Neste campo de refugiados da Austrália há crianças que só pensam "como morrer"
Desde tentativas de suicídio à automutilação, os relatos que saem de Nauru, pequena ilha do Pacífico, mostram que estas crianças refugiadas não estão bem. (...)

Neste campo de refugiados da Austrália há crianças que só pensam "como morrer"
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 Migrantes Pontuação: 5 Refugiados Pontuação: 21 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: Desde tentativas de suicídio à automutilação, os relatos que saem de Nauru, pequena ilha do Pacífico, mostram que estas crianças refugiadas não estão bem.
TEXTO: Em Junho de 2018, uma rapariga de 14 anos a viver no campo de Nauru “derramou gasolina sobre si própria e tinha um isqueiro”, diz um relatório a que a emissora pública australiana, ABC, teve acesso. No mesmo mês, uma outra criança de dez anos “tentou autoflagelar-se ao ingerir pedaços de metal pontiagudos”, diz a mesma fonte. Estas são algumas das histórias que chegam da ilha de Nauru, um pequeno país com metade da área da cidade do Porto e cerca de 13. 000 habitantes, onde está instalado um dos centros de processamento para refugiados do Governo australiano que funciona fora do país — a ilha fica a cerca de 3000 quilómetros a nordeste da Austrália. O jornal The Guardian cita fontes médicas em Nauru que dizem que pelo menos 20 crianças no centro de detenção se recusam a comer ou ingerir líquidos. Pelo menos uma dúzia de crianças precisará de ser retirada com urgência do centro. Um outro caso é o de Ahoora, noticiado pelo The Guardian no final de Agosto, um menino de sete anos que vive no campo há cinco. Ahoora toma antidepressivos, a mãe já tentou suicidar-se, o pai está em depressão profunda e já viu o irmão a coser os lábios em protesto. Quando lhe dão uma caneta Ahoora desenha crianças a chorar por trás de grades, rodeadas por tubarões e em chamas. “A escuridão rodeia-me”, diz sobre as noites em que adormece e tem pesadelos. “A única coisa em que muitas destas crianças pensam é como morrer. Elas pesquisam na internet”, diz à ABC Fiona Owens, a assistente social que esteve encarregue da equipa de saúde mental infantil em Nauru de Maio a Julho de 2018. O psiquiatra Vernon Reynolds, que também trabalhou na ilha, conta (também à ABC) que as crianças exibem sinais de trauma graves. "O que vemos é que esses jovens e adultos basicamente desistem da vida, vão para a cama e todo o seu funcionamento se deteriora. Eles não comem muito, não bebem muito e param de cuidar do seu dia-a-dia”, detalha. "Eles param de interagir com as pessoas, deixam de falar e de fazer qualquer coisa que faziam por interesse e prazer". O presidente de Nauru, Baron Waqa, admitiu à Sky News Austrália que “nos últimos tempos se registou um aumento neste tipo de incidentes”. Os activistas pelos direitos dos refugiados, bem como os pais das crianças, estão "a empurrar" as crianças refugiadas para este tipo de situações como forma de “enganar o sistema e chegar à Austrália”, defendeu. "Estamos a investigar muitos desses casos. "Vernon Reynolds diz que por causa dos relatórios que tem escrito sobre o estado de saúde mental destes refugiados — que não estão confinados a viver no campo e podem interagir com a comunidade de Nauru — foi impedido de voltar à ilha em Abril de 2018. "Fui informado pelo meu empregador [a International Health and Medical Services, contratada pelo Governo australiano] que algumas das minhas declarações eram muito pessoais. . . não eram clínicas o suficiente, e que eu podia estar a colocar a organização, ou o Governo, em risco, afirmando que estávamos negligenciar o cuidado dessas crianças. "Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Um porta-voz do Departamento de Assuntos Internos da Austrália disse, em comunicado, que "os cuidados de saúde para todas as pessoas, incluindo refugiados, em Nauru, são da responsabilidade do Governo de Nauru”. Entre 3 e 6 de Setembro, Nauru será o país anfitrião do Fórum das Ilhas do Pacífico. A emissora australiana ABC está proibida de entrar no país. Baron Waqa, o presidente de Nauru, diz que se deve à interferência da ABC na política do país aquando das eleições de 2016. A Austrália intercepta os requerentes de asilo ao largo da sua costa e envia-os para campos financiados por si, como o de Nauru e outros na Papuásia-Nova Guiné. Em Maio de 2018 havia 939 pessoas no campo de Nauru e 137 eram crianças, segundo a ABC.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave direitos campo comunidade social criança rapariga infantil
Hungria declara estado de emergência para impedir entrada de refugiados
Polícia já prendeu 60 refugiados que saltaram o muro - vão ser alvo de um processo penal. Governo diz que os que não pedirem asilo serão reenviados para a Sérvia. (...)

Hungria declara estado de emergência para impedir entrada de refugiados
MINORIA(S): Migrantes Pontuação: 6 Refugiados Pontuação: 21 | Sentimento 0.0
DATA: 2015-09-15 | Jornal Público
SUMÁRIO: Polícia já prendeu 60 refugiados que saltaram o muro - vão ser alvo de um processo penal. Governo diz que os que não pedirem asilo serão reenviados para a Sérvia.
TEXTO: O Governo da Hungria declarou esta terça-feira o estado de emergência em duas zonas da sua fronteira Sul. Pretende impedir a entrada de refugiados, mas não só: estes vão ser criminalizados caso entrem no território, como aconteceu aos 60 que, de manhã e já depois de a fronteira estar fechada, passaram o muro de arame farpado erguido na linha de separação com a Sérvia. “Sessenta pessoas passaram ilegalmente a fronteira, vai ser aberto um processo penal contra eles”, anunciou um porta-voz do Governo de Budapeste, Giorgi Bakondi, numa conferência de imprensa no Sul da Hungria. Depois da construção do muro ao longo dos 175 quilómetros de fronteira, a entrada de Röszke tornou-se, para dezenas de milhares de pessoas que fogem sobretudo da guerra e de perseguições e estão em rota com destino à União Europeia, o ponto de passagem para a quase totalidade de refugiados. Porém, esta passagem foi bloqueada à meia-noite de segunda-feira (23 horas em Portugal continental). Pouco antes do encerramento, relata a BBC, viveram-se momentos de angústia e tensão em Röszke, onde as pessoas se acumularam tentando entrar em território da UE antes do fecho da fronteira. Do lado de lá, na Sérvia, ficou um grupo grande, de perto de 300 pessoas. Ficaram ali toda a noite, alguns dormindo nas tendas cedidas por grupos de apoio humanitário e montadas, como forma de protesto, no asfalto, algumas mesmo junto à vedação, diz a AFP que falou com alguns dos refugiados, sobretudo sírios e iraquianos. Por causa do anúncio do encerramento, os refugiados aceleraram o passo e, segunda-feira, passaram por Röszke 9380 pessoas. Mas por causa do estado de emergência e da nova legislação anti-imigração aprovada pelo Governo de Budapeste, foi como se não tivessem passado — na prática, a Hungria impediu que estas 9380 pessoas entrassem no seu território. Vão ser transportadas de autocarro para “zonas de trânsito”, outra novidade anunciada por Budapeste. Ali, os refugiados são registados e têm à disposição os mecanismos para pedirem asilo. A esmagadora maioria, porém, não quer pedir asilo neste país, quer seguir caminho e fazê-lo na Alemanha ou noutro país do Norte da Europa. Nas zonas de trânsito, explicou o Governo húngaro através de um porta-voz, o processo burocrático será rápido e os pedidos serão examinados em oito dias. Aqueles a quem o pedido for recusado, ou os que decidirem não o pedir — porque, de acordo com as regras da UE, ficam impossibilitados de o fazer no país onde desejam viver — serão enviados imediatamente para o lugar por onde entraram na Hungria, ou seja a Sérvia. A Sérvia já respondeu — diz que não permitirá que os refugiados voltem para trás e que a Hungria tem que reabrir as suas fronteiras. Mas o Governo de Viktor Orbán (direita) está irredutível. “Estas medidas [encerramento de fronteiras] foram tomadas devido à evolução da situação no lado sérvio, onde o controlo não está assegurado”, disse um porta-voz da polícia de fronteiras, Laszlo Balazs, numa conferência de imprensa em Budapeste. Acrescentou que a reabertura dos postos fronteiriços só acontecerá “quando as condições estiverem reunidas”. E, prevendo que o fluxo de gente se desloque para outro lugar, a equipa de Orbán anunciou também a construção de mais um muro de vedação e arame farpado, na fronteira com a Roménia. “O Governo decidiu dar início aos preparativos para a construção de uma vedação na fronteira entre a Hungria com a Roménia, estendendo-se ao ponto de intercepção entre as fronteiras sérvia, húngara e romena, porque uma parte da pressão migratória pode deslocar-se para a Roménia”, disse esta terça-feira o ministro dos Negócios Estrangeiros, Peter Szijjarto. A provável mudança de rota foi comentada pela porta-voz do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), Melissa Fleming. Em declarações à Reuters, refugiados disseram que não podendo chegar à Áustria através da Hungria, poderão optar por uma rota que atravesse a Croácia e a Eslovénia. O alto-comissário, António Guterres, considerando-se “desapontado” e “sob choque” devido ao fracasso dos 28 países da UE em chegarem a acordo sobre uma forma de distribuir 120 mil refugiados, disse que é importante ter um “plano B”. Considerou que “se a fronteira húngara se mantiver fechada”, deve ser dada “uma resposta de emergência centrada na Sérvia”, onde devem ser criadas capacidades de acolhimento e assistência, e começar daí, imediatamente, o programa de recolocação de refugiados, até porque se aproxima o Inverno.
REFERÊNCIAS:
Entidades UE
Hungria vai pedir anulação da distribuição dos refugiados pela UE
O antagonismo para com os refugiados sobe de tom em alguns países europeus. Junto à ilha grega de Kos, em mais um naufrágio, morreram nove pessoas, quatro delas crianças. (...)

Hungria vai pedir anulação da distribuição dos refugiados pela UE
MINORIA(S): Migrantes Pontuação: 6 Refugiados Pontuação: 21 | Sentimento 0.0
DATA: 2015-11-19 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20151119191644/http://www.publico.pt/1714708
SUMÁRIO: O antagonismo para com os refugiados sobe de tom em alguns países europeus. Junto à ilha grega de Kos, em mais um naufrágio, morreram nove pessoas, quatro delas crianças.
TEXTO: Dois países da União Europeia deram esta terça-feira mais um passo de ruptura com a política de Bruxelas para os refugiados e imigrantes que continuam a chegar oriundos da Síria, Afeganistão, Iraque e outros países com guerras e conflitos. Em Budapeste, o Governo populista e de direita vai pedir ao Tribunal Europeu para anular a decisão de distribuir pelos países-membros 160 mil pessoas chegadas a Itália e à Grécia. Em Varsóvia, o futuro responsável pela diplomacia sugeriu que os sírios devem ser devolvidos ao seu país para "lutarem pela liberdade". Enquanto as posições políticas e a retórica se extremam, o fluxo de chegadas de refugiados e imigrantes não abranda e as tragédias não páram — esta terça-feira, nove pessoas morreram afogadas ao largo da ilha grega de Kos, depois de o barco insuflável onde viajavam se ter afundado. Sete pessoas que seguiam na frágil embarcação foram retiradas das águas já geladas do Mediterrâneo pela polícia marítima grega. Quatro dos mortos são crianças; há mais duas crianças entre os vários desaparecidos. A embarcação tinha saído da costa turca durante a noite de segunda para terça-feira e fora detectada por um navio patrulha ao serviço da agência de segurança nas fronteiras da UE, Frontex. O primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras, esteve esta terça-feira na Turquia para debater com o Governo de Ancara formas de travar a partida dos refugiados. Mais a norte, já bem dentro do território da União Europeia, na Hungria, o primeiro-ministro, Viktor Orbán, discursava no Parlamento. "Enquanto este Governo respirar, não haverá quotas e não ficaremos nem com um migrante. "Orbán fez um discurso inflamado e conseguiu, com 145 votos a favor e 41 contra (também houve uma abstenção), que o Parlamento aprovasse uma resolução que permite ao Governo contestar uma decisão tomada por Bruxelas no início do Outono que determina a distribuição de um grupo de 160 mil refugiados pelos Estados-membros. Os países recebem um determinado número de pessoas consoante a sua capacidade económica — trata-se de um sistema de quotas, apesar de a UE ter retirado esta palavra da equação, por haver muitos países contra essa fórmula. O texto aprovado pelo Parlamento húngaro diz que a divisão dos refugiados por quotas "não tem em conta o princípio de subsidiariedade e não dá aos parlamentos nacionais a possibilidade de exprimir a sua opinião" na matéria. "Nós decidiremos quem deixamos entrar no nosso país e com quem queremos viver", disse Viktor Orbán no Parlamento. O ministro da Justiça, Laszlo Trocsanyi, citado pela AFP, declarou que o pedido de anulação da decisão vai chegar ao Tribunal Europeu em Dezembro. Até lá, a Hungria — por onde passaram 400 mil pessoas até o Governo decidir encerrar totalmente as fronteiras, em meados de Outubro — não aplicará a decisão e não receberá qualquer refugiado. O Governo da Eslováquia também ameaçara apresentar às instância europeia (tribunais) um recurso da decisão europeia de distribuição dos 160 mil refugiados, mas ainda não o fez. Também esta terça-feira, em Varsóvia, surgiram sinais de que o novo Governo — saído das eleições de 31 de Outubro, que a direita nacionalista e eurocéptica venceu — liderado por Beata Szydlo, vai adoptar uma linha próxima da de Orbán. Aqui, a retórica foi mais longe e aquele que será o responsável pela diplomacia (o Governo ainda não foi aprovado pelo Parlamento) fez declarações muito polémicas em relação aos sírios que fogem de várias guerras — o território do que era este país do Médio Oriente é disputado pelas forças de Bashar al-Assad, que combatem a oposição armada que o quer derrubar, e pelos radicais do Estado Islâmico que já dominam uma grande parte do mapa. Disse Witold Waszczykowski, próximo ministro dos Negócios Estrangeiros: "Centenas de milhares de sírios chegaram à Europa. Podiam formar um exército. Dezenas de milhares de homens jovens saem dos botes com os seus iPad na mão, e, em vez de pedirem de beber e comer, perguntam onde podem ligar os telefones e portáteis. Podiam ir combater para libertar o seu país. "
REFERÊNCIAS:
Entidades UE
Perseguições levam ACNUR a pedir à Europa que acolha mais refugiados sírios
Há refugiados presos em esquadras no Egipto e situação não é melhor na Líbia. Na Turquia o número de sírios ultrapassa já os 600 mil (...)

Perseguições levam ACNUR a pedir à Europa que acolha mais refugiados sírios
MINORIA(S): Migrantes Pontuação: 6 Africanos Pontuação: 2 Refugiados Pontuação: 21 | Sentimento 0.65
DATA: 2013-10-21 | Jornal Público
SUMÁRIO: Há refugiados presos em esquadras no Egipto e situação não é melhor na Líbia. Na Turquia o número de sírios ultrapassa já os 600 mil
TEXTO: Fugiram da guerra na Síria, mas a situação que encontram nos países vizinhos é cada vez mais difícil: na Turquia, onde todas as semanas nascem novos campos de refugiados, estão já mais de 600 mil sírios; no Egipto centenas estão detidos ilegalmente e na Líbia houve barcos alvejados quando tentavam navegar em direcção à Europa. Perante isto, o Alto Comissariado da ONU para os Refugiados (ACNUR) voltou a apelar à solidariedade dos europeus, pedindo-lhes que abram as suas portas a quem procura asilo. “Um número crescente de sírios está a atravessar o Mediterrâneo do Egipto para Itália, referindo uma ansiedade crescente com a sua segurança, bem como incidentes que envolvem agressões físicas, ameaças verbais, detenção e deportações”, denunciou, na sexta-feira, a porta-voz do ACNUR, Melissa Fleming, citada pela Reuters. Na véspera, a Amnistia Internacional acusou o regime egípcio de estar a “falhar de forma abissal as suas obrigações internacionais” e de “não proteger sequer os refugiados mais vulneráveis”. Segundo a organização de direitos humanos, a Marinha egípcia interceptou nos últimos dois meses 13 embarcações que partiram das suas costas com destino a Itália, detendo 946 refugiados, das quais 724 continuam na prisão. Acções que começaram após o golpe que derrubou o Presidente islamista Mohamed Morsi e que desencadeou no Egipto um clima de desconfiança em relação aos refugiados sírios (cerca de 125 mil, quase todos sunitas), acusados de serem simpatizantes da Irmandade Muçulmana. A Amnistia diz que numa visita a uma esquadra de polícia em Alexandria encontrou 40 refugiados sírios detidos sem ordem judicial, dez dos quais eram crianças, incluindo dois gémeos com apenas um ano de idade. Os refugiados contaram que a polícia ameaçou transferi-los para uma prisão no Cairo a menos que assinem um papel aceitando ser deportados para outros países da região ou levados de novo para a Síria. Não é caso único – há relatos de sobreviventes de naufrágios que depois de serem resgatados ficaram detidos e, no início do mês, um grupo de 36 refugiados, a maioria de origem palestiniana, foi deportado para Damasco e, segundo a Amnistia, vários deles foram levados para uma das prisões mais temidas dos serviços secretos sírios. “Enviar refugiados para uma zona de conflitos sangrentos é uma violação da lei internacional”, denuncia a organização. A situação é igualmente perigosa na Líbia – um país dominado pelas milícias e que continua a ser o principal porto de partida para a Europa, já não apenas de imigrantes africanos, mas de um número cada vez maior de refugiados. O barco que naufragou no início do mês junto à ilha de Lampedusa, provocando a morte a 339 dos mais de 500 ocupantes, foi alvejado no mar, o que poderá ter danificado a embarcação e contribuído para a tragédia. Apelo à solidariedade europeiaO ACNUR sublinha que, face aos problemas internos dos dois países e às previsões de que mais sírios vão deixar o país, “é urgente reforçar as capacidades de acolhimento nestes países do Norte de África”. Mas diz que isso não basta: “Pedimos aos países que têm meios, na Europa e não só, que mostrem a sua solidariedade não apenas com financiamento e contribuições, mas também com medidas que envolvam o acolhimento de refugiados em países terceiros e a reunificação das famílias”. Mais de três quartos dos 2, 2 milhões de refugiados sírios, metade dos quais crianças, estão em três países vizinhos, onde as capacidades de resposta estão perto do limite. Quase 800 mil estão no Líbano, um dos países mais pequenos da região; na Jordânia nasceu em pouco mais de um ano o segundo maior campo de refugiados do mundo; e segundo números divulgados nesta segunda-feira, a Turquia acolheu já mais de 600 mil pessoas, das quais um terço está nos 21 campos erguidos junto à fronteira. Ancara é um dos governos mais hostis ao regime de Bashar al-Assad e assegurou que iria manter as fronteiras abertas aos sírios. No entanto, o primeiro-ministro, Tayyip Erdogan, anunciou recentemente que o país já gastou mais de dois mil milhões de dólares com o acolhimento de refugiados. O ACNUR lançou um apelo para que os países ocidentais aceitem receber pelo menos 30 mil refugiados até ao final de 2014, através de programas temporários de acolhimento ou vistos humanitários. Até agora, apenas 16 países responderam ao apelo, comprometendo-se a receber pouco mais de 10 mil pessoas, quase metade das quais na Alemanha. Em Setembro, o Ministério dos Negócios Estrangeiros comunicou ao ACNUR que Portugal está disponível para receber ainda este ano 15 sírios.
