O “rebelde” que mostrou que “a grande cozinha pode estar em qualquer lado”
Criado em New Jersey, Bourdain começou desde cedo a interessar-se pela cozinha. Casou-se e divorciou-se por duas vezes – e do segundo casamento, com Ottavia Busia, teve uma filha, agora com 11 anos. Morreu nesta sexta-feira, aos 61 anos. (...)

O “rebelde” que mostrou que “a grande cozinha pode estar em qualquer lado”
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.8
DATA: 2018-06-21 | Jornal Público
SUMÁRIO: Criado em New Jersey, Bourdain começou desde cedo a interessar-se pela cozinha. Casou-se e divorciou-se por duas vezes – e do segundo casamento, com Ottavia Busia, teve uma filha, agora com 11 anos. Morreu nesta sexta-feira, aos 61 anos.
TEXTO: Era um irreverente. De língua afiada e um estômago sedento de experiências. Muitas vezes divertido, outras tantas soturno. Sem medo de expor o que era, sentia ou pensava. Mostrava na televisão aquilo que era quando as câmaras se desligavam. “Quem gosta gosta. Quem não gosta not my problem”, recorda agora Henrique Sá Pessoa. Para lá da imagem entre o bad boy e o rock star, que transmitia nos livros e nos programas de televisão, é essa “honestidade” e “genuinidade”, aliada à capacidade de provar que a “grande cozinha pode estar em qualquer lugar”, que Anthony Bourdain deixa como legado. O chef, escritor e apresentador de televisão norte-americano morreu nesta sexta-feira, aos 61 anos. Bourdain foi encontrado inconsciente pelo amigo e chef francês Eric Ripert no quarto de hotel em Estrasburgo, onde se encontrava a gravar um episódio para a série televisiva Parts Unknown, transmitida pela CNN. De acordo com o procurador francês Christian de Rocquigny du Fayel tratou-se de um caso de suicídio. “Anthony era o meu melhor amigo. Um ser humano excepcional, tão inspirador e generoso. Um dos grandes contadores de histórias, que tocou tanta gente. Rezo para que esteja em paz do fundo do meu coração”, reagia Eric Ripert momentos mais tarde no Twitter. Depois de duas décadas a trabalhar em restaurantes, dos pratos lavados numa marisqueira em Cape Cod à liderança de cozinhas sofisticadas em Nova Iorque, Bourdain largou os tachos para se reinventar como escritor e, mais tarde, como apresentador de televisão. Não para esquecer a gastronomia, mas para revelar ao mundo os seus lados ocultos: por um lado, o negrume das histórias de “sexo, drogas e mau comportamento” escondidas na alta cozinha; por outro, a qualidade negligenciada das comidas mais humildes — e sui generis — dos quatro cantos do mundo. “Se olharem para o que as pessoas comem, como comem, em que circunstâncias, o que cozinham, o que lhes dá prazer, aprende-se muito sobre essas pessoas. É uma maneira rápida, talvez a mais rápida, de conhecermos uma cultura”, defenderia Bourdain em 2011, quando dedicou a Lisboa um episódio do programa Não Aceitamos Reservas (No Reservations na versão original). Era já a personalidade irreverente e humorada que mais se destacava em Bourdain quando o norte-americano foi trabalhar para o Brasserie Les Halles, em Manhattan, propriedade do português José Meirelles. “Pusemos um anúncio no New York Times e ele era um dos candidatos”, recorda o empresário ao telefone. “Gostei logo dele pelo currículo, mas principalmente pela personalidade. ” Nas alturas de maior stress na cozinha, em que acabavam a “berrar” uns com os outros, Bourdain era uma “lufada de ar fresco”, conta Meirelles. “Reagia sempre com humor ou de forma sarcástica, criando um ambiente muito melhor. ”Ao telefone, o antigo patrão recorda a última vez que estiveram juntos. “Foi um almoço divertido em casa da minha mãe, em Celorico de Basto”, conta. Já tinham terminado as gravações do episódio sobre o Porto para o programa Viagem ao Desconhecido (Parts Unknown no original), filmado e transmitido no ano passado, e aquele era o único desvio ao programa. Tal como 12 anos antes, voltaram a ter uma matança de porco, experiência que Bourdain tinha vivido pela primeira vez ali e classificado como “verdadeiramente perturbadora”. O estômago de ferro fazia parte da imagem que o catapultou para a ribalta televisiva. Raramente dizia que não ao que lhe colocavam no prato. De testículos crus de carneiro a olho cru de foca ou ovos de formiga. No Porto, o programa não foi tão desafiador, mas o suficiente para impressionar quem viajava com ele. Num dia em que “chovia torrencialmente”, recorda Avelino Freitas, presidente da Associação Profissional de Pescadores do Cais do Ouro, Bourdain e a equipa de filmagens fizeram-se ao estuário do Douro para pescar lampreia. “Estava mau tempo, um dos operadores de câmara recusou-se a entrar no barco e teve de ser substituído. ” Bourdain, garante ao telefone Avelino Freitas, nunca vacilou. “Mostrou-se sempre interessado e fez imensas perguntas. ” Depois da faina, foi em casa de um pescador, Pedro Cachote, que a lampreia foi preparada. “Aqui usamos o método de lhe arrancarmos a pele. Uma pessoa da produção sentiu-se mal e desmaiou. Ele não, sempre a querer saber tudo. ” E quando chegou a hora de comer, Anthony Bourdain ficou “fascinado”. Serviu-se uma vez, duas, três. “Adorou. Foi um almoço que passou de duas horas. E depois ficámos ali em amena cavaqueira. ”Para Sergi Arola, “haverá um antes e um depois de Anthony Bourdain” no que à divulgação da gastronomia diz respeito. “De todos os bad boys que fizeram programas de televisão, ele era o mais interessante e o mais diferenciador. Os programas dele são ferramentas maravilhosas para entendermos a gastronomia de cantos do mundo onde seguramente a maioria de nós nunca irá”, afirmou à Fugas em declarações à margem do festival The Art of Flavours, que está na decorrer no Funchal. Para o chef do LAB by Sergi Arola (Penha Longa Resort, uma estrela Michelin), Anthony Bourdain “inventou uma maneira de comunicar a gastronomia”. “Num determinado momento da vida, procurei referências e encontrei-as em cozinheiros que já não se dedicavam à cozinha, como era o caso dele. ” E continua: “Hoje não se pode entender personalidades como David Muñoz [restaurante DiverXo, Madrid, três estrelas Michelin] sem que se fale numa espécie de herança de Bourdain. ” É por isso, diz Arola, que o legado de Bourdain é “valiosíssimo” e “irrepetível”. Ljubomir Stanisic conheceu-o em Lisboa, quando Bourdain esteve na capital portuguesa para filmar o episódio de No Reservations, em 2012. “Foi um cozinheiro que nos inspirou a todos, que personificava aquela ideia de fazermos as coisas como achávamos que deviam ser feitas, sem regras nem medos, dentro e fora da cozinha”, recorda agora em comunicado. Para o chef do restaurante 100 Maneiras, Bourdain era um “rebelde com causas” e um dos primeiros a mostrar que “a grande cozinha pode estar em qualquer lugar, dos melhores restaurantes à casa mais humilde, fazendo com que o mundo se apaixonasse pela aventura de comer”. É essa faceta de Bourdain que Henrique Sá Pessoa escolhe destacar. “Era uma pessoa por quem tinha imensa admiração. Tinha aquela atitude: ‘Eu sou assim. Quem gosta gosta. Quem não gosta not my problem. ’” Para o chef do Alma, com quem Bourdain visitou o Mercado de Alvalade e “comeu tudo o que havia para comer” na Cervejaria Ramiro, era essa “honestidade e transparência”, esse “lado cool, mas ao mesmo tempo genuíno”, que diferenciava o chef norte--americano. “É uma grande perda para o mundo cultural gastronómico. O Bourdain era uma figura importante na divulgação da gastronomia mundial e ficamos mais pobres sem ele. ”Criado em New Jersey, Bourdain começou desde cedo a interessar-se pela cozinha. Quando aos nove anos viajou por França, pela primeira vez, num cruzeiro, já começava a associar a comida à descoberta. Numa entrevista ao Guardian, lembra como os pais o deixaram no carro, enquanto jantavam num restaurante, em Vienne. “Reagi pedindo ostras e pratos que eles consideravam repulsivos e tornando-me cada vez mais aventureiro nos meus gostos. ”Depois de dois anos na Vassar College, Bourdain desistiu da faculdade e entrou mais tarde no também conceituado Culinary Institute of America, terminando o curso em 1978. Em Nova Iorque passou por uma série de restaurantes, como o Rainbow Room, W. P. A. e o italino Gianni’s. Um dos seus maiores arrependimentos, contou à Newsweek, foi ter aceitado o cargo de chef muito rapidamente, em vez de procurar “posições baixas em excelentes restaurantes”. Chegou a chefiar, nos anos 1990, restaurantes de topo: primeiro o Sullivan’s, na zona da Broadway, e depois o Les Halles. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Casou-se e divorciou-se por duas vezes — e do segundo casamento, com Ottavia Busia, teve uma filha, agora com 11 anos. Há dois anos que namorava com a actriz e realizadora Asia Argento, uma das mulheres que acusaram Harvey Weinstein de assédio. No seguimento do escândalo em Hollywood e da disseminação do movimento #MeToo, o chef veio pronunciar-se contra o assédio sexual na restauração e a “cultura institucionalizada de meatheads [brutamontes] na área da restauração”. Em entrevista ao Guardian, Bourdain revelou que ao longo da vida os seus gostos tornaram-se “cada vez mais simples”. “As comidas que realmente me fazem feliz, que têm um verdadeiro apelo emocional, são a simples taça de massa, noodles picantes vendidos no Vietname ou o rolo de carne da avó de alguém”, contou ao jornal. “Na verdade não quero saber o que as pessoas dirão de mim quando morrer. Imagino que [o autor] Jerry Stahl faria uma história divertida — mesmo que não lisonjeadora — com detalhes tenebrosos”, disse o chef em 2017, em entrevista ao New York Times.
REFERÊNCIAS:
Turquia, um pot pourri de culturas
A leitora Manuela Santos partilha a sua experiência em Istambul. (...)

Turquia, um pot pourri de culturas
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-06-21 | Jornal Público
SUMÁRIO: A leitora Manuela Santos partilha a sua experiência em Istambul.
TEXTO: Envolvente e apaixonante, a Turquia embriaga-nos, baralha-nos os sentidos. É certo que sultões gorduchos, tapetes voadores e turcos conquistadores povoaram o meu imaginário infantil, mas não é razão suficiente. Que mistério é este que paira pelo ar nas ruas e ruelas de Istambul e, mesmo saindo para outros lugares, persegue-nos, cola-se à nossa pele. Respira-se quando olhamos do alto da Torre Gálata para uma cidade maravilhosa, dourada pelo sol que vai tombando em cada tarde que termina. Salpicada por numerosos minaretes, quais agulhas espetadas no céu no seu papel de sentinelas do culto, sempre prontos a chamar os fiéis à oração. Será porque esse chamamento místico, saído da voz de um qualquer muezzin e que ecoa em todos os cantos da cidade de Istambul, nos faz sentir um tanto profanos em terras do grande Mustafa Ataturk?A Turquia é mesmo surpreendente! Não é Ocidente mas também não é Oriente. É a porta para o mundo das diferentes civilizações que marcaram para sempre o seu território. Entro nos primórdios do cristianismo, apreciando a Casa da Virgem onde, alegadamente, terá vivido com o apóstolo João após a crucificação de Cristo e reparo que os fiéis, em rituais tão próximos a Fátima, acendem também a sua vela, rezam, depositam as suas preocupações num pequeno papel que colocam num dos muros envolventes. Olho para estes rostos sérios da solenidade e descubro culturas ocidentais e orientais a surpreenderem-me nesta devoção comum. Relativamente próximo da Casa da Virgem, o túmulo do apóstolo João pode ser visitado nas magníficas ruínas da Basílica de São João, erguida por Justiniano, no século VI, na região de Éfeso. Os vestígios da Civilização Romana são, na Turquia, de uma magnitude espectacular e Éfeso é um bom exemplo disso. Aqui, por entre o vastíssimo conjunto de ruínas desta cidade greco-romana e berço da filosofia, destaca-se a famosa Biblioteca de Celso. Se as manifestações do Cristianismo se cruzam com as do Império Romano, Bizantino e Otomano em toda a Turquia, todas elas se vão homogeneizar numa elegância perfeita e extremamente bela na grande mesquita Hagia Sophia de Istambul, transformada em museu. Santa Sofia é uma obra-prima da arquitectura bizantina e espelho da História da Turquia. Os maravilhosos ícones do culto outrora ali praticado sob as três religiões, católica romana, ortodoxa e islâmica, expressos em toda a arquitectura interior, conferem-lhe um clima místico e até um pouco intimidante. Mergulho em rios de gente que percorre, tranquilamente, as ruas de Istambul, gozando umas pequenas férias, consequência de dois feriados e do fim do Ramadão. A magia continua! O vai-e-vem de tantas famílias à minha volta dá a sensação de estarem em festa. A Ponte Gálata está engalanada. Não de balões, flores ou outros enfeites, mas sim de um emaranhado de canas e anzóis pendurados sobre o Corno de Ouro. A pesca é um hobby masculino de peso. A pequena viagem pelas águas calmas do Bósforo revela-me a grandiosidade e beleza exterior do Palácio Dolmabahçe implantado junto a este canal. Construído ao estilo europeu de finais do século XIX, os seus interiores ricamente decorados, revelam, no entanto, o gosto dos ricos sultões de outrora, esparramados nos seus cadeirões, contemplando graciosas mulheres nas suas danças do ventre. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Hora de entrar no Grande Bazar. Ambiente alucinante! Gente rodopiando como quem dança aos sons de um oud ou de uma baglama que ecoam pelos corredores labirínticos deste vasto bazar, anunciando botequins de instrumentos musicais para mim desconhecidos. Por entre todo o rebuliço de comerciantes e compradores, envolvidos num regateio aromatizado pelo cheiro das especiarias e couros que penetram bem forte nas narinas, no meio do colorido de tantos objectos, eis que me deparo com um calígrafo no seu pequeno estaminé. Fico ali a observar a leveza do gesto, a segurança da caligrafia para dali aparecer o meu nome ocidental cheio de arabescos. Uma recordação que guardarei para sempre da mágica Turquia. Manuela Santosviajarparaalimentarossentidos. blogspot. com/
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Religiões Cristianismo
Todas as famílias são inconvenientes, mas poucas como esta
The Excavation, último livro de Max Andersson, é uma viagem alucinante que parte dos sonhos deste autor de BD e que carrega as suas marcas habituais, sobretudo o humor negro, mordaz. Ainda não está editado em Portugal, mas vale bem a pena procurá-lo. (...)

Todas as famílias são inconvenientes, mas poucas como esta
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento -0.4
DATA: 2018-06-11 | Jornal Público
SUMÁRIO: The Excavation, último livro de Max Andersson, é uma viagem alucinante que parte dos sonhos deste autor de BD e que carrega as suas marcas habituais, sobretudo o humor negro, mordaz. Ainda não está editado em Portugal, mas vale bem a pena procurá-lo.
TEXTO: Pela primeira vez, Max Andersson resolveu usar os seus sonhos — ou pesadelos, para ele tanto faz o que lhes chamamos — como matéria-prima para um dos seus livros. Ao invés de passar muito tempo, como lhe é habitual, a escrever um guião alicerçado apenas na imaginação, acabou por passar muito tempo a organizar uma narrativa que é também ela ficção mas que saiu do “arquivo de histórias” que mantém nos cadernos onde anota o que lhe passa pela cabeça enquanto dorme. Histórias que partem das recordações que guarda, sobretudo da infância e do começo da adolescência, e de “memórias de coisas que nunca aconteceram”. Estranho? Confuso? Sim. E o que há de mais próximo de um retrato conciso da substância de que é feito The Excavation, o mais recente livro deste autor sueco que se divide entre a BD e o cinema de animação. O Ípsilon foi encontrá-lo no Festival Internacional de Banda Desenhada de Beja, que termina no domingo, no meio das pranchas de alguns dos seus títulos — Lolita’s Adventures (1988), Car-Boy (1999), Bosnian Flat Dog (2004, em parte publicado em Portugal na revista da Bedeteca de Lisboa como Cão Capacho Bósnio), Toy Comix (2007) e, claro, de The Excavation (2017, edição americana da Fantagraphics Books) — e fez com ele uma viagem pelos bastidores desta obra que já teve oportunidade de apresentar em Cracóvia, Moscovo, Aix-en-Provence, Montpellier e Paris. The Excavation, explica, começou por ser uma short story, e não passaria disso se Andersson não tivesse gostado tanto de trabalhar a partir dos seus próprios sonhos. “Tinha tantos — todos temos, embora a maioria se perca para sempre — que achei que valia a pena usá-los. Costumo anotá-los. É um hábito que tenho desde meados dos anos 1980, desde que percebi que há várias técnicas para não os esquecermos. ” Há mais de 30 anos, portanto, que o autor mantém este arquivo em actualização. E como é que faz?“Regra geral só nos lembramos de um momento mais forte do sonho ou de uma personagem, e é nisso que devemos concentrar-nos. Depois insistimos e o mais provável é vir-nos à cabeça outro momento interessante. Depois começamos a tentar relacionar estes momentos. É como fazer um daqueles desenhos em que se ligam pontos [numerados] uns aos outros. Isto pode levar uns 20 minutos em que temos de estar mesmo concentrados. ” O desafio é não voltar a adormecer a meio do processo. “Assim que temos a história toda, apercebemo-nos de que é grande e de que está cheia de pormenores. É aí que devemos escrevê-la para, então, podermos voltar a adormecer. ”Foi ao criar este arquivo nos seus cadernos que Max Andersson (n. 1962) se apercebeu de que muitos dos seus sonhos eram sobre a sua família, de que se foi afastando progressivamente desde que saiu de casa aos 15 anos. Queria escrever sobre a sua relação com os pais e os dois irmãos, mas não sabia bem como. “Apercebi-me de que, na realidade, não conhecia a minha família, mesmo que nos meus sonhos ela estivesse muito activa e fizesse coisas estranhas”, diz. Resolveu, então, pegar no que imaginava enquanto dormia e usá-lo como quem edita material para um filme. “Isto é uma colecção de sonhos que fui encadeando para contar histórias. Não inventei nada, mas o que resulta desta montagem é claramente uma ficção. ”The Excavation é uma viagem alucinante que os críticos da especialidade têm ligado sem esforço ao universo “negro” e “surreal” característico do autor sueco. O volume com 375 páginas, com uma ilustração por cada uma (há apenas uma excepção), apresenta-nos uma família que não é, certamente, como as outras. A história, que está permanentemente a desafiar aquilo que julgávamos já saber sobre as personagens, conta-se ao longo de sete capítulos. Começa com o protagonista de quem nunca se saberá o nome, um alter ego do autor, a levar a namorada a casa dos pais para descobrir, à chegada, que está soterrada (é mesmo objecto de escavações arqueológicas) e que já nada é como ele o recorda, a começar pela mãe, que mais à frente se há-de multiplicar, e pelo pai, que insiste em dividir os filhos em peças para os remontar em seguida, qual Dr. Frankenstein. Foram precisos 18 anos para que Andersson concluísse esta história, que às tantas se divide em duas que correm paralelas — a dos homens (protagonista, pai e irmão) e a das mulheres (mãe e namorada) — antes de tudo regressar ao ponto de partida. O homem que começou este livro, assegura este cartoonista alternativo que está habituado a que juntem ao seu nome a palavra underground, não é o mesmo que o deu por concluído. “Só muito recentemente me apercebi de que mudei muito enquanto fazia isto, talvez porque agora falo muito sobre o livro e antes ele estava apenas dentro da minha cabeça. Quando o comecei tinha 35 anos, quando o acabei 52, e muita coisa acontecera entretanto. Agora vejo mais o meu irmão e a minha irmã do que via há uns anos e sinto que temos muitas coisas em comum, apesar de não termos interagido muito durante quase 30 anos. Temos a mesma infância. Eu e o meu irmão, por exemplo, somos parecidos na maneira como nos comportamos, como pensamos. ”Ao logo dos 18 anos que este livro demorou a amadurecer — Andersson terminava um capítulo e só voltava ao seguinte dois ou três anos depois, envolvendo-se noutros projectos pelo meio —, o autor manteve o fim em aberto. Precisou de o fazer, diz, para permanecer interessado na história, deixando que as personagens tomassem conta dela. Neste The Excavation há um cadáver debaixo da mesa da cozinha, condenações à morte, restaurantes de luxo numa cave e um reality show pornográfico na casa dos vizinhos do lado. Tudo servido com uma crueza e um humor mordaz, evidentes em diálogos e propostas desconcertantes. A associação entre o universo dos seus livros e o de Franz Kafka é algo a que o autor já se habituou. Os leitores fazem-na por causa deste lado mais negro, mas sobretudo devido a um certo “surrealismo checo” capaz de criar “narrativas sonhadas” que sempre lhe interessou e que encontra também, embora sem a “economia de meios” de o autor de A Metamorfose, na escrita do polaco Bruno Schulz, que tem mais detalhe, mais texturas e cores. “Há muitos anos que não leio Kafka, que era um dos meus preferidos na adolescência. Não sei bem o que penso dessa associação entre o meu trabalho e a sua escrita, mas não é difícil perceber por que razão as pessoas a fazem: também há no que faço um lado sonhador, estranho, também ele é sobre as relações familiares. ”Ainda que diga que tudo o que faz é sobre si mesmo, a história que Max Andersson conta em The Excavation está longe de ser autobiográfica — basta começar a lê-la, aliás, para que isso fique claro — ou de ser contada nos moldes tradicionais. “Não foi um projecto difícil, só precisou de tempo. Se a contasse de maneira realista, seria preciso lidar com as reacções das pessoas que lá aparecem. Teria de me perguntar: ‘Quão honesto posso ser?’ Neste caso, as personagens são versões de mim, não representam a minha família. ”Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Seja como for, Andersson ainda não mostrou o livro aos irmãos, mas tenciona fazê-lo. O pai já morreu e a mãe é hoje incapaz de ler. “Foi a doença da minha mãe que nos aproximou a todos. Tem alucinações e falamos muito sobre elas. Agora estou muito mais tempo com ela do que alguma vez estive na minha vida adulta. ”Se lhe perguntamos por que razão foram precisos 18 anos para terminar The Excavation, e se esse tempo longo teve alguma coisa que ver com o facto de ser um livro sobre a família, o autor faz uma pausa: “Quando temos alguma coisa que nos sabe bem, queremos que dure. É como uma barra de chocolate perfeita, temos de a comer em pequenas porções. Acho que para mim foi saudável manter uma certa distância da minha família por uns tempos para que conseguisse encontrar o meu caminho de volta a ela. Não sei se este livro ajudou, mas sei que não quero tornar a pegar nos meus sonhos para fazer outro. ”
REFERÊNCIAS:
A “Campeã da Terra” que está a criar um retiro para criativos em Portugal
Leyla Acaroglu percorre o mundo para demonstrar como o design pode ter um papel importante na sustentabilidade. Subiu ao palco das TED Talks, foi eleita “Champion of the Earth” pelas Nações Unidas em 2016. Agora, a australiana está em Portugal para transformar uma quinta centenária num retiro para empreendedores e criativos. (...)

A “Campeã da Terra” que está a criar um retiro para criativos em Portugal
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-05-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: Leyla Acaroglu percorre o mundo para demonstrar como o design pode ter um papel importante na sustentabilidade. Subiu ao palco das TED Talks, foi eleita “Champion of the Earth” pelas Nações Unidas em 2016. Agora, a australiana está em Portugal para transformar uma quinta centenária num retiro para empreendedores e criativos.
TEXTO: Encontrar a quinta de Leyla Acaroglu é mais difícil do que antecipámos. Trazemos as indicações pormenorizadas num e-mail mas perdemo-nos assim que entramos no emaranhado de pequenas localidades em redor de Serra, no concelho de Tomar. Uma senhora há-de guiar-nos até Figueira Redonda, onde dois agricultores interrompem os trabalhos na horta para nos indicar a estrada de terra batida até ao que já foi um lagar de azeite. Nada como um GPS à moda antiga. Na fachada do longo edifício esboroado, um azulejo anuncia a propriedade, agora em escombros, sem telhado nem porta: “Lagar de azeite de Manuel da Eira”. Durante anos, era aqui que cada agricultor da região deixava a colheita para ser transformada em líquido dourado. Nas redondezas, ainda há quem se lembre de ver o lagar a funcionar, conta Leyla, enquanto nos mostra os cantos à ruína. Com o sucessivo abandono das terras, a demanda caiu e o lagar fechou há mais de 50 anos. Agora, promete ser a maior empreitada do projecto que a empresária australiana quer criar à beira do Zêzere. “Preciso de um quarto de um milhão de dólares [205 mil euros]”, diz, com ar de quem reconhece o desafio mas não desarma o optimismo e a convicção de que há-de conseguir. Quer transformá-lo num “boutique hotel para criativos”, com dez ou 12 quartos, um café aberto ao público e uma biblioteca com uma cúpula em vidro para se observarem as estrelas. “Depois quero convidar um astrónomo para vir cá e liderar alguns programas. ”Para já, o projecto ganha forma na quinta centenária ao lado do lagar. Enquanto um dos primeiros workshops sobre liderança decorre na sala de trabalho, conversamos com Leyla no terraço com vista para os pomares, as oliveiras, a horta e os animais. Nove galinhas, quatro ovelhas e quatro cabras, que já fomos cumprimentar com pedaços de laranjas. “Este minúsculo rebento vai transformar-se num pepino. Não é incrível?”Apesar de grande parte da carreira de Leyla Acaroglu estar ligada à luta pela sustentabilidade e pela protecção do meio ambiente, a agricultura ainda é um admirável mundo novo para a australiana, que há cerca de quatro anos trocou Melbourne por Nova Iorque. Até vir para Portugal há um ano para criar o CO Project Brain Spa, um “spa cerebral para criativos optimistas”. Isto é, “um lugar onde se pode vir para recarregar os neurónios”. “Para muita gente, o conceito de relaxar é não fazer nada ou ter alguém que faça coisas por ti, como uma massagem ou uma bela refeição. Mas acredito que quando perdes a criatividade, quando estás em burn out ou exausto é, na verdade, a tua mente que está sem energia”, começa por explicar a empresária. De acordo com a investigação que fez na área das ciências cognitivas, o vazio só se desbloqueia com a “quantidade certa de desafios”. “Damos-lhes algo que os desafia da forma certa para que aprendam algo novo, ao mesmo tempo que se sentem profundamente empenhados no processo. ” Daí que a estadia aqui esteja sempre integrada num programa: bootcamps sobre liderança, “campos de férias”, workshops, retiros temáticos ou residências criativas. Há tempo para relaxar na quinta, cozinhar pizzas no forno a lenha, dar um mergulho na barragem de Castelo de Bode, visitar Tomar ou mesmo receber a tal massagem. Mas “o aspecto único” do conceito é que quem vem cá “quer ser activamente energizado criativamente, pensar de forma diferente e ser inspirado pelo contacto com outras pessoas e pela natureza”. Mas recuemos um pouco. Quem é, afinal, a australiana de cabelo curto e energia contagiante que quer revitalizar a criatividade de quem anda a mudar o mundo numa quinta perdida em Portugal? O percurso académico e profissional de Leyla é o reflexo de quem temos à nossa frente: irrequieto e irreverente. “I was always like this, pushing everyone’s buttons. ”Terminou o secundário sem saber que carreira escolher. “Gostava de tudo, menos de matemática”, recorda. Sabia que queria algo criativo e, em conversa, um amigo sugeriu-lhe o curso de design de produto. “Queria fazer escovas de dentes e telecomandos porque me irritavam de tão mal desenhados”, ri-se. Quando chegou às aulas, no entanto, teve duas revelações. Por um lado, que teria de criar intencionalmente objectos que se estragassem, a bem da economia baseada na produção em massa. Por outro, que “tudo na natureza está interligado” e, por isso, “as decisões que tomasse enquanto designer teriam um grande impacto no planeta”. “Aquele momento mudou a direcção da minha vida”, recorda. O professor de engenharia falava-lhes da Teoria de Gaia e, enquanto ela ficou “chocada”, um colega reagiu de uma forma que ela nunca mais esqueceu. Ainda hoje recorda as palavras exactas: “Não sei por que é que te estás a passar, não é como se estes impactos ambientais catastróficos nos fossem afectar ao longo da vida. Para quê preocuparmo-nos?” Fazer com que os outros se preocupem tornou-se um “objectivo de vida”. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. A rapariga que “sabia zero sobre como o planeta funciona” desistiu de design para estudar sociologia, com um major em sustentabilidade. Aos 25 anos, fundou a primeira empresa, Eco Innovators, que desenvolvia “ferramentas para educação” que interligavam os temas da comunicação, design e sustentabilidade. Regressou ao design industrial para um doutoramento sobre “como provocar mudanças através do design”. E é isso que tenta fazer desde então, criando jogos educativos, dando palestras pelo mundo — a sua TED Talk tem mais de um milhão de visualizações — e na escola online que fundou em Nova Iorque, a UnSchool, que ganha agora uma base fixa em Figueira Redonda. Em 2016, foi eleita “Champion of the Earth” pelas Nações Unidas. Mas porquê escolher Portugal entre todos os países do mundo? “Vim de férias há oito anos e gostei tanto que em vez de três dias fiquei duas semanas”, conta. “Adorei as pessoas, a comida, o café, o vinho. Toda a gente é tão simpática. Há muito positivismo aqui e isso era algo que eu procurava”, enumera. “Há muitas coisas com que nos devemos preocupar em relação ao mundo, mas nem sempre temos tempo para pensar em conjunto e colaborar. ” Muito menos para ficar a olhar a natureza e vê-la actuar. É esse o grande objectivo de Leyla: criar ferramentas que nos levem a criar as coisas materiais de que necessitamos de uma forma que respeite os ciclos do ambiente. Sem desperdícios. E a quinta é o “laboratório vivo de aprendizagem” ideal. Qual é a figura internacional que mais precisa de um spa cerebral? Só posso escolher um? Não queria um político porque é tão óbvio. Pode ser alguém com quem gostava de conviver no meu spa cerebral? Neil Degrasse Tyson! É o astrofísico mais cool do mundo e eu queria conviver com ele e aprender astrofísica. [risos]Nunca tinha trabalhado numa quinta. O que aprendeu desde que chegou? Que as cabras comem tudo. [risos] E que é muito difícil fazer algo crescer. É mesmo preciso ter as condições certas para a vida existir. Vi muitos vídeos no Youtube sobre macieiras porque estas intrigavam-me. Pareciam mortas e de repente, veio a chuva, depois o sol e boom. Quando vou ao mercado e vejo comida barata não consigo compreender, dá muito trabalho criar aqueles produtos. Alguma coisa está errada no sistema. Estamos a comer o futuro. Que outros projectos tem a decorrer neste momento? Estou a trabalhar no [movimento] pós-descartável. E numa iniciativa ligada aos objectivos globais das Nações Unidas em torno das acções quotidianas que podemos adoptar para ter um estilo de vida mais sustentável. E estou a escrever um livro sobre como provocar mudanças sistémicas através do design. Estou a trabalhar nele há três anos e quero muito terminá-lo. Pensava que ter uma quinta em Portugal ia ajudar, mas acabei a gerir uma obra. [risos]
REFERÊNCIAS:
A memória dos arrozais servida num prato
Pedimos a Bruno Carvalho, chef do restaurante Criatura, que apresentasse três dos seus pratos de arroz e recomendasse três vinhos para os acompanhar. Ele fê-lo, partilhando as suas recordações de uma infância passada no meio dos campos de arroz do vale do Pranto. (...)

A memória dos arrozais servida num prato
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-05-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: Pedimos a Bruno Carvalho, chef do restaurante Criatura, que apresentasse três dos seus pratos de arroz e recomendasse três vinhos para os acompanhar. Ele fê-lo, partilhando as suas recordações de uma infância passada no meio dos campos de arroz do vale do Pranto.
TEXTO: Bruno Carvalho cresceu entre os arrozais. As memórias de infância do chef dos restaurantes Suba e Criatura, no Verride Palácio Santa Catarina, em Lisboa, são todas ligadas ao ritmo da vida numa aldeia – Calvino, em Borda do Campo, Figueira da Foz – rodeada de campos de arroz, no vale do rio Pranto. “O arroz acompanhou-me desde a infância”, conta. “Borda do Campo é uma zona onde há essa constante mudança de paisagem, do espelho de água ao verdejante que surge quando o arroz começa a crescer e parece um manto verde, ao dourado de quando as espigas começam a maturar, até ao castanho do restolho depois da apanha. ” Após a colheita, as palhas ficam a secar nos campos e “há uma altura em que as queimam e estamos a olhar para um campo isolado com fogueiras por todo o lado, durante a noite”. Quando era criança, recorda, o cultivo do arroz era ainda muito artesanal, sem a maquinaria que existe hoje. “O terreno era tratado inicialmente com os bois, a sementeira era à mão, os homens levavam um saco com os grãos de arroz que já tinham germinado em água para os semear. ” Os terrenos eram balizados por canas que as pessoas apanhavam nos canaviais em redor e usavam para fazer corredores. Bruno não teria nessa altura mais do que oito anos, mas não esquece essas cenas, a sementeira, depois a colheita, homens e mulheres avançando pelos campos, de foices na mão, juntando molhos que equilibravam com mestria nos carros de bois para que não caíssem pelos esburacados caminhos agrícolas. Para Bruno e os amigos, a parte mais divertida era quando os adultos se juntavam para tirar as espigas do arroz. “Isso era feito numas máquinas antigas, as descascadoras, ainda movidas a correias. ” A palha que saía da máquina era o grande divertimento para os miúdos, que pulavam para cima dos montes, tentando resistir às comichões e aproveitando para brincar antes de ela seguir para os palheiros onde era guardada para alimentação dos animais. Depois de o arroz colhido, era altura de os miúdos irem para as valas em redor dos campos e, armados com armadilhas de pesca, baterem a água para obrigar os peixes a entrar na rede. Outras memórias de Bruno estão ligadas à transformação do arroz. “O meu avô, que fez agora 95 anos, era moleiro e as pessoas levavam-lhe sacos com o arroz ainda com casca para fazer o descasque na mó de granito, movida a água, ou para fazer a farinha. ”Ainda hoje há quem prefira este processo artesanal porque “o arroz mantém mais alguma goma, não há um desgaste do branqueamento tão profundo como no processo industrial, a fricção que a pedra faz entre o granito e a base de cortiça é inferior. ” Esse arroz saído da mó ficava mais opaco, com um ou outro grão por descascar, alguma impureza agarrada. Era por isso que, antes de se cozinhar, deitava-se água sobre ele, fazendo vir ao de cima as impurezas para as separar. Era do arroz, ou das pescas, que vinha o rendimento da maior parte dos habitantes da Borda do Campo. Hoje, apesar de muita gente na região continuar ligada aos arrozais, as coisas são muito diferentes – quem trabalha os campos são máquinas, os tractores preparam os terrenos, a sementeira é feita por avioneta e a separação acontece imediatamente após o corte, arroz para um lado, palha para o outro, esticada em linhas sobre o terreno que vai, mais tarde, ajudar a fertilizar. Além disso, continua Bruno Carvalho, “hoje os italianos estão a comprar 90% da produção de arroz do vale do Pranto”. O carolino, da variedade aríete, tem características próximas (mas não iguais) às do risotto – é um arroz que fica bem caldoso, porque, ao contrário do agulha, por exemplo, que fica solto, tem capacidade para absorver parte do caldo e todo o sabor. Para o chef do Criatura, o do vale do Pranto tem uma característica que lhe agrada muito: “No interior é suave, mas o exterior do grão oferece alguma resistência inicial, o que evita que, ao cozinhar, se desfaça e fique em papa. ” Quando serve, tem o cuidado de ver se o arroz vai colocado num prato mais raso ou num tachinho – a velocidade de absorção do líquido será diferente e é preciso ter isso em conta para que esteja no ponto quando for comido. Os produtores mais pequenos de Calvino e arredores continuam a guardar sacas de arroz para irem cozinhando ao longo do ano e para fazer as especialidades da região, a mais famosa das quais é o arroz de carneiro com hortelã, que até tem uma festa anual a ele dedicada. Há também o arroz de petingas e, claro, o arroz doce, que a avó de Bruno fazia com um chá de flores de laranjeira colhidas por ela. “Como o arroz tem uma goma grande, essa cremosidade sobrepunha-se a tudo e parecia quase um leite-creme. ”Essas memórias, desde as discussões dos produtores sobre a gestão comum da água para os arrozais até às colheradas de arroz doce quente, ainda na panela, que a avó o deixava tirar, tudo isso é parte integrante da forma como Bruno cozinha hoje, mesmo depois de uma carreira internacional que o levou a Nova Iorque, ao Dubai e às Seychelles. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. No Criatura e no gastrobar Suba (no topo do Palácio Verride, com uma vista extraordinária sobre Lisboa e o Tejo) faz uma comida onde junta muitas dessas influências, mas onde o arroz continua a ter um lugar muito especial. Tal como tem para a maioria dos portugueses desde que a sua produção foi introduzida, durante o reinado de D. Dinis. Portugal é o país europeu com maior consumo de arroz per capita (cerca de 16 kg por pessoa por ano) embora nos últimos anos se tenha registado uma quebra e o carolino, o tipo mais produzido nos arrozais nacionais, tenha vindo a perder espaço nas despensas, dando muitas vezes lugar ao agulha (que também se produz em Portugal), ao mais exótico basmati ou ainda ao risotto italiano. O que Bruno Carvalho quer recordar ao trabalhar o carolino, dando-lhe destaque na carta, são as razões que fazem dele, desde sempre, o melhor arroz para a cozinha portuguesa. Bruno de Carvalho apresenta três pratos de arroz, dois dos quais, mais tradicionais, estão na carta do restaurante Criatura, enquanto o terceiro, mais criativo, está no gastrobar Suba. No final, sugere três vinhos para os acompanhar. Arroz de cabidela “É uma cabidela tradicional, a única diferença é que geralmente serve-se a galinha em pedaços maiores. Nós aqui, depois de estufar a galinha, desfiamo-la e envolvemos no arroz. No Calvino, se fizesse assim, era considerado quase um herege, mas no restaurante o que queremos é manter o sabor dando-lhe outra apresentação. ”O vinho: “Para este prato sugiro o Baga, que é das nossas castas mais antigas e durante muito tempo foi muito maltratada. Aconselho um Baga do Luís Pato ou Quinta das Bágeiras. ” Arroz de línguas de bacalhau “É um clássico da cozinha portuguesa, que gosto de trabalhar porque nos lembra outros sabores muito tradicionais como a salga do bacalhau. As línguas vêm de uma salmoura, temos que as demolhar, e gosto de as usar com grelos porque estes dão um lado de acidez um pouco diferente. ”O vinho: “Para este prato escolheria um branco mais forte, da Bairrada ou do Dão. Talvez o Quinta do Carvalhais branco”. Arroz de wakami com atum “Este é um prato que vem das influências da minha vida profissional, das ligações que tive à Ásia. Gosto de fazer a ligação ao mar e as algas passam esse sabor a mar, que é essencial. Usamos as algas, o berbibão e o tataki de atum. As algas dão ainda ao arroz o tom de verde. O carolino tem esta capacidade de absorção não só dos sabores mas das cores. ”O vinho: “Lembrei-me logo de um vinho que acho que vai muito bem com o atum. O Frei Gigante, da ilha do Pico, nos Açores”.
REFERÊNCIAS:
The Woman who Left ganha Leão de Ouro do Festival de Veneza
O júri que deu o prémio ao realizador filipino Lav Diaz foi presidido pelo cineasta Sam Mendes. (...)

The Woman who Left ganha Leão de Ouro do Festival de Veneza
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.199
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: O júri que deu o prémio ao realizador filipino Lav Diaz foi presidido pelo cineasta Sam Mendes.
TEXTO: Seis meses depois do Urso de Prata em Berlim, por A Lullaby to the Sorrowful Mystery, o “fenómeno” Lav Diaz marca o Festival de Veneza: The Woman who Left recebeu o Leão de Ouro, decisão de um júri presidido pelo cineasta Sam Mendes. De alguma maneira, o Lido reclama aquilo que também é seu, porque foi em 2007 que o filipino foi exposto ao público e à crítica internacionais, com Death in the Land of Encantos exibido na secção Horizontes. Os filmes de Diaz, as longas durações (The Woman who Left até só dura cerca de quatro horas), tornaram-se rapidamente na coqueluche dos festivais. São experiências sobre o espaço da História filipina, e este é também uma experiência no espaço da História do cinema filipino: uma tradição melodramática que teve num cineasta como Lino Brocka (1939-1991) um incandescente cultor. É a história de uma mulher que sai da prisão onde esteve presa durante 30 anos e regressa à vida, ou a uma aparência de vida, porque ficou condenada a habitar, como super-herói sombrio, o mundo dos fantasmas – o lado mais interessante é este negrume fantasmagórico. É considerado o mais acessível do cineasta, mas não está nada isento de auto-indulgências. Mas alguma coisa fez “clic” entre os festivais e Lav Diaz, chegou a vez de Veneza e não há muito que se possa fazer. Dizia-se, curiosamente, que o filipino não seria “coisa” para um júri presidido por Sam Mendes. Afinal, engano. Mendes em conferência de imprensa revelou que houve um “grande” entusiasmo no júri. Mas deve haver algum mal-entendido nisto: no início da cerimónia no Lido, o presidente do júri elogiou o “extraordinário” festival que foi a selecção dos programadores, o que é uma opinião, mas está longe de ser consensual. Por aqui achamos que foi medíocre. Nos três prémios principais, estão um deficiente vai-e-vem narrativo entre níveis de ficção (Grande Prémio do Júri a Nocturnal Animals, de Tom Ford, muito esforçado, com óbvios e feios raccords, e sem chegar lá), uma versão autoritária, académica, de cinema de autor (Paradise, de Andrei Konchalovsky, que recebe o mesmo prémio, Melhor Realizador, que teve, com o muito diferente The Postman’s White Nights, em 2014), e uma próxima next big thing, ou se calhar já o é, filme desafiante, sim, frustrante, também, mas seco e orgulhoso: o mexicano Amat Escalante, por La Region Salvaje, premiado ex-áqueo com Konchalovski – são temperamentos de cineasta tão diferentes que é uma associação esquizofrénica. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Um dos piores filmes do concurso, porque se encosta de forma oportunista a uma série de referências (Tarantino, Lynch. . . ) sem articular, recebeu o Prémio Especial do Júri, e logo esse: The Bad Batch, de Lily Amirpour. Emma Stone, por La La Land, de Damien Chazelle, Oscar Martinez, por Il Ciudadano Ilustre, de Gastón Duprat e Mariano Cohn, foram os intérpretes premiados – o discurso de Martinez, obviamente, mais caloroso e emocionado que o discurso cínico e angustiado da sua personagem, um escritor que recebe o Nobel. O prémio do Melhor Argumento foi para Frank Oppenheimer, por Jackie, de Pablo Larraín. Um dos melhores filmes do concurso, Frantz, de François Ozon, recebeu “apenas” o Prémio Marcello Mastroianni para uma jovem actriz emergente: Paula Beer. Um dos melhores filmes do concurso, Une Vie, de Stéphane Brizé, não levou nada do palmarés oficial (os jurados da FIPRESCI, associação da crítica de cinema internacional, não se esqueceram dele). Do maior filme do concurso, o grande e comovente come back de um cineasta, On the Milky Road, de Emir Kusturica, o júri constituído por Sam Mendes (presidente), pela cantora e artista visual Laurie Anderson, pelas actrizes Gemma Arterton, Nina Hoss, Chiara Mastroianni e Zhao Wei, pelos realizadores Joshua Oppenheimer, Lorenzo Vigas, e pelo argumentista Giancarlo de Cataldo, passou ao lado.
REFERÊNCIAS:
Vinhos feitos de mar, de rocha, de areia e de vento
O Centro de Portugal vai do Atlântico até Espanha passando pela serra mais alta do país, a da Estrela, e tem uma enorme diversidade de terroirs. É uma região para descobrir com calma, por entre brancos, tintos, espumantes e algumas surpresas. (...)

Vinhos feitos de mar, de rocha, de areia e de vento
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-05-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: O Centro de Portugal vai do Atlântico até Espanha passando pela serra mais alta do país, a da Estrela, e tem uma enorme diversidade de terroirs. É uma região para descobrir com calma, por entre brancos, tintos, espumantes e algumas surpresas.
TEXTO: Ainda mal entrámos em Óbidos e já Vasco d’Avillez nos está a falar do mar, dos romanos, dos mouros. E de vinho, claro. Começamos a viagem logo aí, com D. Afonso Henriques a arrebanhar tropas para lutarem ao seu lado e a dar-lhes, em troca, “terra boa para a vinha, pela qual pagam 20% de imposto, ou seja, um quinto, daí o nome de quintas”. E, no Sul, onde, mais tarde, as terras podem ser herdadas, passam a chamar-se herdades, continua, entusiasmado, o presidente da Comissão Vitivinícola da Região de Lisboa. Foram os vinhos que nos trouxeram nesta viagem pelo centro de Portugal, mas, em todas as paragens, eles cruzaram-se com a História e com muitas histórias. De mapa aberto sobre uma mesa, Vasco d’Avillez está lançado: “Toda a região de Lisboa tem uma frente atlântica e por aqui, na zona de Peniche e Óbidos, passa a corrente quente do Golfo, que influencia o clima. Por isso, há nevoeiros nocturnos na Primavera e no Verão, que são chamados de rocío. ” As pérolas de água que se depositam nas folhas da videira de madrugada “são melhores que uma rega”. As uvas criam menos açúcar e ganham maior acidez e frescura. Andamos por Óbidos, guiados por Paula Ganhão, da Câmara Municipal, que nos fala do tempo em que a vila era o “porta-moedas das rainhas”, que, no dia do casamento, a recebiam para gerir e, de como, muito mais tarde, o Estado Novo criou o concurso das janelas floridas para que trepadeiras e flores nas janelas escondessem algum desgaste no exterior das casas. Passamos por algumas das muitas livrarias da Vila Literária, a que fica dentro de uma antiga igreja ou a que partilha o espaço com um mercado biológico, e acabamos a tomar uma ginjinha noutra livraria dentro de uma antiga adega, antes de partirmos, guiados por Vasco d’Avillez, para um almoço no restaurante Dom José, no Bombarral, onde provamos o vinho leve, que existe nesta região e cujo teor alcoólico não ultrapassa os 10º. Apesar de ainda não estar tempo de praia, o mar nunca anda muito longe nesta visita à Região de Lisboa. Na Adega Mãe, a 40 quilómetros da capital para Norte, há um barco de onde de vê a vinha. É o Dori 37 (Dory é o nome de um dos vinhos deste produtor) – que pertenceu ao bacalhoeiro Creoula. Era nestes frágeis barcos que os homens que faziam a pesca do bacalhau passavam o dia inteiro sozinhos, até o terem cheio de peixe e poderem voltar ao bacalhoeiro. E está aqui, no meio de uma adega e rodeado de vinha, porque este é um projecto familiar de Ricardo e Bernardo Alves, os dois irmãos à frente da empresa de bacalhau Riberalves, que fizeram assim uma homenagem aos pais – e, sobretudo, à mãe. Mas o mar tem muito mais a ver com esta história – estas são vinhas que estão a apenas oito quilómetros do Atlântico e as brisas que aqui correm trazem o ar salgado até ao vale. A humidade do solo dá vinhos frescos e é excelente para os brancos, o que levou os enólogos (Anselmo Mendes e Diogo Lopes) a optarem por arrancar as castas tintas e apostar nas brancas (os tintos da Adega Mãe são feitos com uvas que crescem do outro lado do vale). A maresia chega até nós também no hotel Areias do Seixo, onde ficamos hospedados, e protegemo-nos dela bebendo um copo de vinho junto à fogueira no exterior, que todas as noites atrai um grupo de hóspedes que por ali fica à conversa com Gonçalo Alves, o proprietário. No interior, espera-nos um menu de degustação criado por Henrique Mouro, chef do Areias do Seixo, onde pratos tradicionais portugueses, como a sopa à fragateira, o cozido à portuguesa ou um choco frito com arroz de ostra conseguem mostrar-se, ao mesmo tempo, familiares e surpreendentes – tal como é surpreendente a carta de vinhos, com uma colecção de Portos e Madeiras, herança de família de Gonçalo. Na noite seguinte, é ainda com Gonçalo que vamos conhecer um dos mais recentes projectos da região, a Quinta da Boa Esperança, onde Artur Gama e Eva Moura Guedes fazem vinhos handcrafted – chamam-lhes assim por serem uvas colhidas à mão e pelo cuidado que põem em tudo, da vindima ao suave desenho dos rótulos, criados por Eva. Paula Fernandes, enóloga da quinta, fala de cada um, explicando como os monocasta – fazem Syrah, Touriga Nacional, Alicante Bouschet, Fernão Pires, Arinto (além da combinação das duas castas, clássica na região) e Sauvignon Blanc – podem ser didácticos para se perceber as características de cada uma e comparar com outras regiões – o Syrah “muito mais especiado do que no Alentejo”, a Touriga “mais fresca do que no Douro”. E assim, conversamos noite dentro, numa sala de jantar na adega, à luz de um candeeiro que Eva decorou com rosas que balançam sobre as nossas cabeças enquanto provamos os vinhos e comemos ervilhas com ovos escalfados. É preciso deixarmos os olhos habituarem-se à escuridão do espaço subterrâneo da adega da Quinta de Lemos, em Silgueiros, próximo de Viseu, para vermos na rocha granítica que se desfaz quando passamos os dedos sinais das raízes das videiras. Mas, sim, lá estão elas, aparentemente frágeis mas capazes de penetrar a pedra para chegar à água. Estamos a 400 metros de altitude, entre as serras da Estrela e do Caramulo, numa zona de microclima, fustigada por chuvadas grandes nos finais de Setembro. No exterior, as formações da mesma rocha, com 300 milhões de anos, despontam por todo o lado, junto à vinha, e até no meio do restaurante Mesa de Lemos – onde o chef Diogo Rocha inicia o menu colocando na mesa um prato com pequenas pedras de granito, vide e gelo que evoca as geadas primaveris da região. Aqui, nesta quinta do empresário têxtil Celso Lemos, um projecto relativamente recente comparado com muitos da região, fazem-se vinhos em condições especiais: 75% da produção de uva é deitada fora para aumentar a qualidade dos frutos que ficam na videira e foram já construídos lagares em pedra, semelhantes aos antigos, para se poder fazer pisa a pé. Dos 23 hectares de vinha da Quinta de Lemos saem vinhos, na sua maioria tintos, com os nomes das mulheres da família, e a ambição de terem grande longevidade. O melhor mesmo é prová-los no Mesa de Lemos, com a comida de Diogo Rocha. Mas o terroir do Dão está longe de ser todo igual. Depois de jantarmos no Mesa de Lemos, dormimos na Casa da Ínsua, a poucas dezenas de quilómetros, em Penalva do Castelo. Estamos noutra realidade, com solos argilosos além dos granítico-arenosos, e um clima continental, marcado pelo calor seco vindo de Espanha. Já não vemos as grandes formações rochosas e aqui são os ventos quentes que sopram as vinhas. “A região do Dão é muito heterogénea”, explica José Matias, enólogo e responsável agrícola da Casa da Ínsua, enquanto nos mostra as vinhas e nos fala da aventura em que o Grupo Visabeira, o proprietário, se lançou ao começar a fazer vinho em Moçambique. Ao lado das vinhas há um pomar onde as macieiras estão em flor e, a dois passos, os românticos jardins francês e inglês deste palácio barroco que pertenceu a Luís de Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres, capitão-general de Mato Grosso e Cuiabá. Num pequeno lago, um cisne branco lança-se num semi-voo, batendo as asas na água e estilhaçando os reflexos de luz. Logo à frente, na queijaria, faz-se Queijo da Serra da Estrela e os doces caseiros que comemos ao pequeno-almoço. Mas é tempo de partir porque na Casa de Santar espera-nos Osvaldo Amado, o enólogo do grupo Global Wines, para nos contar que a Casa de Santar produz anualmente 1 200 mil quilos de uvas, faz 140 referências de vinhos e sete milhões de garrafas às quais se somam mais dois milhões no Brasil, onde tem, em Pernambuco, o projecto Rio Sol. Para provarmos os vinhos, vamos até ao vizinho Paço dos Cunhas de Santar, enoturismo que pertence também à Global Wines, onde nos espera um almoço preparado pelo chef Henrique Ferreira, durante o qual percorremos as referências mais emblemáticas, Cabriz, Casa de Santar, Paço do Cunhas, descobrimos experiências como o Touriga Nacional branco (um branco feito com uvas tintas) e ficamos a saber que a casta favorita de Osvaldo Amado é o Encruzado. Para o enólogo, o Encruzado “está entre as cinco melhores castas brancas do mundo, com o Arinto, o Chardonnay, o Sauvignon Blanc e o Alvarinho”. Porquê? “É completamente transversal. Faz um vinho tranquilo para todos os dias, um de guarda, um espumante e um colheita tardia. Esta acidez não se encontra em qualquer lado. ”Para falarmos sobre a Bairrada nada melhor do que começar por um encontro com Luís Pato, o enólogo mais carismático da região, conhecido como o Sr. Baga pelo trabalho que tem feito com esta casta com fama de difícil de domar. E encontramo-nos precisamente noutro dos ícones locais, o restaurante Rei dos Leitões, famoso pelo leitão, claro, mas actualmente com uma carta muito mais variada e de grande qualidade – e sobremesas imperdíveis, da pasteleira Lídia Ribeiro. É ao almoço que provamos o primeiro espumante feito sem sulfuroso, através da micro-oxigenação, uma das muitas experiências que Luís Pato gosta de realizar na adega (como o tinto de uvas brancas que fez para um dos netos ou o vinho de sobremesa colheita antecipada que fez para outro ou ainda o vinho laranja, o Laranja da Madalena, que fez para a neta). Na Bairrada há solos arenosos, mas 80% são argilo-calcários, aqueles que a Baga prefere (é uma casta que se dá melhor aqui do que no Dão por ser muito sensível à podridão). “O clima é parecido com o de Bordéus, mas muito melhor porque o mar é mais frio”, diz Luís Pato, e as noites frias entre dias quentes são boas para a vinha. Depois do almoço, passamos pela adega e Luís mostra-nos os fósseis que foram encontrados nas vinhas e que provam que, no Jurássico, esta região esteve debaixo do mar. Para despedida levamos outra experiência: dois Bagas feitos por Luís Pato, um em vinha de pé-franco (como existia antes da filoxera ter atacado as vinhas europeias no século XIX) no solo arenoso e a outra em pé-franco mas em solo argiloso. Antes de deixar a Bairrada, voltamos a encontrarmo-nos com Osvaldo Amado, da Global Wines, que também tem aqui, a poucos quilómetros de Luís Pato, um projecto de enoturismo, a Quinta do Encontro, numa zona de vinha e eucaliptos, a 20 quilómetros do mar, com solos argilo-calcários a poente e arenosos a nascente e uma adega que desce em espiral até aos frescos subterrâneos onde o vinho fermenta. É entre as ruínas do castelo da Aldeia Histórica de Castelo Rodrigo, numa posição privilegiada para vermos tudo ao nosso redor, que Ana Berliner, a proprietária da Casa da Cisterna, onde ficaremos instalados, e a enóloga Jenny Silva, da Adega Cooperativa de Figueira de Castelo Rodrigo, nos recebem e descrevem o que vemos: estamos entre os rios Douro e Côa, no planalto da Meseta Ibérica, numa terra onde os monges de Cister começaram a fazer vinho logo no século XII. O planalto que se estende à nossa frente está a 600/700 metros de altitude o que, em conjunto com os solos muito marcados pelo quartzo e o xisto mas com bolsas de granito, permite fazer os chamados vinhos de altitude, com “uma acidez e frescura muito natural”. Os Verões aqui são muito quentes e secos e os Invernos extremamente rigorosos e esta dureza beneficia as uvas. A zona escarpada agrada também às aves de rapina (há uma colónia de abutres no Côa), que Ana estuda, no meio de muitas outras actividades. Jenny, por seu lado, dedica-se ao vinho e, nos últimos anos, em particular, ao estudo de um fenómeno que acontece apenas em algumas zonas do mundo e que dá origem a um vinho que neste momento só pode ser produzido pela Adega Cooperativa de Figueira de Castelo Rodrigo: o Pinking. Trata-se de um vinho branco, feito com a casta Síria, uma das mais características da região, com um bonito tom rosado natural que, até há pouco tempo, era atribuído a um defeito das uvas. O que Jenny provou foi que esse tom, que surge no final da maturação, não é um defeito, mas sim o resultado de uma mutação genética que fez com que mantivesse antocianinas das uvas tintas. O Pinking não é rosé porque é de uvas brancas, mas tem um delicado tom de rosa que é natural e que deixou numa casta branca uma memória do tempo em que terá sido tinta. Desde que a descoberta de Jenny foi conhecida, a Adega de Figueira de Castelo Rodrigo é a única que tem, para já, autorização para fazer este vinho, mas a enóloga tem sido contactada por produtores de outros países, como Itália, onde, em regiões específicas e com determinadas castas, o fenómeno também acontece. O que se fazia até agora era correcção de cor, mas quando o Pinking começou a ser engarrafado aqui, algumas pessoas mais velhas disseram a Jenny: “Quando era miúdo, o vinho era desta cor”. É com o Pinking que começamos a refeição, mas depois passamos para outro dos vinhos famosos da região, o Beyra, do enólogo Rui Roboredo Madeira, que se encantou com a ideia de trabalhar a partir de vinhas em altitude nestes solos de xisto, granito e quartzo e neste clima em que a alternância entre noites frescas e dias quentes resulta em vinhos com maior frescura e acidez. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. E terminamos com uma sobremesa de doce de ovos com amêndoa, acompanhada por um espumante da Adega de Figueira de Castelo Rodrigo, feito com as uvas Síria e Malvasia Fina, enquanto olhamos o vale e, ao longe, as terras onde os monges de Cister faziam o seu vinho há muitos séculos atrás, deixando aqui uma herança que, até hoje, os homens não esquecem. E, como prova esta história, o vinho também não. A Fugas viajou a convite do Turismo do CentroAreias do Seixo Praceta do Atlântico, Mexilhoeira, Póvoa de Penafirme A-Dos-Cunhados Telf: 261936355 SiteAdega Mãe Estrada Municipal 554, Ventosa, Torres Vedras Visitas todos os dias das 9h30 às 18h30 (domingos das 11h às 13h e das 14h às 18h). Telf: 261950105 E-mailQuinta da Boa Esperança Rua da Moita – Zibreira, Carvoeira Telf: 261742044 E-mail SiteQuinta de Lemos Restaurante Mesa de Lemos Passos de Silgueiros, Silgueiros, Viseu Telf: 961158503 Site E-mailHotel Parador Casa da Ínsua Penalva do Castelo Telf: 232420000 E-mailPaço dos Cunhas de Santar Largo do Paço 28, Santar Telf: 232945452Adega Luís Pato Rua da Quinta Nova Amoreira da Gândara, Anadia Telf: 231596432 Site E-mail Visitas: de 2ª a domingo das 9h às 12h e das 14h às 17h (marcação prévia)Rei dos Leitões EN1, Av. da Restauração nº 17 Mealhada Telf: 231202093 Fecha à 4ªCasa da Cisterna Rua da Cadeia nº 7 e Largo da Igreja Castelo Rodrigo E-mail Telf: 271313515 ou 917618122
REFERÊNCIAS:
Nesta aldeia o tempo é outra coisa e o barro é para todos
Na Lousã há uma aldeia de xisto que esteve abandonada e hoje tem alojamento e uma escola de artes aberta a todos. Na Cerdeira os dias passam mais devagar e ganha-se a serra, o vale. Para os que gostam de experimentar, há cursos de cerâmica, desenho e muito mais. Tudo para nos ligar à terra, à água, aos carvalhos e castanheiros. (...)

Nesta aldeia o tempo é outra coisa e o barro é para todos
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-05-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: Na Lousã há uma aldeia de xisto que esteve abandonada e hoje tem alojamento e uma escola de artes aberta a todos. Na Cerdeira os dias passam mais devagar e ganha-se a serra, o vale. Para os que gostam de experimentar, há cursos de cerâmica, desenho e muito mais. Tudo para nos ligar à terra, à água, aos carvalhos e castanheiros.
TEXTO: Ainda de longe, sob a chuva cerrada, é difícil perceber que tamanho tem. Do fim da estrada, no largo onde se deixam os carros e onde há uma capela muito pequenina com as paredes rebocadas, coisa pouco comum para aqueles lados, é impossível dizer quantas casas terá. À medida que se caminha, começa a ouvir-se a água do riacho, de cascatas vigorosas nesta época do ano, e o canto dos pássaros. Se estivéssemos na chamada época da brama (entre Setembro e Novembro), período de acasalamento do maior mamífero da serra da Lousã, talvez pudéssemos juntar os veados a esta banda sonora de boas-vindas a uma das mais bem preservadas aldeias de xisto da região. Rodeada por um emaranhado de caminhos que apetece percorrer, plantada na encosta como se sempre ali tivesse estado, a Cerdeira passou dez anos abandonada, antes de renascer graças ao impulso de dois casais — o dos alemães Kerstin Thomas e Bernard Langer e o dos portugueses Natália e José Serra —, e tem hoje um projecto de turismo rural que inclui uma escola de artes voltada para as práticas manuais como a olaria, a pintura em cerâmica e a tecelagem (Cerdeira, Arts & Crafts School). “O que queremos é que as pessoas venham até aqui para se desligar do mundo que conhecem e para viverem mais perto esta natureza que é tão inspiradora e que, por isso mesmo, pode fazer com que lhes apeteça experimentar o trabalho do barro ou da madeira. Aqui o tempo é outra coisa”, diz Kerstin Thomas, a escultora alemã de 54 anos que descobriu a Cerdeira aos 24, quando estudava em Coimbra e quando tudo o que queria, lembra à Fugas, era um espaço para o seu atelier. Acabou por encontrar um para viver, e isso foi há já 30 anos. Desde então, foi apresentando a aldeia aos amigos e alguns deles estão hoje a ajudar a recuperá-la. “Quando chegámos, a maioria das casas estava muito degradada, não havia saneamento, nem electricidade, a rua que atravessa a aldeia não estava arranjada. Hoje tudo isso está mudado. ” Na parte de cima da Cerdeira Kerstin encontrou o local ideal para montar o seu estúdio e bastou isso para que desse início a um projecto que levou à recuperação de metade das casas. As contas são simples: “A aldeia tem 30 casas, todas em xisto, e nós recuperámos 16, mas nem todas são para ficar — temos a biblioteca, o café, a galeria, a oficina, a casa das artes…”Onde dormirCerdeira Village Lugar da Cerdeira, Lousã Tel. : 239160799/911789605 Site Nove casas de xisto recuperadas que no conjunto recebem até 32 pessoas. A capacidade das casas varia e os preços começam nos 70 euros. Onde comerSabores da Aldeia Aldeia do Candal Tel. : 239 991 393Ti Lena Aldeia do Talasnal Tel. : 911 932 948Casa Velha Praça Sá Carneiro, 14, Lousã Tel. : 239 991 555Nove delas estão preparadas para alojamento e foram recuperadas respeitando técnicas tradicionais e usando materiais locais, tornando a construção tão sustentável quanto possível. Foi a Casa das Artes, que hoje serve de sala de exposições e de trabalho para grupos maiores (a aldeia é também muito usada para “retiros” de empresa) e que tem uma vista soberba sobre o vale, o “balão de ensaio” para o projecto de alojamento que arrancou em 2012 com duas casas. “Para nós era muito importante que as casas fossem muito eficientes em termos energéticos, mas que mantivessem não só a traça arquitectónica, como métodos de construção da região. ” Usar materiais e mão-de-obra locais, estabelecendo modelos para intervenções semelhantes na serra, também estava entre os objectivos. A arte, essa, seria sempre um factor diferenciador. As nove casas que recebem com todo o conforto os hóspedes — o projecto deverá ficar por aqui no que ao alojamento diz respeito — têm intervenções de escultores ou ceramistas. É assim na Casa do Sol, que deve o nome ao facto de ser a primeira a recebê-lo (quando ele se deixa ver) pela manhã, com as portas e janelas de João Gomes; na da Azeitona, em que as criações em têxtil de Vânia Kosta homenageiam animais ligados à aldeia (é lá que ficamos a saber que Branquinha é nome de cadela e que o Azeitona era um gato); na das Vizinhas, em que as esculturas em madeira da própria Kerstin Thomas sublinham a importância das relações porta a porta nestas pequenas comunidades serranas, durante décadas muito isoladas; ou na das Estórias, com as peças de Carmina Anastácio e de Martim Santa Rita a recordarem o papel da oralidade nas noites rigorosas de Inverno, à lareira, ou nas tardes de Verão, à sombra, quando o calor não deixava trabalhar. “As pessoas que vêm não querem só dormir num lugar bonito. Querem mais e nós queremos dar-lhes mais. ”A maioria das 27 povoações abrangidas pela Agência para o Desenvolvimento Turístico das Aldeias do Xisto (Adxtur), que envolve também a Cerdeira, não chegou a ser abandonada, lembra Thomas: “Na Cerdeira foi diferente. As pessoas começaram a sair nos anos 1920, mais intensamente depois, na década de 60, até isto ficar vazio. Iam para Lisboa, trabalhar na estiva, ou para os Estados Unidos. ” A escultora chegou a conhecer alguns dos antigos moradores e ainda hoje mantém contacto com os seus descendentes. Os que foram para a capital ficaram quase todos a morar no mesmo bairro. “Repetiam esta comunidade, mas noutro lugar, noutra rua. ”O que fazerPara além dos percursos pedestres e de BTT disponíveis, assim como nove roteiros pela região Centro, na Cerdeira encontra uma oferta variada de cursos e workshops. Há também um festival anual — Elementos à Solta — que transforma a aldeia numa galeria. Tel. : 911789603 SiteComprarNa loja do Candal há mel, vinho, queijos, enchidos e artesanato da região. Estrada Nacional 236 Tel. : 239 991 393Tendo ficado deserta, continua, a Cerdeira perdeu a riqueza humana e tudo o que ela traz: “Não temos os campos cultivados, aqui não se produz azeite, não se faz vinho, nem pão, nem chouriços… As histórias que conhecemos sobre este lugar foram aquelas que conseguimos encontrar fora daqui. Tínhamos à partida uma grande riqueza arquitectónica, é verdade, mas faltavam as pessoas. ” Hoje já não faltam — oito famílias estão a recuperar a aldeia e os planos de alguns dos seus membros passam por viver ali todo o ano. Na aldeia não há televisão, o uso do telemóvel depende do operador que se tiver (só um tem cobertura de rede) e a Internet está limitada ao Café da Videira, onde são servidos os pequenos-almoços e onde se pode ir ler um jornal ou tomar uma bebida a meio da tarde. É também lá que está a chave da biblioteca, um espaço pequeno, mas muito acolhedor, perfeito para trabalhar quando é mesmo preciso roubar algum tempo aos dias ali passados em família ou com amigos. No café estão também disponíveis nove roteiros para descobrir a região, com paragem em locais de interesse histórico e natural, assim como muitos percursos que se podem fazer a pé ou de bicicleta e que levam a aldeias vizinhas, obrigando a serra a revelar-se, devagarinho. Por baixo do Videira fica uma pequena loja, onde se podem comprar peças da autoria de alguns dos artistas que têm vindo a participar no festival que ali se realiza anualmente desde 2006 — chama-se Elementos à Solta e reúne uns 15 criadores nacionais e estrangeiros, que se desdobram em exposições, palestras e ateliers — e que são hoje convidados para dar formação na escola da aldeia (Cerdeira, Arts & Crafts School). Desde o ano passado que Kerstin Thomas organiza na Cerdeira, de forma mais estruturada, cursos de cerâmica ou de desenho que ocupam vários dias, semanas criativas que misturam várias artes e workshops temáticos de três horas em que os participantes podem experimentar a tinturaria natural, a fiação de lã, a talha em madeira de castanho, a construção de casas de xisto em miniatura ou, simplesmente, aprender a preparar uma chanfana, prato típico que é servido em muitos dos restaurantes da região. “Criar este centro na aldeia não tem só a ver com a nossa formação artística, tem a ver com garantir o futuro. Para continuar, a aldeia precisa de ter algo mais do que as infra-estruturas básicas que já tem. A arte dá-lhe uma razão para sobreviver para além da nossa paixão por ela. ”Não se trata apenas de recuperar o passado quando se trabalha em barro ou no tear, defende, trata-se de viver bem o presente e de imaginar o que há-de vir. “Diz o World Craft Council [organização não governamental criada em 1964 e ligada à UNESCO que se destina a promover o desenvolvimento a partir das actividades relacionadas com as artes e ofícios] que o futuro é feito à mão – eu acredito nisso. ”Renato Costa e Silva é ceramista e escultor e um dos formadores com que a escola da Cerdeira trabalha. Deu, com Kerstin Thomas, o curso de iniciação à cerâmica que a Fugas acompanhou em meados de Março. Perante um grupo pequeno de “artistas não profissionais” — dos três formandos, dois eram da área da saúde e o outro arquitecto — Renato recorreu à sua experiência de 40 anos para mostrar, com grande serenidade e um sorriso generoso, as possibilidades infinitas do barro. Começa por explicar como é formado — “microcristais que se organizam de forma lamelar” — para depois poder ensinar a prepará-lo, em camadas, como se fosse massa folhada. “O barro cria memórias”, diz, “se o dobramos de determinada maneira, ele fica com essa memória e depois, mais à frente, quando julgamos estar já a fazer outra coisa, ele vai buscar esse jeito inicial. ”Na oficina onde o curso decorre há duas rodas eléctricas, caixas de barro e de outros materiais, duas mesas de marcenaria com um pequeno torno, cadeiras, peças já terminadas e outras que esperam a sua vez para entrar no forno, e uma salamandra que ajuda a tornar ainda mais acolhedor este espaço onde se pode experimentar sem limites, onde se pode “perder” tempo para se ganharem outras coisas. “A causa-efeito é o vosso guia. Se hoje correu mal não façam outra vez sem perceber por que é que correu mal”, continua Renato, que por vezes parece falar como se estivesse a treinar quem o ouve para a vida e não apenas para o trabalho manual. “Gosto do lado de mistério do barro — haverá sempre muita coisa que eu ainda não sei, que ainda não descobri. E isso torna-me mais atento, mais disponível. É como com as pessoas e as coisas que fazem parte da nossa vida — quanto mais elas nos intrigam, mais nos interessam. ”Filho de um minhoto e de uma alentejana, Renato Costa e Silva começou por estudar arquitectura, no Canadá, mas acabou por regressar à Terceira, ilha onde nasceu e onde passa ainda boa parte do ano. Experimentou esculpir em ferro, madeira, pedra e argamassas de cimento, fez gravura, serigrafia e litografia, mas depois voltou-se para o barro e é esse o material que hoje mais trabalha. Começou sozinho a pegar nele, encomendou uns livros técnicos de cerâmica em Inglaterra e foi explorando. Em meados dos anos 1980, pediram-lhe que fizesse um levantamento dos barros da ilha, que o escultor depois analisava nos laboratórios da Universidade dos Açores: “Demorei algum tempo a perceber que eram barros vulcânicos e que, por causa disso, tinham características muito especiais. ”À Cerdeira chegou pela primeira vez para trabalhar em Setembro de 2015, quando os veados bramavam e não estava ainda construído o forno do japonês Masakazu Kusakabe, um ceramista que há quase 50 anos faz as suas cozeduras a lenha e que estará de regresso à aldeia para mais um curso em Agosto (4 a 11). Enquanto explica como se fazem placas de barro, onde depois se podem imprimir texturas usando rendas, esteiras, folhas ou pedaços de casca de árvore, Renato vai demonstrando por que razão o barro é um material generoso e sustentável, sempre a refazer-se, a renascer. “As únicas normas são ditadas pela reacção dos materiais”, diz o escultor. “A gente pode experimentar tudo e o que não der… Vamos construindo mas, se começarmos a abusar, a peça sente-se, dá de si. Claro que há truques para fazer com que aguente um pouco mais, mas a engenharia tem limites. Uns limites que só descobrimos fazendo, errando. E toda a gente pode pegar no barro, fazer, errar e fazer outra vez. ”Há muitos criadores, diz, que fazem carreira a partir daquilo que para outros não passa de um defeito. “Gosto disto de não haver regras rígidas. É sempre possível corrigir a mão da próxima vez. ” Uma forma de aprender, seja a moldar, a secar, a cozer ou a decorar, é repetir os processos, garante o formador, que começou a trabalhar mais intensamente em escultura há quase 20 anos e que regressa à aldeia para um novo curso com Kerstin já em Julho (7 a 15). A Cerdeira é uma das protagonistas do Craft+Design+Identidade, projecto da Agência para o Desenvolvimento Turístico das Aldeias do Xisto (Adxtur) que envolveu nos últimos anos nove escolas superiores de design (como a ESAD de Matosinhos e das Caldas da Rainha ou o Instituto Politécnico de Castelo Branco) e 22 ateliers de criação artística com base nas técnicas tradicionais espalhados pelo país. Este projecto, que toma as 27 Aldeias do Xisto como fonte de inspiração e território de experiências várias, que é coordenado pelo designer João Nunes e que envolveu cerca de 150 pessoas, deu já origem a uma trilogia expositiva que começou em 2013 com Água Musa, continuou no ano seguinte com L4Craft e termina agora com Agricultura Lusitana 2015-18, no Museu de Arte Popular (MAP), em Lisboa, até 30 de Dezembro. Quem for ao MAP poderá ver dezenas de peças contemporâneas que nasceram da interacção de artistas, alunos e professores com o tecido natural e humano de pequenos (uns mais do que outros) aglomerados do interior centro do país, como Janeiro de Cima, Benfeita, Ferraria de São João, Fajão ou Aldeia das Dez. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. “A ideia foi levar os alunos destas escolas a mergulhar no espaço e a interpretá-lo. Mas queríamos que o fizessem com tempo, mantendo esta ligação à terra e às pessoas. E uns conseguiram-no melhor do que outros, o que é natural”, diz Kerstin. Na escola da Cerdeira, continua a escultora, também se pretende que as pessoas se envolvam com o que as rodeia, divertindo-se e aprendendo ao mesmo tempo. “A ligação à terra, aos materiais, é absolutamente fundamental para ganharmos equilíbrio. É como fazer BTT ou correr. Trabalhar o barro ou a lã enriquece a nossa vida. É altamente satisfatório fazer uma coisa com as mãos e chegar ao fim do dia e ter um objecto a mostrar-nos o que aprendemos e, ao mesmo tempo, o que ainda não sabemos. ” E é altamente satisfatório fazê-lo num lugar como este. A Fugas viajou a convite da Cerdeira Village
REFERÊNCIAS:
Uma imponente festa nordestina nos coliseus
Alceu Valença, Elba Ramalho e Geraldo Azevedo conquistaram o Coliseu de Lisboa com a celebração dos 20 anos d’O Grande Encontro. Uma imponente festa nordestina. Na primeira parte actuou o pernambucano Almério. (...)

Uma imponente festa nordestina nos coliseus
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-07-16 | Jornal Público
SUMÁRIO: Alceu Valença, Elba Ramalho e Geraldo Azevedo conquistaram o Coliseu de Lisboa com a celebração dos 20 anos d’O Grande Encontro. Uma imponente festa nordestina. Na primeira parte actuou o pernambucano Almério.
TEXTO: Quem vira o DVD já imaginava ao que ia. E quem programou o espectáculo também: os bilhetes para o Coliseu de Lisboa eram de preço único (com acesso a qualquer ponto da sala) e as cadeiras da plateia foram retiradas, para em seu lugar ser improvisada uma pista de dança. Mas uma coisa é ouvir e ver um vídeo, outra é sentir o apelo e a força que um espectáculo como O Grande Encontro tem ao vivo, capaz de “abanar” uma sala. Mesmo assim, convém fazer uma ressalva: o espectáculo que desde 2016 comemora ao vivo os 20 anos do Grande Encontro original, reunindo Alceu Valença, Elba Ramalho e Geraldo Azevedo (Zé Ramalho, que participou nos três anteriores, desta vez não quis), não tem paralelo com as sessões de suada aeróbica a que nos habituaram cantoras como Ivete Sangalo ou Daniela Mercury, é uma outra coisa, mais refinada; um apanhado de ritmos e estilos nordestinos que apelam à dança mas também ao intelecto, num desfile por onde passam o baião, o frevo, o maracatu, a ciranda, a embolada, o xote, numa rica diversidade de géneros que excita os sentidos e também conforta a alma. Há neles um brilho genuíno que teima em não ceder à tentação da frivolidade, um sentido das raízes e das heranças mais celebradas (Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro, Dominguinhos) que de algum modo nos conduz a um enquadramento histórico dos seus percursos. Alceu Valença, Elba Ramalho e Geraldo Azevedo Lisboa, Coliseu dos Recreios Quinta-feira, 12 de Julho, às 21h 1. ª parte: Almério Sala quase cheia (repetiu no Coliseu do Porto, dia 13, às 21h)Porque Alceu, Elba e Geraldo mantêm vivas, desde há décadas, carreiras individuais, servindo este reencontro para celebrar a força da música nordestina e dos seus autores. O Grande Encontro 20 anos difere, essencialmente, do primeiro (gravado no Canecão, em Julho de 1996) em dois pontos: onde este era totalmente acústico, vozes e violões, sem cenário pré-concebido, o actual ganha o peso e a força acústica e eléctrica de uma banda de sete elementos, acrescida de cenários coloridos e visualmente sumptuosos; e onde o primeiro era juvenil e transpirava leveza, exibe este uma madura vitalidade. No Coliseu de Lisboa, onde muita gente dançou alegremente (na plateia ou mesmo nas bancadas) ao longo da noite, o alinhamento distanciou-se muito pouco do que foi registado no DVD gravado no Brasil em 2016 (e já disponível nas lojas portuguesas). Começou com Anunciação, desde logo num ambiente de festa, e seguiu o roteiro sem dele se afastar, com Caravana, Me dá um Beijo, Sabiá (tema imortal de Luiz Gonzaga, como imortal é um outro Sabiá, o de Tom Jobim), Papagaio do Futuro, Coco das Serras, Moça bonita, Sétimo céu, Dona da minha cabeça e Dia branco. Primeiro com os três cantores em palco, depois só com Alceu e Geraldo e por fim com Geraldo a solo. Geraldo que, sem ser tão efusivo quanto os seus companheiros desta aventura, cativa plateias com a sua voz envolvente e a profundidade musical e poética das suas canções. Neste sentido, O Grande Encontro é também um espectáculo múltiplo, em trio, duos ou a solo, assomando cada um dos protagonistas à ribalta, à vez. Foi com Sabor colorido que Geraldo cedeu a Elba o protagonismo, juntando-se-lhe em Bicho de 7 Cabeças, Chorando e cantando e O Princípio do Prazer, todas canções com a sua assinatura. Depois ficou Elba a solo, brilhando (e com que voz, já refeita de uma infecção que a tolhera nas vésperas) em temas como Chão de giz, Ai que saudade d’ocê ou o medley nordestino Na base da chinela, Qui nem jiló e Eu só quero um xodó, celebrando a um só tempo Jackson do Pandeiro, Luiz Gonzaga e Dominguinhos, os respectivos autores. Foi uma interpretação electrizante, desde o primeiro tema, chegando Elba a descer à plateia para cantar no meio do público, obtendo deste uma atenção calorosa e vibrante. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Depois foi a vez de Elba passar o testemunho a Alceu, cantando juntos Ciranda da Rosa Vermelha, e ficando cada qual a agitar um shaker enquanto o outro solava. Quando Alceu se apropriou do palco, começou por um tema (ausente do alinhamento brasileiro) que dirá mais a Portugal do que ao Brasil, até porque foi composto em Lisboa e com várias referências locais: Loas de Lisboa. Vale a pena citar uma parte: “Ao pé de uma praça/ Chamada alegria/ Havia uma rua/ Que responderia/ O porquê dessa chuva/ Sem filosofia, / A grande verdade/ É que a chuva chovia/ A grande verdade/ É que a chuva nascia/ Na rua Mãe d’Água/ Depois se expandia/ lavava Lisboa/ E me comovia. ” Alceu, agitador nato, fez então desfilar alguns dos seus temas “fatais”, aqueles que arrebatam plateias logo aos primeiros acordes: La Belle de Jour, Girassol, Como dois animais, Coração bobo, Cabelo no pente e Tropicana. Com a festa no auge, e já com Elba e Geraldo regressados ao palco, interpretaram os três, e com a banda a todo o gás, Táxi lunar, Pelas ruas que andei, Banho de cheiro e Frevo mulher, esta última criação de Zé Ramalho e forma de o trazer a um palco português, mesmo que fisicamente ausente. Celebração musical e cultural nordestina, apologia de um apelo dançante que não rejeita (pelo contrário) o envolvimento cerebral, O Grande Encontro abraçou Lisboa com o calor que o fez nascer e renascer no Brasil. Chegou tarde? Mas chegou em boa hora. P. S. : – Na primeira parte do espectáculo, actuou Almério, cantor e actor pernambucano que já abrira O Grande Encontro no Rio de Janeiro em 2017. Com 37 anos e dois discos editados (Almério, 2013; e Desempena, 2017), Almério faz lembrar, em palco, um misto do Roger Daltrey do início dos The Who (tronco nu e uma casaca de peles ou tiras) com um émulo de cantores como Ney Matogrosso ou Filipe Catto (pela androginia da voz e da pose, embora longe destes), parecendo ainda alguém que está mais a “fazer género” do que a procurar uma voz distinta no já muito plural panorama brasileiro. Próximo do rock e da performance, decerto pela via teatral, Almério apresentou no Coliseu várias canções do seu repertório, como Trêmula carne, Segredo, Queria ter pra te dar ou Por que você, a par de uma versão pouco apelativa de Fado tropical, de Chico Buarque. A ter em atenção, na sua evolução futura. Ainda em Portugal, Almério vai participar, com o seu grupo, no festival Mimo, em Amarante, no dia 21 de Julho, às 20h.
REFERÊNCIAS:
Entidades NATO
Todos diferentes, todos iguais, todos vários
Neste Dia dos Irmãos, são memórias que bailam comigo. Do meu irmão Fernando e de outros irmãos que fui recebendo ao longo da vida. (...)

Todos diferentes, todos iguais, todos vários
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-05-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: Neste Dia dos Irmãos, são memórias que bailam comigo. Do meu irmão Fernando e de outros irmãos que fui recebendo ao longo da vida.
TEXTO: A festa dos irmãos, o 31 de Maio, é uma grande festa, uma festa de inesgotável variedade. As relações entre irmãos e irmãs variam muito consoante o seu número, o sexo e a diferença de idades. A observação tem-me mostrado isso. Dois irmãos quase da mesma idade não são iguais a outros de idade afastada, nem iguais a duas irmãs ou a um irmão e uma irmã. Muitos irmãos, como sete, nove ou mais, parece organizarem-se por patamares, gerando subgrupos entre os mais velhos, os do meio, os mais novos. Um irmão muito mais novo de duas ou mais irmãs é um príncipe, uma espécie de boneco adorado. Mas, se for o mais velho de somente irmãs, parece ser-lhes um estranho: nem o entendem, nem o adoram, nem brincam com ele – verdade seja que esse único entre as mulheres também não mostra muita paciência para elas. O quadro é semelhante se for uma rapariga mais nova de só irmãos, em que estes tendem a assumir um papel protector. Mas já se a rapariga for a mais velha, o quadro típico muda: os rapazes, todos mais novos, funcionam à parte; a irmã mais velha tenta, repetidas vezes, papéis de mandona, de segunda mãe, propósito em que costuma ser mal sucedida. Se os irmãos são só rapazes, a cumplicidade é intensíssima. Dois são parelha ideal para a paródia e a asneira, ou núcleo formidável em equipas de bairro, de escola ou de amigos. Quem não se lembra dos irmãos Nunes, ou dos Castrinhos ou dos Sousas? E se são três, quatro ou cinco, todos seguidos nas idades, a coisa pode evoluir para grupos lendários de temível coesão. Se forem só irmãs, o quadro é similar, embora mudem os jogos, as dinâmicas e os temas grupais para os interesses e olhares mais típicos nas raparigas. Se a muitos irmãos, nasce um irmão ou irmã muito mais novo, esse bebé, essa criança tardia muda todo o quadro estabelecido, ganhando novidades e riqueza para toda a vida. Diferentes são as relações se são todos filhos dos mesmos pai e mãe – os irmãos germanos – ou só do mesmo pai ou da mesma mãe, mas, se não há veneno a ser metido, é marcante a unidade como laço que todos querem construir e proteger. Cada um sabe do seu quadro. A minha experiência é a de dois irmãos, a mais simples de todas. Só tive um irmão, um ano e meio mais velho do que eu. Desenvolvemos cumplicidade fortíssima, que ninguém desenhou, nem ensinou. Cresceu connosco e nós com ela. Hoje, nos meus netos, há dois irmãos, ainda muito pequenos (um a chegar aos quatro, outro a caminho dos três anos), com quase a mesma diferença de idades que eu tinha do meu irmão. Tenho dado várias vezes por mim a deliciar-me a observar a forma como, ainda antes das primeiras palavras do mais novo, aprenderam a comunicar entre ambos, a inventar jogos e brincadeiras, a bulhar até partilharem, a construir alianças, a tentar ludibriar o outro, a construir espaço comum e conquistar espaço próprio, ou o mais velho a querer mandar e o mais novo a furtar-se. Os primeiros amigos um do outro, amigos para sempre, amigos para toda a vida. Sendo o mais novo, usei sapatos, calções, camisolas, casacões que tinham sido de meu irmão. Andei nas mesmas escolas que ele, a maior parte do tempo um ano atrás dele: na infantil, na escola primária n. º 24, na secção de Alvalade do Camões, no Padre António Vieira. Estudei pelos mesmos livros que tinham sido dele. Os percursos separaram-se, quando ele seguiu a alínea “F” (engenharias) e eu a alínea “E” (direito). Mais ainda quando ele escolheu a Escola Naval e eu fiquei por casa para ir para a Faculdade. Começámos a fumar praticamente na mesma altura, aí pelos 13 ou 14 anos – um disparate monumental, que fazia parte da cultura do tempo. Ao meu irmão, foi isso que o matou aos 61 anos; a mim, embora já tenha deixado de fumar há uns bons anos, nunca sei. Até ao ensino superior nos separar, incontáveis milhares de quilómetros fizemos a pé, lado a lado, ano após ano, em longas e repetidas caminhadas entre casa e a escola e, depois, o liceu, para ir e para voltar. Dormíamos, brincávamos e estudávamos no mesmo quarto – por vezes, a brincadeira e o estudo transbordavam para outras partes. O Fernando mostrou, entre outros talentos, jeito para a música. A certa altura, comprou uma gaita. E não é que aprendeu a tocar sozinho? Passou a passatempo quotidiano, por vezes um pouco massacrante: não é fácil partilhar o quarto com o Mozart da gaita-de-beiços. Definiu e apurou o repertório para espectáculos familiares ou com amigos. Tornou-se um clássico de grande risota quando actuava ao lado de um cão que tínhamos, o “Dominó”, rafeiro, mas melómano. Quando o meu irmão tocava, o “Dominó” desatava a uivar sentidamente; só se calava quando a harmónica deixava de se ouvir. Nunca ficou inteiramente esclarecido a que se devia o fenómeno: se era protesto, se querer cantar na onda melódica da inspirada gaita. A nota mais dominante da nossa parceria foi a inventiva e a criação. Em S. Domingos de Rana, onde passávamos férias, a garagem foi nosso laboratório social multiusos. Em Verões consecutivos, foi sujeita a múltiplas metamorfoses: estaleiro de Lego e comboio eléctricos, com arrojados e sempre remodelados percursos; estúdio de pintura; laboratório de química; centro botânico experimental; sala de jogos e, depois, sala de jogo; laboratório fotográfico, com câmara escura, e sala de montagem de cinema; discoteca ou, como na altura dizíamos, “boîte”, nesse tempo imortal das festas de garagem dos slows e do yé-yé. O meu lado “bricoleur”, que ainda mantenho e exerço, devo-o à contínua e variada aprendizagem destas engenhocas, em que imaginávamos, construíamos e resolvíamos todos os problemas surgidos. Aprendi grandes lições de vida. O Fernando gostava muito de provas de campo – eu não. Uma vez, teve uma na serra da Arrábida. Coisa dura: várias equipas de pares tinham de descobrir o caminho, por uma série de mensagens e sinais, ao longo de cerca de 50 quilómetros de matas, trilhos e encostas, previstos para dois dias. A dupla do meu irmão desistiu, cansados, desorientados, crendo-se perdidos, ao fim do segundo dia. Ficaram fulos consigo mesmos: estavam apenas a 1 km da meta, menos de uma hora. Ficou para ele e para mim como lição contra a desistência: ao percorrermos o desconhecido, nunca sabemos se já só falta o mais fácil. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Quando voltou dessa prova de campo, convenceu-me a armar a tenda num pequeno relvado ao lado da garagem e dormirmos lá nessa noite, antes de a devolver. O cão também. Tudo esteve bem até o Fernando adormecer. Depois de me certificar de que ele já dormia profundamente, escapuli-me para o meu quarto e a minha cama. O cão, que era da mesma religião, fez o mesmo. O Fernando ficou entregue à paz campista de que tanto gostava. Eu e o “Dominó” não. Neste Dia dos Irmãos, 31 de Maio, são memórias que bailam comigo. Do meu irmão Fernando e de outros irmãos que, sendo amigos tão chegados e com laços tão próximos e tão cúmplices, fui recebendo ao longo da vida: o Adelino Amaro da Costa, o José Artur Quesada Pastor, o Roberto Carneiro, o Rui Pena; os primos, prolongamento dos irmãos; os irmãos dos pais, os tios, com que cresce mais abertura e confidência, marca da cumplicidade. O Dia dos Irmãos é para nos festejarmos uns aos outros, no espaço da vida e das memórias de cada um. Somos diferentes e iguais, somos muito vários, somos parecidos e sempre próximos. Perto ou longe, é sempre como se ainda ontem tivéssemos estado juntos. A vida nunca parou entre nós. Bom Dia dos Irmãos!
REFERÊNCIAS: