Mulheres sentem que transportam no corpo uma bomba-relógio
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 12 | Sentimento 0.0
DATA: 2012-01-21
SUMÁRIO: No caso das mulheres com cancro, o sentimento é muito semelhante ao que afecta as vítimas de recidivas, diz especialista.
TEXTO: M. , que se define como desinibida, agora não suporta que o namorado lhe toque; T. , que "finalmente tinha adquirido paz", passou a acordar várias vezes por noite, sobressaltada; e Helena, que teve um cancro em 2006, voltou "a ter medo todos os dias". São três mulheres com idades e histórias de vida muito diferentes, mas com algo comum. Têm implantes mamários da marca francesa PIP e não conseguem evitar a angústia. Sentem-se como se transportassem no peito uma "bomba-relógio", explica a psicóloga da Liga Portuguesa Contra o Cancro, Sónia Silva. Carlos Pires, cirurgião plástico, diz que calculou que "isto" ia acontecer. Estava de férias, dias antes do Natal, quando surgiu a notícia de que as autoridades de saúde francesas iam pedir que as portadoras daquele tipo de implantes os retirassem, por precaução. Um exercício simples levou-o a telefonar para a secretária, a dizer-lhe que passasse em revista as fichas de todas as pacientes para identificar e chamar as que tinham implantes da marca francesa. "Pus-me no lugar delas. E apesar de continuar a pensar que se trata de alarmismo puro, naquele momento percebi que só podiam estar muito assustadas", diz o cirurgião. A sua suspeita tinha razão de ser. As centenas de telefonemas e de e-mails , que vários cirurgiões dizem ter recebido, não começaram logo. Mas algumas mulheres ficaram, de imediato, em estado de alerta. Foi o caso de Helena Oliveira, de 54 anos, que teve cancro da mama e colocou uma prótese há dois. Não entrou em pânico, mas tornou-se "uma consumidora obsessiva de informação". Dia após dia escrutinou os jornais online , portugueses e dos vários países do mundo que se confrontavam com o problema. Comparou informações, reacções e medidas tomadas pelos diferentes governos. Até que leu que a própria Direcção-Geral de Saúde aconselhava as mulheres a procurarem os seus médicos. "Nem queria acreditar. Não é um processo simples, sabe? Depois da mastectomia, não decidi logo fazer a reconstrução. E, depois, demorei um ano a fazer a expansão da pele antes de pôr o implante. Passei por isso, passei por três cirurgias, e agora descubro que no lugar do tumor pus um objecto que me pode causar um tumor?" Fala com serenidade e com firmeza. Apesar de o cirurgião plástico a ter descansado, Helena já decidiu que não vai viver com algo que a ameaça e a angustia. Explica porquê: "Já conseguia olhar-me no espelho sem me lembrar sempre do cancro; não posso voltar a ter medo todos os dias". Sónia Silva, psicóloga da LPCC, afirma que a tranquilidade de Helena é invulgar. "É uma mulher informada, positiva e exigente. Preocupam-me mais as mulheres que estão num sofrimento silencioso, passivo. As que não aparecem", diz. A situação é tão invulgar que a liga criou um programa de apoio psicológico. "Estamos a falar de mulheres que já vivem sob a ameaça constante do regresso da doença, que são hipervigilantes em relação ao próprio corpo. O que estão a passar é muito semelhante ao que enfrenta quem tem uma recidiva. Voltam a incerteza, os exames, a espera, a angústia face a um eventual regresso ao bloco cirúrgico e também a vontade de tirar "aquilo" o mais depressa possível - é como se transportassem uma bomba-relógio", compara Sónia. Mamoplastia entre os 30 e 50 O Serviço Nacional de Saúde distingue estes casos de outros, das mulheres que fizeram mamoplastias de aumento, por razões meramente estéticas. A estas assegura a retirada do implante, em caso de necessidade, mas não a reconstrução. Os anónimos que enchem as caixas de comentários das notícias online nem isto aceitam. "Há comentários muito grosseiros", confirma Helena Oliveira. Diz que quando descreve o seu caso os comentários mudam de tom e recebe mensagens simpáticas, de apoio.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave mulher doença medo mulheres corpo pânico