A próxima aventura de Musk é no subsolo
O patrão da Tesla quer ligar Chicago ao seu aeroporto internacional através de viaturas eléctricas sem condutor que vão circular num novo túnel. Mais do que tecnológico, o desafio será sobretudo financeiro. (...)

A próxima aventura de Musk é no subsolo
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-06-21 | Jornal Público
SUMÁRIO: O patrão da Tesla quer ligar Chicago ao seu aeroporto internacional através de viaturas eléctricas sem condutor que vão circular num novo túnel. Mais do que tecnológico, o desafio será sobretudo financeiro.
TEXTO: Tem sido um ano preenchido para o multimilionário sul-africano Elon Musk. Em Fevereiro, colocou um carro em órbita a bordo do foguetão mais potente em actividade, o Falcon Heavy. Em Maio, mês em que tornou público o namoro com a música canadiana Grimes, comprou uma guerra com a imprensa ao acusar os jornalistas que investigam a segurança e as finanças da Tesla de estarem conluiados com a indústria petrolífera. Na terça-feira, anunciou o despedimento de 9% dos trabalhadores da sua empresa de carros eléctricos, que continua a não descolar dos prejuízos. E, na quinta-feira, apareceu ao lado do mayor de Chicago, Rahm Emanuel, para anunciar a sua mais recente aventura: a construção de um túnel entre o centro da cidade norte-americana e o aeroporto internacional O’Hare, através do qual prevê transportar milhares de passageiros em viaturas eléctricas sem condutor. Não é uma empreitada com a mesma espectacularidade de disparar um automóvel para o espaço, mas o que poderá (ou não) acontecer no subsolo de Chicago representa um enorme desafio técnico e financeiro. A Boring Company de Musk propõe construir um túnel com cerca de 27 quilómetros e encurtar de 45 para 12 minutos o tempo de ligação entre o aeroporto e a terceira maior cidade dos EUA. O transporte dos passageiros será feito em viaturas automáticas, assentes em trilhos magnéticos, que vão transportar 16 pessoas cada a velocidades de até 240km/h. Com um carro a sair em cada direcção a cada 30 segundos, a empresa prevê transportar 4000 passageiros por hora nos dois sentidos, 20 horas por dia. Se Musk já provou ser capaz de cumprir e superar metas tecnológicas, maiores dúvidas existem em relação aos custos e à viabilidade financeira da operação. A Boring Company estima gastar 861 milhões de euros, sem usar um cêntimo do erário. Em troca, ficará com todo o lucro da operação. Mas existem sérias dúvidas sobre se é possível construir a estrutura com semelhante orçamento. O site tecnológico The Verge, citando especialistas em urbanismo e transportes, lembra que a extensão da linha 14 do Metro de Paris custou 241 milhões de euros por quilómetro, enquanto a linha da Segunda Avenida do Metro de Nova Iorque ficou em 1346 milhões de euros por quilómetro. Em Chicago, a Boring Company diz que vai conseguir baixar os custos de duas formas: reduzindo o diâmetro do túnel cavado e aumentando a eficiência das máquinas tuneladoras, que serão integralmente automatizadas e movidas a electricidade. Na quinta-feira, Musk admitiu que esta será uma empreitada “difícil” e pediu tréguas aos críticos: “Eu espero que nos apoiem desta vez. Porque se formos bem-sucedidos, vai ser óptimo para a cidade. E se falharmos, bom, então eu e outros tipos perderemos imenso dinheiro. ”
REFERÊNCIAS:
Entidades EUA
P3: as vossas causas são a nossa causa
A partir desta quinta-feira, os leitores podem encontrar um P3 renovado. Partilha é uma das nossas palavras favoritas. O P3 é um site de causas; das nossas e das vossas. (...)

P3: as vossas causas são a nossa causa
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-06-21 | Jornal Público
SUMÁRIO: A partir desta quinta-feira, os leitores podem encontrar um P3 renovado. Partilha é uma das nossas palavras favoritas. O P3 é um site de causas; das nossas e das vossas.
TEXTO: Estávamos a 22 de Setembro de 2011, dia em que o PÚBLICO festejava o 16. º aniversário da sua edição online, a troika já andava por cá e os primeiros das cerca de centenas de milhares de jovens que deixaram o país já faziam as malas. Nesse dia, o primeiro dia do P3, o nosso site que “trata tudo por tu”, destacava, precisamente, o que a geração do desenrasca andava a fazer para sobreviver. Criámos este site a pensar numa nova geração de leitores, mais afastada do que as anteriores da leitura dos jornais em banca, e numa nova relação com eles. O site foi planeado e pensado para uma faixa etária entre os 18 e os 35 anos, para um público urbano de jovens pré-universitários, universitários e pós-universitários, mas sem excluir fosse quem fosse. O P3 foi o primeiro site generalista para este público-alvo, nasceu de uma parceria entre um jornal privado e uma instituição pública, na sequência de um consórcio com a Universidade do Porto, funcionou durante vários anos no interior de uma faculdade como um laboratório de media, a dar voz à criatividade e descontentamento de uma geração que ninguém escutava — um terço dos conteúdos é produzido pelos próprios utilizadores — ou a estabelecer uma relação com os leitores para lá da dicotomia entre emissor e receptor. A partir desta quinta-feira, os leitores podem encontrar um P3 renovado. Mas as mudanças não são apenas gráficas — afinal, o P3 até ganhou em 2012 o prémio de melhor design jornalístico da Península Ibérica, para publicações até 12 milhões de páginas visitadas. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Mudámos porque queremos ir mais longe na relação de proximidade e de cumplicidade com os nossos utilizadores e porque o mundo hoje exige um jornalismo diferente de há seis anos e meio. Basta olhar à volta para perceber que o jornalismo, sem se amedrontar ou embaraçar, não pode ignorar o seu papel cívico quando crianças são separadas dos pais e engaioladas numa fronteira, quando o racismo e a xenofobia crescem assustadoramente por toda a Europa, quando distinguir a verdade da mentira é um exercício crucial de cidadania e contributo democrático. Queremos fazer com os nossos utilizadores um novo P3 todos os dias, porque este site colaborativo só existe por causa de quem o lê, vê ou o faz. E não queremos fazê-lo sozinhos e muito menos de forma inócua. Partilha é uma das nossas palavras favoritas. O P3 é um site de causas; das nossas e das vossas.
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Entidades TROIKA
Os mesmos problemas, disfarçados por Patrício e Ronaldo
Portugal derrotou Marrocos mas teve de sofrer bastante para segurar os três pontos. (...)

Os mesmos problemas, disfarçados por Patrício e Ronaldo
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-06-21 | Jornal Público
SUMÁRIO: Portugal derrotou Marrocos mas teve de sofrer bastante para segurar os três pontos.
TEXTO: Se antes do primeiro jogo de Portugal perguntassem a Fernando Santos se comprava um empate (Espanha) e uma vitória (Marrocos) nos dois primeiros jogos do Mundial 2018, é provável que o seleccionador nacional respondesse que o objectivo seria começar com dois triunfos. No seu íntimo, porém, o técnico dificilmente desdenharia garantir quatro pontos contra um dos favoritos à vitória na prova e uma das melhores selecções africanas. O que Fernando Santos dispensava, de certeza - no final do jogo deixou-o claro -, eram exibições “difíceis de perceber”. À semelhança da estreia em Sochi, o desempenho de Portugal em Moscovo revelou-se repleto de equívocos. Valeu (mais) um golo de Cristiano Ronaldo e uma exibição sem mácula de Rui Patrício para garantir uma sofrida vitória contra Marrocos. “Vou ter que falar com os jogadores. ” Ainda a quente, poucos segundos depois de Portugal garantir a primeira vitória no Mundial 2018, Fernando Santos não escondeu que algo “difícil de perceber” acontecera no Estádio Luzhniki. Numa reprise de um filme já visto com Espanha, a selecção entrou praticamente a ganhar, mas de imediato perdeu o controlo. Se os espanhóis viram-se empatados por uma exibição histórica de Ronaldo, os marroquinos podem-se queixar da falta de eficácia e de um super Rui Patrício. Aos 65 segundos, a bola só tinha conhecido pés marroquinos e o perigo já rondava a baliza portuguesa. De forma ruidosa, os adeptos africanos, em clara maioria, responderam com entusiasmo, mas foram os poucos portugueses que festejaram: após um canto, Moutinho colocou na área e Ronaldo, após fugir à marcação de Manuel da Costa, fez de cabeça o primeiro golo. Com apenas quatro minutos, o “7” de Portugal destronava Puskas como jogador europeu com mais golos (85) pelas selecções nacionais; Moutinho fazia a quinta assistência em fases finais (Euro 2008, 2012, 2016 e Mundial 2018); Marrocos ficava ainda mais pressionado. Com João Mário no lugar de Bruno Fernandes – a única alteração em relação ao jogo com a Espanha -, o 4x4x2 de Fernando Santos nem tempo teve de ser testado. Repetindo uma opção já vista em Sochi, o técnico não demorou a encostar Gonçalo Guedes à esquerda, colocando João Mário no centro, nas costas de Cristiano Ronaldo e à frente da dupla Moutinho-William. O “plano B” de Fernando Santos parece, no entanto, inquinado. Sem se desorganizar, Marrocos mostrou que o 4x2x3x1 do competente Hervé Renard está bem trabalhado. Com três alterações em relação ao jogo com o Irão – entraram Manuel da Costa, Nabil Dirar e Khalid Boutaid -, o futebol apoiado e veloz pelos flancos de Marrocos rapidamente colocou Portugal em aflição. Boussoufa (10’ e 19’) e Benatia (11’) deixaram as primeiras ameaças. Com demasiados passes falhados e pouca segurança na posse de bola, os portugueses mostravam-se incapazes de estancar o perigo marroquino, mas o génio de Ronaldo quase garantiu o segundo da equipa nacional: isolado por um grande passe do capitão, Gonçalo Guedes não soube ultrapassar El Kajoui. A primeira parte acabava com mais perigo para Rui Patrício - Belhanda novamente após uma bola parada – e uma estatística pouco abonatória para Portugal: desvantagem nos remates (5-8) e na posse de bola (49%-51%). Ao intervalo Fernando Santos não mexeu, mas o arranque dos últimos 45 minutos parecia trazer melhorias: em boa posição, Ronaldo chutou por cima. Mas o jogo continuava a ser de Marrocos. Com a luta a meio campo perdida – João Mário foi sempre demasiado passivo para a agressividade marroquina -, Portugal foi recuando, dando a injecção de confiança que os africanos precisavam. Aos 55’, Patrício mostrou segurança após um remate de Belhanda; dois minutos depois o guarda-redes português impediu com uma defesa fantástica nova tentativa do médio do Galatasaray. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Visivelmente preocupado, Fernando Santos tentou equilibrar a luta a meio campo com a troca de João Mário por Bruno Fernandes, mas apesar de uma ligeira melhoria, Benatia (78’) esteve perto do empate e, em cima do minuto 90, foi Pepe que travou um remate perigoso de Ziyach. A importante vitória estava garantida, mas apesar do mérito de Marrocos, há demasiados problemas para Fernando Santos corrigir nos próximos dias em Kratovo.
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Palavras-chave campo
Físico português avança explicação para dois dos grandes mistérios do Universo
O enigma da matéria escura tem 85 anos, o das explosões rápidas de rádio fez uma década. O físico João Rosa e um colega norte-americano desenvolveram um modelo teórico que procura explicar estes fenómenos. (...)

Físico português avança explicação para dois dos grandes mistérios do Universo
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 0.8
DATA: 2018-06-21 | Jornal Público
SUMÁRIO: O enigma da matéria escura tem 85 anos, o das explosões rápidas de rádio fez uma década. O físico João Rosa e um colega norte-americano desenvolveram um modelo teórico que procura explicar estes fenómenos.
