Touradas recuperaram espectadores em 2017, mas perderam mais de 320 mil na última década
Estimativas recolhidas pela Inspecção-Geral das Actividades Culturais dão conta de 378 mil espectadores nas 181 corridas licenciadas: mais 4,4% do que no ano anterior, mas menos 45% do que em 2008. (...)

Touradas recuperaram espectadores em 2017, mas perderam mais de 320 mil na última década
MINORIA(S): Animais Pontuação: 18 | Sentimento 0.25
DATA: 2018-12-26 | Jornal Público
SUMÁRIO: Estimativas recolhidas pela Inspecção-Geral das Actividades Culturais dão conta de 378 mil espectadores nas 181 corridas licenciadas: mais 4,4% do que no ano anterior, mas menos 45% do que em 2008.
TEXTO: O número de pessoas que assistiram a espectáculos licenciados em praças de touros em Portugal aumentou cerca de 4, 4% em 2017, mas registou uma diminuição bem mais significativa, na ordem dos 45%, no decorrer da última década: se em 2008 a Inspecção-Geral das Actividades Culturais (IGAC) contabilizou 698. 142 espectadores em 307 eventos, no ano passado registou 377. 952 pessoas em 181 espectáculos – mesmo assim, mais 15. 895 do que em 2016. São números do relatório da actividade tauromáquica de 2017, publicado pela IGAC, e que se baseiam "na estimativa apresentada pelos delegados técnicos tauromáquicos", explicou ao PÚBLICO, via email, o director-geral deste organismo, Luís Silveira Botelho. Estes dados – que recentemente ganharam maior relevância na sequência da polémica política motivada pela proposta do Governo de manter o IVA dos espectáculos tauromáquicos nos 13 por cento – não coincidem, no entanto, com os números divulgados pela Prótoiro – Federação Portuguesa de Tauromaquia. Segundo o site deste organismo, no ano passado 435. 660 espectadores assistiram a 205 touradas, e “a média continua a subir”. Uma explicação para este diferencial poderá encontrar-se, por um lado, no facto de a IGAC só superintender o território de Portugal continental, deixando por isso de fora os Açores, que reclama possuir “a população mais taurina do mundo”, como defendeu o deputado social-democrata daquele arquipélago António Ventura, citado pelo Observador, e onde se realizará uma dezena de espectáculos por ano. Outra será o facto de o IGAC se limitar a fazer “um retrato administrativo” deste universo, que estará distante da realidade no terreno, como disse àquele diário electrónico o porta-voz da Prótoiro, Hélder Milheiro. Ao PÚBLICO, Luís Silveira Botelho especificou que as estimativas contabilizadas pela IGAC decorrem dos números apresentados pelos delegados tauromáquicos, que têm em conta "a dimensão e lotação dos recintos destinados à realização deste tipo de espectáculos”. O que parece confirmar a ausência de uma verificação efectiva destes dados. Apesar disso, o relatório traça um retrato do Portugal tauromáquico. Um país onde, em várias regiões, as touradas assumem “particular relevo ao nível artístico-cultural e na afirmação das respectivas economias locais”, como pode ler-se na nota introdutória do relatório da IGAC, afirmação sustentada no Decreto-Lei n. º 89/2014, que declara a tauromaquia “parte integrante do património da cultura portuguesa”. Um pressuposto que contrasta, contudo, com o facto de o Instituto Nacional de Estatística (INE) ter deixado em 2012 de incluir informações sobre actividades tauromáquicas nas Estatísticas da Cultura, respeitando as alterações feitas nesse sentido, em Setembro desse ano, pelo gabinete de estatística da União Europeia – o Eurostat –, que excluiu esses espectáculos das listas do sector cultural. Sem surpresa, a maioria dos espectáculos tauromáquicos realiza-se no sul do país, com destaque para a Praça de Touros de Albufeira, que em 2017 acolheu 26 corridas (e 25. 199 espectadores), o dobro das realizadas no Campo Pequeno, em Lisboa, que no entanto mobilizaram bem mais assistentes (61. 580). Vila Franca de Xira, Nazaré, Coruche, Moita, Évora, Montijo, Santarém e Alcochete são as outras praças que acolheram mais de 10 mil espectadores, no conjunto dos 181 espectáculos licenciados. Destes, não se realizaram apenas três, dois dos quais – explica o responsável pela IGAC – por decisão da Câmara Municipal de Lourosa, uma vez que se tratava de eventos a realizar “em praças ambulantes” e por essa razão precisavam de autorização autárquica. A IGAC instruiu também durante o ano referido 17 processos de contra-ordenação. Contudo, nenhuma delas teve a ver com a prática de touros de morte. E isto porque “as situações previstas na legislação sobre a excepcionalidade de touros de morte em duas regiões do país não se integram na tipologia de espectáculos tauromáquicos e resultam da observância de um conjunto de requisitos resultantes de legislação especial”, nota Luís Silveira Botelho. As duas localidades citadas serão Barrancos e Monsaraz, que conseguiram um regime legal de excepção invocando a tradição e a história. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. As infracções detectadas pela IGAC disseram então respeito a questões de ordem técnica ou regulamentar, como a violação de normas relativas à publicidade e à localização dos espectadores, e também a realização de corridas sem o devido licenciamento. O relatório da IGAC não contempla dados monetários, num universo em que parece também haver alguma falta de controlo oficial, tanto das bilheteiras como das restantes verbas envolvidas na tauromaquia. Ao Observador, Hélder Milheiro avança, contudo, a estimativa de uma receita bruta de bilheteira superior a 10 milhões de euros.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave morte lei cultura campo social violação
Licenciamento de touradas: municípios rejeitaram descentralização proposta por Costa
Autarquias recusaram a transferência de competências para licenciar espectáculos tauromárquicos por considerar que a temática deve ser encarada e gerida numa perspectiva nacional. (...)

Licenciamento de touradas: municípios rejeitaram descentralização proposta por Costa
MINORIA(S): Animais Pontuação: 18 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-11-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Autarquias recusaram a transferência de competências para licenciar espectáculos tauromárquicos por considerar que a temática deve ser encarada e gerida numa perspectiva nacional.
TEXTO: António Costa tem defendido a transferência para os municípios da competência para autorizar ou recusar a realização de espectáculos taurinos nos seus territórios - fê-lo, inclusivamente, numa carta aberta a Manuel Alegre -, mas a proposta que o Governo fez nesse sentido foi rejeitada pela Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e não vai constar do pacote de descentralização aprovado para os próximos anos. Os municípios alegam que a tauromaquia está sob a alçada da Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC) e que, como tal, deve ser encarada e gerida numa perspectiva nacional. E os municípios com actividade taurina acreditam mesmo que a DGPC vai reconhecer a tauromaquia como parte integrante do Inventário do Património Imaterial português, assegurando assim a sua salvaguarda futura. Certo é que o primeiro-ministro reafirmou, em carta aberta publicada na edição de 11 de Novembro do “PÚBLICO”, que preferiria “conceder a cada município a liberdade de permitir ou não a realização de touradas no seu território à sua pura e simples proibição legal”. Mas António Costa não referiu que, meses antes, a ANMP tinha recusado formalmente essa possibilidade. “Não faz nenhum sentido que sejam os municípios a ter essa discricionariedade, porque a tauromaquia, enquanto património cultural, deve ser tutelada pela Direcção-Geral do Património Cultural, que tem toda a componente de fiscalização e de acompanhamento das actividades culturais. Deve continuar na competência da DGPC, porque uma mudança levar-nos-ia ao livre arbítrio de, em função de qualquer manifestação de gosto de qualquer autarca, poder ser condicionada qualquer actividade tauromáquica”, sublinha Francisco Oliveira, autarca socialista que preside à Câmara de Coruche e à Secção de Municípios com Actividade Taurina (SMAT) – estrutura criada na década de 90 no seio da ANMP, que aglutina 44 dos 308 municípios portugueses. O PÚBLICO quis saber se esta posição da ANMP resultou de uma pressão feita nesse sentido pelas autarquias da SMAT. Francisco Oliveira garante que não e que esta rejeição da proposta de descentralização feita pelo Governo foi da Associação de Municípios no seu todo e não da SMAT em particular. “Não foi aceite, foi retirada a descentralização da competência da tauromaquia, porque pensamos que deve estar nas competências do Governo. É uma posição dos municípios, uma posição da ANMP que traduz a posição dos municípios, que entendem que esta competência deve estar sob alçada da DGPC, até porque pensamos que deve continuar a fazer parte das actividades culturais no seu todo e não deve estar separada sem que haja razões para isso”, acrescenta Francisco Oliveira. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Nesse contexto, o autarca também considera que não deve haver nenhum tipo de “discriminação” da tauromaquia em sede de IVA e que as actividades taurinas devem ter uma taxa reduzida de 6 por cento, tal como as restantes actividades culturais. “A tauromaquia não é uma questão de civilização, faz parte do nosso património cultural desde tempos imemoriais e deve ser preservada”, defende, lembrando que não envolve apenas corridas de toiros, mas está associada a muitas outras facetas desde a confecção dos trajes à equitação, passando pela gastronomia e pela música. A mesma opinião tem Alberto Mesquita, eleito do PS que preside à Câmara de Vila Franca de Xira e integra a direcção da SMAT. “Discordamos frontalmente do que foi mencionado pela senhora ministra da Cultura, que lastimamos, e esperamos que, em sede de especialidade, a proposta de Lei do Orçamento do Estado seja modificada no sentido da redução do IVA aplicável aos espectáculos tauromáquicos, em linha com os demais espectáculos e sem qualquer discriminação”, refere o edil. Mesquita realça ainda que o campo, a criação de toiros de lide e a Festa Brava “são elementos fundamentais da história, da memória e da cultura” do concelho vila-franquense e “merecem a devida preservação e valorização”. “Tudo o que está associado à tauromaquia também tem um grande peso económico e social que não pode ser esquecido. No concelho de Coruche temos oito das 88 ganadarias portuguesas. Isso tem um grande impacto em termos da agro-pecuária. A actividade turística também é essencial, as nossas festas tradicionais atraem muitos milhares de pessoas. Se retirássemos esta componente tauromáquica todos ficaríamos a perder. E as corridas de toiros, a seguir ao futebol, são o espectáculo que junta mais espectadores”, sustenta Francisco Oliveira, salientando que está em preparação uma candidatura da tauromaquia a património imaterial e que projectos de divulgação e preservação da tauromaquia têm sido dos mais votados no Orçamento Participativo Nacional.
