Co-produção com Palestina em risco de falhar a Capital Europeia da Cultura
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2012-08-09
SUMÁRIO: Directora artística recusa fazer um "espectáculo de souvenir". Produtor diz que continua a trabalhar para que Sarha se mantenha.
TEXTO: Um dos espectáculos mais emblemáticos da programação de Verão da Capital Europeia da Cultura - Sarha, co-produção do Centro de Criação para o Teatro e as Artes de Rua (CCTAR) com o Freedom Theatre de Jenin, na Cisjordânia - está em risco de não chegar a acontecer. Anteontem, sem aviso prévio, a directora artística, Mia Hansen-Love, anunciou na inauguração da exposição paralela a Sarha que considera "impossível prosseguir o trabalho" por "drástico incumprimento" das mais "elementares condições artísticas, administrativas e logísticas": "Acima de tudo", afirma no comunicado entretanto distribuído à imprensa, "choca-nos que uma sofisticada representação sobre os direitos humanos (. . . ) e a interacção entre culturas variadas possa ver-se tratada como um espectáculo de souvenir para a Capital Europeia da Cultura". Apanhado de surpresa pela decisão, unilateral, de cancelamento do espectáculo, cujas apresentações estavam previstas para os dias 29, 30 e 31 deste mês, o director do CCTAR, Renzo Barsotti, admite que este tem sido um processo de criação "particularmente difícil" e que é "natural" que uma peça original criada em residência, num país estrangeiro, por uma equipa multicultural que nunca tinha trabalhado junta (e que associa artistas palestinianos a outros vindos da Turquia, da Macedónia e da Dinamarca) atravesse fases de maior turbulência. Mas diz também que a comparação entre as condições de acolhimento dos artistas pela Capital Europeia da Cultura e o sofrimento da população palestiniana nos territórios ocupados "foi absolutamente infeliz" e até desrespeitadora da entidade co-produtora, tendo em conta as circunstâncias "terrivelmente complexas" em que o Freedom Theatre mantém a sua actividade desde o assassinato do seu fundador, Juliano Mer-Khamis, a 4 de Abril do ano passado. No final da reunião de emergência de ontem com a equipa artística, o produtor garantiu ao PÚBLICO que "o CCTAR continua a trabalhar para que o espectáculo aconteça" e recusou as acusações de "drástico incumprimento": "Se a produção não tivesse cumprido as mais elementares condições, os artistas não estariam cá e o espectáculo nunca teria existido sequer enquanto intenção. Mas não quero fugir das minhas responsabilidades, para o bem e para o mal. Temos obrigação de dar a melhor resposta possível". Minutos depois, saída da mesma reunião, a encenadora reiterava ao PÚBLICO que as dificuldades descritas no comunicado "se mantêm" e que a situação actual é "impossível": "Vamos ver o que acontece", adiantou, não excluindo que hoje possa haver novos desenvolvimentos. Igualmente apanhada de surpresa e incomodada com a forma, o conteúdo e o momento da declaração de anteontem, a Fundação Cidade de Guimarães, entidade gestora da Capital Europeia da Cultura, só emitirá uma posição oficial depois de receber do CCTAR um relatório pormenorizado do que se passou. O projecto Sarha, cujos trabalhos se iniciaram há cerca de um ano e incluíram workshops no campo de refugiados de Jenin, decorrem da relação pessoal entre Barsotti e Mer-Khamis, e do protocolo que ambos assinaram para a realização de projectos de teatro para o espaço público da Cisjordânia ocupada - um trabalho de envolvimento da comunidade que, diz o produtor, Mer-Khamis considerava "urgente": "Sarha é apenas o início de um trabalho na Palestina. E inscreve-se na vontade que o CCTAR tem de se colocar sempre em jogo. Quero acreditar que isto não passa de uma crise pontual no decurso de um processo criativo".
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave direitos humanos cultura campo comunidade assassinato