TEXTO: Buracos negros, matéria escura e impulsos rápidos de rádio – três fenómenos do Universo com os quais os físicos se têm debatido. Se a física dos buracos negros já é mais conhecida, a matéria escura e os impulsos rápidos de rádio mantêm-se como dois grandes enigmas. Mais de 26% do Universo é matéria escura – que não se vê mas que se sabe existir, desde a década de 30, pelos efeitos que provoca à sua volta – e só 5% é matéria dita “normal” (o resto é uma energia escura, que contraria os efeitos da gravidade). Mas de que é feita a matéria escura ninguém sabe. Tal como não se sabe o que origina os impulsos rápidos de rádio – as maiores explosões luminosas do espaço profundo, detectadas pela primeira vez apenas em 2007. E se do estudo dos buracos negros saísse uma explicação tanto para a natureza da matéria escura como para a origem dos impulsos rápidos de rádio? É mesmo essa a proposta de João Rosa, da Universidade de Aveiro, num artigo na revista Physical Review Letters. João Rosa, de 35 anos, é físico teórico. Depois do doutoramento na Universidade de Oxford e de um pós-doutoramento na Universidade de Edimburgo, regressou a Portugal em 2012, para a Universidade de Aveiro. É enquanto físico teórico que investiga os buracos negros que terão surgido no início do Universo, nas fracções de segundo após o Big Bang, há cerca de 13. 800 milhões de anos. Um buraco negro forma-se quando a matéria entra em colapso sobre si própria, criando um objecto denso, que não vemos de forma directa e de onde nem a luz, uma vez lá caída, dada a gravidade exercida, consegue escapar-se. Por exemplo, ao morrerem, estrelas muito maciças originam buracos negros. Têm de ter algumas vezes a massa do nosso Sol para se transformarem nestes objectos superdensos. Além disso, no centro das galáxias, como a nossa Via Láctea, pensa-se que a enorme acumulação de matéria também desembocou em buracos negros monstruosos. Já a existência de buracos negros primordiais, criados nas fracções de segundo a seguir ao Big Bang, foi postulada pela primeira vez pelo físico britânico Stephen Hawking, em 1971. Estes buracos negros ter-se-ão formado em regiões do espaço com densidades extremamente elevadas, no seguimento do colapso dessas zonas por acção da gravidade. Mais pequenos e “leves” do que os buracos resultantes da morte de estrelas, terão sobrevivido até aos dias de hoje. “São hipotéticos, para já”, explica João Rosa. Voltemos pois ao que o físico português tem investigado nos buracos negros. Quando rodam muito rapidamente, os buracos negros primordiais podem criar à sua volta uma nuvem de umas partículas (também ainda) hipotéticas – os axiões. A existência destas partículas começou por ser proposta no final da década de 70. Depois, em 1983, avançou-se que os axiões poderiam constituir a matéria escura que não conseguimos detectar, que por sua vez já tinha sido proposta pela primeira vez em 1933, pelo físico Fritz Zwicky. “Os axiões são bons candidatos a serem a matéria escura do Universo, porque não emitem luz em condições normais”, nota João Rosa. “Queria saber se essa nuvem [de axiões] emitia radiação electromagnética. Ninguém tinha ainda considerado isso. ”Se os axiões emitissem alguma radiação electromagnética – ou seja, fotões, luz –, então tornar-se-ia possível apanhar de alguma maneira essas partículas até agora hipotéticas. E, a confirmar-se que os axiões são os principais constituintes da misteriosa matéria escura, desvendar-se-ia também finalmente a natureza desta matéria que tem teimado em manter-se invisível para nós. “Até agora pensava-se que as nuvens de axiões formadas em torno de buracos negros instáveis não emitiriam radiação electromagnética detectável, uma vez que a probabilidade de um axião se transformar espontaneamente em fotões é extremamente pequena. ”Ora os resultados de João Rosa e do norte-americano Thomas Kephart, da Universidade Vanderbilt (EUA), os dois autores do artigo na revista Physical Review Letters, apontam precisamente para a possibilidade de os axiões se transformarem em fotões e, desta forma, tornarem-se passíveis de detecção. Para não nos perdermos nesta viagem de conceitos nem sempre fáceis para todos, ouçamos as explicações do físico sobre o encontro de dois buracos negros primordiais. “Quando dois destes buracos negros colidem, formam um novo buraco negro que roda muito rápido sobre si mesmo e isso torna-o instável, levando a que produza uma densa nuvem de axiões em seu redor”, diz-nos João Rosa. Nuvem, essa, que tem a forma “curiosa” de um donut. “No interior desta nuvem, alguns axiões decaem, isto é, transformam-se em dois fotões, constituintes da radiação electromagnética. Cada um destes fotões estimula, por sua vez, o decaimento de outro axião da nuvem em mais dois fotões, e assim sucessivamente. Este efeito é semelhante ao que ocorre num laser e gera tantos fotões que a nuvem de axiões torna-se tão brilhante quanto mil milhões de sóis em apenas milésimos de segundo”, prossegue o físico. “A radiação emitida tem um comprimento de onda na gama do rádio do espectro electromagnético, daí observarmos este fenómeno como um impulso rápido de rádio. ”Foi assim a partir da descoberta teórica de que os axiões podiam transformar-se em fotões que acabou por surgir a ligação – por acaso – aos impulsos rápidos de rádio, as grandes explosões de luz vindas do espaço profundo descobertas em 2007, pelo radiotelescópio de Parkes, na Austrália. Desde então, já se observaram mais de 30 destas explosões muito brilhantes de ondas rádio, que duram apenas alguns milissegundos. Pensa-se que vêm de galáxias muito distantes. Só numa das explosões – designada como FRB121102 – foi possível identificar a galáxia onde ocorreu, situada a cerca de 3000 milhões de anos-luz de distância da Terra. Mas, dentro dessas galáxias distantes, o que causava estas explosões manteve-se um mistério. “Apesar das muitas teorias propostas para as explicar, a sua origem permanecia desconhecida”, refere João Rosa, segundo um comunicado da sua universidade. “Descobrimos que estes impulsos”, diz agora ao PÚBLICO, “podem dever-se a enormes explosões electromagnéticas em torno de pequenos buracos negros que se formaram no início do Universo”. Segundo o modelo proposto pelos dois investigadores, estes impulsos deverão ocorrer principalmente nos centros das galáxias mais densas: “Uma maior densidade tornará mais prováveis as colisões entre os buracos negros primordiais que dão origem aos impulsos. ”A estas enormes explosões electromagnéticas em torno de buracos negros os dois físicos deram o nome BLAST (“explosão”, em inglês), acrónimo de Black Hole Laser powered by Axion SuperradianT instabilities, por causa da semelhança deste novo fenómeno com um laser, por um lado, e da sua natureza explosiva, por outro. “Para nós que estudamos a física dos buracos negros e da matéria escura, foi surpreendente perceber que o fenómeno que descobrimos também oferece uma nova explicação para os impulsos rápidos de rádio. Assim, se vier a confirmar-se esta explicação, poderão estar resolvidos dois dos maiores mistérios do Universo – de que é feita a matéria escura e o que gera os impulsos rápidos de rádio. A resposta poderá ser a mesma a ambas as questões – axiões e buracos negros primordiais. ” Nesse caso, o mistério de 85 anos sobre a matéria escura e o de uma década sobre as explosões rápidas de rádio estariam mais perto do fim. Resumindo, para mantermos o rumo da viagem: os buracos negros primordiais em grande rotação geram nuvens de axiões e é nessas nuvens que, por sua vez, se geram os impulsos rápidos de rádio. De dentro dos buracos negros continua a não sair nada, como se pensava até agora. É na nuvem de axiões produzida pelos buracos negros, que se encontra à sua volta, que é originada essa radiação. Os próprios buracos negros primordiais, a confirmar-se a sua existência, um mistério de 47 anos, também contribuirão para a matéria escura que existe e não vemos. “Se estes buracos negros tiverem sido produzidos em número suficientemente grande no Universo primordial, poderão também explicar uma fracção significativa da matéria escura, ainda que provavelmente não a expliquem na sua totalidade”, adianta o físico. Agora a descoberta do fenómeno BLAST abre a possibilidade de aprofundar a natureza da própria matéria escura. “Detectar estas nuvens de axiões, através dos impulsos rápidos de rádio que emitem, potencia uma forma completamente nova de estudar as propriedades da matéria escura, uma vez que esta, como o próprio nome indica, não emite radiação em condições normais”, sublinha justamente João Rosa. Se os axiões forem as partículas que constituem a matéria escura, não só se produzem em torno de buracos negros como também se espalharão por todo o Universo, em todas as galáxias. Ainda que não seja explosivo, um processo semelhante ao agora descrito poderá converter esses axiões pelo Universo fora em fotões. Um dos telescópios com capacidade para detectar essa radiação ténue será o futuro radiotelescópio intercontinental Square Kilometre Array (SKA), que terá antenas espalhadas na Austrália, África do Sul e outros países africanos, e de que Portugal fará parte como um dos membros fundadores a partir deste ano. “Haverá radiação em todo o lado da matéria escura. Essa radiação, esses fotões, que a matéria escura emitirá, em teoria, será difusa, não explosiva. Se for [emitida por] axiões, o SKA poderá detectá-la também na gama do rádio. ”Sendo uma partícula hipotética, o valor da massa do axião não é efectivamente conhecido. Mas esse valor é importante para explicar as propriedades das enormes explosões electromagnéticas à volta de buracos negros. É também importante para determinar a fracção da matéria escura que poderá ser composta por axiões. Teoricamente, para explicar a matéria escura do Universo, já se apontava que valor a massa do axião teria de ter. Acontece que, no modelo proposto pelos dois físicos, esse mesmo valor explica os impulsos rápidos de rádio. “O nosso momento ‘eureka’ foi percebermos que o valor da massa dos axiões em que estes podem constituir a totalidade da matéria escura no Universo coincide com o valor que explica não só o comprimento de onda como a luminosidade e a duração dos impulsos rápidos de rádio. ”Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Esta coincidência entre as duas coisas levanta a suspeita de que poderá não ser só uma coincidência, considera João Rosa. Já permitiu à equipa fazer “uma previsão concreta” para o valor da massa do axião, que poderá vir a ser testada em laboratório nos próximos anos: deverá ser cerca de 50. 000 milhões de vezes inferior à massa do electrão. Para a Physical Review Letters este artigo merecia um lugar de destaque, pelo que o integrou nas Sugestões do Editor, uma distinção, salienta o comunicado da Universidade de Aveiro, atribuída a cerca de um em cada seis artigos divulgados nesta revista. Agora é a vez de a física experimental e observacional entrar em campo, para confirmar estas propostas teóricas com a detecção, por um lado, dos axiões em laboratório e, por outro, com a descoberta dos buracos negros primordiais no cosmos, usando o efeito de distorção da luz de estrelas que estiverem atrás desses objectos escuros para denunciar a sua presença. “O ideal seria conseguir detectar estas partículas em laboratório e também procurar os buracos negros primordiais. Espero que o nosso trabalho possa motivar este tipo de experiências. ”
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Entidades EUA
A peste do futebol
Os deuses do estádio são os representantes de formas extremas de escravidão, que a nossa época recalca e não ousa pensar. (...)

A peste do futebol
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-05-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: Os deuses do estádio são os representantes de formas extremas de escravidão, que a nossa época recalca e não ousa pensar.
TEXTO: Consumada a futebolização do país, chegados ao estádio último de um ininterrupto matraquear futebolístico do espaço público, já os ideólogos desportivos se parecem com hooligans e os hooligans se parecem com os ideólogos desportivos. Todos primos, todos irmãos. Para prosseguir a crónica de uma intoxicação voluntária, aproprio-me do título de um livro que não li, de dois sociólogos franceses. Basta-me o título: Le football, une peste émotionnelle (“O futebol, uma peste emocional”). Em vez de peste, o futebol-espectáculo organizado também pode ser um lugar de formações sociopatológicas. Ou uma obsolescência desportiva. O que não devemos fazer é naturalizar o que nele e à sua volta se passa. Tal como não devemos tratar como meros desvios ou derivas aquilo que já constitui a própria substância do espectáculo. E não é preciso ter ocorrido um episódio de violência real para percebermos o que tem sido uma continuada violência simbólica, exercida como uma injunção colectiva através do empreendimento dos media. A crónica de uma violência normalizada, ou mesmo da banalidade do ódio, é aquela que nos fala dessa peste emocional promotora da barbárie nos estádios e à volta deles, que difunde o racismo, o populismo, os nacionalismos xenófobos, os regionalismos atávicos e os ódios identitários, dando origem a uma regressão cultural generalizada. O futebol-espectáculo não é simplesmente um jogo colectivo, tornou-se uma organização para o enquadramento pulsional das multidões: e os estádios de futebol são lugares concentracionários, modelos de totalitarismo. É preciso abdicar da ideia de que são os grandes acontecimentos que determinam essencialmente os homens. Pelo contrário, são as catástrofes minúsculas de que é feita a vida quotidiana que têm uma influência maior e mais duradoura. Ora, o futebol, que é uma crónica ininterrupta de catástrofes minúsculas, dramatizadas de maneira enfática através da mediatização e da espectacularização exacerbadas, propõe de maneira ideal a violência da competição desportiva. O bárbaro — escreveu Claude Lévi-Strauss — é sobretudo o homem que acredita na barbárie. No futebol-espectáculo instalou-se a barbárie da competição desportiva e a barbárie originada pela peste emocional. Lutas, enfrentamentos, guerras, conflitos, rivalidades, provações, desafios agonísticos: o mais extremo campo semântico do darwinismo social transferiu-se para aqui. E os media praticam o incitamento à guerra e montam o palco das baixas contendas. Não fazem jornalismo desportivo: são, digamos assim, especialistas de polemologia do futebol. E os jogadores, no meio de tudo isto? Os deuses do estádio são os representantes de formas extremas de escravidão, que a nossa época recalca e não ousa pensar. Há uma pequena parte com ganhos tão astronómicos que tudo o resto é esquecido. E o resto é a instrumentalização dos indivíduos no mais alto grau, estritamente reduzidos à sua função específica: espera-se que eles sejam um apêndice da performance absoluta. E, por serem isso e nada mais, não podem falar para além daquilo que lhes é consentido pelo clube, não podem protestar contra os patrões, mal são “comprados” ficam destituídos de todo o direito e têm como única condição serem “activos” dos clubes. Têm de abdicar de toda a autonomia e da vida privada. São inteira propriedade do clube, da empresa desportiva que os compra, os vende, os empresta. E quanto mais valem como desportistas, menos valor têm como pessoas. Chegámos aqui ao grau último da mercadorização da existência. Não há nenhum deus do estádio que não seja ao mesmo tempo uma criatura que se defronta com o inferno.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave homens guerra violência campo homem racismo social
Uma rádio que só toca David Fonseca
Depois de uma aventura em português, David Fonseca regressa ao inglês em Radio Gemini, álbum pensado como playlist de uma rádio em que lhe cabe a ele ser rock, r&b, hip-hop, funk e tropical, sempre debaixo de um filtro pop. (...)

Uma rádio que só toca David Fonseca
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-05-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: Depois de uma aventura em português, David Fonseca regressa ao inglês em Radio Gemini, álbum pensado como playlist de uma rádio em que lhe cabe a ele ser rock, r&b, hip-hop, funk e tropical, sempre debaixo de um filtro pop.