REFERÊNCIAS:
Partidos PS LIVRE
Prótoiro quer que Presidente defenda touradas, de que até gosta, de “ataques inconstitucionais”
Federação pediu audiência a Belém. Em 2015, antes da candidatura, Marcelo disse gostar das faenas, até com toiros de morte. Mesmo que não fosse aficionado, o Presidente teria de intervir, diz Prótoiro. (...)

Prótoiro quer que Presidente defenda touradas, de que até gosta, de “ataques inconstitucionais”
MINORIA(S): Animais Pontuação: 18 | Sentimento 0.2
DATA: 2018-11-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Federação pediu audiência a Belém. Em 2015, antes da candidatura, Marcelo disse gostar das faenas, até com toiros de morte. Mesmo que não fosse aficionado, o Presidente teria de intervir, diz Prótoiro.
TEXTO: A Prótoiro-Federação Portuguesa de Tauromaquia pediu uma audiência ao Presidente da República para lhe fazer um ponto da situação sobre “o que se passa pelo país” relativamente “aos ataques inconstitucionais de acesso dos portugueses à cultura”. Vai também pedir a Marcelo Rebelo de Sousa que se pronuncie publicamente sobre “estes ataques enquanto responsável pelo garante da Constituição”. O pedido de audiência em Belém foi enviado a 7 de Novembro e ainda não obteve resposta. “Queremos debater com o Presidente da República o envolvimento de alguns órgãos de Estado na restrição que está a ser feita aos direitos, liberdades e garantias de acesso aos cidadãos à cultura”, neste caso às touradas, afirmou ao PÚBLICO Hélder Milheiro, secretário-geral da Prótoiro. Milheiro diz saber que Marcelo “é um aficionado das touradas” – “foi ele que o revelou publicamente há cerca de três anos” -, mas “o pedido é feito ao Presidente da República, independentemente de ele ser um aficionado ou não”. “Penso que, face aos ataques que têm sido feitos, o Presidente já devia ter vindo a público, ter uma reacção em relação a estes ataques enquanto garante da Constituição”, acrescentou o secretário-geral da Prótoiro. Em Fevereiro de 2015, ainda antes de anunciar a sua candidatura a Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, após participar na Tertúlia do Convento, iniciativa organizada pela Junta de Freguesia de Aveiras de Baixo, em Virtudes, concelho de Azambuja, assumiu-se um aficionado das touradas, nomeadamente dos espectáculos com toiros de morte. “Já assisti diversas vezes a faenas sensacionais que terminaram com a morte do toiro, sobretudo em Espanha, e não me lembro de ter ficado indignado com o facto. Em Portugal há quase uma tradição contra isso desde o tempo do Marquês de Marialva”, afirmou na altura ao jornal O Mirante. Marcelo Rebelo de Sousa considerou mesmo “incompreensível” o facto de “haver pessoas e movimentos que se opõem à realização de touradas em Portugal”. Afirmando que não se via como um “homem das cavernas” ou um “troglodita”, como por vezes são classificados os aficionados pelos activistas antitouradas, o agora chefe de Estado deu o exemplo de Pablo Picasso, que “era um amante de toiros e tinha uma visão de esquerda”, ou do próprio Manuel Alegre, que além de ser político e poeta “é caçador e gosta de touradas”. No início deste mês, a Prótoiro e a Associação de Tertúlias Tauromáquicas de Portugal reclamaram a demissão da ministra da Cultura, considerando que Graça Fonseca “insultou” os milhões de portugueses aficionados ao afirmar no Parlamento que a discriminação da tauromaquia “não é uma questão de gosto, mas de civilização”. Nesta segunda-feira, a ministra da Cultura, Graça Fonseca, afirmou à agência Lusa que olha "com pouca angústia" para a polémica em torno do IVA sobre a tauromaquia e que, enquanto titular da pasta, "não há fragilidade" sobre a matéria. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. "Faz parte da forma como as polémicas se geram hoje em dia nas sociedades modernas. Olho para isso com pouca angústia. Não é um tema que me angustie, na perspectiva de hoje em dia vivermos todos muito das polémicas que duram uma semana, duas semanas, três semanas. Vamos ver. E com isto não estou a desvalorizar a questão nuclear", disse. Para a ministra, a decisão final sobre o assunto cabe agora aos deputados da Assembleia da República. Perante uma divergência destas, garantiu, "o Parlamento será soberano. É o que o Parlamento decidir". "Quem faz serviço público, no meu caso há vinte anos, é assim. Teremos sempre momentos em que há confrontos, ou há - uma palavra que prefiro - diferendo. (. . . ) O papel que o membro do Governo desempenha é procurar encontrar formas de fazer a 'quadratura do círculo'. (. . . ) Não há fragilidade. É a acção que o membro do Governo deve ter", concluiu Graça Fonseca.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave direitos morte cultura homem discriminação
Câmara "chumba" pedido de licenciamento para tourada em Viana
Município invoca falta de condições de segurança do espaço. Prótoiro “regozija-se” com a decisão por assentar numa preocupação mútua. (...)

Câmara "chumba" pedido de licenciamento para tourada em Viana
MINORIA(S): Animais Pontuação: 18 | Sentimento 0.0
DATA: 2013-08-02 | Jornal Público
SUMÁRIO: Município invoca falta de condições de segurança do espaço. Prótoiro “regozija-se” com a decisão por assentar numa preocupação mútua.
TEXTO: A Câmara de Viana do Castelo indeferiu, esta quinta-feira, o pedido de licenciamento apresentado pela Prótoiro para a instalação uma arena amovível, num terreno privado em Darque, invocando falta de condições de segurança e mobilidade no espaço. A decisão foi anunciada pelo presidente José Maria Costa que adiantou ter sido solicitado à federação das associações taurinas a apresentação de um plano de mobilidade, pois a única ligação ao espaço, que "tem uma acessibilidade muito complicada”, é "uma via muito estreita". Na reacção, a federação das associações taurinas felicitou o presidente da Câmara pela “mudança de atitude” e, garantiu que irá apresentar toda a documentação necessária. Com este indeferimento, a edilidade tenta travar a realização da tourada, a segunda realizada pela Protóiro no concelho desde que, em 2009, Viana se declarou, por decisão camarária, Cidade Anti-Touradas. “Indeferimos o licenciamento porque temos muitas dúvidas relativamente às questões de segurança e mobilidade do espaço. Não há lugares para estacionamento, não há lugares para serviços de emergência e temos de garantir as condições de segurança, nomeadamente a rápida acessibilidade de bombeiros e de serviços de emergência médica, se for necessário”, explicou José Maria Costa. De acordo com o autarca no pedido de licenciamento para a instalação da arena amovível com capacidade para 3. 300 pessoas, “não constava qualquer plano de mobilidade” para o local, um terreno privado junto à antiga seca do bacalhau, em Darque, na margem esquerda do rio Lima, cujo acesso não permite o cruzamento de viaturas. A Prótoiro afirmou, em comunicado enviado à imprensa, “partilhar” das preocupações de segurança do autarca socialista que considera serem “um fundamento sensato”. A Prótoiro acrescentou que “é de salutar a mudança de atitude do Presidente da Câmara, que passou de uma posição de hostilidade para uma posição de colaboração ecooperação, tendo apenas pedido à Prótoiro mais documentação sobre o ordenamento do trânsito, para que possa deferir o licenciamento da praça de toiros, pedido esse a que acede de bom grado”. Por se tratar de um indeferimento apenas temporário, a Prótoiro adiantou que, “para já não irá avançar com nenhuma medida judicial. “Assim se mantenha este clima de cooperação entre presidente da câmara e a Prótoiro, em prol do bem público e da saudável relação entre as instituições públicas e as organizações privadas”, sublinhou a organização. A federação das associações taurinas diz ainda que “é de louvar que o Presidente tenha reconhecido que a declaração de Viana como cidade anti-touradas não tem qualquer fundamento ou validade legal, razão pela qual não foi sequer invocada na análise do licenciamento feita pela Câmara Municipal”. A Prótoiro diz também a que “irá continuar a trabalhar com o Movimento de Cidadãos Vianenses pela Liberdade na organização da tourada das Festas da Senhora da Agonia”, anunciada para dia 18 de Agosto. O autarca tinha já classificado esta segunda investida da Prótoiro como uma “provocação”, reafirmando a intenção de “fazer uso de tudo o que estiver ao seu alcance” para tentar impedir a realização de nova corrida no concelho. Em 2012, após um diferendo de duas semanas entre o município e a Prótoiro, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga (TAFB) acabou por viabilizar a tourada numa arena amovível instalada em terrenos da freguesia de Areosa classificados pela autarquia como sendo de “elevado valor paisagístico”. O espectáculo tauromáquico ocorreu a 19 de Agosto, também durante a Romaria da Agonia. Cerca de 2300 espectadores assistiram à corrida que motivou o protesto de cerca de três centenas de pessoas apoiadas por várias associações de defesa dos animais.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave tribunal tourada
Prótoiro garante ter autorização do tribunal para realizar tourada em Viana
Federação das associações taurinas anunciou esta segunda-feira que a decisão da providência cautelar que interpôs lhe é favorável. (...)

