Sudoeste: musical de Hollywood na pradaria com Janelle Monáe
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2011-08-05
SUMÁRIO: Todos os festivais têm contrastes, o Sudoeste parece ter mais do que outros. Cerca de 40 mil pessoas celebraram a estreia do rapper americano Snoop Dogg em Portugal. Nem 40 pessoas terão assistido à estreia em Portugal do canadiano Dan Bejar, ou seja Destroyer, que veio apresentar um dos álbuns mais brilhantes do corrente ano, “Kaputt”.
TEXTO: Não vale a pena chover no molhado. Ou talvez valha. O Sudoeste dos últimos anos apostou decididamente num conceito (o festival onde a música não é importante) e numa estratégia de comunicação (todo o aparato comercial, com os telemóveis em destaque) que aponta certeiramente para um público juvenil para quem os concertos são secundários. Nada a dizer. É uma opção estratégica como qualquer outra. Ninguém é obrigado a ir ao Sudoeste. Mas depois é bizarro ver um projecto de pop adulta, com letras evocativas, canções intemporais e um som de grande elaboração formal, como é Destroyer, a actuar para meia dúzia de pessoas. Ou outros fazerem-no até com alguma neglicência porque percebem nitidamente que aquele não é o seu habitat. No seu ambiente esteve a pequena americana Janelle Monáe. Ou por outra, fez por criá-lo. Se o local do festival remete para ar livre, verde, pradaria, ela e uma trupe de quase 15 músicos e bailarinos, fizeram questão de o transformar numa espécie de “Singing In The Rain”. Uma produção de Hollywood dos anos 50 com paragem na soul e funk. Nada de estranhar. Sabe-se como ela gosta de cinema. O álbum “The ArchAndroid” (2010), foi aliás embrulhado num conceito inspirado no filme “Metropolis” (1927) de Fritz Lang. Apresentou-se, como sempre, com roupa a preto e branco, penteado geométrico à Grace Jones e pés irrequietos de fazer inveja a James Brown. A voz, bem, a voz, é inigualável. E depois há a música, caleidoscópio impressionante de funk físico, pop barroca ou rock psicadélico, que tanto desagua em temas muito irrequietos como em baladas – brilhante a interpretação de “Smile”, popularizada por Nat King Cole. Foi dela o concerto mais entusiasmante da noite, com uma secção de cordas e sopros imparável, um guitarrista virtuoso, um teclista movimentado, e uma Janelle que, para além de cantar, pintou enquanto cantava e correu até à mesa de som, pelo meio do público, regressando às cavalitas de um dos músicos. Interagiu, divertiu-se, enfim, contagiou por completo o público, principalmente em canções como “Cold war”, “Tightrope” ou “Come alive (the war of the roses)”. Ao contrário do que muitos previam não houve homenagem a Amy Winehouse (recorde-se que a falecida cantora inglesa seria a cabeça de cartaz desta noite e Janelle andou em digressão com ela num passado recente), mas existiu uma excelente versão de “I want you back” dos Jackson 5. Ao contrário da cantora americana, que se esforçou por conquistar o público, conseguindo fazê-lo sem dúvida, o rapper Snoop Dogg não precisou de fazer um grande espectáculo para que a multidão à sua frente ficasse rendida. Snoop Dogg com um imaginário que, há uns anos, era codificado e que agora se tornou global – bastava olhar para a heterogénea multidão para se perceber isso. Há sugestões eróticas, alusões ao dinheiro e à fama, ao consumo de substâncias ilícitas e um visual de acessórios brilhantes, mas tudo isto numa atitude excessiva que acaba por ser mais auto-irónica ou mesmo caricatural do que provocatória. É curioso o percurso do californiano, várias vezes resgatado do esquecimento e passando, na actualidade, por um período de algum fulgor criativo e de grande sucesso comercial. Quando ele entrou em palco, atrasado, de óculos escuros e armação branca, o público abandonou-se à sonoridade bamboleante, celebrou as bailarinas lascivas que o acompanhavam e fez o que mandou: mãos no ar ou saltar. Houve direito a clássicos, como “Deep cover”, com a banda que o acompanha a mostrar serviço, provocações às mulheres da assistência com “Sexual eruption” e minimalismo erótico com o magnífico “Drop it like it’s hot”. No final disse que esta não seria a primeira e última vez em Portugal. Acreditamos que sim, até porque não se percebe por que é que a maior parte dos nomes de topo do hip-hop continuam a não ser presença regular em Portugal.
REFERÊNCIAS:
Partidos LIVRE