TEXTO: Assim que tomou o primeiro contacto com o vídeo de This is America, de Childish Gambino, David Fonseca quis voltar ao tema mas desligando-se do vídeo de uma das mais intensas e perturbadoras canções que abalaram o mundo pop nos últimos meses. Queria perceber se o tema sobrevivia à ausência desse fortíssimo discurso visual acerca do racismo e da perseguição policial em território norte-americano, calando com absoluta violência todos os cantos solares que eludem a realidade. E sim, concluiu, a canção sobrevive “de uma forma ainda mais incrível” depois de privada da relação com a imagem. “Tem tudo aquilo que uma boa canção pop deve ter – porque, para mim, aquilo é uma canção pop, das mais notáveis”, diz. E concretiza: “Mantém uma forma vaga, é dançável, é cantarolável, dá para cantar a caminho da praia sem ter de aparentar ser uma coisa muito séria, mas ouvindo nas entrelinhas tudo aquilo é extremamente violento e acutilante de um ponto de vista social, em relação àquilo que se vive de facto hoje na América, e marca um tempo. Dizer aquilo que ele diz e ser extremamente popular é muito complicado. ” Esta conjugação de popularidade e assertividade discursiva, nota, é algo que está habitualmente ausente do mainstream português. “A música pop que aparece e está no top 10 não é uma música que transporte algo de especial, é facilmente esquecível. ”Autoria:David Fonseca Universal MusicDavid Fonseca não está a comparar-se a Childish Gambino. Nada disso. E di-lo com todas as letras para que não haja qualquer confusão a esse respeito. Simplesmente cita o alter ego musical do actor Donald Glover como antídoto contra a opinião vulgarizada de que a música pop não tem a missão de propor qualquer temática séria e deve ater-se à superficialidade. É uma discussão que toma forma a partir de uma das abundantes excelentes canções de Radio Gemini, o seu sétimo álbum a solo. Blah-blah-blah pode ser lida, sem grande imaginação, como uma crítica à vacuidade que tantas vezes se apodera das canções de massas, quando pouco mais fazem do que apontar para a esquerda e para a direita, sugerir uns elementares passos de dança e elencar umas palavras escolhidas pela rima e não pelo seu real sentido. Mais uma vez, não é que a pop esteja obrigada a desencadear revoluções e que David Fonseca esteja a reclamar para as suas canções um impacto capaz de derrubar governos ou salvar cidadãos de acções de despejo. Mas há do seu lado uma crença inabalável no poder de uma canção para pintar o quadro de um momento e, idealmente, carregar “uma intenção disruptiva”. E hoje em dia, reforça, a música que se ouve nas discotecas ou nas rádios mainstream é a de uma pop sempre disponível para dizer sim e pouco questionar o mundo, em vez de ousar dizer não e semear qualquer impulso de oposição ou de revolta. Na sua própria discografia, aquilo que haverá, porventura, de mais disruptivo é o constante reset que se propõe levar a cabo, recusando o conforto de permanecer agarrado a uma mesma linguagem testada e validada pelo grande público, e submetendo tantas vezes as suas canções a um arco conceptual que, com frequência, implica alguns tropeções numa sequência de melodias que, mandam as regras, se quer o menos atreita possível a distracções. Assim volta a ser em Radio Gemini – depois da aventura isolada em português que foi Futuro Eu, e da investida em dois álbuns interligados de Seasons – Rising : Falling. Do início ao fim, ao longo de uma hora certa, o músico junta canções e interlúdios como se ouvíssemos uma emissão de rádio em directo (sem anúncios). E enquanto Radio Gemini se espraia volta a tornar-se claro que David é um dos mais lúcidos exploradores da pop em Portugal, ao compreender e explorar a natureza volúvel dessa linguagem, fazendo dela íman para todos os géneros musicais que canibaliza impiedosamente. É por isso que, sem qualquer pudor, Radio Gemini quase se pode acompanhar como um número de travestismo: ouvimos David Fonseca nas suas peles mais habituais, de seguidor do rock clássico e orelhudo dos Cars (Sloppy kisses) ou da pop aberta ao mundo de David Byrne (Hang on…), mas também em terreno de balada ao jeitos dos Blur de Tender (em Lazy), em modo funk-pop com marca registada de Prince (Men boys women girls), em pop atmosférica francófona via Air (C’est pas fini), em distensão r&b (My love is real), em r&b mais robusto e lascivo como se quisesse imaginar-se Britney Spears (Tell me something I don’t know) ou a tentar acercar-se de um hip-hop de ego farto em modo Kanye West (Anyone can do it). Apesar do que possa parecer nas linhas acima, Radio Gemini não é: a) uma abordagem a rasar o paródico das várias linguagens em apreço, quase se limitando a um efeito caricatural; b) um exercício de estilo em que David Fonseca tenta, à força, enfiar-se nos géneros musicais que emula para se confundir com qualquer um dos seus legítimos autores. É sobretudo a criação em disco de uma playlist que obedece, isso sim, a uma lógica de diversidade de abordagens, sem cair na armadilha da artificialidade. Tanto foi pensado como emissão de rádio que, revela o músico, Radio Gemini estará disponível nos serviços de streaming na opção de faixa única, com os temas todos encadeados, sem pausas. “Isso permite-me ser um pouco mais radical nos extremos”, defende. “Nesse sentido, é um disco que me dá mais liberdade. Não tenho de me cingir especificamente a uma forma de fazer as coisas porque o conceito me permite ir a sítios onde normalmente não vou. Mas vou sempre com um medo horrível de poder fazer um exercício de estilo. ”Esse medo horrível foi sossegado pelo facto de, diante de cada um dos 21 temas (entre canções e separadores) que compõem Radio Gemini, David Fonseca nunca se ter estranhado. Possivelmente porque a voz é sempre a sua e porque foi ele, como de costume, a gravar quase todos os instrumentos. “E isso tem uma certa forma”, reconhece. “Mesmo que eu vá até uma área mais do rock ou da música de dança, vou tocar os instrumentos da mesma forma. Os sons podem ser diferentes, mas são tocados com as minhas limitações. Uma das conclusões a que cheguei foi que, mesmo usando outros formatos, acabo por fazer a minha música. Pensei até: ‘Caramba, fiz todo este caminho para chegar exactamente ao mesmo sítio’. Podia estar numa banda de metal e ia soar a mim na mesma. Acho que é por isso que soa a uma coisa una e que a pessoa neste disco sou mesmo eu. ”Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. A única excepção que o músico admite a esta intuitiva construção de canções nascida de um pequeno sintetizador a pilhas que o acompanhou em quartos de hotel, carros a caminho de concertos, comboios, aviões ou regressos a casa depois de uma noite numa discoteca, é Anyone can do it. Esse mergulho nas águas do hip-hop é o único a não ter sido norteado pela mera curiosidade de perceber como se desenvolve determinado género e de que maneira ele se pode aplicar às suas criações. “Estava com uma pessoa a falar de vários assuntos e lembro-me de lhe dizer que parecíamos aqueles rappers que começam logo a tentar ensinar-nos alguma coisa”, conta. “Achei piada a essa forma, a essa abordagem do rapper que se coloca logo num sítio muito superior a quem o está a ouvir. E então peguei nisso, fui claramente para um sítio onde não costumo ir e chamei à canção Anyone can do it, numa abordagem auto-referencial e auto-irónica. ”De resto, quis que todas as canções ficassem “prisioneiras do sítio de onde saíram”. Daí que o conceito de rádio tenha surgido, antes de mais, numa alusão à premissa inicial de se sintonizar na frequência de cada um dos lugares e das situações em que os temas nasceram, só depois evoluindo para a tal condição de playlist. Mais do que correr atrás do gosto popular que essa playlist poderia indiciar, David Fonseca diz ser sobretudo tentado pela “ideia extremamente atractiva para qualquer músico de poder entrar num universo que não é o seu”. Com a curiosidade de se rodear de ferramentas que não lhe são habituais, mas também na tentativa de descodificar as características que tornam certas correntes musicais tão apelativas. Sem se preocupar demasiado com as opiniões de terceiros, David recorda uma ida até à praia, em Dezembro de 2015. Ia fazer fotografias de promoção para um disco de Natal e seguia vestido de pinheiro. Quando chegou, em família, os filhos envergonharam-se com a sua figura numa praia que, afinal, não estava deserta. David, o pai, fê-los repetir consigo: “Não quero saber o que as outras pessoas dizem de mim”. Debaixo do fato de pinheiro, imune a quaisquer comentários, continuava a estar David Fonseca. Radio Gemini não é muito diferente.