Prótoiro garante ter autorização do tribunal para realizar tourada em Viana
MINORIA(S): Animais Pontuação: 18 | Sentimento 0.0
DATA: 2013-08-12 | Jornal Público
SUMÁRIO: Federação das associações taurinas anunciou esta segunda-feira que a decisão da providência cautelar que interpôs lhe é favorável.
TEXTO: A Prótoiro garantiu esta segunda-feira ter recebido luz verde do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga (TAFB) para instalar uma praça amovível, em Darque, para a realização, no domingo, de uma corrida de touros. Esta será a segunda tourada realizada, nos últimos cinco anos em Viana, cidade cuja câmara municipal declarou antitouradas em 2009. Em comunicado enviado à imprensa, a federação das associações taurinas adiantou que, “tal como sucedeu em 2012, o Tribunal Administrativo de Braga voltou a autorizar a instalação de uma praça de toiros em Viana do Castelo, agora na freguesia de Darque, na sequência de uma providência cautelar requerida pela Prótoiro”. Na sexta-feira, a Prótoiro entregou na Câmara Municipal o plano de mobilidade exigido pela autarquia para licenciar a arena amovível, com capacidade para 3300 pessoas, apesar de defender que tal não era necessário. Na altura a federação das associações taurinas afirmou que foi "muito para além" do que era exigido legalmente, ao apresentar este plano de mobilidade. Sa câmara “estiver de boa-fé e cumprir a lei, deferirá o pedido”, conclui então. “A Prótoiro já tinha entregado na Câmara de Viana do Castelo toda a documentação legalmente exigida para o efeito, tendo ido além do legalmente necessário, e entregue ainda um plano de mobilidade e declarações dos bombeiros e da PSP garantindo todas as condições de circulação rodoviária e de segurança do evento”, refere o comunicado. A Câmara de Viana do Castelo tinha indeferido, no início deste mês, o pedido para a instalação da arena amovível alegando falta de condições de segurança e mobilidade no espaço e solicitando à organização um plano de mobilidade. A federação das associações taurinas diz ter sido “obrigada” a avançar para tribunal “de modo a garantir os direitos e liberdades do povo de Viana”, uma vez que “o presidente José Maria Costa já tinha afirmado que iria tentar inviabilizar a tourada por todos os meios. Sabendo "que o presidente José Maria Costa não estava de boa-fé neste processo e que iria atropelar todas as leis para, de uma forma maldosa, limitar a liberdade dos vianenses”, não esperaram pela decisão da autarquia. Com esta decisão do tribunal, adianta ainda a Prótoiro na nota enviada à imprensa, “o presidente José Maria Costa volta a ser obrigado a cumprir a lei e, pelo segundo ano consecutivo, volta a passar pela vergonha de ver as suas práticas autoritárias serem corrigidas pelo tribunal, dando uma péssima imagem da cidade de Viana e das suas gentes”. Para a Prótoiro, “com esta decisão judicial, fica definitivamente garantida a realização da 'tourada da Liberdade'”, no dia 18 de Agosto, às 17h, num terreno privado junto à antiga seca do bacalhau, em Darque, na margem esquerda do rio Lima. A Prótoiro diz que vai disponibilizar "cerca de 540 lugares de estacionamento num terreno privado a menos de 100 metros do local do evento, sendo que na zona envolvente estarão disponíveis mais cerca de 250 lugares", garante. A PSP de Viana do Castelo já analisou o local da tourada, acrescenta ainda a organização, tendo definido um "plano de segurança para o evento" e manifestado a "total disponibilidade para, nos termos da lei, assegurar a manutenção da ordem pública", que acresce à segurança privada que também será garantida. Após medições técnicas na rua de acesso aos terrenos onde deverá acontecer a corrida de touros, a Prótoiro concluiu ainda que se trata de uma via rodoviária por "onde passam menos de dois carros por minuto”. “Não haverá, portanto, qualquer problema com a circulação rodoviária, sendo que o plano de mobilidade que apresentamos aborda criteriosamente essa questão e a PSP de Viana do Castelo também já se disponibilizou para proceder ao ordenamento do tráfego", garante a Prótoiro. Que acrescenta que também os bombeiros vão prestar assistência durante o evento, “fazendo deslocar para o local meios humanos e materiais que assegurarão todas as necessidades relativas a assistência médica”, lê-se. Em conclusão, garante a federação, estão “reunidas todas as condições de estacionamento, circulação rodoviária e serviços de emergência antes, durante e após” a tourada, a qual será “uma grande e verdadeira festa em defesa da liberdade". Em 2012, após um diferendo de duas semanas entre o município e a Prótoiro, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga acabou por viabilizar a tourada numa arena amovível instalada em terrenos da freguesia de Areosa, classificados pela autarquia como sendo de “elevado valor paisagístico”. O espectáculo tauromáquico ocorreu a 19 de Agosto, também durante a Romaria da Agonia. Cerca de 2300 espectadores assistiram à corrida que motivou o protesto de cerca de três centenas de manifestantes, apoiados por várias associações de defesa dos animais.
REFERÊNCIAS:
Entidades PSP
Autarca de Viana ainda acredita que pode travar tourada junto do tribunal
Município deduziu oposição ao decretamento provisório da providência cautelar pedida pela Prótoiro. E voltou a indeferir o licenciamento da instalação da arena, que já está a ser montada. (...)

Autarca de Viana ainda acredita que pode travar tourada junto do tribunal
MINORIA(S): Animais Pontuação: 18 | Sentimento 0.0
DATA: 2013-08-14 | Jornal Público
SUMÁRIO: Município deduziu oposição ao decretamento provisório da providência cautelar pedida pela Prótoiro. E voltou a indeferir o licenciamento da instalação da arena, que já está a ser montada.
TEXTO: A Câmara de Viana do Castelo deduziu nesta terça-feira oposição ao decretamento provisório da providência cautelar pedida pela Prótoiro ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga (TAFB) e que permite, para já, a esta federação realizar uma tourada na freguesia de Darque, no próximo domingo. Entre outros argumentos, o município apontou a “ausência de condições de segurança” no local escolhido este ano pela Prótoiro-Federação das Associações Taurinas para o evento, um terreno privado junto à antiga seca do bacalhau na margem esquerda do rio Lima. Em paralelo, a autarquia liderada por José Maria Costa voltou a indeferiu o licenciamento da instalação de uma arena amovível, alegando que o plano de mobilidade, apresentado na sexta-feira pela Prótoiro veio até confirmar a sua convicção de que o local não é “o mais adequado” para acolher o evento. Em declarações ao PÚBLICO, José Maria Costa sublinhou que a empresa contratada pela Prótoiro para elaborar o plano de mobilidade que a câmara lhe exigiu “reconhece que há um sítio de circulação que não permite o trânsito nos dois sentidos - não permite o cruzamento de duas viaturas, como o PÚBLICO confirmou no local – e que “a Prótoiro pede para que o trânsito seja interrompido durante seis horas para a realização deste evento”. O autarca diz tratar-se de uma pretensão “inaceitável”, por implicar, durante seis horas, o encerramento de uma estrada que serve 200 habitações. “Como principal responsável pela protecção civil, não posso deixar que haja uma zona da freguesia de Darque que fique sem qualquer tipo de trânsito durante seis horas. Se houver um acidente, um incêndio ou uma situação de força maior, as pessoas ficam desprovidas de socorro. Ficaríamos com uma parte significativa de Darque sitiada, o que, do ponto de vista da técnico e de segurança, é inaceitável”, sustentou. O autarca adiantou que informou também o TAFB de que o município não assumirá "qualquer responsabilidade", no caso de esta situação ser permitida pelo tribunal. “A própria empresa que produziu o estudo de tráfego reconhece a necessidade de implementação de muitas medidas mitigadoras, de muitas alterações ao trânsito e da própria interdição da via, o que não podemos aceitar, porque estaríamos a violar regras de segurança básicas e não estamos disponíveis para correr esses riscos”, argumenta ainda o autarca. José Maria Costa rejeitou a ideia de que o TAFB já não possa apreciar em tempo útil a oposição da autarquia ao decretamento provisório da providência cautelar pedida pela Prótoiro, alegando que este é um processo com especial urgência e que o tribunal ainda poderá analisar a argumentação da câmara até sexta-feira. No entanto, o mais certo é o TAFB notificar a Prótoiro para se pronunciar sobre os novos argumentos aduzidos pela autarquia, nos termos da lei que dá à federação cinco dias para o fazer. . . Apesar do novo indeferimento do licenciamento do recinto, a arena amovível com capacidade para acolher 3300 pessoas começou a ser montada nesta terça-feira, graças ao decretamento provisório da providência cautelar concedido peloTAFB à Prótoiro. A operação deverá ficar concluída nesta quarta-feira. A denominada “Corrida pela Liberdade” está marcada para as 17h de domingo, o dia forte da Romaria d’Agonia. O director executivo da Prótoiro, Diogo Monteiro, garantiu ao PÚBLICO, durante a montagem da arena, que vai ser “uma grande festa, uma celebração popular da diversidade e da liberdade”. Manifestação e festival de músicaDo outro lado da barricada, os movimento antitouradas prometem ripostar. Já está anunciado, para o mesmo dia, um festival de música, com o lema “Porque Viana é Amor, nunca tortura nem dor”, na zona envolvente da desactivada praça de touros da cidade. O festival “Viana ManiFesta Amor”, organizado do movimento Viana Antitouradas, acontecerá às 20h, após uma manifestação pacífica que o grupo irá promover no local e à hora da tourada, tal como aconteceu em 2012. Despacho da Lusa substituído por notícia própria
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave lei tribunal estudo tourada
Touros fugitivos de Viana: um está em parte incerta, outro está feito ao bife
Em Oliveira do Bairro, a SOS Equinos continua sem rasto do "Marreta", que voltou a fugir em Julho. Em Viana, o "Espertalhão" já foi abatido, para venda num talho do concelho. (...)