REFERÊNCIAS:
Entidades ONU
Os refugiados, a bomba-relógio e os medos católicos
As organizações católicas italianas que trabalham com refugiados criticam duramente a nova política do país: o Governo reclama a tradição cristã da Europa, mas as instituições dizem que a política “aldraba a realidade”. E têm receio dos efeitos negativos das orientações no acolhimento e integração dos refugiados — dos que ainda conseguem chegar. Muitos são bloqueados por uma Turquia “que não os protege” ou morrem no Mediterrâneo. (...)

Os refugiados, a bomba-relógio e os medos católicos
MINORIA(S): Migrantes Pontuação: 6 Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 Asiáticos Pontuação: 6 Refugiados Pontuação: 21 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-08-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: As organizações católicas italianas que trabalham com refugiados criticam duramente a nova política do país: o Governo reclama a tradição cristã da Europa, mas as instituições dizem que a política “aldraba a realidade”. E têm receio dos efeitos negativos das orientações no acolhimento e integração dos refugiados — dos que ainda conseguem chegar. Muitos são bloqueados por uma Turquia “que não os protege” ou morrem no Mediterrâneo.
TEXTO: O camaronês Franck Tayodjo, 41 anos, está há 15 anos em Itália, mas tem na pele as marcas do que o levou a fugir do seu país, aos 26 anos: basta levantar ligeiramente as calças para poder ver as cicatrizes da violência e da tortura a que foi sujeito. Jornalista no Aurore Plus, ele e outros colegas eram perseguidos pelo Governo, por causa do que publicavam. “Os governos foram sempre duros com jornais mais críticos. ” Forma branda de explicar porque foi metido numa prisão subterrânea e torturado. Apesar de estar detido na cadeia Regina Coeli, no centro de Roma, Pedro Celeita, 66 anos, colombiano condenado por furto a dois anos de prisão, tem autorização do director para sair durante algumas horas do dia e ajudar outros imigrantes e refugiados no Angolo del Pellegrino: “Estou aprendendo a liberdade. Assim como me ajudaram a mim, estou agora a ajudar outros”, diz, a poucos dias de sair em liberdade e poder regressar à Colômbia, para tentar reconstruir a vida. Apenas terá de cumprir um pedido que lhe fez o Papa — já veremos o quê e quando. Às duas horas da tarde, a fila à porta do Centro Astalli, do Serviço Jesuíta aos Refugiados (JRS, da sigla inglesa), já tem umas 30 pessoas, aguardando a comida que será distribuída uma hora depois. Os rostos são sobretudo africanos, mas também asiáticos e do Médio Oriente. Para os voluntários e funcionários do JRS que ali trabalham, nem sempre a tarefa é fácil. “Quem é diferente, vem de outros países e traz consigo uma bagagem de tanto sofrimento, não é uma pessoa fácil de acompanhar”, dirá, uma hora depois, o padre Camillo Ripamonti, director do JRS-Itália, que se manifestará também preocupado com as decisões e atitudes do novo Governo do seu país e com as indecisões europeias. Odine Gideon, 21 anos, nigeriano, viu morrer gente no barco em que se meteu para chegar a Itália, depois de ter ido a pé do seu país até à Líbia. “Umas 14 pessoas perderam a vida” no barco, incluindo crianças. O infortúnio do pequeno Aylan Kurdi, que morreu em Setembro de 2015 numa praia da Grécia, repete-se incessantemente. Na mesma Casa Scalabrini, um antigo seminário transformado em residência de uns 30 refugiados, o missionário Emanuel Selleri, 35 anos, teme a bomba-relógio que as políticas europeias (ou a falta delas) estão a provocar, com o fechamento de fronteiras. Com 75 anos feitos em Julho, o padre Vittorio Trabi quer ser optimista, mas alerta: “Deixamos as pessoas entrar, mas depois não as podemos deixar dormir debaixo da ponte. ” Franciscano, capelão na cadeia Regina Coeli, o padre Vittorio criou o Angolo del Pellegrino e os Voluntari Regina Coeli, grupo de presos que ajudam quem precisa ainda mais. Na última Quinta-Feira Santa, foi este centro de detenção do bairro de Trastevere, no centro de Roma, que o papa Francisco escolheu para o gesto simbólico e litúrgico de lavar os pés a vários presos. Não é fácil o novo quadro político italiano para as organizações católicas que trabalham com imigrantes e refugiados. O Governo fecha portos aos navios e portas da burocracia, corta a torneira da ajuda financeira, cria um ambiente “hostil”, como dirá o padre Camillo. Ainda em Junho, no início da odisseia do navio Aquarius, que só esta semana conheceu um desfecho, o cardeal Ravasi foi criticado por ter recordado que Santo António também foi náufrago e defender o dever evangélico de acolher o estrangeiro. Os bispos assumem a voz da oposição às novas políticas, dizendo que se sentem responsáveis por quem foge das guerras, do deserto, da fome da tortura. A revista Famiglia Cristiana colocou uma fotografia do ministro do Interior, Matteo Salvini, na capa com o título “Vade retro”. O Papa é popular, mas as suas posições sobre este tema não colhem na opinião pública: em cada três italianos, um está do lado do Governo. . . A história de Franck Tayodjo é tragicamente vulgar: nas eleições de 2003 nos Camarões, o jornal Aurore Plus, onde trabalhava, pronunciou-se contra a fraude na contagem dos votos. A resposta do Presidente, Paul Byia, no poder há 36 anos (desde 1982), foi mandar vários militares intimidar jornalistas. Líderes de opinião, comentadores, políticos de oposição, responsáveis de um jornal católico onde Franck também colaborava, ninguém escapou à vigilância da polícia secreta. “Houve pessoas mortas, o Presidente decidiu fechar o jornal, nós procurávamos vender mesmo às escondidas, o Governo militarizou a cidade e mandou a polícia secreta ao jornal. ”E também a sua casa, onde os militares apareceram à noite: “A minha mulher disse que eu não estava e eles começaram a torturá-la. Ela gritou, eu apareci e eles levaram-me. Antes, com a polícia normal, eu escondia-me e o chefe de redacção resolvia o problema. Dessa vez, já não foi possível. . . ”Franck Tayodjo foi submetido a tortura numa prisão subterrânea. Uma das técnicas era fazer rolar os presos no chão e caminhar com as botas sobre eles. Intimidações, perseguições e tortura são práticas quotidianas, acusa. Enquanto fala, Tayodjo mexe timidamente as mãos, sentado na pequena Capela da Fuga para o Egipto, do Centro Astalli: dois bancos corridos, uma cruz etíope e um missal sobre o pequeno altar, que era a escrivaninha do padre Pedro Arrupe, antigo superior geral dos jesuítas, que criou o JRS há 35 anos, na altura da crise dos boat people vietnamitas. Nas paredes, um ícone pintado por Abbye Melaka, refugiado etíope que ali chegou na década de 1990 e hoje vive na Alemanha, evoca a cena da fuga que a tradição coloca no começo da vida de Jesus. Em frente, outro ícone representa a Última Ceia de Jesus com os seus discípulos, como que dizendo que naquela casa o pão é partilhado por quem precisa. Também Franck Tayodjo já teve de fugir, como no episódio que o nome da capela evoca. Em 2003, a região noroeste dos Camarões lutava pela secessão. “A polícia secreta queria que eu lhes desse documentos sobre isso e perguntavam quem estava por detrás de mim. ” Várias pessoas organizaram--se para conseguir a sua libertação. Um bispo católico conhecia-o e organizou a fuga, em direcção a Bamenda, na região secessionista, e depois para a Nigéria, com a qual o país estava em guerra. Mesmo assim, Franck não se sentia em segurança. Acabou por conseguir arranjar documentos falsos e meter-se no porão de um avião da Alitalia, sem poder mexer as pernas durante as oito horas de viagem. “Não sabia que era um avião italiano. ” Quando chegou a Roma, teve quem o informasse de que poderia pedir asilo político, algo que ele ignorava. No aeroporto de Fiumicino, deram-lhe o endereço do Centro Astalli, nas traseiras da igreja jesuíta do Gesù, no centro de Roma. Cinco dias depois da viagem, conseguiu finalmente tomar um duche, ser visto por um médico, contar a sua história, falar com um psicólogo e juristas e, depois, começar a aprender italiano. A resposta ao pedido de asilo, positiva, chegou ano e meio depois. A história de Franck não tem um final feliz: em Roma, faz por vezes alguns trabalhos manuais, sente-se um “eterno precário”. Vive numa casa nos arredores de Roma, com a mulher, que conseguiu juntar-se a ele mais tarde e trabalha como empregada doméstica, indo a casa duas vezes por semana. Mas sente-se permanentemente “em risco de perder a casa, de perder tudo”. E, enquanto refugiado político, não recebe nada do Estado, sublinha. Pelo meio, e ainda nos Camarões, perdera o filho de três anos, por falta de assistência médica. Ele e a mulher adoptaram uma criança, que tinha mais ou menos a idade do filho que morrera — entrou na universidade há um ano. Com tempo livre, Franck acompanha os voluntários do JRS, há cinco anos, em muitas escolas: conta a sua história e fala com os alunos acerca da situação dos refugiados. As idas às escolas fazem parte do projecto que o JRS desenvolve para alunos entre os 13 e os 19 anos, explica Francesca Cuomo, coordenadora do Finestre (palavra italiana para janelas), dedicado ao trabalho nas escolas, e do Incontro, que trabalha o diálogo inter-religioso. “Pretendemos que os jovens desenvolvam um pensamento crítico, baseado no conhecimento”, diz. Isso significa fazer com eles um percurso didáctico sobre migrações forçadas, o contexto geopolítico, a realidade dos países de origem dos refugiados, o direito de asilo, os direitos humanos. . . É nesse percurso que surge o encontro com um refugiado, que servirá de base a um conto que os estudantes escreverão para um concurso literário. “Não se trata de um relatório, mas de se meter na pele daquela pessoa, fugindo à guerra e enfrentando viagens cheias de riscos. E contar isso com um ponto de vista e sensações. ”Mais de 15 mil jovens participaram na última edição do concurso. “O objectivo não é convencer, mas permitir uma experiência e pôr os jovens ao corrente desta realidade, a partir do testemunho, que é o que a televisão não mostra. ” A memória histórica da Itália enquanto país de emigração também serve de recurso, recordando as histórias da emigração económica dos pais ou das emigrações dos avós após a destruição da II Guerra Mundial. Francesca Cuomo tem consciência de que este é um trabalho de paciência, que se confronta com uma opinião pública em que a recusa da diversidade tem crescido. “O que fazemos é plantar uma semente de mudança de mentalidade. Na aula, eles são mais do que 25, porque depois falam com os pais, os amigos. . . É só um instrumento, talvez pequeno, mas poderoso, para mudar as mentalidades. ”Donatella Parisi, responsável pela comunicação no JRS Itália, está consciente de que a tarefa é árdua e o ambiente cada vez mais difícil. “A política aldraba a realidade e a mensagem positiva fica mais frágil. ” O seu dedo aponta responsabilidades graves a muitos políticos e meios de comunicação: “O binómio imigração igual a terrorismo é cavalgado por políticos e pelos media. Tentamos apelar à responsabilidade e à deontologia dos jornalistas, contra as campanhas de ódio que já estão muito estudadas. ”Nota-se tristeza na voz. “Há uma estratégia política muito precisa num momento muito delicado”, diz. Por isso, os 63 mortos de Junho, num novo naufrágio, ou o mês e meio de navegação do Aquarius à espera de autorização para atracar num porto europeu já quase não são notícia, admite. É o “racismo e xenofobia” a crescer, diz. O padre franciscano Vittorio Trani, que reuniu os voluntários da prisão Regina Coeli no Angolo del Pellegrino, para ajudar imigrantes, refugiados, pobres e sem-abrigo, não dramatiza as palavras, mas olha a nova realidade como “muito difícil”. Os media também não ajudam, com a mensagem de que entre os refugiados podem vir terroristas. Há muitos elementos de confusão, diz, e o panorama “não permite pensar o fenómeno” na sua globalidade: pouca clareza no sistema de acolhimento, a “voz comum”, que não corresponde à realidade, de que os refugiados vêm roubar o trabalho. . . “A propaganda não se baseia na realidade”, sublinha Donatella Parisi. Há cada vez menos refugiados a chegar, depois do acordo que a União Europeia fez com a Turquia: entre Janeiro e Junho deste ano entraram em Itália apenas 18 mil pessoas, num país de 65 milhões, observa. “Pagamos à Turquia, que não protege os refugiados. ”Os meios de comunicação falam de uma emergência que afinal não existe, os políticos não resolvem os problemas e apanham a onda, como tem feito o novo ministro Salvini. “Ele já criticara, enquanto deputado europeu, o acordo de Dublin”, que atribui ao país de acolhimento a responsabilidade pela integração. Rejeita-se pois a ideia de que Grécia, Itália e Espanha são os que têm a factura mais alta. No Conselho Europeu de Junho, o problema foi mais uma vez adiado, critica Donatella: “Foi um grande falhanço, nem sequer se previu a reforma do tratado de Dublin. ”O padre Vittorio insiste em que não se pode apenas fazer entrar as pessoas. É preciso “estar na primeira fila para ajudar de modo completo”, ou seja, “acolher de forma a dar uma vida digna às pessoas, acolher com inteligência, ter a coragem de dizer, como o Papa, que a pessoa é uma pessoa”. Na portaria do Centro Astalli (o nome vem da rua onde se situa), vê-se uma fotografia do Papa quando visitou a instituição, há cinco anos. Logo a seguir, um gabinete minúsculo: duas secretárias, um relógio de parede, móveis de arquivo. Três voluntários fazem a primeira triagem de quem chega, respondem a pedidos de informação, entregam correspondência — quem não tem morada dá a direcção do centro — e impõem a ordem quando necessário: por exemplo, quando um homem e uma mulher se envolvem numa discussão acesa. Ela traz uma mala, será a “bagagem de sofrimento” de que falará o padre Camillo?Foi na cave do edifício que tudo começou, há mais de 35 anos: o padre Pedro Arrupe, que estava em Hiroxima quando a bomba nuclear foi lançada, viu as imagens dos boat people do Vietname e quis ajudar os refugiados. Além do apoio nos países asiáticos atingidos pela crise, grupos de voluntários organizaram-se em Roma para distribuir comida, organizar serviços de ambulatório, promover aulas de italiano. . . Hoje, é aqui que se concentram os serviços de distribuição de comida, duches, gabinetes de apoio médico e jurídico, serviços de apoio para a segurança social ou a vítimas de tortura. . . No último ano, mais de 14 mil pessoas foram aqui atendidas, só em Roma, mas o número chegou a cerca de 30 mil nas cinco estruturas do Centro Astalli/JRS em Itália. Uma realidade só possível com os 50 funcionários e 450 voluntários que ali trabalham. Um desses voluntários é Renzo Giannotti, 73 anos, farmacêutico aposentado que há dez anos faz o serviço ambulatório, complementando os dois médicos que dão consultas todas as tardes. É ele que guarda as fichas clínicas dos refugiados que por lá passam e que distribui os medicamentos (doados por outros amigos farmacêuticos ou alguns laboratórios) mais necessários para patologias menos graves — gripes, constipações, dores, problemas de digestão — ou para tratar alguns problemas crónicos. No Verão, 15 a 20 pessoas recorrem diariamente ao serviço. A maior parte são homens jovens, a média etária é de 25 anos. Os casos mais graves são enviados para especialistas amigos ou para as urgências hospitalares, se há necessidade de intervenção imediata. Oitenta por cento dos que procuram os diferentes serviços do Centro Astalli são muçulmanos — por isso, não se distribui álcool nas refeições ali servidas. “Aqui verifica-se um diálogo de vida. Quando o Papa veio, fez-se uma festa e quase todos eram muçulmanos”, conta Donatella Parisi. A maior parte dos que chegam são homens, mas muitos sírios vêm em família e, do Congo, há muitas mulheres que trabalham. Em 2015, o papa Francisco apelou a que instituições católicas convertessem as casas que estivessem vazias em centros de acolhimento de refugiados. Até agora, cerca de oito mil pessoas foram acolhidas nas 35 instituições que responderam imediatamente e noutras que o fizeram depois. Os Missionários Scalabrinianos — o nome vem do fundador, o bispo Giovanni Battista Scalabrini que, em 1887, fundou a congregação para trabalhar precisamente com os imigrantes pobres — fizeram-no, transformando o antigo seminário, vazio, na Casa Scalabrini. Residem ali 32 refugiados, a maior parte de origem africana — por lá já passaram mais de 120, nos últimos dois anos. Significativamente, além da capela que já existia na casa, criou-se um espaço para a oração muçulmana. “Não podíamos fazer mais nada do que abrir as portas e pensar em algo que fosse bom para as pessoas”, diz Emanuel Selleri, missionário leigo, que esteve antes na América do Sul e agora é um dos responsáveis da casa. “Eles vieram primeiro pelo deserto, depois pelo mar. Os que conseguem chegar vêm muito traumatizados e com medo de não serem aceites. ”Por isso, ali, em cerca de seis meses, sempre em comunidade, formam-se os refugiados para os munir de possibilidades de trabalho — língua italiana, carta de condução, noções básicas de economia, direitos e deveres de cidadão — e forma-se a população do bairro social em volta para acolher a diversidade. Uma rádio privada serve para os refugiados expressarem mais intimamente a sua história, os seus anseios, num momento “íntimo, quase terapêutico”. O padre Gabriele Beltrami, 47 anos, responsável pela comunidade, diz que há refugiados que querem regressar ao país de origem. Não é o que pensa o nigeriano Odine Gideon, que prefere ficar na Europa: no seu país, “não havia esperança, nada. . . ” Por causa destas situações, Emanuel acrescenta: “Fechar as fronteiras não é solução, este é mais um drama que esta política europeia e italiana está a colocar no nosso coração: fecham os portos, mas os refugiados chegam por outro lado. ” E o desabafo: “Como italiano, não posso mais com isto. . . ”O Centro Astalli também tem quatro casas para acolhimento e residência de refugiados. Num deles, o da via San Saba, residem 20 homens, actualmente, explica Giuseppe Coletta. Procura-se criar autonomia, neste caso através de um projecto experimental de trabalho em serigrafia. “Permite estabelecer relação entre pessoas que normalmente vivem sozinhas”, explica Donatella. Não tem havido só boas notícias, mesmo nestas instituições: houve paróquias onde várias pessoas abandonaram as missas, quando os párocos anunciaram o acolhimento de refugiados em instalações paroquiais. No início de Agosto, um gambiano acolhido na paróquia de Vicofaro, na Toscana, foi alvejado a tiro quando saiu à rua. Seria necessário alargar a rede de acolhimento e acção, diz Donatella, com católicos, outros cristãos, sindicatos e diferentes organizações. No Angolo del Pellegrino, criado há seis anos pelo padre Vittorio, também se faz a distribuição de comida e de roupa, há lavandaria, apoio médico e farmacêutico, apoio jurídico e para a burocracia do Estado. Não se gasta dinheiro, explica o capelão da prisão Regina Coeli, pois tudo é oferecido e recolhido por uma rede de voluntários. À hora de jantar — pão, bebida, arroz e frango para 30 pessoas —, vários carregam a bateria do telemóvel, objecto que permite a ligação ao mundo e o acesso a informação. Diariamente, há pequeno-almoço às 8h, pizza às 11h e uma ceia às 19h. Vinte pessoas podem dormir nos anexos da Igreja de San Giacomo. Ricardo, um romano de 50 anos (um dos poucos europeus), sem-abrigo, tem falta de trabalho e problemas cardíacos a mais. “Ao menos tenho comida. Caso contrário, ia para supermercados pedir esmola. ” Simon, 53 anos, veio do Líbano, ficou sem nada há um ano: separou-se da mulher, teve de ser operado, perdeu o trabalho. Hoje dorme na rua. Pedro Celeita guarda da visita do Papa à cadeia onde tem estado a recordação do momento em que Francisco lhe pediu: “Quando saíres em liberdade, toma um café e reza por mim. ”São amargos alguns cafés que Franck ainda toma. Há pouco tempo, num autocarro, uma mulher virou-se para ele a dizer que por sua causa é que o transporte estava cheio. “Em vez de pedirmos todos mais autocarros, sou eu o culpado por o autocarro ir cheio. Saí na paragem seguinte. Ou, se dou o lugar a alguém, ainda me dizem que a gentileza era ir para o meu país. ”Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. O machado que lhe fazem sentir em cima da cabeça não lhe corta a raiz do pensamento: “Vim para um continente democrático, supostamente civilizado, que deu muita coisa a África. Mas que descarrega sobre os refugiados e os imigrantes a ideia de que a crise é culpa nossa. ” E acrescenta: “As pessoas são mal informadas por muitos políticos, pelos meios de comunicação. Antes, os maus eram os italianos que emigravam ou os do Sul de Itália que vinham para o Norte. Hoje, somos nós. Raramente somos chamados para falar. . . ”A tortura a que Franck foi sujeito cicatrizou nas pernas. Continua, no coração, gravada a sangue.
REFERÊNCIAS:
Só quem chegue pelo acordo europeu tem estatuto de refugiado garantido
Refugiados que cheguem a Portugal fora do acordo europeu vão ter de apresentar o pedido de asilo junto do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. (...)

Só quem chegue pelo acordo europeu tem estatuto de refugiado garantido
MINORIA(S): Migrantes Pontuação: 5 Refugiados Pontuação: 21 | Sentimento 0.0
DATA: 2015-10-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: Refugiados que cheguem a Portugal fora do acordo europeu vão ter de apresentar o pedido de asilo junto do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.
TEXTO: Os refugiados que cheguem a Portugal fora do acordo europeu não têm a garantia de que lhes seja atribuído o estatuto jurídico de protecção internacional, alertou esta quinta-feira o coordenador da Plataforma de Apoio aos Refugiados . Em declarações à agência Lusa, Rui Marques, coordenador da Plataforma de Apoio aos Refugiados (PAR), desdramatizou os casos de portugueses que, por iniciativa própria, foram buscar famílias de migrantes para trazer para Portugal, mas salientou que estas pessoas não têm, à partida, a garantia de receber o estatuto de refugiado. Quando chegarem a território nacional, as famílias deverão apresentar o pedido de asilo, tal como está previsto na lei, para que possam ser acolhidos enquanto refugiados. "Se isso acontecer, acontece o mecanismo habitual de quem pede asilo em Portugal, quer uma resposta por parte do SEF [Serviço de Estrangeiros e Fronteiras], quer uma resposta humanitária do CPR [Conselho Português para os Refugiados] ou do Serviço Jesuíta aos Refugiados, que é quem tem mais serviço nesta área", explicou. Segundo Rui Marques, a partir do momento em que o pedido é feito, faz o circuito normal, cabendo ao SEF determinar se a pessoa reúne ou não as condições para ter o estatuto de refugiado. Adiantou que se as famílias de refugiados chegarem a Portugal via o acordo europeu que foi definido, e segundo o qual o país deverá receber entre 4500 e 5000 refugiados, "a nenhum será negado o estatuto jurídico de protecção internacional que irá ter porque já vêm para Portugal nesse pressuposto". "Quem por acaso vier fora desse circuito não tem, à partida, garantia dessa protecção. (. . . ) Não tem a certeza absoluta de que vai ter resposta positiva a esse pedido", apontou. Uma situação que, para Rui Marques, não deve ser dramatizada, assegurando que qualquer pessoa que peça asilo em Portugal será tratada "com toda a dignidade e com todo o respeito e com toda a eficiência por parte dos serviços públicos e por parte das organizações humanitárias que trabalham nesta área". O coordenador da PAR disse ainda que o motivo de preocupação dos portugueses que se aventuraram para ir buscar famílias de refugiados já se esbateu, agora que as autoridades europeias estão a conseguir dar uma resposta mais célere ao problema e lembrou que "Portugal vai começar a receber refugiados já". Na segunda-feira, o ministro-adjunto e do Desenvolvimento Regional, Poiares Maduro, anunciou que Portugal vai receber 30 refugiados durante a primeira quinzena de Outubro a pedido da Comissão Europeia no âmbito de um projecto-piloto.
REFERÊNCIAS:
Entidades SEF
Há 100 instituições e 144 autarquias disponíveis para receber refugiados em Portugal
Para já, prevê-se que apenas instituições acolherão refugiados, mas há cada vez mais famílias portuguesas a oferecerem apoio que o Conselho Português para os Refugiados admite vir a ser gerido pelas autarquias. Dois pais partem esta sexta-feira para a Croácia e Hungria para trazerem refugiados. (...)

Há 100 instituições e 144 autarquias disponíveis para receber refugiados em Portugal
MINORIA(S): Migrantes Pontuação: 5 Refugiados Pontuação: 21 | Sentimento 0.4
DATA: 2015-10-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: Para já, prevê-se que apenas instituições acolherão refugiados, mas há cada vez mais famílias portuguesas a oferecerem apoio que o Conselho Português para os Refugiados admite vir a ser gerido pelas autarquias. Dois pais partem esta sexta-feira para a Croácia e Hungria para trazerem refugiados.
TEXTO: Pelo menos 100 instituições em Portugal já se disponibilizaram para acolher refugiados no âmbito do programa europeu delineado para fazer face à crise resultante da guerra na Síria. Entre elas estão escolas, paróquias, empresas e instituições particulares de solidariedade social em todo o país. Segundo a Plataforma de Apoio aos Refugiados (PAR), que está articulada com o Governo e com o Conselho Português para os Refugiados (CPR), 50 já foram seleccionadas para acolher refugiados, enquanto outras 50 estão a terminar a fase de avaliação. Os números foram confirmados ao PÚBLICO por Rui Marques, presidente do Instituto Padre António Vieira, e um dos dinamizadores que tem liderado a PAR. Também a presidente do CPR, Teresa Tito de Morais, adiantou que 144 autarquias se mostraram disponíveis para acolher migrantes. Do total de 160 mil refugiados, a recolocar por toda a Europa, Portugal receberá entre 4500 e 5000, provenientes de Itália e Grécia. Deverão chegar no final de Novembro, segundo o CPR. O acolhimento desse número de refugiados, conforme as quotas acordadas recentemente entre os países europeus, está a ser preparado a nível interministerial em conjunto com o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF). Será feito pelos canais oficiais e através da PAR e do CPR. Neste âmbito, só instituições se poderão candidatar ao programa de acolhimento, apesar de serem cada vez mais as pessoas e famílias que nas redes sociais ou em contacto com estas entidades se oferecem para acolher refugiados nas suas casas. O plano do Governo não prevê, pelo menos para já, o acolhimento individual por famílias, mas já há sinais de que tal poderá alterar-se. O Ministério da Administração Interna e o SEF remeteram respostas para o gabinete do Ministro adjunto e do Desenvolvimento Regional que, porém, não enviou esclarecimentos em tempo útil. Teresa Tito Morais diz que têm chegado inúmeras ofertas ao CPR. De particulares, câmaras municipais, paróquias, misericórdias ou instituições particulares de solidariedade social. “Temos recebido muitas propostas que têm que ser coordenadas e estruturadas para serem operacionalizadas no terreno”, afirma. Relativamente às ofertas dos particulares, Teresa Tito Morais defende que as câmaras são as entidades mais bem preparadas para fazer a triagem e a avaliação das ofertas. “As câmaras que têm equipas multidisciplinares é que podem coordenar estes apoios, nomeadamente fazer uma avaliação para perceber se as famílias candidatas possuem de facto condições para receber os refugiados”, sustenta. O Grupo de Trabalho dos Refugiados, criado recentemente a nível interministerial, reúne-se na manhã desta sexta-feira no SEF, em Lisboa, pela primeira vez com a PAR, o CPR e a Associação Nacional de Municípios Portugueses. O encontro deverá ser decisivo quanto à eventual assinatura de memorandos com estas entidades. Uma questão importante para organizar e definir as fases de trabalho que se aproximam. As instituições que recebam refugiados terão de cumprir uma série de requisitos obrigatórios, entre eles o fornecimento de alojamento autónomo, alimentação e vestuário, apoio à integração laboral, apoio no acesso à educação das crianças, apoio no acesso à saúde e apoio à aprendizagem do português. Como podem fazer as pessoas e famílias que desejem contribuir para o acolhimento? “As pessoas que queiram podem contribuir com a doação de verbas através do PAR — Linha da frente. É um projecto que prevê a recolha de fundos até ao final deste ano. As verbas serão de imediato enviadas para a Cáritas Médio Oriente e para o Serviço de Jesuítas no Médio Oriente Oriente e Norte de África, particularmente Síria, Líbano e Jordânia, no apoio a refugiados e deslocados internos”, explicou Rui Marques. Existem ainda iniciativas de recolha de fundos como a que ocorreu na noite desta quinta-feira no Teatro da Trindade, onde o Chapitô apresentou a peça Édipo. As receitas reverteram para a campanha. O site da Plataforma deixa ainda sugestões a quem queira ajudar a título individual. Quem quiser poderá escolher a via do voluntariado e apoiar as instituições de acolhimento, apoiar na divulgação da campanha da PAR ou contactar a plataforma se estiver interessado em fazer uma “oferta específica de bens ou serviços”. Há, porém, quem não se contente com estas opções institucionais e não fique sentado a aguardar que o Governo resolva o problema, concordando, aliás, com o mote da PAR no seu site dado pelos versos de Sophia de Mello Breyner Andresen: “Vemos, ouvimos e lemos. Não podemos ignorar”. Por isso, dois pais de família, ambos com formação em Direito, partem de Lisboa na noite desta sexta-feira a caminho das fronteiras da Croácia ou da Hungria. Cada um, trará uma família de cinco pessoas. Nuno Félix e Pedro Policarpo conseguiram contactar com organizaçções não-governamentais que estão nessas regiões e estão em contacto com refugiados e vão preparar o seu resgate.
REFERÊNCIAS:
Entidades SEF
Khuloud Kalthoum, a refugiada síria que ajuda outros migrantes a sentirem-se em casa
Despediu-se da Síria há três anos e escolheu Portugal para prosseguir os estudos. Em 2017 conheceu o Speak, um programa de integração de estrangeiros e refugiados através de línguas, e agora começou uma campanha de crowdfunding para sedimentar o projecto em Braga (e não só). (...)

Khuloud Kalthoum, a refugiada síria que ajuda outros migrantes a sentirem-se em casa
MINORIA(S): Migrantes Pontuação: 5 Refugiados Pontuação: 21 | Sentimento -0.12
DATA: 2018-06-30 | Jornal Público
SUMÁRIO: Despediu-se da Síria há três anos e escolheu Portugal para prosseguir os estudos. Em 2017 conheceu o Speak, um programa de integração de estrangeiros e refugiados através de línguas, e agora começou uma campanha de crowdfunding para sedimentar o projecto em Braga (e não só).
TEXTO: Num país que não é o seu e rodeada por uma língua que não é a sua, foi a ler livros infantis, como Ali Babá e os 40 Ladrões, que Khuloud Kalthoum aprendeu, pouco a pouco, a língua portuguesa. Aos 26 anos, deixou Damasco devido à guerra e chegou a Portugal em 2015, ao abrigo da Plataforma Global para Estudantes Sírios (GP4SS), organização fundada pelo ex-presidente Jorge Sampaio, para prosseguir os estudos. Por causa disso, conhece em primeira mão as dificuldades que os migrantes e refugiados encontram enquanto se estão a adaptar a uma nova vida. Agora, a jovem síria quer fazer a sua parte e contribuir para que quem está nessa situação se sinta “em casa numa cidade estrangeira. ” A viver em Braga, Khuloud criou agora uma campanha de angariação de fundos para sedimentar o Speak, projecto que promove cursos de línguas e actividades de integração entre nativos e estrangeiros, e que já está em funcionamento na cidade desde Setembro de 2017. “A missão do Speak é juntar pessoas, quebrar barreiras linguísticas e fazer amigos”, explica Khuloud, à mesa de um café no Porto. “Conheço uma família síria em Braga que chegou a Portugal há um ano e nunca se sentiu à vontade para contactar com os portugueses. Por isso, na semana passada, fizemos um jantar sírio com essa família e os estudantes do curso de árabe e sinto que isso os ajudou a ganhar confiança”, acrescenta. É, aliás, o que a rede Speak ambiciona, desde os primeiros passos em Leiria em 2013: ligar locais e estrangeiros através do intercâmbio de línguas e culturas. O projecto propõe, do mesmo modo, ajudar a integrar pessoas migrantes e refugiadas, quebrando estigmas, promovendo a igualdade e criando, pelo meio, redes de suporte informal entre os participantes. A fundadora do grupo bracarense quer alicerçar o projecto e, para isso, lançou uma campanha de crowdfunding em conjunto com o colectivo Desert Sailors. O grupo de sete aventureiros portugueses vai participar no Rally da Mongólia para angariar 20 mil euros para ajudar a jovem refugiada a expandir o Speak em Braga e até a outra cidade portuguesa. A Google já se juntou ao desafio e irá doar um euro por cada euro angariado. De momento, já conseguiram angariar mais de nove mil euros. “A equipa do Speak não poderia estar mais perto do meu coração", confessa Khuloud. "Mudar de cidade ou de país nunca é fácil, mas consegui ultrapassar esses desafios e agora estou a fazer a minha parte, quero ajudar pessoas a integrarem-se numa nova comunidade. Em Braga, tenho uma rede de amigos fantástica, sinto-me em casa e acho que todas as pessoas têm direito a sentirem-se em casa numa cidade estrangeira. ”Em 2011, quando eclodiu o conflito na Síria, Khuloud estudava Engenharia Electrotécnica na Universidade de Damasco. “Sempre quis ser engenheira”, conta Khuloud. Filha de um engenheiro, a jovem cresceu a ouvir o pai falar sobre linhas aéreas e transformadores. Por isso, quando concluiu o ensino secundário, fez-lhe todo o sentido optar por uma licenciatura de cinco anos na mesma área. Nessa altura, o país tinha um sistema de ensino superior em expansão, com um quinto da população entre os 18 e os 24 anos a frequentar universidades, mas o conflito forçou mais de 200 mil sírios a desistirem dos estudos, segundo números do Institute of International Education. Khuloud concluiu a licenciatura, mas viu-se impedida de prosseguir para o mestrado. Viveu de perto a guerra e sentiu na pele as suas consequências. “Damasco é mais seguro do que outras cidades, mas todos os dias víamos bombardeamentos e vi muitos colegas morrerem. Sentia muita insegurança, quando saía de casa não tinha a certeza se iria voltar”, confessa a jovem, que recorda “de coração apertado” a família que deixou naquela cidade em ruínas. “A guerra já dura há sete anos e até hoje a situação não está estável, mas as pessoas estão habituadas", diz. "Para os mais velhos", refere, comovida, "não é fácil mudar de país, mas para os jovens é obrigatório fugir". Foi o que os seus irmãos fizeram: o mais velho trabalha na Holanda e o mais novo, Ahmad, seguiu os passos da irmã e estuda Engenharia Civil na Universidade de Aveiro, também com uma bolsa da plataforma criada por Jorge Sampaio. De acordo com um relatório do Alto Comissariado para as Migrações de Dezembro de 2017, Portugal é o sexto país da União Europeia com o maior número de refugiados acolhidos no âmbito do programa de recolocação, tendo recebido 1520 cidadãos entre 2015 e o final de 2017. Em Damasco, Khuloud tem ainda os pais e uma irmã, que nunca mais viu depois de se mudar para Portugal, já lá vão três anos. “As saudades são imensas, mas é muito difícil regressar ou trazê-los a Portugal, por isso estamos à espera que as coisas acalmem", diz, de sorriso no rosto e olhos brilhantes. "Costumamos falar por Skype, falo com o meu pai sobre o trabalho e a vida cá. Ele diz que tem muito orgulho em mim. ”A vinda para Portugal trouxe desafios e dificuldades, mas também uma nova esperança a Khuloud. A língua e a cultura foram algumas das maiores diferenças que a jovem encontrou, mas nunca se sentiu sozinha: “Vivi em Vila do Conde, no Porto e em Braga e tive sempre pessoas muito simpáticas comigo, que me ajudaram com a língua e na adaptação. ”Apesar de agora já ser fluente em português, em 2015 Khuloud chegou ao Porto sem saber uma palavra. Ainda assim, optou por ter as aulas do mestrado em Energias Sustentáveis em português, em vez de optar pela oferta lectiva direccionada para os estudantes internacionais — e não se arrepende. Durante três meses, frequentou ainda um curso de português com um grupo de estudantes sírios. Como não foi suficiente, apostou também em aulas privadas. “Comecei a ler livros infantis, lembro-me bem de ler o Ali Babá e os 40 Ladrões, repetia frase atrás de frase”, recorda a jovem síria, que entretanto se apaixonou pela literatura portuguesa. Era a única estrangeira no mestrado do Instituto Superior de Engenharia do Porto, mas quando alguém tentava iniciar uma conversa em inglês, escusava-se: “Dizia ‘não, eu quero praticar o português, falem em português’. ” O primeiro ano foi o mais difícil, mas com esforço foi superando as dificuldades e acabou mesmo por escrever a tese em português — que concluiu com 17 valores — e hoje gosta muito de ler na língua de Camões. Seguiu-se um estágio curricular e profissional na EDP e, ao receber uma proposta de trabalho na empresa, mudou-se para Braga. Para Khuloud, estar parada não é opção. É voluntária do serviço de leitura especial da Biblioteca de Vila Nova de Gaia, que coloca à disposição de pessoas com deficiência livros em braille, áudio ou em formato digital, e frequenta diversas formações de empreendedorismo, inovação e serviços sociais. Agora, no Speak, vê a “oportunidade ideal” para aplicar as suas competências. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Foi na maratona de programação Hack For Good — que no ano passado procurava soluções tecnológicas para ajudar refugiados — que Khuloud conheceu o projecto Speak. Ao ouvir a apresentação de Hugo Menino Aguiar, o fundador da plataforma, ficou tão entusiasmada que quis saber mais. O projecto, criado em 2013, proporciona cursos de línguas com a duração de três meses, para estrangeiros, assim como uma série de actividades de integração. As aulas, de hora e meia, em horário pós-laboral, acontecem uma vez por semana e são dadas por buddies, voluntários que abrem mão do seu tempo livre para transmitir os seus conhecimentos a quem precisa. “Qualquer pessoa pode ir ao site e inscrever-se para aprender um idioma ou então ensinar o seu ou outra língua que fale bem”, refere a jovem síria, actualmente a leccionar um curso de árabe em Braga, onde já existem 200 pessoas inscritas. “Temos oito participantes portugueses que estão mesmo empenhados em aprender árabe e vamos ainda abrir aulas de inglês e italiano. ”Os cursos são gratuitos para os buddies; já os participantes pagam 25 euros por curso para ajudar a cobrir as despesas com a logística e arrendamento de espaço. A par dos cursos de línguas, o Speak oferece também os Language Exchanges, eventos sociais que promovem a integração e onde é possível colocar em prática os conhecimentos linguísticos aprendidos durantes as aulas. Ao todo, o Speak chega hoje a mais de 14 mil pessoas, estando presente em sete cidades portuguesas (Leiria, Amarante, Aveiro, Braga, Coimbra, Lisboa e Porto) e três no estrangeiro (Berlim, Madrid e Turim). É uma forma, diz a engenheira, de abrir a mente: “No final, os refugiados e migrantes sentem-se integrados na comunidade e os locais aprendem novas línguas e conhecem outras culturas. ”
REFERÊNCIAS:
Partidos LIVRE
Apoio que Portugal dá aos refugiados é “casuístico, isolado, descoordenado"
O Governo “abandonou” e deixou de dialogar com as organizações civis responsáveis pela reintegração dos refugiados. A partir do terreno, responsáveis apontam vários entraves à autonomização dos milhares de refugiados que Portugal se predispôs a acolher. (...)

Apoio que Portugal dá aos refugiados é “casuístico, isolado, descoordenado"
MINORIA(S): Migrantes Pontuação: 5 Refugiados Pontuação: 21 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-14 | Jornal Público
SUMÁRIO: O Governo “abandonou” e deixou de dialogar com as organizações civis responsáveis pela reintegração dos refugiados. A partir do terreno, responsáveis apontam vários entraves à autonomização dos milhares de refugiados que Portugal se predispôs a acolher.
TEXTO: Dos atrasos do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) na emissão de documentos que levam à perda de contratos de trabalho, à inexistência de aulas de português quando não está reunido um número mínimo de alunos, passando pela ausência de diálogo entre as instituições envolvidas, a integração dos refugiados em território português parece longe de se poder declarar como bem-sucedida. Desde Dezembro de 2017 - há um ano, portanto - que o Governo não reúne com as organizações da sociedade civil responsáveis pelo acompanhamento dos refugiados no terreno, segundo as organizações ouvidas pelo PÚBLICO depois de conhecidos os problemas com as três famílias de sírios que se viram sem água e sem electricidade em Miranda do Corvo, distrito de Coimbra. Por causa disso, aponta André Costa Jorge, coordenador da Plataforma de Apoio aos Refugiados (PAR), o apoio a esta população é “casuístico, isolado, descoordenado”. “Temos mesmo de voltar a encontrar mecanismos de trabalho integrado e em rede, para que todos saibamos que respostas existem e como podem ser operadas, e abandonemos a lógica de resolver os problemas em cima da emergência”, acrescentou o coordenador da PAR, reivindicando assim a filosofia de funcionamento em rede criada em 2015, quando Portugal se candidatou a acolher os primeiros refugiados, e que foi, entretanto, abandonada. “Estamos numa espécie de indefinição, sem uma liderança clara. E é fundamental que todos os refugiados saibam com que linhas se podem coser”, reforça André Costa Jorge, para quem, a pronta disponibilização do ministro com a tutela da Segurança Social, Vieira da Silva, para prolongar os apoios aos sírios em Miranda do Corvo só vem reforçar “as situações de desigualdade no tratamento e de desarticulação”. À chegada, os refugiados podem contar à partida com um acompanhamento que se pode prolongar por 18 meses, num pacote que incluí apoios no acesso à regularização do estatuto de refugiado, à habitação, ao emprego, à escola e à aprendizagem da língua portuguesa. E a primeira a apontar a urgência em rever o sistema de apoio aos refugiados em Portugal foi a presidente do Conselho Português para os Refugiados (CPR), Teresa Tito de Morais. “A primeira interrogação é se, num cenário em que os apoios se prolongassem por 24 meses, chegaríamos ou não ao fim desse tempo com as mesmas dificuldades de autonomização das pessoas”, adianta, dizendo-se convicta de que o investimento conducente à autonomização tem começar a ser feito logo à chegada. A questão são as dificuldades que as organizações sentem na prossecução deste objectivo. Desde logo, na aprendizagem da língua. “É diferente de sítio para sítio: nalguns o ‘português para todos’ exige um número mínimo de inscritos e, quando não há, as aulas não têm lugar”, acusa. Somam-se a isto os atrasos na obtenção da documentação necessária para que os refugiados possam, por exemplo, assinar um contrato de trabalho. “O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras [SEF] não tem conseguido emitir os documentos com a rapidez desejável”, denuncia. A investigadora Lisa Matos (que à experiência no terreno com refugiados, em Portugal mas também nos Estados Unidos da América, soma a investigação académica sobre o tema) confirma os atrasos do SEF. “Quando os refugiados chegam, é-lhes dada rapidamente uma autorização provisória de residência, renovada de seis em seis meses até que haja uma decisão que confirme que aquela pessoa tem direito ao estatuto de asilo. Mas, muitas vezes, o intervalo entre o fim da validade do documento provisório e a emissão do seguinte faz com que as pessoas percam o contrato de trabalho. Mas não é só. A presidente do CPR, reconhecendo embora a capacidade das escolas em absorver as crianças refugiadas e o acesso aos cuidados de saúde, aponta outras falhas: na saúde mental, por exemplo, é mais difícil garantir a assistência aos refugiados que chegam, em boa parte dos casos, com traumas de guerra e de perseguição. Mais: “Ao fim de 12 meses é possível antecipar que uma dada família terá dificuldades em autonomizar-se até ao fim do programa. Mas, mesmo que o caso seja sinalizado com antecedência e numa lógica prevenção, a Segurança Social só actua quando decorrem os 18 meses”. Dito de outro modo, “as organizações civis foram deixadas sozinhas”, acrescenta a presidente do CPR, reivindicando a reactivação das reuniões interministeriais com SEF, Alto Comissariado, Segurança Social e organizações no terreno. Portugal tem sido um bom exemplo de abertura de portas aos refugiados no espaço europeu. Nas contas do Ministério da Administração Interna (MAI), Portugal acolheu 1552 refugiados naturais da Síria, Iraque e Eritreia mas provenientes da Grécia e da Itália, ao abrigo do programa de recolocação da União Europeia, entre Dezembro de 2015 e Março de 2018. Ao abrigo deste programa, em que os refugiados foram disseminados por 99 cidades portuguesas, o país recebeu, segundo informações do gabinete da ministra da Presidência e da Modernização Administrativa, Maria Manuel Leitão Marques, seis mil euros por pessoa. Àqueles 1552 “recolocados”, cujo programa terminou em Março, somam-se 171 refugiados chegados de países terceiros – Turquia, Egipto e Marrocos -, no âmbito do subsequente Programa Voluntário de Reinstalação, dinamizado pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR). Ao longo deste e do próximo ano, prevê-se a chegada de mais 1010 cidadãos, ao abrigo deste programa. Acrescem os 1008 pedidos de protecção que Portugal recebeu em 2017, os chamados “espontâneos”, isto é, pessoas que chegaram isoladamente às fronteiras portuguesas em busca de asilo, vindas de Angola, Congo, Eritreia, Paquistão e Sudão, entre outros. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. “Este ano já chegaram 960 pedidos ‘espontâneos, o que nos leva a concluir que, no final de 2018, vamos ultrapassar os 1010 do ano passado”, acrescenta Teresa Tito de Morais, aproveitando para lembrar as dificuldades de tesouraria criadas pelo recurso “a colónias balneares, pensões e quartos” – solução encontrada para responder a este aumento dos pedidos: “É certo que o MAI acaba por cobrir estas despesas, mas o pagamento não acompanha a despesa. ”Em paralelo, e porque Portugal se posicionou para responder às situações de emergência que resultam dos resgates de migrantes no Mediterrâneo, chegaram este ano a Portugal 86 pessoas resgatadas por navios humanitários. Tudo somado, são milhares de refugiados em solo português. Mas as contas não são líquidas, porquanto se calcula que, entre os 1552 refugiados chegados ao abrigo do programa de recolocação, “entre 40% a 50% abandonaram o país”, segundo Lisa Matos. “Muitos foram para a Alemanha que está agora a mandá-los de volta”, confirma o coordenador da PAR. “Não foram para Alemanha só porque conheciam lá alguém”, reforça Lisa Matos. “Foram porque as coisas não correram bem no seu processo de reintegração”. Para a investigadora, “o país não deve dar o passo seguinte em termos de acolhimento de novos refugiados sem ouvir da boca dos refugiados que cá estão o que não correu bem”. Se assim não for, “se os refugiados não forem ouvidos, continuaremos a cometer erros, por mais boa vontade que haja”.
REFERÊNCIAS:
Ministros da UE adiam decisão sobre redistribuição de refugiados
Mantém-se o impasse após a cimeira extraordinária sobre a crise de refugiados em Bruxelas. Alemanha, Áustria, Eslováquia e Holanda recuperam controlos fronteiriços, e o primeiro-ministro da Hungria sobe a parada: a partir desta terça-feira, a passagem não autorizada dará direito a prisão. (...)

Ministros da UE adiam decisão sobre redistribuição de refugiados
MINORIA(S): Migrantes Pontuação: 2 Refugiados Pontuação: 21 | Sentimento 0.0
DATA: 2015-09-15 | Jornal Público
SUMÁRIO: Mantém-se o impasse após a cimeira extraordinária sobre a crise de refugiados em Bruxelas. Alemanha, Áustria, Eslováquia e Holanda recuperam controlos fronteiriços, e o primeiro-ministro da Hungria sobe a parada: a partir desta terça-feira, a passagem não autorizada dará direito a prisão.
TEXTO: Indiferentes às críticas dos manifestantes que denunciaram o falhanço da Europa na resposta à crise de refugiados, os ministros do Interior e Administração Interna da União Europeia (UE), reunidos nesta segunda-feira numa cimeira extraordinária em Bruxelas, concordaram em financiar a construção de novos campos de acolhimento longe do continente, para travar o afluxo, mas não conseguiram consenso para a redistribuição de milhares de pessoas que já fizeram a viagem. A cimeira de "emergência" foi convocada há mais de duas semanas para discutir o êxodo das populações em fuga da guerra na Síria, da ameaça do Estado Islâmico no Iraque e na Líbia, da violência dos taliban no Afeganistão ou da pobreza extrema e repressão política na Eritreia, e que buscam santuário, asilo político ou abrigo nos países mais ricos da Europa – o maior movimento de refugiados no continente desde a Segunda Guerra Mundial, que dividiu a "Velha" e a "Nova" Europa e expôs enormes fracturas entre os Estados-membros. Se ninguém criticou os planos e as políticas pensadas para fortalecer as fronteiras, como se esperava, os ministros dividiram-se quanto à proposta da Comissão Europeia para a redistribuição de 160 mil requerentes de asilo político actualmente em Itália, na Grécia e na Hungria, as três principais portas de entrada na UE: o sistema de quotas, de aplicação obrigatória, é ferozmente criticado pelos Estados do Leste (Polónia, República Checa, Eslováquia, Roménia e Hungria) e merece sérias reservas aos bálticos. Em Bruxelas para pressionar os dirigentes da UE, o Alto-comissário da ONU para os Refugiados, António Guterres, aconselhou os ministros a acertar finalmente uma estratégia que permita pôr fim ao sofrimento de milhares de pessoas. “Vivemos numa situação de caos e de confusão no interior da UE, e é absolutamente necessário que este Conselho seja um passo decisivo para pôr a casa em ordem e permitir à Europa dar uma resposta adequada aos desafios colocados por esta crise migratória e de refugiados”, considerou. O máximo que a Comissão conseguiu arrancar aos líderes no encontro foi o “compromisso” para um acordo nos termos definidos por Jean-Claude Juncker – além de terem adiado uma decisão formal sobre os detalhes desse plano para 8 de Outubro, os ministros desvalorizaram a proposta actual como um “rascunho”. Em conferência de imprensa, o ministro francês, Bernard Cazeneuve, e o seu congénere alemão, Thomas de Maiziere, informaram que “não foi tomada nenhuma decisão em termos de quotas ou de redistribuição” para além do acordo de princípio. "Uma grande maioria dos Estados está comprometida com os princípios para uma relocalização [dos refugiados], mas nem todos estão para já a bordo", admitiu o ministro luxemburguês Jean Asselborn, que presidiu à reunião. Entre as ideias apreciadas na reunião estavam planos (descritos como “radicais”) para a detenção de “migrantes irregulares”, bem como a organização de “unidades de recepção e acolhimento temporário” para a rápida identificação e registo dos candidatos a asilo que chegam à Grécia e a Itália através do mar Mediterrâneo – mas nada de concreto para além da garantia de relocalização dos indivíduos com direito à protecção internacional e da deportação daqueles fora dessa categoria. “O controlo efectivo da fronteira [exterior da EU] é um imperativo para a gestão migratória”, insistia o documento apresentado aos ministros. Antes de se sentarem à mesa em Bruxelas, vários governos suspenderam a livre circulação prevista nos acordos de Schengen e reintroduziram controlos nas fronteiras que, em caso de emergência, podem manter-se em vigor por um período máximo de dois meses. O fim do sistema Schengen?À Alemanha, que tomou essa decisão no domingo, alegando uma pressão incomportável após a chegada de mais de 12 mil refugiados a Munique na véspera, seguiram-se esta manhã a Áustria, que mobilizou as Forças Armadas para uma missão de auxílio humanitário na fronteira com a Hungria, e a Eslováquia, que chamou a polícia para "detectar a presença de contrabandistas", justificou o ministro do Interior, Robert Kalinak. "Não se trata de controlo de fronteira no sentido clássico", acrescentou. Na Alemanha, em menos de 24 horas, foram detidos 25 indivíduos sob suspeita de tráfico de seres humanos. Também a Holanda recuperou as inspecções aleatórias nas regiões fronteiriças – uma medida "preventiva" depois de 3000 refugiados terem procurado abrigo no país na semana passada (o dobro da semana anterior). Pelas estimativas do Governo, os centros de abrigo atingirão a capacidade máxima antes do fim do mês. A primeira-ministra da Polónia, Ewa Kopacz, confirmou que não hesitará em fechar as fronteiras assim que forem detectadas "ameaças externas" à segurança nacional, uma definição ambígua que se recusou a explicitar.
REFERÊNCIAS:
Partidos LIVRE