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave violência racismo social medo género perseguição
Por um Museu da Lusofonia
Esperamos que o futuro “Museu das Descobertas” (ou “da Descoberta”) não seja estruturado a partir de uma visão completamente enviesada do colonialismo e da escravatura. (...)

Por um Museu da Lusofonia
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-05-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: Esperamos que o futuro “Museu das Descobertas” (ou “da Descoberta”) não seja estruturado a partir de uma visão completamente enviesada do colonialismo e da escravatura.
TEXTO: Como era fácil de adivinhar, a proposta da Câmara Municipal de Lisboa de criar um “Museu das Descobertas” (ou “da Descoberta”) fez ressurgir uma série de lugares-comuns relativos à história da colonização portuguesa, que parecem resistir a toda a crítica, por mais que se comprove a sua falta de fundamento. De forma mais ou menos expressa, parte-se sempre desta premissa: antes dos portugueses chegarem a África ou à América, esses territórios eram uma espécie de paraíso terrestre, que, obviamente, os portugueses tornaram num inferno. Nesta visão tão grosseira quanto falsa, de um lado temos pois os portugueses (por extensão, todos os europeus) como “ontologicamente agressores” e, do outro, os africanos e os americanos como “ontologicamente vítimas”. Sendo que quem questiona esta visão só pode ter, claro está, um olhar eurocêntrico. “Impedidos” que estamos de citar um historiador europeu, citemos então um historiador brasileiro, assumidamente “de esquerda” e particularmente insuspeito de qualquer espécie de “eurocentrismo”, que reencontrámos em Maio deste ano num Congresso decorrido no Brasil, na cidade de Mariana: Paulo Margutti, autor da monumental obra História da Filosofia no Brasil (São Paulo, Ed. Loyola, 2013). O que nos diz ele de África antes da chegada dos portugueses e do alegado início do inferno da escravatura? Literalmente, isto: “De um modo geral, os costumes dos negros facilitavam grandemente a escravidão, uma vez que essa constituía a penalidade imposta entre eles para diversos delitos. Além disso, os pais podiam vender os filhos, o rei podia escravizar os seus súditos e grande parte dos membros de uma tribo derrotada em guerra estavam submetidos ao cativeiro” (p. 191). E quanto ao alegado paraíso que era a América do Sul antes da chegada de Pedro Álvares Cabral? Ouçamos uma vez mais o insigne académico brasileiro: “Cada tribo tupi vivia em guerra permanente com os vizinhos, qualquer que fosse a sua matriz cultural. Quando essa matriz era diferente, as lutas eram motivadas por disputas territoriais. Quando a matriz era a mesma, as lutas eram motivadas por uma visão de mundo culturalmente condicionada, que envolvia expedições guerreiras com o objetivo de capturar prisioneiros para a realização de rituais antropofágicos (. . . ). A fama de um homem dependia de quantos inimigos já tinha capturado ou executado, acumulando assim novos nomes. Isso está ligado à ideia de que só os corajosos tinham acesso ao paraíso, ficando as almas dos covardes condenadas a vagar pela terra, acompanhadas pelos demônios. Uma vida de valor caracterizava-se fundamentalmente pela vingança obtida graças à execução dos inimigos, fosse em combate, fosse em rituais antropofágicos” (pp. 180-181). Bem sabemos que estas evidências históricas em nada põem em causa as certezas de quem insiste que, “de facto”, antes de os portugueses chegarem a África ou à América, esses territórios eram uma espécie de paraíso terrestre, que, obviamente, os portugueses tornaram num inferno. Como “certezas metafísicas”, elas são absolutamente intangíveis a todo e qualquer argumento. Esperamos, porém, que o futuro “Museu das Descobertas” (ou “da Descoberta”) não seja estruturado a partir dessa visão completamente enviesada do colonialismo e da escravatura. Caso se queira salientar esta questão, então que se conte a história toda: quanto à escravatura, os povos europeus não foram apenas agressores, foram também vítimas (pois que a história da Europa foi, também ela, violenta); e os restantes povos do mundo não foram apenas vítimas, foram também agressores. Infelizmente, a escravatura foi uma constante na história da humanidade até há poucos séculos, em todos os continentes, sem excepção. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Mais do que o nome do futuro Museu, o que nos preocupa são pois os conteúdos que serão apresentados e a forma como tais conteúdos serão apresentados. Se prevalecer essa visão completamente enviesada do colonialismo e da escravatura, então o melhor, no limite, é que não se faça o Museu. Assim, pelo menos, essa visão completamente enviesada do colonialismo e da escravatura não terá a caução do Estado Português, ainda que por via da Câmara Municipal de Lisboa. Esperamos, ainda assim, que o bom senso prevaleça e que o Museu se faça. Com o nome de “Museu das Descobertas”, “da Descoberta”, ou, como preferiríamos, “da Lusofonia”. No século XXI, este é, a nosso ver, o nome que mais sentido faz, porque é isso o que, no século XXI, resultou de toda essa história: a Lusofonia. Por mais controversa e traumática que continue a ser essa história, sobre o que dela resultou não nos parece haver espaço para contestação. Mesmo aqueles que consideram que, no essencial, a história da expansão marítima portuguesa foi uma história de pilhagem e devastação, não podem deixar de reconhecer a difusão da nossa língua à escala global. Difusão que permanece e que se acentuará, neste século XXI. Como tem sido antecipado, o número de falantes da língua portuguesa irá continuar a crescer de forma significativa (excepto, ironia das ironias, em Portugal). O nome de “Museu da Lusofonia” teria pois essa vantagem: mais do que nos reenviar para o passado, projecta-nos no nosso futuro comum. Sem escamotearmos esse passado e todos os crimes, à luz dos valores de hoje, que então se cometeram, olhemos pois sobretudo para o futuro. O “Museu da Lusofonia” deveria ter esse enfoque, assim promovendo, hoje (felizmente) numa base de liberdade e de fraternidade, a relação entre todos os povos de língua portuguesa.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave guerra homem espécie escravatura cativeiro
Eduardo Lourenço na Disneylândia
Miguel Gonçalves Mendes traduz certeiramente o pensamento de Eduardo Lourenço, mas fá-lo pelo meio de uma parafernália digital que corre o risco de o trair. (...)

Eduardo Lourenço na Disneylândia
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-05-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: Miguel Gonçalves Mendes traduz certeiramente o pensamento de Eduardo Lourenço, mas fá-lo pelo meio de uma parafernália digital que corre o risco de o trair.
TEXTO: Caso estranho, este de um filme que, em pouco mais de uma hora, dá tantos tiros no pé e ao mesmo tempo acerta na mouche no essencial. À imagem do que fizera com Mário Cesariny em Autografia (2004) e com José Saramago em José e Pilar (2010), Miguel Gonçalves Mendes volta a contornar a lógica tradicional do documentário hagiográfico. Em O Labirinto da Saudade, é o próprio filósofo e ensaísta Eduardo Lourenço, que completa 95 anos esta quarta-feira, a conduzir-nos por uma “encenação onírica” das ideias do livro que publicou pela primeira vez em 1978, assim protagonizando este projecto encomendado por um colectivo de amigos e admiradores (alguns dos quais participam no filme). A ideia terá parecido irresistível a Gonçalves Mendes, cineasta que gosta de inventar e brincar com as formas, mas O Labirinto da Saudade quer ser demasiadas coisas para demasiada gente. Adaptação mais ou menos livre de um ensaio seminal sobre a identidade portuguesa, pequena introdução a uma das figuras seminais da cultura nacional do último século, celebração da sua vida, o filme acaba por ser melhor quando se concentra apenas em Lourenço e nas suas ideias. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Realização:Miguel Gonçalves MendesNas suas próprias palavras, o ensaísta é “um ser terrivelmente abstracto”, sem o magnetismo físico, performativo, de um Cesariny. A solução encontrada para contornar essa modéstia é o grande calcanhar de Aquiles do filme. Gonçalves Mendes coloca Lourenço a debater as suas ideias em diálogos “socráticos”, pedagógicos, com figuras públicas ali presentes como amigos ou admiradores do pensador mas também em representação de arquétipos referenciados no livro (“o escritor” Gonçalo M. Tavares, “a espanhola” Pilar del Río, “o psiquiatra” Tiago Marques, “o brasileiro” Gregório Duvivier, “o africano” José Nafafe. . . ). Essa incapacidade de delimitar fronteiras entre personalidade e personagem abre as portas ao equívoco de uma récita amadora cheia de boas intenções mas algo canhestra, e que não é ajudada pelo recurso recorrente ao efeito de imagem. Algures entre o Darren Aronofsky de O Último Capítulo e um Terry Gilliam digital, fica a sensação de que Gonçalves Mendes está a criar uma “Disneylândia visual”, cujo barroquismo ostentatório parece espelhar (talvez inadvertidamente?) a descrição que Lourenço faz do Portugal “virtual” e idílico que Salazar criou. A verdade é que esse “papel de embrulho” não era preciso. Bastaria a voz e a presença de espírito que Eduardo Lourenço (muito menos abstracto do que diz ser) ainda respira. Sempre que tudo se concentra no seu pensamento, na sua (brilhante) “psicanálise mítica” da portugalidade, no modo como a sua obra e a sua vida se ligam, o filme descola para lá do lastro institucional das expectativas, deixa antever o que O Labirinto da Saudade podia ter sido. Assim, fica aquém daquilo que Miguel Gonçalves Mendes já provou saber fazer — ao mesmo tempo que faz inteira justiça ao que Eduardo Lourenço é e representa. Parece contraditório, sim, mas faz todo o sentido pelo meio deste labirinto.
REFERÊNCIAS:
Partidos LIVRE
Às vezes, os hipopótamos defecam tanto que matam todos os peixes à sua volta
Para infortúnio dos peixes, estes mamíferos de grande porte passam grande parte do seu tempo na água, para regular a sua temperatura. As fezes dos hipopótamos fazem com que os níveis de oxigénio na água baixem. (...)

Às vezes, os hipopótamos defecam tanto que matam todos os peixes à sua volta
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 0.2
DATA: 2018-05-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: Para infortúnio dos peixes, estes mamíferos de grande porte passam grande parte do seu tempo na água, para regular a sua temperatura. As fezes dos hipopótamos fazem com que os níveis de oxigénio na água baixem.
TEXTO: Um grupo de cientistas norte-americanos descobriu que existe uma relação directa entre a quantidade de fezes de hipopótamo na água e o número de peixes mortos (às vezes são milhares). Quando os mamíferos herbívoros defecam em grande quantidade para a água – algo descrito pelos investigadores como uma descarga de nutrientes e matéria orgânica – os ecossistemas aquáticos são afectados, podendo dar-se um caso de hipoxia (a diminuição da concentração de oxigénio no sangue ou nos tecidos, semelhante ao que acontece em águas muito poluídas), lê-se num artigo publicado na revista científica Nature Communications na semana passada. A morte maciça de peixes começou por causar estranheza a Christopher Dutton e a Amanda Subalusky, dois dos autores do estudo, que ficavam admirados com o fenómeno, sem razão aparente. Os moradores locais pensavam que fosse culpa da poluição, dos pesticidas deitados ao rio, conta a revista The Atlantic, mas as experiências levadas a cabo pelos cientistas viria a identificar os verdadeiros culpados: os hipopótamos. Os dois investigadores estudaram o caso do Rio Mara, na Tanzânia, no Leste africano. Ao todo, os cientistas registaram 49 descargas do género que baixaram os níveis de oxigénio nas águas, havendo nove ocorrências, ao longo de cinco anos, que resultaram na morte por asfixia de praticamente todos os peixes que estavam na água. “Se pusermos redes na água só durante alguns segundos, o centro ficará coberto de fezes de hipopótamo”, refere Dutton. “Há fezes de hipopótamo em todo o lado: nas rochas, no fundo”. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Ainda assim, os cinco cientistas (há três outros além de Dutton e Subalusky) admitem que este fenómeno possa ter vindo a diminuir nos últimos anos, devido à redução do número de hipopótamos. Estima-se que haja cerca de 70 mil hipopótamos na zona Este de África, o que resulta em toneladas e toneladas de excrementos por ano. Como estes mamíferos são dependentes da água, que os ajuda a regular a temperatura do corpo durante o dia, grande parte desses excrementos são libertados directamente nos ecossistemas aquáticos. Os hipopótamos são uma espécie vulnerável no que toca à conservação e vivem sobretudo em locais junto a rios, lagos e a outros cursos de água.
REFERÊNCIAS:
A angústia punk-jazz-candomblé dos Metá Metá vai estar entre nós
Unidos na transgressão do samba e da afro-religião do candomblé, os Metá Metá tocam hoje uma música que responde ao clima social e político do Brasil. Esta sexta-feira estão na abertura do Lisboa Mistura, seguem depois para o Nos Primavera Sound, no Porto, e para o Festival Med, em Loulé. (...)

A angústia punk-jazz-candomblé dos Metá Metá vai estar entre nós
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-06-11 | Jornal Público
SUMÁRIO: Unidos na transgressão do samba e da afro-religião do candomblé, os Metá Metá tocam hoje uma música que responde ao clima social e político do Brasil. Esta sexta-feira estão na abertura do Lisboa Mistura, seguem depois para o Nos Primavera Sound, no Porto, e para o Festival Med, em Loulé.
TEXTO: Em Julho de 2015, a digressão europeia dos brasileiros Metá Metá havia de sofrer um pequeno desvio. Descendo pelo mapa continental, o trio formado por Juçara Marçal (voz), Thiago França (saxofone) e Kiko Dinucci (guitarra) acabou por resvalar até Rabat para tocar no Festival Mawazine. Ao pisarem pela primeira vez solo africano, os três músicos de São Paulo emocionaram-se com essa epifania colectiva e deixaram-se contagiar pela arquitectura e pela música, pelos lugares e pelas sonoridades com que se cruzaram na capital marroquina. Tal experiência deixou um rasto claro na composição do terceiro álbum do grupo, MM3 (2016). Basta ouvir os primeiros segundos de Três amigos, hipnótico e modorrento tema de abertura, para intuir no diálogo de França e Dinucci o calor denso da região magrebina. Composto maioritariamente na estrada, MM3 sugaria elementos de várias das paragens por onde os Metá Metá então actuaram, “mas nada muito determinado”, diz a vocalista Juçara Marçal numa chamada com o PÚBLICO dias antes de a banda cumprir uma ronda por festivais portugueses – até ao final do mês, estarão no Lisboa Mistura (esta sexta-feira, dia 8), subirão logo de seguida ao Porto para actuar no Nos Primavera Sound (sábado, dia 9), terminando o périplo em Loulé, no Festival Med (dia 28). “Ao fazer o disco, a gente ouvia e percebia que o que tínhamos vivenciado estava a tornar-se presente na sonoridade do MM3. ”Mais do que o resultado de uma qualquer investigação local levada a cabo em torno da música marroquina, MM3 é sobretudo o resultado da permeabilidade dos Metá Metá aos sons africanos que dizem continuar a conhecer sobretudo através do YouTube, vindos de países como o Mali ou o Níger. “Mas, de uma maneira geral”, declara Kiko Dinucci, “este disco é mais brasileiro e mais paulistano do que propriamente vindo da África do Norte”. E essa matriz, embora presente sem surpresa num grupo que se juntou a partir do encontro acidental em formações ligadas ao samba, tornar-se-ia mais proeminente dada a coincidência temporal da sua gestação. “Quando a gente saiu do Brasil para a tournée europeia, deram o golpe de Estado na Presidente [a destituição de Dilma Rousseff]. O disco reflecte muito isso – o nosso tempo, o Brasil, São Paulo, o momento político. Nada é explícito nas letras, mas acho que o disco tem uma angústia que reflecte um pouco esse colapso social e político que estamos vivendo no país”, afirma o guitarrista. “É muito difícil no meio de um contexto destes a gente parar e conseguir falar sobre as árvores, o canto dos passarinhos, a lua, o pôr-do-sol”, acrescenta Thiago França. Daí que MM3 seja um íman para esses sentimentos de angústia, descontentamento, reacção contra a opressão política, resultando numa sonoridade mais agressiva do que aquela que conhecíamos aos Metá Metá. Sem se permitir “perder a esperança ou entrar num estado catatónico”, a banda canalizou para os oito temas toda a revolta e toda a insatisfação de um país que, acreditam, “está em transe” e a ser "levado para algo que não se sabe o que é, mas se encontra a caminho de ter resultados horrorosos de aumento de criminalidade e de miséria, que já estão crescendo muito”. No pior dos cenários, os três antecipam mesmo uma guerra civil ou uma guerra de classes declarada. E a música, a cada momento, terá de responder a isso. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Kiko Dinucci aproximou-se do movimento do samba paulista depois de “enjoar do rock”, quando na ressaca dos anos 90 começou a achá-lo demasiado inofensivo e excessivamente propenso a uma sonoridade comercial. De repente, Kiko – tal como Thiago e Juçara – encontrou no samba uma música que lhe oferecia o que nenhum outro género garantia. “Mas depois começámos a transgredir o samba à nossa maneira”, confessa o guitarrista. No caso dos Metá Metá, essa transgressão toma a forma de um samba transfigurado pelo rock, pelo punk e pelo jazz, e casou-se com um interesse comum – descoberto através de conversas hidratadas a cerveja – pelas raízes africanas do candomblé. Foi essa experiência afro-religiosa partilhada pelos três a dar o impulso crucial para o estabelecimento de uma linguagem de invenção da música brasileira. E o encaixe entre o trio foi tão perfeito que Kiko o descreve como “um caso de amor”. “Quando se acha o parceiro ou a parceira ideal e as coisas se encaixam – foi assim o nosso encontro, como Dona Flor e seus Dois Maridos [título de romance de Jorge Amado]”, resume entre risos. Resgatada a matriz afro-religiosa presente no próprio samba, o candomblé e o jazz uniram-se para dar forma a uma linguagem tão particular que, logo ao primeiro álbum, homónimo, os Metá Metá se estabeleceram como uma das propostas mais entusiasmantes e originais da música brasileira actual. Depois de Metá Metá, vieram MetaL MetaL e MM3, reafirmando essa condição única de uma banda que diz reagir ao que há de “mais pulsante e vigoroso” na música. E se isso é evidente em disco, é ainda mais indisfarçável em palco, como por estes dias se poderá confirmar.
REFERÊNCIAS:
Religiões Candomblé