Em Trípoli opera-se sem anestesia e morre-se por falta de cuidados
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DATA: 2011-08-27
SUMÁRIO: No maior hospital de Trípoli ainda há uma placa que diz “Alá, Muammar, Líbia e nada mais”. Khadafi “compara-se a Deus”, diz um rapaz indignado. Faltam médicos, anestesia sangue. E noutro hospital na capital, na zona de Abu Salim, foram encontrados 200 cadáveres de pessoas que morreram por falta de cuidados.
TEXTO: Os confrontos em Trípoli entre os rebeldes e as forças de Khadafi ainda não serenaram, sobretudo na zona de Abu Salim. Deixaram centenas de feridos e um deles foi Abdelsalam Mohamed, atingido por uma munição de antiaérea. Mas também há ferimentos de bala, queimaduras, ossos partidos. O que não há é médicos e enfermeiros para atender estas pessoas, nem sangue que chegue para as operações. No hospital de Shara Azzauia, o maior de Trípoli, há uma folha à entrada com pelo menos uma centena de nomes escritos à mão. São os feridos que ali chegaram nos últimos dias, conta o jornalista do “El País”. Ali costumam trabalhar cerca de 2000 pessoas, mas agora só lá estão cerca de 300 para socorrer os que chegam. “O principal problema é que não temos pessoal, porque a maioria não pôde vir com medo dos atiradores furtivos”, contou o subdirector do hospital, Ali Haddud. Muitos médicos não conseguiram chegar ali, “ficaram em zonas onde há muitos feridos para atender, não há meios de transporte e alguns vivem em Zauia, a cerca de 50 quilómetros. Há camas ensopadas de sangue, pontas de cigarro no chão de salas que ficaram vazias. “É que aqui estiveram as tropas de Khadafi durante três meses”, explica um homem que acompanha o repórter do “El País” numa visita ao hospital. “Só temos um médico para tratar problemas cardiovasculares, não temos anestesistas e quase não temos analgésicos”, conta o cirurgião Ali Ben Amar. “Aqui estamos a operar sem anestesia”. E quase não vale a pena procurar medicamentos nas farmácias porque muitas estão fechadas. No chão estão 15 a 20 cadáveres que já não couberam nas câmaras frigoríficas, numa cama está uma menina de 13 meses que ficou em coma depois de ter sido atingida por uma bala na nuca. Um massacre em Abu SalimNo hospital de Abu Salim o cenário de horror repete-se. Também não há médicos, que os confrontos dos últimos dias impediram muitos deles de ali chegar. Wyre Davies, o correspondente da BBC, deparou-se com 200 cadáveres “num tal estado de decomposição que é difícil saber de que morreram”. Entre eles estavam homens que poderão ter estado nos confrontos, mas também mulheres e crianças. Alguns corpos estavam empilhados, muitos deles pelo chão. Alguns residentes contaram que muitas pessoas estavam vivas quando ali chegaram, outras já não. “Estes corpos estão no hospital há cinco dias. Ninguém cuidou deles, os levou para a morgue, identificou ou enterrou”, disse à BBC Osama Pilil, que mora ali perto. “Precisamos de ajuda e é muito urgente. Não há aqui governo, precisamos de ajuda profissional, da Cruz Vermelha Internacional, porque o que aconteceu em Abu Salim foi um massacre. "O responsável dos Médicos Sem Fronteiras em Trípoli, Jonathan Whittal, disse ao “Guardian” que a situação ficou mais calma, apesar de haver confrontos em algumas partes da cidade, e que começou a ser prestado um escasso apoio médico. “Trípoli já estava a enfrentar inúmeros desafios antes dos últimos dias. Já havia falta de equipamentos médicos e muitas das pessoas que trabalhavam na área da saúde saíram do país por causa de vários problemas. ”O hospital de Abu Salim esteve controlado pelas forças de Khadafi entre sábado e quinta-feira, que mantiveram à distância quem se aproximasse. Os pacientes acabaram por morrer, um após outro. Tornou-se num hospital fantasma repleto de cadáveres e com a fachada crivada de balas. A Cruz Vermelha retirou do hospital 17 doentes, entre eles um rapaz de 10 anos que foi baleado e era há vários dias procurado pela mãe. “O meu filho foi ferido em frente a Bab al-Aziziyah [o complexo militar de Khadafi onde os rebeldes entraram na terça-feira] mas eu não sabia que ele tinha aqui chegado” contou à AFP Zine Mohammed al-Zadma. “Não sabia onde estava, não podia entrar no hospital, havia mortos por todo o lado. Finalmente, encontrei-o. ”
REFERÊNCIAS:
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