Síria: o colapso do medo
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2012-07-19
SUMÁRIO: Mohamed Hamdan, jornalista residente em Damasco, foi testemunha do que Ayman Abdel-Nour, analista político obrigado a exilar-se no Canadá, descreveu como “o colapso do medo nos corações dos sírios” após a explosão que ontem quase decapitou o círculo restrito do regime, no centro da capital.
TEXTO: “Muitas pessoas celebraram nas ruas, a cantar e a dançar; outras estão a festejar no Facebook e no Twitter”, disse Hamdan, numa entrevista ao PÚBLICO por e-mail, fazendo questão de ser identificado, porque já não teme represálias. “O ataque ocorreu no bairro de al-Rawdeh, onde vivem os mais ricos, e nas proximidades da residência do Presidente, Bashar al-Assad, na área de Moujajereen”, precisou. “Também ouvimos dizer que foi atacado o quartel-general da 4º Divisão do Exército, liderada por Maher al-Assad, irmão do Presidente, mas não há confirmação. ” “A Guarda republicana isolou totalmente o Hospital de Shami, para onde foram enviados os feridos, alguns em estado grave”, adiantou Hamdan. “A televisão estatal deu a notícia, mas não mostrou imagens. Oficialmente, foi tudo apresentado como um ‘atentado terrorista, levado a cabo por gangues criminosos’, mas ninguém acredita. A mobilização de reservistas e das tropas que estavam nos Montes Golã [a Síria só controla a cidade de Kuneitra] mostrou que, para o regime, o principal inimigo não é Israel mas o seu próprio povo, bombardeado com canhões, artilharia e carros de combate. ”Na explosão de ontem foram confirmadas as mortes do ministro da Defesa, general Daoud Rajha; do titular da pasta do Interior, Mohammad Ibrahim al-Shaar; do seu “vice” e cunhado do Presidente, general Assef Shawkat; do chefe da “célula de crise” e adjunto do vice-presidente, general Hassan Turkmani; e do director dos serviços secretos e primo do chefe de Estado, general Hafez Makhlouf. “Mais importante do que saber quem morreu é a estocada desferida à reputação de Bashar al-Assad, que se apresentava como um deus, rodeado de líderes intocáveis – essa imagem foi totalmente desfeita”, disse Nour, também por e-mail. Filho de um médico cristão que aderiu ao Partido Baas (no poder) aos 14 anos, o autor do influente blogue all4Syria teve de abandonar a pátria quando percebeu que o regime socialista e pan-arabista que fascinou o seu pai não podia ser reformado, apenas derrubado. A morte do principal conselheiro de segurança de Bashar, elo de ligação com o Irão e o Hezbollah no Líbano, foi um duro revés para o Presidente, mas Nour, ao contrário de outros, não considera Shawkat o “cérebro da repressão”. Em seu entender, “há três figuras piores: Maher, Jamil Hassan [chefe da espionagem militar] e Ali Mamlouk”, outro consultor presidencial, alegadamente, encarregado de infiltrar sírios em grupos terroristas. Certo é que, embora o ministro da Defesa fosse Daoud Rajha, um cristão “nomeado à pressa em 2011 para dar a aparência de abertura multiconfessional”, segundo o diário britânico The Guardian, o verdadeiro detentor do cargo era Shawkat, de 62 anos. A reputação de implacável ganhou-a quando, depois de se divorciar da primeira mulher, ousou ir ao palácio do defunto Presidente Hafez al-Assad buscar a única filha deste, Bushra, “a solteira mais cobiçada da Síria”, para se casar com ela. Inicialmente, toda a família e, em particular, Basil, o primogénito, se opunha a este enlace: Shawkat era mais velho do que “a menina querida da Esfinge de Damasco” e, embora alauita e militar de carreira, tinha origens humildes e demasiada ambição. Basil, a ser preparado para suceder ao pai, morreu num misterioso acidente na estrada para Beirute em 1994 – foi a única vez que alguém viu Hafez chorar em público. Shawkat, que desposou Bushra no ano seguinte, esteve na lista de suspeitos mas provou a sua lealdade. Quando chegou a altura de Bashar ocupar o lugar do irmão, o cunhado ajudou-o. E Bashar foi grato, oferecendo-lhe o controlo da espionagem militar, em 2001, e o domínio sobre o vizinho Líbano.
REFERÊNCIAS:
Partidos PAN