Touros fugitivos de Viana: um está em parte incerta, outro está feito ao bife
MINORIA(S): Animais Pontuação: 18 | Sentimento 0.0
DATA: 2013-09-17 | Jornal Público
SUMÁRIO: Em Oliveira do Bairro, a SOS Equinos continua sem rasto do "Marreta", que voltou a fugir em Julho. Em Viana, o "Espertalhão" já foi abatido, para venda num talho do concelho.
TEXTO: Os dois touros que em Maio fugiram de uma quinta de Perre, Viana do Castelo, quando estavam a ser encaminhados para o camião com destino ao matadouro, cedo se separaram para protagonizarem cada um a sua saga, com desfechos diferentes. Aliás, ainda se desconhece o epílogo da história de um deles. A associação SOS Equinos, sedeada na Palhaça, Oliveira do Bairro, que adquiriu o touro “Marreta” com dinheiro de uma campanha lançada nas redes sociais para evitar que o bicho fosse parar ao matadouro, continua sem rasto do bovino que, em Julho, voltou a fugir do recinto onde era suposto acabar os seus dias, praticamente em liberdade. Apesar das buscas realizadas, na qual até têm participado praticantes de parapente, a associação ainda não conseguiu detectar o touro de raça galega com mais de 500 quilos. João Paulo Jacinto, dirigente da SOS Equinos, promete não irá desistir de procurar o animal que foi avistado pela última vez numa zona de vegetação densa. Entretanto, com a abertura da época de caça, a associação lançou o apelo aos caçadores das redondezas para avisarem, se avistarem o touro. Menos sorte teve o “Espertalhão”, assim baptizado por Manuel Farinhoto, o agricultor de 66 anos de cuja exploração agrícola os dois touros fugiram, pela primeira vez, em Maio passado. Este bovino foi encontrado e capturado no final de Agosto, tendo sido conduzido no domingo ao matadouro. E foi por pouco que não voltou a fugir. Manuel Farinhoto conta que apanhou um “susto enorme” que apanhou quando o animal “rebentou uma das três cordas que tinha presa aos cifres”. “Éramos seis e, mesmo assim, vi o caso mal parado. Estava com muito receio que alguém se magoasse. O animal estava com muita força e era muito teimoso”, explicou. Criador de gado durante mais de 50 anos, Manuel Farinhoto vendeu o “Espertalhão” a quatro euros o quilo. A fuga que permitiu ao touro passar três meses e meio em liberdade pelos montes de Viana do Castelo também o fez perder peso. Apesar da engorda das últimas semanas, a balança do matadouro só atribuiu 280 quilos ao "Espertalhão". “Ainda assim não se perdeu tudo”, comentou o agricultor que ainda antes da fuga protagonizada pelos dois animais já tinha decidido acabar com a criação de gado e dedicar-se à produção de vinho.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave animal raça touro
Sete mil quilómetros com um cão na bagageira
De Bruxelas a Lisboa, ida e volta, com escalas em Itália, França e Espanha. Um casal, o seu filho de 15 anos e Luna, um cão de água português que só este Verão descobriu o prazer do mar. Foram várias as limitações e muitos os trabalhos, houve momentos hilariantes e duas visitas ao veterinário, mas a coisa fez-se sem grandes sobressaltos. (...)

Sete mil quilómetros com um cão na bagageira
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Migrantes Pontuação: 6 Animais Pontuação: 17 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-10-26 | Jornal Público
SUMÁRIO: De Bruxelas a Lisboa, ida e volta, com escalas em Itália, França e Espanha. Um casal, o seu filho de 15 anos e Luna, um cão de água português que só este Verão descobriu o prazer do mar. Foram várias as limitações e muitos os trabalhos, houve momentos hilariantes e duas visitas ao veterinário, mas a coisa fez-se sem grandes sobressaltos.
TEXTO: Luna, um ilustre mas trapalhão exemplar de cão de água português com medo da água até chegar a este Verão, entrou muda e quase saiu calada de uma viagem de automóvel de sete mil quilómetros. No entanto, a sua presença foi um divertimento constante e foi graças ao seu encontro em Pula, Sul da Sardenha, com Lina, uma pachorrenta setter inglesa, que soube que a melhor sardinha da linha de Cascais se come na Rebelva. Soube depois, à chegada a Lisboa, que Portugal não é lá muito amigo dos animais. “C’est la cátá”, (é uma catástrofe), disse-me uma francesa no Jardim da Estrela, em Lisboa, ao comentar as dificuldades levantadas para encontrar alojamento e restaurantes que aceitem cães. Bélgica, França, Itália e Espanha são mais amigas dos animais, mas, valha a verdade, nós, fiéis aos nossos brandos costumes, fechamos os olhos a legislação mais restritiva, embora tenhamos muita dificuldade em alterar mentalidades. A viagem, que começou e irá acabar em Bruxelas, teve pernoitas em Estrasburgo, Cagliari, Barcelona, Ávila, Palencia, Bayonne e Orléans e estadias na Sardenha, Batalha, Casa Branca (Alentejo) e Lisboa. “So far, so good”. Até agora, calcorreados 6600kms, tudo bem, salvo duas idas a diferentes veterinários e alguns outros contratempos próprios de uma viagem tão longa. É necessária paciência e jurisprudência numa matéria tão delicada como é a relação entre o homem e o seu melhor amigo e como é a relação deste com a sociedade humana em que vive. Para quem nunca teve um cão e sempre resistiu a tê-lo, andar estrada fora com um bicho que permanentemente nos interpela com o seu olhar é uma experiência de vida gratificante, surpreendente e hilariante. Gratificante porque nos consola a sua presença, surpreendente porque traz o rebuliço à rotina, hilariante porque origina situações muito divertidas, como aquela em que quase levou consigo a mesa da esplanada onde estava atada, quando resolveu ir atrás de um cão todo bem-parecido. Também deitou ao chão o fotógrafo deste jornal quando ele, de cócoras, lhe acenava com o seu frisbee numa mão e, com a outra, procurava tirar um bom boneco. A Luna não resistiu e saltou para cima dele. Outro dia, resolveu sacudir-se a meio da noite e bateu com a cauda com tanta força na porta do quarto que eu acordei assustado a pensar que me estavam a assaltar a casa. Fiquei a saber que os cães também sentem as costas quentes. Em Agodim, norte de Leiria, observava a cautelosa distância um gato a comer a sua refeição. Quando me aproximei, levantou-se e foi reivindicar as suas massas. Luna, que fez dois anos no passado dia 31, é o primeiro cão da família e estas foram as primeiras férias em conjunto. Foram várias as limitações e as alegrias e muitos os trabalhos, nomeadamente os de cozinha, tanto mais que a cachorra tem a mania que é gente e deixa para amanhã a ração de hoje sempre à espera da “comida normal” — massa, arroz ou batata com peixe, carne e verdura de linha branca congelados e fruta, que vai comendo depois de alguma insistência. Como anda sempre com fome, come tudo o que lhe vem à boca dos passeios por onde anda, mas essa é uma ingestão que já deixou de nos preocupar porque quem come algas e ossos roídos por outros cães não deve ser lá muito boa da cabeça e há que aceitá-la como tal. Até comeu uma bola de algas secas, não sei que carga de sabor possa ter uma bola cheia de areia. E foi por causa disso, da areia às voltas no estômago, que teve de ir ao segundo veterinário para estancar uma diarreia. Curou-a num dia com a recomendação de lhe darmos “polenta” (farinha de milho) para “agarrar” a areia e de que nunca nos devemos esquecer que um cão é um animal carnívoro e por isso é natural que não goste das rações granuladas. Foi o que ela quis ouvir, pareceu-nos. Já antes tinha desistido da ração matinal e só jantava comida de gente, que ela pede ladrando em seco ou mordiscando as mãos de quem lhe parece estar a preparar a sua refeição. A decisão de ir de carro ficou a dever-se à impraticabilidade de uma viagem de avião, por implicar escalas. Já o voo em si é muito complicado para um cão que tem de ir no porão, quanto mais com escalas onde tudo pode acontecer, nomeadamente a perda. No ano passado, num voo de Lisboa para Bruxelas, a Luna ficou perdida durante duas horas no aeroporto de chegada e foi uma aflição. Noutra viagem, foi muito triste vê-la cambalear sob o efeito de um soporífero administrado antes de se saber que o voo tinha um atraso de mais de uma hora. Para uma viagem de automóvel, um cão tem de levar a sua “mala” com passaporte europeu, comida, brinquedos, saquinhos higiénicos, medicamentos, especialmente gotas para as suas conjuntivites e contra as carraças, água, etc. Tem de parar de duas em duas ou de três em três horas para esticar as pernas, comer qualquer coisa e aliviar-se. É bom viajar de carro sem destinos ou pernoitas certas, mas a presença de um cão obriga a uma logística mais cuidada, muito embora a maioria dos hotéis de estrada, à excepção de Portugal, aceitem animais de estimação. O primeiro estirão de 1200kms levou-nos de Bruxelas, com pernoita em Estrasburgo, a uma chegada de afogadilho a Livorno, Noroeste de Itália. Daqui, um ferry (que transportava naquela travessia