucian Freud prefere a designação profissional de "biólogo": um pintor atento à evolução orgânica dos corpos, reduzidos a uma naturalidade animal. O atelier do pintor, cápsula sufocante de toda a sua obra, é o fio condutor de uma grande exposição no Centro Pompidou, em Paris.
TEXTO: A primeira palavra que Lucian Freud aprendeu a dizer, segundo a sua mãe, foi "alleine", que significa sozinho. "Todas as minhas alegrias foram solitárias. Detesto que me vejam trabalhar. " Lucian Freud, o Atelier, uma grande exposição do "maior pintor inglês vivo", no Centro Georges Pompidou, em Paris, permite violar o interdito fundamental da sua obra e penetrar na arena fechada e sufocante onde o pintor e os seus objectos se confrontam, "como carne", na pintura. "O meu trabalho é puramente autobiográfico. Trata-se de mim e daquilo que me rodeia", diz o pintor, citado no catálogo desta exposição que termina a 19 de Julho. "Quanto mais nos concentramos, mais as coisas que temos realmente na cabeça começam a sair. " Desde 1987 que Lucian Freud, hoje com 88 anos, não era objecto de uma grande exposição em Paris. Para a do Centro Pompidou, a comissária Cécile Debray quis afastar-se de um programa retrospectivo e contornou todo o primeiro período da carreira de Lucian Freud, os seus anos de hiper-realismo. Dos anos 40 apenas foi guardado The Painter's Room (1944), senha de entrada para uma exposição organizada em torno do tema do atelier do pintor. O eixo de Lucian Freud, o Atelier é constituído por trabalhos que mostram a evolução do artista desde o final dos anos 60, revelando a intimidade do seu atelier, colocando a questão do dispositivo espacial e da sua reflexividade, a pintura. O atelier é o lugar estratégico no trabalho de Freud, num método enunciado pelo pintor: "A aura que se liberta de uma pessoa é tanto parte dela quanto a sua carne. O efeito que produzem numa divisão é tão marcante como a sua cor ou o seu cheiro. O efeito produzido no espaço por dois indivíduos pode ser assim tão diferente quanto o efeito de uma vela e de uma lâmpada eléctrica. O pintor deve, por isso, estar tão consciente da atmosfera como do seu objecto. É através da observação e da percepção da atmosfera que o pintor pode atingir o sentimento que pretende fazer realçar através da sua pintura. " O percurso da exposição no Centro Pompidou organiza-se em quatro secções, Interior/Exterior, Reflexão, Reprises e As Flesh ("como a carne"), mostrando meia centena de pinturas e uma dezena de gravuras. Há também várias fotografias tiradas por David Dawson, assistente de Lucian Freud, que fornecem uma janela ou um espelho para o mundo recôndito, quase clandestino, concentracionário, do atelier. Um dos conjuntos importantes da exposição é formado por vários quadros a que Lucian Freud chama os "grandes interiores", ostensivamente enraizados nos grandes mestres flamengos e numa tradição que se poderia estender até aos grandes ateliers de Henri Matisse. Reprises marca, em especial, uma reflexão sobre a pintura encetada por Lucian Freud a partir dos anos 80, início de um diálogo fértil com algumas pinturas antigas, como o trabalho que realizou em torno de um pequeno quadro de Watteau. Há outras obras, autênticas releituras de quadros de Chardin, Constable ou Cézanne, que vão desde a cópia livre à transposição e à total reinterpretação. O nu na naturalidade animalOs nus, essência da obra de Lucian Freud, marcam a escolha de obras na exposição do Pompidou, colocando o visitante num percurso sem fuga por uma sucessão de imagens atraentes sem serem eróticas, repulsivas sem serem repugnantes, chocantes sem serem violentas. Os nus de Freud são nus monstruosos, desproporcionados ou obesos, marmóreos ou rugosos, despojados, maculados por toda a espécie de marcas, varizes, rugas, pregas acumuladas pela pele humana. Estes corpos de uma beleza monstruosa pesam na tela em poses bizarras ou apenas banais, numa tensão entrópica revelada pela lenta exposição do modelo ao pintor e pela prolongada, quase fastidiosa, análise que o pintor faz do modelo.
REFERÊNCIAS:
Partidos LIVRE