de sete horas cerca de 700 veículos e à volta de 2000 passageiros) zarpou pouco depois da meia-noite para Olbia, a nordeste da Sardenha, ilha onde desembarcámos rumo a uma praia selvagem, perto da beleza de Chia, que no ano passado foi considerada a melhor praia de Itália, talvez também por causa da laguna adjacente povoada por flamingos vermelhos. As melgas não contaram para a classificação. Foi uma viagem de menos de 300kms pelo interior da ilha que incluiu uma passagem por Cagliari, a capital, a sudoeste. A cachorra viajou na bagageira de uma carrinha, numa cabine de um ferry e, clandestina, noutra cabine, noutro ferry. O mundo dos ferries mediterrânicos é um microcosmo navegante de pressas, vagares e vaidades próprias da natureza humana em férias. Pressas nos trajectos nocturnos quando os passageiros mais conhecedores ocupam rapidamente os corredores, estendem os seus colchões insufláveis e se deixam dormir durante as sete horas que dura a travessia entre os rumores passageiros dos embarcados. Vagares, nas travessias de dia (Porto Torres-Barcelona, 12 horas) onde o ambiente é de cruzeiro de luxo de trazer por casa. Os cães terão de ir no canil em jaulas individuais, uma regra que não é cumprida à risca. Na viagem nocturna, a Moby Lines dispõe de cabines onde os cães podem dormir junto dos donos. Como oferta do barco ao cliente de estimação, um pequeno lençol absorvente, uns biscoitos e um recipiente de plástico para a água. Na ida para Barcelona com a Grimaldi, a Luna viajou clandestina numa cabine porque nenhum de nós, especialmente o seu dono, o meu filho Tomás, de 15 anos, quis vê-la presa numa jaula. Lá estavam um belíssimo braque húngaro, um ternurento golden retriever e um jovem pastor alemão acachapados, tristes, de olhar suplicante e choramingando. Montada a vigilância nos dois extremos do corredor de acesso às cabines, lá foi ela meio escondida em direcção à nossa cabine. No último deck, o do canil, onde os cães podem ser passeados à brisa marítima, alguns caniches faziam companhia às suas donas refasteladas nas espreguiçadeiras à volta da piscina, ladrando a quem da sua espécie passava. Foi na ida para os carros antes do desembarque que vimos outros cães fora-de-lei, vindos de outras cabines, entre eles um belíssimo galgo de uma tímida altivez e coleira que devia ser o último grito da moda canina italiana. Vou escrevendo este texto às vezes com a Luna quase a pôr as patas em cima do teclado e a esfregar-me nas mãos a sua bola de feltro, outras vezes a empurrar-me com o focinho os cotovelos para cima (sinal de que quer comer ou ir à rua), outras, ainda, deitada sobre os meus pés sem que necessitem de serem aquecidos. Estamos em pleno Verão, em férias, mas os animais, como as pessoas, necessitam de estar perto de alguém que compreenda a sua fragilidade e dependência. E eu compreendo-a muito bem, agora que a vi nadar atabalhoadamente. Um cão de água português, como ela é, deve, por definição, saber nadar e não ter medo da água. Mas a Luna foi até agora a vergonha da espécie e da raça, pois fugia da água como gato escaldado. Foi o rebentar das ondas na praia da Caparica, perto de Lisboa, que a traumatizou desde a infância, penso eu. Aquelas sucessivas massas de água vociferando espumas e estrondos devem ter-lhe parecido monstros ameaçadores de fazer meter o rabo entre as pernas, o que ela, aliás, fazia muito à-vontade e sem qualquer espécie de cerimónia. Um ano depois, na mansidão marítima de uma praia selvagem, em Perdalonga, no Sul da Sardenha, vê-la entrar imediata e determinadamente na água deixou-me feliz, por ela e por mim. Para nos alojarmos aqui, um local com vista para a praia de Tuerreda, a mais fotografada da Sardenha, tive de passar por cego! Excluída a hipótese do voo, tratámos da logística terrestre mas esquecemo-nos de um pormenor: perguntar ao nosso amigo Aldo, que nos tinha reservado a casa, se era permitida a presença de um cão. Perante a negativa e a perspectiva de férias estragadas, o Aldo disse que ia encontrar uma alternativa. No dia seguinte, numa solução alla italiana, disse que o Miguel (eu) teria de passar por cego porque assim poderia justificar ao proprietário a presença de um cão em sua casa. Dada a irrequietude e desatenção congénitas, a Luna nunca passaria por um cão-guia, mas isso o proprietário da casa não precisava de saber. Os caprichos marinhos do Inverno passado fizeram desaparecer a pequena e rochosa praia de Sa Pinnetta que serve o aldeamento, pelo que tínhamos de percorrer durante vinte minutos um trilho de cabras para chegar a um recanto arenoso e desértico. A cachorra farejava sempre o ar num desassossego próprio de quem não está habituada aos inconfundíveis cheiros da macchia mediterrânica (vegetação baixa arbustiva), apimentados pelas marcas de território de javalis, raposas, cabras, coelhos, sapos, lagartixas e, quem sabe, um ou outro veado que resolvesse descer das montanhas um pouco mais a norte. Entrou na água com o afoito e a inconsciência dos jovens que reagem instintivamente. Estava surpreendida com um meio que lhe está no sangue mas que desconhecia, principalmente quando ficava sem pé, aliás, sem patas. Comparada com outros pequenitotes que mais tarde nadaram a seu lado cumprindo as boas regras da natação canídea, a Luna parecia uma trolha prestes a afogar-se — as patas dianteiras fora de água num chapinhar desesperado à procura de fundo que a sustentasse, o pescoço tão esticado quanto possível, a respiração resfolegante. Aos poucos, de cada vez que lhe atirávamos a sua bola de estimação ou um pau, lá ia, insegura, sem nunca se afastar muito. Se a bola era atirada para mais longe, hesitava um bom minuto antes de se lançar à água e depressa aprendeu que podia apoiar-se nas rochas com as patas dianteiras e pensar duas ou três vezes se havia de regressar ao conforto do areal ou ir buscar a bola, apesar de todo o seu desconforto. De regresso à Caparica durante a recente onda de calor, entrou resolutamente na água, demorou a adaptar-se às ondinhas da maré baixa, não se atrevia a perder pé durante muito tempo, ficando com evidente pena de não recuperar o seu frisbee. Não sei se as suas correrias desenfreadas pela faixa de areia, se o modo como afocinhava, fazia covas, se sacudia ou se espojava era a expressão da sua alegria ou a necessidade de sentir na pele a terra que antes lhe tinha faltado. Sei que, por vezes, se ajoelhava, empertigava as patas traseiras o máximo possível, abanava a cauda alegremente e saltava em direcção ao seu dono. “Não, Luna, não!”. Qual quê!, lá estão os dois embrulhados às voltas na areia e ele a atirar-lhe a bola para longe, para ganhar tempo e ver-se livre dela. Foi assim que ele perdeu uma havaiana que ela queria apanhar. Num desses dias, uma farpa de um centímetro entrou-lhe na pata direita dianteira durante o trajecto pelo trilho que conduz à praia. Andou coxa e murcha durante dois dias e eu dei comigo a falar com ela como quem fala com um bebé — “tadinha da cachorra, tá ‘noente’”. Lambia a ferida incessantemente, alargando-a, ingerindo a contragosto a solução de Betadine que lhe era aplicada regularmente. Uma observação mais atenta não permitiu ver o pico, mas apenas constatar que a ferida se localizava na membrana interdigital que distingue o cão de água português das outras raças. É esta membrana que permite à raça uma natação ágil, mesmo debaixo de água. Dava muita pena vê-la coxear e quase não poder andar e dar os seus passeios higiénicos. Toda a gente a mimou muito porque tinha perdido a sua proverbial alegria, mas não a curiosidade, outra característica da raça. Esta é uma característica que por vezes causa embaraços. Vê-la olhar fixamente para quem vem atrás de nós ou estar atentíssima e quieta a olhar para um homem na praia em posição de ioga é muito divertido, mas temos sempre de apresentar um “desculpe, ela é assim, muito curiosa”. É muito divertido vê-la ladrar para uma boca de incêndio vermelha numa paisagem verde ou olhar pasmada para algo, nem que seja uma folha que mexe numa tarde de calmaria. Tem especial curiosidade por sacos de plástico a voarem. Dois dias depois parecia que estava a adivinhar ao que ia, o que é uma extraordinária prova da sua intuição. Contrariamente ao que é seu hábito, o de uma maria-vai-com-todos e a todo-o-lado sem nunca perder a sua timidez, não quis entrar num edifício, muito menos no consultório. Finalmente, ao fim de umas rosnadelas de protesto, tentativas de mordidelas, um açaime e uns ganidos suplicantes, o veterinário conseguiu injectar-lhe uma anestesia local, fazer-lhe uma incisão, extrair o pico, sugar com uma cânula o pus acumulado, dar-lhe uma injecção com um anti-inflamatório e receitar-lhe um antibiótico de 12 em 12 horas, que tomou sem grande convicção durante sete dias. Nada de mar durante três dias e teve de andar de meia para não arranjar mais complicações. Dormitou e lambeu a ferida nas cinco horas seguintes e depois, com vontade, mas ainda sem forças, foi buscar a corda entrelaçada para alguém brincar com ela. No dia seguinte, com a meia atada na pata ferida com um elástico de cabelo, voltou à praia e aos folguedos. Como dizem todos os donos de cães, aos seus animais só lhes falta falar de tão inteligentes que são. A Luna é muito inteligente, disso não restam dúvidas, mas sofre de défice de atenção. No fundo, é uma despassarada, uma assustadiça mariquinhas-pé-de-salsa e uma metediça a quem nem sequer falta o seu dengoso andar (outra característica da raça) e também dengoso abanar de cauda quando reencontra os seus donos no dia seguinte ou após uma ausência. É uma alegria enorme, uma efusão de companheirismo traduzida pelo brinquedo abocanhado com a evidente intenção de dar ao dono aquilo que ela quer — um bom tempo de brincadeira que a retire da sua pachorrenta rotina de andar a dormitar pela casa à espera que alguém seu conhecido lhe preste atenção, brinque com ela, dê mimos e alimente. Dizem os veterinários que devemos ignorar os cães quando chegamos a casa para eles não ficarem ansiosos durante as nossas ausências, mas quem é que é que lhes consegue negar uma alegria tão grande? Investigações de universidades americanas concluem que os cães apresentam até seis expressões faciais conforme os estímulos, mas eu só consigo identificar o seu olhar pingão de cada vez que saio de casa e não a levo. Quando a vejo a abanar a cauda, lembro-me da história ancestral do cão de água português, que esteve à beira da extinção, foi animal de trabalho dos pescadores algarvios nos finais do século XIX, princípios do século XX, e chegou a estrela global quando o ex-presidente Obama ofereceu um às suas filhas. Lembro-me do geneticista russo Dmitri Belyaev, refugiado na Sibéria, que se dedicou à produção de peles de raposa e que provou o milenar processo de domesticação da espécie. Após cerca de 60 gerações de criação, algumas das suas raposas, as mais sociáveis que foram sendo cruzadas entre si, começavam a evidenciar diversas características dos cães, nomeadamente abanar a cauda, levar brinquedos na boca e ladrar. Então como estás? Cheira-me e logo verás! Quando a Luna chegou à fala, aliás, ao cheiro, com a Lina, uma pachorrenta setter inglesa, os donos, ouvindo-nos a falar português, também meteram conversa connosco num português italianizado. Rosa Carlucci e Marco Possanzi estavam a afogar mágoas no Cuccina Macri, o único restaurante gastronómico de Pula, chorando o regresso há dois dias à Sardenha depois de três anos em Lisboa, onde ele trabalhou como médico radiologista oncologista na Fundação Champalimaud. Foi graças a eles que ficámos a saber que é na Casa do Mar, Rebelva, arredores de Lisboa, que se comem as melhores sardinhas da linha de Cascais. “É duro. Temos muitas saudades”, disse-me a Rosa ao telefone há poucos dias. A presença de um cão facilita muito o convívio humano. Os cães necessitam de brincar e socializar como de osso para a boca e os donos aproveitam a oportunidade para falarem uns com os outros, o que não aconteceria se não houvesse um cão como intermediário de estimação. No dia em que a Luna foi esterilizada, aos oito meses, ao chegar a casa tinha pendurado na porta da nossa casa em Bruxelas um saquinho com biscoitos caninos home made oferecidos pelo seu vizinho Charlie, um dachshund (vulgo salsicha) que tem por dono um jovem casal de bailarinos, ela de Singapura, ele de um país báltico. Num destes dias, no Jardim da Estrela, em Lisboa, estive meia hora à conversa com uma jovem estudante brasileira de Belas Artes, uma senhora americana, outra australiana e outra portuguesa. Na manhã em que quatro cães de água se juntaram, a dona de dois deles, proprietária de uma editora, convidou-me para escrevermos um livro sobre o cão de água português. Como o meu filho já teve de apresentar um trabalho escolar sobre a evolução do cão, estou a pensar em roubar-lho. Trocámos mails. Em Bayonne, perto da fronteira franco-espanhola, foi graças a ela que conheci um engenheiro inglês, nascido em Alexandria, Egipto, onde estive em reportagem há vários anos, e a viver em Knowle, centro de Inglaterra. Ambos conhecíamos o restaurante onde eu jantei com uma família conservadora na véspera das eleições que levaram Tony Blair ao poder, também em reportagem, ambas para o jornal Expresso. Trocámos telefones depois de uma boa hora de conversa. Foi graças à Luna que, em Orléans, 130kms a sul de Paris (e de onde envio este texto), fiquei a saber que um casal inglês na casa dos sessenta, que ia fazer uma semana de bicicleta pelo Vale do Loire, tinha vivido em Bruxelas, não muito longe de mim. Passámos o jantar a falar sobre o “Brexit”. Nunca nos teríamos conhecido se não fosse a brincadeira dos nossos cães. Há uma solidariedade e cumplicidade especiais entre os respectivos donos, que eventualmente se vão tornando amigos com o tempo. Já demos connosco, na família, a chamar de tudo à Luna sem ela se importar, por isso é que é nossa amiga. Sua porca badalhoca, sua doida, sua louca varrida, passando mais docemente por sua doida felpuda, sua farfalhuda, sua coisa mais fofa e outros nomes carinhosos. Pessoalmente gosto de a tratar por Cachorra Luna, enquanto lhe faço festas na barriga. Todos nós, num momento ou noutro do dia, nos sentamos no chão, a aconchegamos entre as nossas pernas, a viramos de patas para o ar e lhe coçamos suavemente a barriga. Não há melhor ansiolítico, tanto para nós como para ela, especialmente quando adormece refastelada e consolada com a sua vida de cão. Não me venhas cá com coisas que não levas nada! Quando se arma em esperta, se porta mal ou não obedece a ordens básicas leva uns bons raspanetes, mas faz de conta que não é nada com ela. Vira para o lado o focinho quando vê um dedo indicador em riste, evita o olhar e os donos têm de se render à evidência de que ela levará a melhor na maior parte dos casos. A sua esperteza advém das suas necessidades afectivas e alimentares. Gosta de festas e festinhas, quem é que não gosta? Gosta de sopas e petiscos, quem é que não gosta? Um exemplo: ela sabe que não se pode aproximar da mesa enquanto duram as refeições e tem de ficar a razoável distância. Deita-se, mas, mal nos apanha distraídos, vai rastejando pata ante pata em direcção à mesa. Para trás, já te disse! Levanta-se, dá meia-volta, recua uns passos, deita-se e volta a rastejar pata ante pata. O cão é o melhor amigo do homem e foi num desses silêncios contemplativos que as praias desertas facilitam que compreendi porquê. Claro, um cão não é uma pessoa, mas é um grande amigo que ouve tudo, não diz nada e tem a grande vantagem de ser um crucial elemento pacificador quando as tensões domésticas sobem. Sabemos por experiência humana feita que o nosso melhor amigo é o nosso melhor ouvinte porque não interrompe o nosso desabafo. Por isso é natural que o cão seja o melhor amigo do homem porque passa a vida a ouvir o que os seus donos lhe dizem e não diz nada. Em vez de dizer que sim com a cabeça, abana a cauda, o que é uma compreensiva diferença gestual que desempenha a mesma função, a do interlocutor silencioso. Álvaro de Campos escrevia que todas as cartas de amor são ridículas e eu sinto-me um pouco ridículo a falar de um cão com uma pieguice da qual não me julguei capaz. No entanto, devo confessar que, após uma noite mal dormida, um dia mal passado, um problema por resolver, um imposto por pagar, chegar a casa e ver um bicho aos pulos de contente, deixo as preocupações para trás e não tenho outro remédio senão o de o abraçar e fazer-lhe festas porque é ele que me cura das maleitas quotidianas. Nem quero pensar no aperto de coração que sentimos quando ela desapareceu em Bruxelas durante três horas. Reencontrei-a no Parc du Cinquantenaire, onde costuma passear, mais aflita do que eu. Durante três ou quatro dias não queria sair de casa, tal o susto. Felizmente, o seu dono estava na escola. A última etapa da viagem (Lisboa-Bruxelas, 2000kms) será feita apenas com a Luna na mala da carrinha. O meu filho regressou mais cedo de avião a Bruxelas na companhia da mãe, o que me deixou mais espaço no carro para levar os bons recuerdos portugueses — azeite, vinhos, sal marinho, conservas, açorianas e da Murtosa, de preferência, e o que mais for na boa e velha tradição do emigrante português, que nunca julguei ser. No fundo, não passo de um emigrante, mas talvez por ser jornalista consideram-me um expat, um expatriado. É uma diferença de estatuto social. No entanto, fiquei reduzido à minha real condição ao fazer a A10 francesa com o carro cheio de embrulhos e caixas e a olhar para os milhares de emigrantes do Norte de África, de Portugal e Espanha que regressam de férias no último dia de Agosto, também com os carros atafulhados. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Viajar com um cão implica logísticas e precauções redobradas. Os emigrantes tradicionais fazem esta viagem sem parar para dormir ou dormitam uma ou duas horas nos carros em estações de serviço. Uma senhora francesa no Jardim da Estrela disse-me que o hotel Europa, em Vitoria-Gasteiz, perto da fronteira franco-espanhola, aceita cães, mas penso que, mesmo assim, não irei tão longe. Fiz Lisboa-Palencia no primeiro dia, não sei, tenho de ir com calma e parar várias vezes. Aí, encontrei-me numa bomba de gasolina com “um grupo excursionista” da família da minha companheira que vai ao casamento da filha. A segunda pernoita foi passada em Bayonne num Formule 1, os mais baratos de todos os hotéis de estrada com casas-de-banho comuns. Como temos de pagar a toalha porque o hotel não a disponibiliza, eu, por uma questão de princípio, tive de me limpar à toalha de praia porque me esqueci de trazer uma e também do pijama, devo confessar. A terceira paragem foi em Orléans, 130kms a sul de Paris, e depois é um pulo de 400kms até Bruxelas, com a complicação que Paris sempre apresenta aos automobilistas. Já tenho as refeições da Luna no congelador para as levar nas mochilas isotérmicas em embalagens de alumínio, não me posso esquecer da água, muita água, e esperar que não haja os engarrafamentos monstruosos que o regresso maciço de férias muitas vezes origina. No dois dias finais a Luna quase não comeu, ou porque as refeições tinha azedado ou porque as enjoou. Nem sequer tocou na ração, que vinha como reserva alimentar. Comeu uns restos de baguete que ia roubando ao pequeno-almoço. Terei que ter cuidado nas estações de serviço por causa dos roubos, não poderei usar o comando das portas porque pode haver alguém a gravar as ondas hertzianas e a abrir o carro sem outros danos, terei de ser rápido a ir à casa-de-banho e tenho de passear a Luna sempre com o carro à vista, mas estas são precauções habituais de quem anda na estrada. Não me sentirei sozinho. Afinal de contas, viajarei com a minha melhor amiga e vou falar pelos cotovelos para não adormecer ao volante. Já viste aquele doido! Olha, aqui passa o meridiano de Greenwich, os Pirenéus, são tão bonitos, não são? Bolas, parece-me que já fui apanhado em excesso de velocidade. Estamos a chegar. Estás cansada, Luna? Também eu, ficamos aqui. Comeremos juntos e já sei que gostamos das mesmas músicas. Há uns quatro anos, quando fiz esta viagem sozinho, tive também um animal por companhia, um tubarão-martelo de peluche azul-bebé. O meu filho tinha-se esquecido dele em Lisboa e eu levei-lho atado com cinto de segurança no lugar do morto. Desta vez levo três animais — duas baleias (mãe e filha) de peluche, que um miúdo se esqueceu em Lisboa, e a Luna. Do mesmo modo que os outros viajantes têm vindo a sorrir para a Luna nesta viagem, também se riam quando viam um tubarão sentado ao meu lado. Os animais são sempre uma boa e convivial companhia.
REFERÊNCIAS:
É através do olhar que cães e humanos criam a sua história de amor mútuo
Tal como entre uma mãe e o seu bebé, a oxitocina – a chamada “hormona do amor” – promove os profundos laços mútuos que unem uma pessoa e o seu cão. (...)

É através do olhar que cães e humanos criam a sua história de amor mútuo
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 Animais Pontuação: 17 | Sentimento 0.5
DATA: 2015-05-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: Tal como entre uma mãe e o seu bebé, a oxitocina – a chamada “hormona do amor” – promove os profundos laços mútuos que unem uma pessoa e o seu cão.
TEXTO: Por que é que os seres humanos amam os seus cães como se de os seus filhos se tratasse? Por que é que os cães retribuem esse afecto, preferindo a companhia do(a) seu(ua) dono (a) à de outros cães? Um estudo publicado na revista Science com data desta sexta-feira sugere que, tal como acontece entre uma mãe e o seu bebé, a hormona oxitocina não é alheia a este fenómeno. Takefumi Kikusui, especialista de comportamento animal da Universidade de Azabu em Sagamihara, Japão, e colegas especulam que, ao longo dos milhares de anos que decorreram desde o início da domesticação do cão, mecanismos cerebrais semelhantes aos que promovem as ligações sociais humanas terão evoluído também no cão, permitindo o estabelecimento de laços emocionais profundos entre as duas espécies. E mais precisamente, mostram que esse mecanismo, que hoje nos une aos cães de uma forma que não acontece com outras espécies, é promovido pela oxitocina – a chamada “hormona do amor” – quando o cão e o humano olham um para o outro, olhos nos olhos. “Existe um mecanismo fisiológico por detrás dos poderosos laços que se estabelecem entre os cães e os humanos”, diz Evan McLean, especialista de cognição canina da Universidade Duke, EUA, entrevistado pela Science. Foi com base em estudos anteriores que os cientistas japoneses decidiram testar a ideia de que a oxitocina e o olhar fazem parte do mecanismo que promove essa relação emocional. No seu artigo, descrevem os dois tipos de experiências que realizaram. Numa primeira fase, quiseram saber se, quando uma pessoa e o seu cão passavam meia hora juntos, fechados numa sala – enquanto o comportamento de ambos era monitorizado ao minuto pela equipa –, “a duração do olhar por parte do cão influía sobre os níveis de oxitocina tanto da pessoa como do animal”, escrevem os autores. Para isso, mediram os níveis de oxitocina urinária de 30 cães e dos seus donos (24 mulheres e seis homens; 15 cães e 15 cadelas) antes e depois dessa interacção cão-humano. E descobriram então que, efectivamente, quanto maior a duração do olhar mútuo, maior o aumento dos níveis de oxitocina tanto nos donos como nos cães. E mais: a mesma experiência, feita pelos cientistas junto de um pequeno grupo de lobos (que foram criados por seres humanos) e os seus cuidadores, não demonstrou correlações deste género nos lobos. Segundo os autores, isso abona em favor da ideia de que o tal mecanismo comum de relacionamento emocional não existe nos lobos – e que, portanto, terá de facto surgido durante a domesticação do cão. “Um dos principais resultados desta parte do trabalho”, salienta contudo McLean, "é que existe muita variabilidade natural na quantidade de tempo que os cães passam a olhar para os seus donos. Ora, só no grupo dos cães que olhavam longamente para os donos é que os próprios donos acusaram uma subida de oxitocina ao fim da meia hora. ”Numa segunda fase do trabalho, os cientistas administraram aos cães, por via nasal, quer oxitocina quer soro fisiológico (substância sem efeito). O objectivo, desta vez, era determinar se isso levaria a observar diferenças tanto ao nível da duração do olhar como dos níveis de oxitocina. E constataram que, de facto, os olhares mais prolongados dos cães e as maiores subidas dos níveis de oxicitocina nos donos aconteciam sistematicamente com animais que tinham recebido oxitocina e não apenas um esguicho de água. Mais uma vez, nenhum destes efeitos se verificou nos lobos. Este efeito da oxitocina não foi geral: só se manifestou nas cadelas e não nos cães machos. “Aqui, o principal resultado foi que as cadelas a quem tinha sido dada oxitocina olhavam durante mais tempo para o(a) dono(a) e que este último apresentava um maior aumento dos seus níveis de oxitocina do que os outros donos”, frisa McLean. “Não percebemos bem o porquê desta diferença entre os sexos", diz ainda, "mas sabemos que também existe nos humanos; os homens e as mulheres não reagem da mesma forma quando lhes é administrada oxitocina” (uma abordagem que está a ser testada no tratamento de perturbações como a síndrome de stress pós-traumático). Seja como for, estes resultados talvez permitam começar a explicar as raízes da nossa relação privilegiada com os cães. “Existem várias teorias”, diz McLean. "Uma delas reza que os cães consideram os seus donos como ‘dominantes’” – tal como acontece com os lobos nas alcateias, onde existe uma hierarquia entre os que mandam e os que obedecem. Mas há também outra teoria, “totalmente diferente, que postula que a nossa relação com os cães é muito parecida com a relação, na espécie humana, entre os pais e os seus filhos”.
REFERÊNCIAS:
Aldeias de mar. Na Vila Chã do pai herói, a pesca é quase memória
A sul do Rio Ave, Vila Chã conserva uma pequena frota de nove barcos, quatro dos quais presos à praia, por falta de quem os manobre. Pescar, por aqui, é quase um acto de resistência. (...)

Aldeias de mar. Na Vila Chã do pai herói, a pesca é quase memória
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 Animais Pontuação: 17 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-08-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: A sul do Rio Ave, Vila Chã conserva uma pequena frota de nove barcos, quatro dos quais presos à praia, por falta de quem os manobre. Pescar, por aqui, é quase um acto de resistência.
TEXTO: O grito de aviso de Elisa Piloto, que antecede o taque-taque do guincho que esta mulher comanda, ecoa pela praia quase vazia. Franco e o genro saíram para largar uns covos entre umas pedras ali à nossa vista, sem segredos, e passados uns minutos estão de regresso, acompanhando, sem esforço, a subida do Pai Herói areal acima, onde o esperam os restantes oito barcos que completam a frota de Vila Chã, em Vila do Conde. O velho, um amigo que conhecemos de outras conversas de mar, resiste, aos 82 anos, a deixar a pesca, e hoje até está preocupado com a vistoria que hão-de vir fazer ao barco de fibra de vidro com que este homem que há quatro décadas se viu viúvo, com sete filhos, compõe, pescando, o orçamento familiar. Nove barcos. A frota de Vila Chã ainda “cabe toda num plano”, como descrevia o realizador Gonçalo Tocha que por aqui andou, em 2013, à procura das mulheres do mar. Mulheres pescadoras, ou pelo menos com cédula marítima, nos dias que correm; mulheres arrais, mestras dos seus barcos, outrora, em terra onde a agricultura e a pesca andaram quase sempre de mão dada, e que no início da década de 90 já tinham atraído aqui a antropóloga canadiana Sally Cole, interessada em perceber os processos sociais que as levaram a tal destaque, sem paralelo que se conheça, em Portugal. Sobre elas sobra-nos, no catálogo da D. Quixote, ou nos melhores alfarrabistas, Mulheres da Praia - O Trabalho e a Vida numa Comunidade Costeira, da investigadora canadiana, e o documentário A Mãe e o Mar, do realizador açoriano, que tem entre as protagonistas uma das descendentes dessa casta que desafiou convenções e recusou ficar no areal, à espera dos seus homens. Glória Costa tem cédula, e poderia ainda andar com o marido no Rumo à Glória, se preciso fosse, mas os dias não correm de feição a esta pequena comunidade piscatória, onde há nove barcos, mas só cinco andam ao mar, tripulados, cada um deles por dois homens. “Isto está ruim para todos”, resume Glória, enquanto vai cortando, com a cunhada Fátima Maia, umas cavalas congeladas para iscar os covos à porta da sua casa de mar. Os maridos de ambas têm cada um o seu barco, mas andam juntos num deles, apenas, dividindo despesas e ganhos. Na verdade, o Rumo à Glória está à venda, e não é o único. E o plano de Gonçalo Tocha é, hoje, uma meia verdade, feita de embarcações paradas por falta de-mão-obra e de uma dúzia de resistentes. Que adiam, nesta freguesia da margem sul do Rio Ave, o fim de uma actividade iniciada há séculos por filhos de agricultores, excluídos do acesso à terra pelo sistema de heranças baseado no morgadio. Enquanto isso, ali ao lado, em Angeiras, já no concelho de Matosinhos, a pesca vive, curiosamente, a esperança de melhores marés. Aliás, no mesmo dia em que escutávamos, de manhã, os lamentos dos vilaplanenses, a ministra do Mar assistia, nessa outra praia vizinha que alberga ainda 15 barcos semelhantes a estes, ao início das obras de construção de um molhe prometido há quatro décadas, para gáudio de velhos pescadores que nunca tiveram uma barra que os defendesse dos instáveis humores do mar. Por lá, à tarde, António Soares, o “Camisola Grossa”, para os amigos, vigiava num banco o vaivém de uma retroescavadora, quase parecendo disposto, aos 72 anos, a contar pedra a pedra o trabalho que esta levará até ao fim de uma obra pela qual também lutou. Em Vila Chã, até há um punho cerrado desenhado no costado do Pai Herói. Mas os esforços do governo socialista na comunidade vizinha são recebidos com indiferença. Aqui o vaivém das embarcações é defendido por um afloramento rochoso, a pedra do Bispo, para norte da qual, escondida dos nossos olhares, se desenvolve uma das concessões balneares da freguesia. A sul, há umas poucas barracas para banhistas à vista, mas o grosso do areal da Praia do Fontão, defronte das típicas casas de mar - evolução para alvenaria e telha, dos antigos barracões que os agricultores foram vendendo aos pescadores - ainda está a salvo das toalhas e guarda-sóis dos turistas. Por aqui ainda é possível amanhar um peixe nos penedos, como vemos Fátima Maia fazer, acabadas as tarefas do barco, ou apanhar um pouco de sargaço que deu à praia, actividade a que Glória, antiga sargaceira, se dedica a meio da manhã, a poucos metros de uma veraneante que se intrometeu no cenário e, deitada, apanha uns (poucos) raios de sol, indiferente às moscas. Esta praia é de gente como a filha e a segunda mulher de Franco, em vigília na areia, enquanto o velho larga os covos com o genro; dos gatos que aguardam tão ansiosos como elas o barco que vem chegando; ou de Manuel Sérgio e Jorge Silva, dois antigos serralheiros que trocaram a oficina por um esquife de nove metros, de boca aberta, que se dedicam, terminada a maré, a limpar com esmero. Com metade da idade de Franco, Manuel e Sérgio podiam prenunciar um futuro para a pesca em Vila Chã, mas Alberto Silva, 62 anos, e outro dos pescadores que pôs o seu barco à venda, faz as contas ao resto da malta, onde ainda descobre dois camaradas com menos de 30 anos, e já não acredita numa efectiva renovação. “Os barcos são quase peças de museu. Mais meia dúzia de anos e aquela praia acaba”, vaticina o presidente da Associação Vila Chã-Pesca, um antigo operário da construção que, um dia, após a morte do pai, na sequência de um acidente na pesca do bacalhau, se fez ao mar também, para ajudar a mãe a manter onze filhos. Pode ser verdade que, como diz, “só vai para o mar quem não sabe o que aquilo é”, mas o facto é que Alberto se deu bem. Pescador/salgador no navio bacalhoeiro São Gabriel, transferiu rapidamente o seu traquejo no manejo da colher de trolha para a pá do sal - essencial para a preservação da qualidade do bacalhau durante campanhas de cinco a seis meses - e na terceira viagem era já mestre-salga do navio, o que lhe trouxe responsabilidades acrescidas e um salário acima do da restante tripulação. O que o ajudou, mais tarde, no final da década de oitenta, a comprar um barco para pescar na sua praia. Nessa altura, recorda, ainda haveria uns 30 barcos, cenário confirmado por Benjamim Moreira, que os construiu quase todos. Bisneto de Lourenço Caseira, famoso construtor naval do início do século XX, Benjamim herdou-lhe os genes e o génio, e ainda hoje será, em toda a região, uma das poucas pessoas capazes de construir uma catraia-fanequeira, embarcação típica de Vila Chã, da tipologia da lancha poveira, mas mais pequena, que aprendeu a fazer com o tio-avô António Caseira. Benjamim Moreira foi até 2017 presidente de Junta, e responsável, num dos seus mandatos, pela criação de um pequeno museu, para onde transferiu muito espólio que vinha guardando em sua casa, juntando-lhe peças recolhidas na comunidade. O espaço fixa com esmero as actividades marítimas desta comunidade, que há décadas vivia ao ritmo dos ciclos da apanha do sargaço e do caranguejo pilado, fertilizantes das hortas e dos campos agrícolas que ainda se espalham pelo interior da freguesia, mas agora desligados dos que vivem do mar. Lá dentro, um galricho - ou nassa, para outras comunidades que usavam esta armadilha para a faneca - serve agora de candeeiro, iluminando um corredor ocupado com um dóri, um bote da pesca do bacalhau, e mais à frente, três catraias, uma delas de popa cortada para encaixe de um motor fora de borda, evolução que nos anos 50 e 60 enterrou na memória dos velhos a navegação à vela e o manejo dos remos. Em honra desses tempos, e do bisavó que encheu de barcos a sua praia, já no início desta década Benjamim construiu a catraia-fanequeira Mestre Lourenço, no âmbito do projecto Celebrar a Cultura Costeira, promovido pela Mútua dos Pescadores, com financiamento dos EEA Grants. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. A seu lado estava um mestre e professor universitário norueguês, que por lá se esforça, com sucesso, por manter vivas as técnicas de construção dos drakkar viquingues, e uma equipa de investigadores daquele país, que documentaram, em vídeo, todo o processo. A admiração dos estrangeiros pela cultura marítima de Vila Chã está, aliás, bem patente nas mensagens que muitos peregrinos de Santiago, utilizadores do albergue instalado na antiga cantina desta escola, deixam à entrada do museu erguido por Benjamim Moreira, e onde este, reformado, passa agora boa parte do dia, tentando manter a salvo a memória dos seus. Este é um trabalho hercúleo, que não se resume aos objectos pregados à parede ou às casas de mar atulhadas de aprestos em desuso que, com o guincho, e o posto de socorros a náufragos, marcam, no território, vínculos antigos à pesca. Na cabeça destes homens e mulheres há um património de histórias e de gestos quotidianos quase esquecidos na preia-mar do tempo, como aquela que ouvimos de Carlos Franco, da primeira vez que o encontramos, há uns anos, num passeio pela praia, e que aqui recuperamos, antes de largar para outro portinho. Nos anos 60, pescador do bacalhau no navio-motor Vila do Conde, Franco, o "Franquito", seguia no seu dóri, para entregar uns documentos ao navio S. Jacinto, a pedido do capitão, quando o bote adernou, deixando-o aflito na água gelada e à mercê de uma morte rápida. Vários companheiros meteram os seus barquitos ao mar, e valeu-lhe um conterrâneo de Caxinas, o António Flores, que o agarrou pelos cabelos, oferecendo mais umas décadas de vida a este homem atarracado e forte, que desafia a estatística e resiste a ir para o abate, como se diz dos barcos. Admitindo que poucos farão como o pai herói, resta saber quem salvará a pesca em Vila Chã, e se terá ela, como ele, direito a uma segunda vida.
REFERÊNCIAS: