Os meus queridos livros de Agosto
Sete sugestões de livros para férias contra a ideia feita de que, nesta época, o cérebro só absorve literatura light. (...)

Os meus queridos livros de Agosto
MINORIA(S): Migrantes Pontuação: 6 Animais Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-10-19 | Jornal Público
SUMÁRIO: Sete sugestões de livros para férias contra a ideia feita de que, nesta época, o cérebro só absorve literatura light.
TEXTO: Regularmente tenho apresentado neste espaço algumas sugestões de livros para férias. Com a mesma regularidade tenho-me pronunciado contra a ideia feita de que, nesta época, o cérebro só absorve literatura light. Pelo contrário, quando temos mais tempo para ler, podemos descobrir mundos desconhecidos (enfatizo a palavra “descobrir”, agora maldita), dando novos mundos a nós mesmos. Alinho aqui alguns títulos, todas eles edições recentes, por ordem alfabética do apelido do autor. — André, João Paulo, Poções e Paixões. Química e Ópera, Gradiva. Este livro, ricamente ilustrado, de um professor de Química da Universidade do Minho e entusiasta da ópera, é uma obra singular que reúne as “duas culturas”, ao relacionar de uma maneira assaz cativante duas áreas tão aparentemente distantes como a química e a ópera. Com sabedoria e elegância, o autor revela-nos que há muita química na ópera. — Camarneiro, Nuno, O Fogo Será a Tua Casa, Dom Quixote. Tenho acompanhado a obra do autor, engenheiro físico que foi meu aluno na Universidade de Coimbra. Depois de ter ganho o Prémio Leya de 2012 (Debaixo de Algum Céu), escreveu a colecção de contos, Se Eu Fosse Chão, e agora faz uma incursão literária pelo Médio Oriente, onde a guerra tudo incendeia. Aqui descreve-se o drama de um grupo de reféns, de vários países, nas mãos de fundamentalistas islâmicos. — Endo, Shusaku, O Samurai, Dom Quixote. O autor é o mesmo de O Silêncio, que conta a odisseia de dois jesuítas portugueses no Japão no século XVII e que serviu de guião ao filme de Martin Scorsese. Este livro, que é uma reedição, conta a aventura de um japonês, Hasekura Tsunemaga, que, no mesmo século, chegou a Espanha via México. Está ainda por contar em literatura a viagem de Bernardo de Kagoshima, outro samurai japonês que se tornou jesuíta e que, 60 anos antes de Tsunemaga, foi o primeiro japonês a chegar à Europa. Descobriu-nos, portanto. — Magalhães, Gabriel, Os Crimes Inocentes, Planeta. Do autor, professor de Literatura na Universidade da Beira Interior, li com muito gosto o Como Sobreviver a Portugal continuando a ser Português (um original ensaio sobre a portugalidade) e Restaurante Canibal (uma divertida sátira). E, por isso, está no meu saco de férias o último romance dele, que parte de um crime perpetrado no Museu dos Coches, que vai ser deslindado por uma filha de emigrantes que vive de empregos precários. Juntando cultura e política, humor e horror, o livro promete. . . — Magdalena, Carlos, O Messias das Plantas. Aventuras em busca das espécies mais raras do mundo, Bizâncio. Magdalena é horticultor nos Jardins Botânicos Reais de Kew, perto de Londres, um dos maiores e melhores jardins botânicos do mundo. Tem dedicado a sua vida a salvar plantas em vias de extinção, procurando-as nos mais remotos cantos do planeta. Um volume imprescindível para quem se interessa pelo prodigioso mundo vegetal. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. — Reeves, Hubert, O Banco do Tempo Que Passa. Meditações Cósmicas, Gradiva. O conhecido astrofísico e divulgador de ciência canadiano, que escreveu Um pouco mais de azul e vários outros bons livros, dá-nos neste livro uma súmula do seu pensamento científico e filosófico, em que cabem tanto o fascínio pelo imensíssimo cosmos, como o alerta pela necessidade de defesa da biodiversidade na Terra. A Gradiva publicou também recentemente duas bandas desenhadas de Reeves, ambas desenhadas por Daniel Casanave. — Verney, Luís António, O Verdadeiro Método de Estudar, Círculo de Leitores (coordenação, introdução e notas de Adelino Cardoso). Esta é uma das obras maiores da cultura nacional, por ter sido o primeiro tratado pedagógico escrito na nossa língua. Quando saiu, em 1746, suscitou uma enorme polémica, entre “antigos” e “modernos, ” tendo mais tarde inspirado a Reforma Pombalina da Universidade. Obra ecléctica, trata tanto da poética e da retórica como da física e da química, é o vol. 27 da colecção Obras Pioneiras da Cultura Portuguesa, coordenada por José Eduardo Franco e por mim, que reúne o “ADN da cultura nacional”. Já saíram dez volumes, alguns deles sobre as descobertas marítimas dos portugueses. Boas leituras. Boas férias!
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave crime guerra filha cultura extinção japonês
A Itália na batalha europeia
O governo de Roma proclama ter “eliminado a pobreza pela primeira vez na História”. Toda a política está já virada para as europeias de Maio de 2019. (...)

A Itália na batalha europeia
MINORIA(S): Migrantes Pontuação: 6 Animais Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-10-26 | Jornal Público
SUMÁRIO: O governo de Roma proclama ter “eliminado a pobreza pela primeira vez na História”. Toda a política está já virada para as europeias de Maio de 2019.
TEXTO: São raros os dias com boas notícias. Ontem, o Movimento 5 Estrelas (M5S) anunciava no Facebook: “Eliminámos a pobreza. Pela primeira vez na História. ” É pena que seja uma notícia imaginária para consumo dos eleitores, com os olhos postos nas eleições europeias de Maio de 2019. Celebrava a aprovação da “lei financeira” que consagra a proposta-bandeira do seu programa eleitoral, o “rendimento de cidadania”. O seu líder, Luigi di Maio, assinalou o “facto histórico” — o primeiro “orçamento do povo” — numa varanda do Palácio Chigi (sede do governo) perante o delírio de algumas centenas de adeptos. Na segunda-feira, tinha sido a vez de a Liga, de Matteo Salvini, fazer aprovar a sua “lei da imigração e da segurança”, mostrando que cumpre as suas promessas e recolhendo aplausos muito para lá do seu partido. A fixação do défice em 2, 4%, durante três anos, foi uma vitória de Di Maio e Salvini sobre o ministro das Finanças, Giovanni Tria, após um longo braço-de-ferro. Teve imediatos reflexos na bolsa e nos juros da dívida. Tria não se demitiu. Ele representa o “sentido da realidade” e a “máquina do Estado”, servindo de garante junto dos investidores e da UE. A demissão seria uma “arma atómica” que dificilmente poderia usar. Nota relevante: a abertura de um contencioso com Bruxelas será capitalizada por Salvini e não por Di Maio. O “rendimento de cidadania” é o nome político de um subsídio. Não é universal (destina-se sobretudo ao Sul), não é igual para todos, nem aparece integrado num programa articulado de combate à pobreza. Pode beneficiar 6, 5 milhões de italianos (mas não os imigrantes), com rendimentos abaixo do limiar da pobreza — 760 euros. Teria este mesmo valor, mas poderá ficar numa média de 560 euros. Para os críticos, é “um retrocesso ruinoso em direcção ao assistencialismo da I República” (Corriere della Sera). O ponto mais polémico é o impacto no défice e nos juros da dívida. O comissário europeu Pierre Moscovici advertiu Roma: “Os italianos não se devem enganar. Cada euro a mais na dívida é um euro a menos para as auto-estradas, para escola, para a justiça social. ”O debate é retórico e inflamado. Di Maio proclama: “O nosso horizonte não é este ano ou o fim da legislatura, mas 2050. ” Na realidade, o horizonte são as europeias de Maio. Massimo Giannini, colunista do La Republica, replica: “O ‘orçamento do povo’, de Di Maio e Salvini, por muito sedutor que seja na forma, arrisca-se a ser para o país um banho de sangue na substância. ”Que pensam os italianos? De momento, estão satisfeitos com o Governo — uma taxa de aprovação de 62%, a mesma de que Matteo Renzi gozava no primeiro ano de governo. A antiga “partidocracia” continua a ser execrada. A oposição desintegrou-se. O Partido Democrático (PD) é hoje uma espécie “em vias de extinção” (Roberto d’Alimonte). O berlusconismo sofreu uma hemorragia em favor da Liga. Continua a lua- de-mel entre o Governo e o país. Contra isto não há argumentos. A coligação não tem adversários externos. O “inimigo” estará no interior da própria maioria, do ministro Tria aos conflitos entre os dois partidos. O M5S e a Liga representam populismos distintos, e até irreconciliáveis, que se aliaram por uma razão simples: conquistar o governo. “Os cinco estrelas propõem-se resolver o problema da representação política e a rejeição da elite através da democracia directa. Salvini quer restituir o poder ao Estado nacional” contra as instâncias supranacionais (Giovanni Orsina). Em termos económicos, o M5S, refém das promessas eleitorais, exige o aumento da despesa. A Liga, com a sua principal base no Norte, defende a redução da receita através dos impostos. As suas políticas de segurança são “mais baratas”. Representa uma nova direita, nacionalista, xenófoba e estatista. E, ao contrário do M5S, tem mais de duas décadas de experiência do poder. Não despreza a oportunidade de um confronto com a UE sobre o Orçamento. O risco está na explosão dos juros da dívida. Aconteceu, entretanto, uma inversão na relação de forças: a erosão do M5S, que desceu de 32% para 28%, e a ascensão da Liga, que subiu de 18% para 32-34%. A Liga é o primeiro partido e, graças à imigração, Salvini afirmou-se como líder da maioria. A incógnita é saber se a coligação se vai manter até às europeias de Maio. Vão concorrer separados e não haverá trégua. Salvini olha as sondagens que lhe dão a perspectiva de sair vencedor de eleições antecipadas. Mas, para governar, precisará de aliados. Pior está Di Maio. “Não pode afastar Salvini pela simples razão de que, se o afastar, reencontra-se pura e simplesmente na oposição, isto é, está liquidado” (Pasquale Pasquino). A crise do PD, para a qual muito contribuiu, deixa o M5S sem alternativas de aliança. Que acontecerá se a popularidade do Governo começar a baixar? Tudo isto passa pelas europeias de Maio. É algo que há muito sabemos: pela primeira vez, desde a eleição directa do Parlamento Europeu (1979), as eleições europeias ultrapassam o âmbito nacional para serem um voto sobre a Europa. Foi lançado um desafio pelo populismo soberanista, que vê no PE a instância ideal para pôr em causa a natureza da UE. Durante meses, os soberanistas de todas as famílias, da direita nacionalista à extrema-direita, apostaram na ruptura do Partido Popular Europeu (PPE). Enfraquecido o grupo socialista, seria a oportunidade dourada para mudar o jogo. A ascensão do soberanismo nas opiniões públicas europeias é indiscutível e colocou os europeístas na defensiva. Uma vez mais, graças à imigração. A politização das eleições de Maio assenta num facto simples: através do seu impacto na UE, os seus resultados condicionarão pesadamente as políticas nacionais. A primeira batalha desta campanha travou-se em Bruxelas, a 12 de Setembro, quando o PE aprovou o princípio de sanções à Hungria: o PPE abandonou os parceiros húngaros. “A UE está dividida, mas já não está anestesiada”, disse alguém. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. A segunda batalha está a desenrolar-se na Itália, o grande laboratório político da Europa Ocidental. O que se passa na Itália é inédito, não é o mesmo que as derrapagens do Leste europeu. A Itália e a Alemanha, onde o soberanismo aumentou a pressão e Merkel está ameaçada no próprio partido, serão os mais críticos “teatros de guerra”. Na Itália o jogo não está pré-determinado. “Volta a subir a confiança na Europa por medo de a perder”, escreve o politólogo Ilvo Diamanti com base em sondagens recentes. A única previsão possível é que será uma batalha crescentemente dura, a começar no interior da maioria, e com um desfecho talvez surpreendente.
REFERÊNCIAS:
Partidos Partido Popular Europeu
Francisco Ribeiro Telles: “Disparei. Fazer a revolução sem dar tiros…”
Francisco Ribeiro Telles é a partir de Janeiro o novo secretário executivo da CPLP. Até lá, embaixador em Roma, acompanha o processo político em Itália. (...)

Francisco Ribeiro Telles: “Disparei. Fazer a revolução sem dar tiros…”
MINORIA(S): Migrantes Pontuação: 6 Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 Animais Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-11-19 | Jornal Público
SUMÁRIO: Francisco Ribeiro Telles é a partir de Janeiro o novo secretário executivo da CPLP. Até lá, embaixador em Roma, acompanha o processo político em Itália.
TEXTO: Diz, com ironia, que aprendeu a ser mediador nas rondas nocturnas nos night clubs da então Lourenço Marques, separando comandos de paraquedistas desavindos no desafogo após o mato. Em Timor sob ocupação da Indonésia, esteve numa missão da ONU para preparar uma frustrada visita de deputados portugueses ao território, e manteve encontros à margem do estabelecido. Depois de estar à frente das embaixadas em Cabo Verde, Angola e Brasil, regressou à Europa e não gosta do que vê. Por não saber desenhar não seguiu as pisadas paternas, a arquitectura paisagista. É um óptimo contador de histórias, com sentido de humor e comicidade das situações, quem vai estar no Palácio de Conde de Penafiel à frente da Comunidade de Países de Língua PortuguesaComo é ser filho do pai?Estamos nos jardins da Fundação Gulbenkian que o meu pai concebeu, lembro-me de os visitar durante a construção duas ou três vezes com 12 ou 13 anos. Ainda pensei ser arquitecto paisagista mas percebi que não podia. Para além do meu pai ser muito criativo, vanguardista, é um excelente desenhador, e eu não tinha jeito para o desenho. Seria o filho do arquitecto e ficaria a perder. Qual o papel diferenciador do arquitecto Gonçalo Ribeiro Telles, seu pai, na sua formação?Sempre o vi como um homem de princípios, de uma coerência absoluta na vida. Atravessou várias fases em termos políticos, mas o que mais me marcou foi a coerência do pensamento sem transigir nos valores fundamentais. Ele tinha uma perspectiva de Portugal a que, na altura, muito pouca gente dava atenção, e o tempo veio provar a sua enorme razão na conservação da natureza e ordenamento do território. Talvez se tivesse sido ouvido pouparíamos muitos problemas dos que temos. Viu muito antes o que seriam os problemas da sociedade contemporânea. Portanto, o seu pai foi mais decisivo na sua formação que o curso de História?Muito mais decisivo. Falo por mim e pelos meus irmãos, marcou-nos profundamente. Com ele aprendi muito. Com Salgueiro Maia, no 25 de Abril de 1974, também aprendeu. Como foi?Na Escola Prática de Cavalaria de Santarém, eram cinco ou seis da tarde de 24 de Abril, comentei a um amigo, o Vasco Câmara Pereira, que iríamos ter exercícios nocturnos, porque os carros de combate e jipes estavam a abastecer, mas estava longe de imaginar que naquela altura já o primeiro e o segundo comandantes estavam presos. Fomos acordados às duas da manhã e eu disse ao Vasco que lá íamos para exercícios, quando o capitão Maia nos leu rapidamente o comunicado do Movimento das Forças Armadas e, depois, faz-nos uma prelecção sobre a questão colonial, dizendo que o Movimento a queria resolver, que se estava a tornar insustentável para todos. Para um alferes miliciano isso foi ouro sobre azul. Exactamente (risos). Depois, pediu 150 voluntários para marchar sobre Lisboa, nós tínhamos três meses de tropa, não sabíamos disparar, havia o exemplo do golpe falhado das Caldas da Rainha [16 de Março de 1974], mas viemos. Saímos de Santarém às 3 da manhã a uma velocidade impressionante, uma coluna de veículos a 30 quilómetros por hora, e chegámos ao Terreiro do Paço. Houve uma série de peripécias já conhecidas, o capitão Maia alertara-nos de que o grande problema seriam os M 47 [blindados] de Cavalaria 7, se disparassem, a revolução estava perdida. Acabaram por se render. Depois, fomos em apoteose até ao Largo do Carmo, onde, como muitos outros, disparei, fazer a revolução sem dar tiros… disparei para as paredes do quartel do Carmo. Eu estava instalado numa seguradora frente ao quartel, com telefone à secretária, ia relatando as peripécias revolucionárias ao meu pai, de quando o Maia iria dar ordem de fogo ou não. Saímos do Carmo já com a prisão do Marcello Caetano, subimos a Avenida da Liberdade em delírio, com toda a agente à janela e acabámos no Colégio Militar. Essa noite ainda fizemos escolta à Junta de Salvação Nacional e ao general Spínola na RTP. Depois partimos para Santarém, lembro-me que demorámos seis ou sete horas, quando chegámos ao Cartaxo às 3 da manhã estava a população na rua para nos saudar. Era da Polícia Militar, tinha uma boa classificação de curso, éramos 40 e fiquei entre os primeiros oito, e em princípio não seria mobilizado. Mas há os acontecimentos em Lourenço Marques, sectores da população que queriam uma independência à Rodésia e alguns militares que se associaram invadiram o Rádio Clube. Eu que estava calmamente em Lisboa, em Lanceiros 2, na Ajuda, fui mobilizado à pressa para Moçambique onde cheguei em Novembro e fiquei até 24 horas antes da independência [25 de Junho de 1975]. Tinha um dia de serviço e três de folga, de maneira que só ia duas vezes por semana ao quartel e, quando ia, fazia rondas na rua Major Araújo, a dos night clubs onde os militares vindos do mato se iam desafogar. Um dos grandes problemas que tinha era separar os paraquedistas dos comandos que inevitavelmente se envolviam à pancada. Daí ter ganho dotes de negociador (risos). No total, tive uma tropa de 15 ou 16 meses muito intensos. O que ficou dessa experiência?Uma enorme admiração pelo capitão Salgueiro Maia. Penso que quando o capitão Maia pede voluntários para Lisboa e ter sido ele a pedir levou muita gente a avançar. Quantos vieram?Entre 150 a 200, quase todos deram um passo em frente. Lembro-me que, duas semanas antes, tivemos uma semana de campo e acabámos à volta da fogueira a cantar Zeca Afonso. Eu comentava que era uma tropa esquisita, que algo se estava a passar. O que me marcou foram os meses que passei com o capitão Salgueiro Maia. A propósito da capacidade de negociador nas rondas de Lourenço Marques. A diplomacia é instrumento do multilateralismo, como é que um diplomata avalia a subalternização da ONU?Muita coisa está a mudar na diplomacia. Comecei por um posto multilateral, as Nações Unidas em 1987, aprendi as vantagens da diplomacia multilateral, da concertação entre Estados. Vejo que muito dos grandes avanços das negociações internacionais, sempre em fóruns multilaterais, se estão a perder. Não sei o que vai acontecer, mas existe um desencanto em relação ao multilateralismo. Há dias deparava com uma carta do eng. Guterres aos países da ONU sobre as enormes dificuldades económicas da organização. Talvez seja pela influência dos tempos que se vivem nos Estados Unidos, mas o multilateralismo está a perder a relevância, quando até hoje todos os Presidentes norte-americanos acreditaram no multilateralismo. Escreveu sobre a necessidade de reforma do Conselho de Segurança da ONU, uma reforma que está no tinteiro. Ficou um sabor amargo?Deixou um sabor amargo, porque temos uma composição do Conselho de Segurança obsoleta que resulta dos vencedores da Segunda Guerra Mundial. O mundo mudou tanto que a legitimidade dos membros permanentes do Conselho de Segurança pode ser posta em causa porque as estruturas de poder mudaram a nível global. De forma que havia de adaptar o Conselho de Segurança, escrevi sobre uma maior presença de membros não permanentes e de não mexer nos cinco permanentes. É uma questão difícil porque os permanentes não abdicam. Lembro-me que uma das coisas que me deixou perplexo foi quando pedíamos aos franceses e ingleses para nos relatarem o que se passava no circuito fechado do Conselho de Segurança, e eles privilegiavam a condição de membros permanentes em detrimento da de membros da União Europeia, o que é sintomático. A diplomacia implica códigos definidos, atitudes previsíveis e guiões compreensíveis. O apogeu do populismo baralha estes dados?Pode baralhar. O que refere como previsibilidade sempre aconteceu, mas esta é uma questão muito mais vasta. Tem a ver, e sinto isso em Itália, com o descontentamento dos italianos e com a perda do poder de compra. Tem a ver com o que significou para os italianos a entrada no euro, com o desemprego, a emigração que não é muito significativa mas que determinados partidos e movimentos aproveitam. A Europa foi um projecto de sucesso no século XX, agora há que adaptar-se ao século XXI. Após 16 anos no hemisfério sul, em Cabo Verde, Angola e Brasil, ao chegar à Europa não gosto do que vejo. A diplomacia está em vias de extinção?De maneira nenhuma. Já muita gente apostou na morte da diplomacia mas, juntamente com a outra, é das mais velhas profissões do mundo. Foi consultor de Mário Soares, trabalhou com o ministro dos Negócios Estrangeiros Jaime Gama e é embaixador. Como chefe de representação teve de se conter mais?Trabalhei três vezes com Mário Soares enquanto primeiro-ministro e duas como Presidente da República, no início e no final da sua Presidência. Com Jaime Gama fui adjunto e chefe de gabinete. Tive a sorte de trabalhar com dois homens excepcionais, muito diferentes mas com enorme sentido de Estado, enorme dimensão humana, com quem aprendi bastante. Tinha um trabalho de gabinete, na chefia de uma missão diplomática é diferente, está-se mais exposto, é-se mais escrutinado, sobretudo nos países onde estive. Pode-se ir para um país da Europa frio e cinzento em que ninguém dá por ti, em que se é uma segunda linha, mas estar em Cabo Verde, Angola ou no Brasil como embaixador de Portugal, tem um escrutínio e visibilidade diferentes. Há que medir muito bem as palavras, o que se faz, com quem nos damos, com quem almoçamos, com quem jantamos. É mais trabalho diplomático?Sim. Lembro-me que após quatro anos em Cabo Verde havia a possibilidade de ir para a Europa, mas não me interessava. Possivelmente ia ser uma segunda linha, estava mal habituado porque em Cabo Verde era uma primeiríssima linha, mas havia também a possibilidade de ir para Buenos Aires ou Luanda. O ministro da altura, professor Freitas do Amaral, tinha-me dito da sua vontade de me ver em Luanda mas se eu quisesse ir para Buenos Aires não havia problema. Lembro-me de ter falado com a minha mulher, Maria João, e de ela me ter dito que se eu queria um pouco de festa, salero e algum trabalho ia para Buenos Aires, mas se queria um posto difícil, exigente o destino era Luanda. A diplomacia é um pouco isto. É de uma fornada de diplomatas para quem a questão de Timor-Leste não estava arrumada. Onde estava e como celebrou a independência?Timor marcou-me muito, foi o meu dossiê quando cheguei em 1987 às Nações Unidas, onde tínhamos vindo a perder apoios, já ninguém queria discutir Timor, era um assunto arrumado. E, quando discutiam, era sobretudo no plano dos Direitos Humanos, nunca mencionando a autodeterminação, embora todas as organizações das Nações Unidas falassem da autodeterminação. Aliás, a resolução 37/30, que pede à ONU negociações com todas as partes, foi aprovada por apenas quatro votos. Exactamente, e na altura o embaixador Futscher Pereira percebeu que mais um ano e perderíamos. Quando cheguei à ONU, tirando os movimentos de libertação que por lá apareciam, o Ramos Horta, o Mari Alkatiri, o José Luís Guterres, pouca gente falava de Timor. Tínhamos alguns apoios, eram sobretudo países africanos de língua oficial portuguesa, no seio da União Europeia muito poucos, talvez os gregos e os espanhóis tivessem alguma apetência para nos apoiar, mas diplomatas europeus chegaram-me a dizer “Francisco, esquece isso, não vale a pena, do que se trata é de sermos vigilantes em relação aos Direitos Humanos”. E nós estávamos, de certa forma, nessa linha. Lembro-me que quando fui em 1991 preparar uma visita de deputados portugueses a Timor, tínhamos chegado a acordo com os indonésios de que a missão era sob a égide da ONU, que envolveria dois diplomatas portugueses, um da missão de Nova Iorque, eu, outro, o assessor diplomático do presidente da Assembleia da República. A Indonésia teria também dois diplomatas e os restantes seriam chefiados por um representante do secretário-geral. Passei cinco dias em Timor-Leste, dois em Díli e três praticamente ao relento nas montanhas. A visita marcou-me imenso. O que nos contavam ser a situação em Timor, pois só nos podíamos basear nos relatórios e informações que nos davam os nossos amigos, não correspondia de maneira nenhuma à realidade, a situação era muito mais tensa. E os timorenses não estavam dispostos a ficarem indefinidamente sob o jugo indonésio. Estava no quarto do hotel, recebia chamadas às duas, três e quatro da manhã que diziam “independência ou morte, viva Timor-Leste”. Quando regressei, chamei a atenção de uma situação diferente da que nos transmitiam. Também escrevi que a visita dos deputados não ia ser um passeio, porque tinha a informação de que se estava a preparar uma grande manifestação para a sua chegada, que havia bandeiras da Fretilin enterradas nos quintais, o que os indonésios desconheciam. Foi em conversas com o bispo Ximenes Belo e em encontros clandestinos com resistentes, à margem da missão que me apercebi do que se preparava. Quando a delegação portuguesa chegasse a Timor, haveria manifestações de rua e a visita poderia não durar cinco dias, poderia acabar ali. A fase final das negociações não surtiu efeito e não houve visita. O pretexto foi que queríamos que uma jornalista muito conhecida, a Jill Jolliffe, fizesse parte da delegação, os indonésios opuseram-se e cancelámos a visita. Há um desencanto dos timorenses e quando chega o relator especial da ONU para os Direitos Humanos, cuja visita tínhamos acordado com os indonésios em Genebra, o que era suposto acontecer para os deputados aconteceu para ele e dá-se o massacre de Santa Cruz. Quando cheguei a Nova Iorque vindo de Díli disse a dois jornalistas americanos com vistos para Timor para a visita dos deputados para não cancelarem a ida. “Vocês vão fazer a reportagem das vossas vidas, porque o que se passa em Timor é escamoteado e escondido”. São eles que filmam o massacre e, no dia em que as imagens aparecem no prime-time da CNN, pensei: está ganho. Há um ponto de viragem, aparecer no prime-time da CNN implica a Casa Branca tomar posição e ninguém acreditava que uma pequena população ocupada por um gigante como a Indonésia, com aliados poderosos na região, caso da Austrália, pudesse ser independente. Foi uma página brilhante da nossa diplomacia, uma página brilhantíssima dos timorenses que resistiram. Quando já estava na embaixada de Madrid como ministro conselheiro, recebi uma carta de Ramos Horta para assistir à cerimónia da independência mas, infelizmente, não pude ir. Esteve em vários destinos, qual foi o maior desafio como embaixador?À sua maneira, cada um foram postos fascinantes, falo de Cabo Verde, Angola e do Brasil onde se tem uma enorme autonomia de actuação, onde o que se diz conta, se é respeitado, se é uma voz de primeiríssima linha. Cabo Verde foi uma experiência muito interessante, num país pobre, um arquipélago no meio do Atlântico praticamente sem recursos, com uma gestão impressionante e pessoas muito preparadas. Angola foi um desafio enorme. Tinha acabado de haver a paz, o país fora destruído pela guerra, os angolanos tinham perdido duas gerações. Fui com a atitude de observar, escutar e tirar conclusões. Uma das coisas que notei ao longo dos cinco anos que lá estive é que qualquer português tem uma opinião formada e definitiva do que deve ser a política do Estado português em relação a Angola. Diplomatas de bancada, portanto?Diplomatas de bancada, o que não se passa em relação a outro país. Os próprios partidos políticos portugueses tomaram partido por movimentos angolanos, o que também não aconteceu em mais lado nenhum. De maneira que as relações com Angola são sempre muito emocionais, muito intensas e muito susceptíveis porque damos muita importância ao que dizemos um do outro. Há que gerir isso com alguma prudência e sabedoria. Lembro-me que muitos portugueses que vinham falar comigo já tinham lido todos os últimos estudos sobre Angola, as análises e estatísticas, já sabiam perfeitamente o que iam encontrar. O problema era quando chocavam com a realidade e ficavam baralhados. Foi um posto fascinante, duro e difícil, mas que me deu muito prazer pessoal e profissional. E o Brasil é o Brasil. Cada diplomata devia fazer um estágio no Brasil. Aprendi muito o que é ser português em Cabo Verde, Angola e no Brasil. No Brasil há aquela dimensão enorme de um país em que se fala português desde o Rio Grande do Sul ao Amazonas, há aspectos positivos e negativos. Na minha despedida falava com um general brasileiro que me dizia “embaixador, nós temos agora um estudo muito sofisticado sobre a segurança e as vulnerabilidades do Brasil em relação à ameaça externa e você sabe que os pontos mais sensíveis, mais vulneráveis, foram onde os portugueses há quatro séculos construíram os fortes?”. Temos com o Brasil uma relação muito forte, nunca me senti estrangeiro, há uma cumplicidade natural. Em Itália estou há ano e meio, é o regresso à Europa, apanhei a mudança de um governo de centro-esquerda para uma coisa que ninguém sabe muito bem o que é, mas que existe, que faz o seu caminho, que transmite as suas mensagens e que neste momento tem um apoio de 60% dos italianos. A Itália sempre funcionou como um laboratório político para a Europa e volta a funcionar. Destes destinos, qual foi a maior surpresa?Não posso dizer que tenha ficado surpreendido com os meus destinos, mas talvez o país que me tenha impressionado mais foi Angola. Apanhei o boom angolano, o regresso e a chegada das empresas portuguesas, havia uma espécie de eldorado, o que chamava de efeito manada do empresariado português – ia um e todos atrás, não se sabe muito bem para fazer o quê. Angola foi de certa forma uma revelação porque é um país próximo de nós, onde as atitudes e os costumes são muito próximos dos portugueses, da forma de falar, de vestir, de vibrar com as situações, é um país onde deixámos, para o bem e para o mal, uma grande influência. E a maior decepção?Não tive decepções, talvez tenha ficado nesta última fase decepcionado com o que se passa no Brasil. O Brasil sempre teve um jeito natural para resolver os seus conflitos, o tal jeitinho brasileiro. Hoje vejo uma sociedade dividida, crispada, tensa, famílias divididas e isso é muito mau. Na base está o problema de sempre, o sistema político que tem de ser refundado de alto abaixo. Oxalá o Brasil tenha condições para o fazer. É verdade que a diplomacia portuguesa passou do croquete à economia?Não, não é verdade. Sempre fiz, e todos os meus colegas também, diplomacia económica. Essa história da diplomacia do croquete é uma caricatura, uma das coisas que mais nos custa, aos meus colegas estrangeiros e nacionais, é ir a uma recepção. Fui a tantas, faço-o por dever, por respeito ao país que me convida. Em Brasília, onde somos 140 embaixadas, comentava que como todos os países tinham o seu dia nacional, nós, embaixadores, todos os dias nos víamos. Em Roma, vou às recepções que considero estritamente indispensáveis, e a representação de Portugal é assegurada pelo número dois ou o número três. Nunca fiz a diplomacia do croquete, fiz sempre uma diplomacia onde a componente política foi muito importante, foi muito importante em Angola e no Brasil. A componente económica também, está a dominar tudo, mas a componente política é essencial a qualquer trabalho diplomático. Temos a ideia que a diplomacia portuguesa é hoje mais eficiente. Tem a ver com o perfil dos novos diplomatas?Talvez, tem a ver com outra preparação. Se compararmos com quem ia para a carreira diplomática há 30 anos quem hoje vai é uma geração mais nova, muito mais bem preparada, mais focalizada nas questões importantes. Há muito mais mulheres, o elemento feminino foi um elemento transformador fantástico da carreira diplomática. Ganhou o prémio Francisco Melo Torres para melhor diplomata económico quando era embaixador no Brasil. Investiu a bolsa de 25 mil euros na compra de um carro eléctrico do CEIIA [Centro de Excelência para a Inovação da Indústria Automóvel] como veículo oficial da embaixada. Foi diplomacia económica no terreno?O carro é o primeiro veículo eléctrico da embaixada portuguesa no Brasil graças ao patrocínio do CEIIA. Na altura, o CEIIA estava-se a instalar no Brasil, tinha um projecto na Foz do Iguaçu que visitei, e começavam a ter projectos importantes na área da mobilidade. Quando ganhei o prémio, e querendo dar uma imagem de modernidade de Portugal, estabeleci uma parceria com o CEIIA para o carro eléctrico. Que lá está, é utilizado todos os dias, tem o escudo da embaixada de Portugal e uma referência ao CEIIA. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Ganhei a primeira edição do prémio – não dou muita importância a isso – talvez pelo trabalho com as empresas portuguesas e porque tinha dossiês sensíveis, como o dos vinhos e do azeite. Mais de metade das nossas exportações para o Brasil é de azeite e os brasileiros queriam que ele fosse certificado no Brasil e não na origem, o que acabaria com as nossas exportações. Tudo se resolveu. Também queriam taxar ainda mais os vinhos portugueses, mas resolveu-se. É esta experiência dos diplomatas na economia que leva antigos embaixadores e ex-ministros dos Estrangeiros a mudarem para o mundo empresarial?É uma tendência que já existe noutros países. Falo com colegas meus em Roma, que estão a atingir o limite de idade, e têm a perspectiva de passarem para uma empresa privada. É muito comum no Reino Unido os embaixadores saírem e determinadas empresas aproveitarem o seu network e know-how para contratarem-nos como consultores. Em França suponho que seja a mesma coisa, em Espanha talvez não tanto. É uma tendência nalguns países europeus aproveitar as mais-valias que alguns diplomatas e ex-ministros têm no campo económico e a rede de contactos que estabeleceram ao longo da sua vida. Na transição devia haver algum período de nojo?Talvez fosse adequado haver um período de nojo, não sei se de seis meses ou um ano, após a cessão de funções enquanto diplomata e a assunção de funções numa empresa.
REFERÊNCIAS:
Entidades ONU
As Festas de Lisboa vão fazer-se de memória: de Vasco Santana à Expo 98
Vasco Santana vai ser lembrado “na folia e no pecado”. Os Olharapos voltam à Expo. Os arraiais mantêm-se por toda a cidade mas este ano querem-se mais sustentáveis. Eis o cardápio das festas populares da capital. (...)

As Festas de Lisboa vão fazer-se de memória: de Vasco Santana à Expo 98
MINORIA(S): Homossexuais Pontuação: 6 Animais Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-05-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: Vasco Santana vai ser lembrado “na folia e no pecado”. Os Olharapos voltam à Expo. Os arraiais mantêm-se por toda a cidade mas este ano querem-se mais sustentáveis. Eis o cardápio das festas populares da capital.
TEXTO: É o tempo da sardinha a pingar no pão, do copo de vinho na mão, do bailarico e do manjerico. As Festas de Lisboa, que arrancam daqui a uma semana, rimam com música e diversão, mas levam este ano uma pitada de memória. Volta a cumprir-se a tradição lisboeta com as marchas populares a descerem a Avenida da Liberdade na noite de 12 para 13 de Junho. Será Vasco Santana quem as guiará este ano, em jeito de celebração dos 120 anos do seu nascimento. Pela avenida, todas as marchas vão interpretar o tema “Vasco é Saudade", vencedor do concurso Grande Marcha de Lisboa 2018. Velha Lisboa Canção da vida inteira Cidade ilustre, Tão culta e altaneiraAtrai estudantes, Boémios e artistas Com versos e paixões Faz promessas imprevistasLembra o Vasquinho, Folia e pecado Num copo a mais Criando um novo fadoTrocando os livros P’lo trinar duma guitarra Faz como ele Deixa o estudo, vai p’rá farra!Refrão Em Lisboa Ninguém te leva a mal Amar é natural Quando amas de verdadeEm Lisboa Há sonhos de conquista Da marcha mais bairrista E o Vasco na saudadeEm Lisboa Alice, a costureira Desfila aventureira Com o arquinho na mãoFoi comprar um manjerico P’ra mostrar no bailarico Um gaiato em forma de balão Vai levando o namorado Por ali dependurado Canta a marcha, dá-lhe uma lição!Foi no passado Que o filme se fez história Hoje é lembrado Na marcha em sua glóriaNossa Lisboa Não esquece a emoção Rolando pela tela Deu seu nome a uma cançãoLembra o Vasquinho Fadista e doutor E os seus trejeitos Armado em sedutorNoites em claro, Lá estudou… muito aprendeu E no exame Até falou do mastoideu!Autor da Letra: Dina Teresa de Oliveira Barco Autor da Música: José Manuel Venda CondinhoEste ano, e “excepcionalmente”, vão a concurso 23 marchas, depois dos grupos do Alto do Pina, Santa Engrácia e Benfica terem reclamado a participação, levantando dúvidas sobre a entrada em vigor do novo regulamento das marchas de Lisboa. São a actividade "mais complexa e mais arriscada que a EGEAC [Empresa de Gestão de Equipamentos e Animação Cultural] organiza ao longo do ano", reconheceu a presidente desta empresa municipal, Joana Gomes Cardoso, na apresentação do programa das festas, que decorreu esta sexta-feira, no Mercado de Arroios. "Se pensarmos que há uns anos temíamos que as marchas populares acabassem, hoje em dia, o contexto é o oposto. Quanto muito temos algumas dores de crescimento", continuou a responsável, aludindo aos problemas que foram levantados este ano. Mas a festa segue, com “um programa vastíssimo, que reúne e assenta muito na manifestação que é mais tradicional, popular, bairrista na cidade”, assinalou o presidente da câmara, Fernando Medina. Pelo terceiro ano, os lisboetas são desafiados a recriarem os Tronos de Santo António, em articulação com o Museu de Lisboa. “Os tronos já estão por toda a cidade e já não apenas nas zonas históricas”, notou Joana Gomes Cardoso. Mas a tradição há-de seguir pelos casamentos de Santo António, em que 16 casais vão dar o nó na manhã do dia 12 de Junho, na Sé de Lisboa. As festas chegam ainda ao Parque das Nações no ano em que passam duas décadas sobre um dos grandes momentos de “viragem na vida cultural da cidade”, a Expo 98. Há espectáculos multimédia e a actuação dos Olharapos, logo no arranque das festas, na Pala do Pavilhão de Portugal. As fotografias de Bruno Portela, que retratam a zona antes da intervenção urbana ali feita há mais de 20 anos, vão estar espalhadas pelas ruas. Você não está aqui inaugura a 9 de Junho para dar a conhecer às novas gerações, e em 70 fotografias, uma zona que não passava de um depósito de fábricas abandonadas, onde chegou a funcionar uma petrolífera, um aterro sanitário e um matadouro. Mas as Festas de Lisboa são também "um espaço para as várias expressões", vincou Joana Gomes Cardoso. Da arte para as crianças, com a reabertura do Teatro Luís de Camões, às artes plásticas, para quem aceitar o desafio de criar a própria sardinha, à música e ao fado. No Castelo de São Jorge, vai-se fazer silêncio para ouvir o fado pelas vozes de Carlos do Carmo, Carminho, Camané, nos dias 14, 15 e 16 de Junho, respectivamente. Já no próximo sábado, dia 2, a música toca no Terreiro do Paço, com o concerto da Orquestra Geração, o projecto de inclusão social que forma jovens músicos de comunidades desfavorecidas, com a Orquestra Gulbenkian, especialmente dedicada a amantes da saga Guerra das Estrelas. Se as festas são “uma expressão do barrismo” lisboeta, como assinalou Fernando Medina, são também uma oportunidade para mostrar “as muitas realidades” que a cidade tem. “Tudo encontra espaço nas festas de Lisboa”, sublinhou o autarca. É para promover esse "encontro de culturas" que o festival Lisboa Mistura e a Festa da Diversidade voltam com espectáculos na Ribeira das Naus, a partir do dia 7 de Junho. O programa das festas termina a 30 de Junho, no jardim da Torre de Belém, com um concerto de Gilberto Gil, que comemora os 40 anos do álbum "Refavela" e terá convidados como Mayra Andrade. Há muita programação paralela durante este mês de festa em Lisboa, que pode ser consultada em culturanarua. pt. Durante todo o mês, os arraiais vão multiplicar-se pelos bairros da cidade, da Vila Berta, na Graça, ao Lumiar. No dia 23, o Terreiro do Paço volta a receber o Arraial Pride, um dos maiores eventos para s população lésbica, gay, bissexual, transgénero e intersexo (LGBTI), com festa das 16h às 4h da manhã. Este ano, a câmara de Lisboa, em parceria com a Central das Cervejas, quer reduzir a quantidade de plástico, e de lixo, que ficam nas ruas da cidade no final de uma noite de folia. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. A mensagem vem gravada nos copos. “É para repetir”, lê-se nos copos reutilizáveis que estarão à venda e que se pretende que sejam um incentivo à reciclagem dos copos tradicionais. "Não será possível ainda em toda a cidade, porque os arraiais são imensos e espalham-se por toda a cidade, mas em todas as organizações de concertos em espaços organizados, será esse o método utilizado", explicou Fernando Medina, aos jornalistas, já no final da apresentação da programação das festas. O autarca lembrou ainda que, durante o mês de Junho, a capital poderá receber “entre um milhão a dois milhões de pessoas no centro da cidade” por causa das festas de Santo António.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave guerra social estudo gay bissexual lésbica
Missão cumprida? Há vida e eleições para além do orçamento
Com o último Orçamento da legislatura aprovado, BE deixou caderno de encargos para 2019, PS reclama ser o garante da estabilidade. (...)

Missão cumprida? Há vida e eleições para além do orçamento
MINORIA(S): Homossexuais Pontuação: 2 Animais Pontuação: 6 | Sentimento 0.2
DATA: 2018-11-30 | Jornal Público
SUMÁRIO: Com o último Orçamento da legislatura aprovado, BE deixou caderno de encargos para 2019, PS reclama ser o garante da estabilidade.
TEXTO: Com o orçamento para o próximo ano aprovado, há que olhar agora para o que ainda falta fazer dos compromissos à esquerda e, sobretudo, como se fará essa gestão até às eleições. Nos discursos de encerramento do orçamento, as legislativas foram uma espécie de elefante na sala, para o qual nem todos da esquerda quiseram olhar, apesar de todos o verem. Mas o PSD não se coibiu de o chamar para o centro da conversa para insistir, citando Rui Rio, na acusação de eleitoralismo. E Assunção Cristas colocou-se mesmo como candidata a primeira-ministra, provocando risos na sala. A versão final do quarto orçamento do Governo de António Costa foi aprovada pelos partidos da esquerda e pelo PAN, e com o prometido voto contra de PSD e CDS. O deputado André Silva acabou por votar a favor apesar de ter visto chumbar as suas pretensões de agravamento do IVA para as touradas. Dos parceiros do Governo ouviu-se um discurso mais suave do que em anos anteriores – já ninguém ousou dizer tão claramente que este “não é” o seu orçamento e que o PS continua encostado à direita -, apesar de manterem a ideia de que era possível ter ido mais longe se o compromisso com Bruxelas e com o défice não o impedisse. Será, porém, certo que nos primeiros eventos partidários em que aparecerem, Catarina Martins e Jerónimo de Sousa irão carregar no discurso crítico do PS ao seu eleitorado. O aviso foi feito da forma mais directa possível por Catarina Martins, que do alto da tribuna lembrou que “esta legislatura não acaba com a votação final deste orçamento” e acrescentou um expressivo “Não pense que se vê livre de nós!” (que na versão escrita do discurso até estava entre parêntesis). “Temos compromissos – entre nós e com a população – para matérias estruturais que serão o centro do debate no Parlamento em 2019”, indicou, garantindo que o Bloco procurará as “melhores soluções até ao último dia da legislatura”. Nesse caderno de encargos incluiu o plano ferroviário nacional, a entidade da transparência, o estatuto do cuidador informal, a habitação, a lei de bases da saúde e a legislação laboral. Tudo matérias que se têm arrastado precisamente por falta de entendimento entre a esquerda. “Temos ainda muito trabalho pela frente”, prometeu, ainda que tenha feito questão de saudar pessoalmente o primeiro-ministro, o Governo, o PS, o PCP e o PEV pelos três anos de trabalho “em conjunto” que permitiu “cumprir o acordo” e até ir “mais longe” em algumas matérias. Depois de o Bloco ter dado o tiro de partida na convenção ao dizer que quer ser Governo, a sua coordenadora admitiu agora como “natural” que em 2019, “ano de eleições” como vincou, BE e PS “confrontem abertamente os seus programas”. “Ninguém deve queixar-se da clareza no debate democrático”, avisou Catarina Martins, numa espécie de tiro de partida eleitoral, que procurou logo a seguir camuflar: “Mas erra quem pensar que a legislatura terminou e que hoje começa a campanha eleitoral. ”Antes, André Silva, do PAN, arriscara entrar directamente na questão eleitoral. O deputado lembrou que o debate que lançou sobre tourada levou o primeiro-ministro a tomar “coragem” para “sair do armário”, elogiou o seu humanismo e defendeu que o PAN “precisa de mais força”. “Afinal de contas são cada vez mais as portuguesas e os portugueses que pensam como nós”, disse, recuperando um slogan do CDS nas legislativas de 2009. Jerónimo de Sousa preferiu puxar pelos louros do PCP não só neste orçamento como nos anteriores – do aumento dos salários e pensões à taxação do grande capital, dos manuais gratuitos ao fim do PEC -, fazendo um balanço “positivo” dos passos dados. Pouco mais de metade do seu discurso foi a elencar medidas, o resto para reclamar “outra política” – mas nada de elogios ao Governo. E ainda teve tempo para criticar a “mão protectora” que PSD e CDS representaram para o Governo nas questões do défice e que impedem o nível de investimento de que o país precisa. Sobre a recuperação do tempo de carreira congelado na função pública e a retoma das negociações dos professores nem uma palavra, mas ficou uma nota mais áspera que a do Bloco: “Não ignoramos o que o Governo e o PS não quiseram adoptar, o que deixaram por cumprir ou mantiveram adiado. ”Uma ideia reiterada pelo ecologista José Luís Ferreira que enalteceu os contributos do PEV para tornar o OE “mais justo e mais sustentável” e que olhou para daqui a um ano, alertando que se o PS tivesse maioria absoluta decerto “não se avançaria o que se avançou”. Com a esquerda apaziguada, o presidente do PS empenhou-se em passar a ideia da missão cumprida – nos indicadores económicos e financeiros e na relação com os parceiros à esquerda. E cumprida pelo PS, insistiu Carlos César, que foi quem “caucionou a boa gestão das finanças públicas e de garantia da sustentabilidade do futuro” do país. E nada disse sobre touradas quando teve a iniciativa singular de apresentar uma proposta que contrariava o Governo. À direita, o discurso oscilou entre o tom de campanha eleitoral de Assunção Cristas e o tom metafórico de Adão Silva. A líder do CDS-PP voltou a assumir optimismo que deixou no congresso de Março – “Se os portugueses me derem a confiança para ser primeira-ministra” – mas sobretudo deixou uma mensagem de demarcação face “às esquerdas” e também ao PSD sem nunca o referir. Colocando o CDS como a “verdadeira alternativa” e a mostrar que “nem todos se curvam aos pés deste Governo", Assunção Cristas contestou a ideia de que o Governo “virou a página da austeridade”. “A austeridade mudou de roupa, maquilhou-se, passou dos impostos directos para os indirectos e passou a pesar no bolso de todos nós independentemente do rendimento”, disse. A líder do CDS dramatizou: “É um Orçamento que persiste na contradição deste Governo: a maior carga fiscal de sempre anda de braço dado com os piores serviços públicos de sempre. Como ouvimos dizer por todo o país: “está pior que no tempo da troika”. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Na avaliação do Orçamento do Estado, o PSD e o CDS chegam a ter pontos de contacto no que diz respeito ao desinvestimento nos serviços públicos. Mas só o PSD apontou as falhas nos números do défice, uma batalha que foi lançada por Rui Rio desde o início do processo orçamental. Adão Silva, vice-presidente da bancada, acusou o Governo de fazer um Orçamento mentiroso porque afinal “o défice orçamental foi reiteradamente escondido ao longo deste debate”. E apontou o exagero das cativações através do recurso a uma metáfora: “Se, como dizia o primeiro-ministro, ‘um orçamento sem cativações é um carro sem travões’, exige-se que o primeiro-ministro vá rapidamente à oficina, porque ficou com os calços dos travões colados. É veículo que não sai do sítio, por mais que acelere. Faz barulho, muito barulho, mas permanece parado no mesmo lugar”, ironizou. Na primeira e única vez que interveio no processo orçamental no Parlamento, o primeiro-ministro teve poucas palavras para os seus parceiros mas ainda disse que “valeu a pena” a maioria parlamentar. Enumerou exaustivamente as medidas do Orçamento e não deixou de apontar um largo horizonte para o futuro – a agenda para a década de 2014 – porque “há mais vida para além do OE 2019”.
REFERÊNCIAS:
Viver mais tempo e não ganhar peso é com uma dieta vegetariana, dizem estudos
A carne pode ser consumida se for de boa qualidade, aponta uma das investigações apresentadas no encontro da Sociedade Americana de Nutrição. (...)

Viver mais tempo e não ganhar peso é com uma dieta vegetariana, dizem estudos
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 6 Animais Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-06-21 | Jornal Público
SUMÁRIO: A carne pode ser consumida se for de boa qualidade, aponta uma das investigações apresentadas no encontro da Sociedade Americana de Nutrição.
TEXTO: A substituição do consumo de carne e de produtos processados por uma dieta baseada em vegetais de alta qualidade poderá reduzir a mortalidade, evitar o ganho de peso e o risco de doenças cardíacas, sugerem diversos estudos apresentados no Nutrition, um encontro da Sociedade Americana de Nutrição, em Boston, no fim-de-semana. Um estudo feito na Holanda, na universidade Erasmus de Roterdão, com cerca de 6000 adultos mostra que os que substituíram o consumo de proteína animal por vegetal apresentaram um risco reduzido de desenvolvimento de doença coronária. Por outro lado, o consumo de mais proteína animal faz aumentar o risco de doenças do coração. As pessoas foram observadas durante 13 anos. Uma outra pesquisa, também apresentada no mesmo evento, feita na Universidade de São Paulo, Brasil, demonstra que 4500 adultos que consumiram mais proteína vegetal, reduziram a sua probabilidade de obstrução das artérias em 60%, quando comparados com os que consumiam proteína animal. Por sua vez, um outro estudo feito na Universidade George Washington, nos EUA, que incidiu sobre os hábitos alimentares dos norte-americanos de origem sul-asiática e que seguem uma dieta vegetariana, revela que estes correm menos riscos de ter doenças cardíacas e diabetes. Além disso, têm menor índice de massa corporal, de circunferência abdominal, de quantidade de gordura abdominal, de colesterol e de açúcar no sangue em comparação com pessoas do mesmo grupo demográfico que comiam carne. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Ainda nesta conferência foi apresentada uma análise de dados, feita em Harvard, sobre o peso de mais de 125 mil adultos, ao longo de quatro anos, e que mostra que as dietas ricas em alimentos vegetais de alta qualidade (como grãos integrais, frutas, verduras e nozes) estão associadas a menor ganho de peso, enquanto um maior consumo de alimentos vegetais não saudáveis (como doces, grãos refinados e batatas fritas) estão associados a um ganho de peso significativamente superior. Aliás, o que se pode concluir, através de um outro estudo da Universidade de Tufts, é que uma dieta saudável também pode reduzir a mortalidade. No estudo foram acompanhados cerca de 30. 000 adultos de diferentes idades, níveis de actividade e rendimentos diferentes e a conclusão a que se chega é que mesmo os que comem carne, se esta for de alta qualidade, não tem efeito sobre as taxas de mortalidade. Portanto pode ser "perigoso" eliminar totalmente a carne, alerta a investigadora Fang Fang Zhang, da Tufts, em Massachusetts. Entre os participantes mais pontuados, logo, mais saudáveis, o consumo combinado de alimentos vegetais e animais de alta qualidade reduziu em 30% o risco de mortalidade por todas as causas. "Não podemos dizer que uma dieta só baseada em vegetais é saudável", sublinha, citada pela Newsweek.
REFERÊNCIAS:
Entidades EUA
O vinho e o azeite ficam por cá. E o resto?
Mais calor, menos chuva, secas, fenómenos extremos, imprevisibilidade - as alterações climáticas vão alterar a agricultura em Portugal? Todos os cenários dizem que a região mediterrânica será das mais afectadas. A vinha pode subir para norte. Preparar o futuro tem de começar já. (...)

O vinho e o azeite ficam por cá. E o resto?
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 6 Animais Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-07-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: Mais calor, menos chuva, secas, fenómenos extremos, imprevisibilidade - as alterações climáticas vão alterar a agricultura em Portugal? Todos os cenários dizem que a região mediterrânica será das mais afectadas. A vinha pode subir para norte. Preparar o futuro tem de começar já.
TEXTO: O fim da pasta? Foi esta a pergunta que a revista Newsweek estampou na capa da sua edição de 17 de Dezembro do ano passado, ilustrada por um ponto de interrogação feito com massinhas. A ideia era alarmante. Um mundo sem esparguete? O que fariam os italianos? E os chineses, sem noodles?Claro que o cenário é exagerado, mas o objectivo do artigo - assinado por Mark Hertsgaard, autor de vários livros, entre os quais Hot: Living Through the Next Fifty Years on Earth (numa tradução livre, Quente: Atravessando os próximos cinquenta anos na Terra) - era chamar a atenção para o impacto que as alterações climáticas previstas terão na agricultura e, consequentemente, na nossa alimentação. O caso da massa tem que ver essencialmente com a produção de trigo, que, a nível mundial, será das mais afectadas, pelo que se prevê que sejam as duas principais consequências das alterações climáticas: o aumento das temperaturas e a diminuição da chuva. Hertsgaard cita projecções dos especialistas que prevêem até 2050 um aumento da frequência de Verões extremamente quentes nos países que constituem a "cintura de trigo" mundial - Estados Unidos, Canadá, Norte da China, Índia, Rússia, Austrália. A consequência pode ser uma quebra na produção de trigo (falamos sobretudo da variedade do trigo duro) entre os 23% e os 27%, de acordo com dados do International Food Policy Research Institute, instituição internacional sedeada em Washington e que se ocupa das questões da fome e da pobreza no mundo. Mas, lembra ainda a Newsweek, há outros produtos que podem estar em risco: o chocolate proveniente de países como o Gana e a Costa do Marfim, em que os novos padrões de chuvas ameaçam a produção de cacau; os morangos, que poderão sofrer com o aumento das temperaturas nas áreas mais frescas do Norte; o café; a cerveja e o vinho; ou alguns tipos de peixe como a truta e o salmão, afectados pela subida da temperatura das águas (ver texto nas páginas 24 e 25). Quando olhamos para os mapas das previsões das alterações climáticas, há uma coisa que salta à vista: a região mediterrânica, nomeadamente a Península Ibérica, é uma das mais afectadas. O que é que isso pode significar para Portugal, e, em particular, para a agricultura? Será que também a nossa alimentação será alterada?A Revista 2 falou com vários especialistas para tentar perceber quais são os cenários mais prováveis para Portugal. E, inevitavelmente, todas as conversas começaram por um ponto prévio: ninguém tem certezas. E só se entrarmos no universo da especulação pura é que poderemos discutir o efeito que as alterações climáticas poderão ter na nossa alimentação futura. Antes de entrarmos na situação portuguesa, vamos só espreitar um trabalho de especulação pura feito pelo diário britânico The Guardian. Como é que uma família se vai alimentar em 2035? Há vários factores que entram na composição do cenário, e um deles são as alterações climáticas. Veja-se o pão. No futuro imaginário, o pão branco é proibido pelo Ministério da Comida, que decretou que a farinha refinada não é autorizada por representar um desperdício de vitaminas e sais minerais. Além disso, com o declínio da área arável na Índia, Sul da Rússia e EUA, o preço do trigo disparara. O cenário do Guardian prevê ainda que em 2035 a carne seja feita em laboratório - chamam aos bifes os frankensteaks (uma espécie de bife Frankenstein). O arroz já só existe na "parte mais rica do mundo", o Sudeste asiático. E o que há em grande quantidade em Inglaterra (o cenário é britânico) é batata, cuja farinha serve para fazer tudo, incluindo massas e até uma imitação de arroz. O peixe é de viveiro e o café e o chá verdadeiros são só para dias de festa. Mas exercícios de futurologia são exactamente isso - e servem sobretudo para, no futuro, os lermos e vermos até que ponto se aproximaram da realidade. Regressemos então àquilo que é possível afirmar, com alguma dose de realismo, neste momento da história da humanidade. O que o Livro Branco para a adaptação às alterações climáticas da União Europeia diz é que "as regiões europeias mais vulneráveis são a Europa meridional, a bacia mediterrânica, as regiões ultraperiféricas e o Árctico". Portugal já tem vindo a aquecer, sobretudo desde a década de 1970. O Instituto Português do Mar e da Atmosfera registou um aumento da temperatura média anual, uma redução da distância entre a temperatura máxima e a mínima, um aumento do número de dias quentes e das ondas de calor e uma diminuição da precipitação, que tende a concentrar-se mais no Outono. Ao mesmo tempo, o conjunto das áreas susceptíveis à desertificação aumentou de 36% para 58% da superfície continental. Não se sabe ainda quanto vai aumentar a temperatura até ao final do século XXI, mas admite-se que em Portugal esse aumento se situe entre os 2, 5ºC e os 4ºC. "Ninguém tem certezas", começa por dizer José Lima Santos, professor do Instituto Superior de Agronomia (ISA), em Lisboa, e especialista em questões de agricultura e alimentação. "Mas já parece haver bastantes evidências de que não iremos ficar pelos 2ºC de aquecimento global, mas sim bastante mais acima. Já temos um aumento de cerca de 0, 5ºC ou 0, 6ºC em relação ao ponto de referência que é o período pré-revolução industrial, altura em que o Homem começou a enriquecer excessivamente a atmosfera com a emissão de gases de efeito de estufa. "O problema é que muitos cientistas começam já a admitir um aumento de 4ºC. E, diz Lima Santos, "se até 2ºC os peritos conseguiam prever mais ou menos o que se iria passar, acima dos 2ºC cada um diz uma coisa diferente". É que não se trata apenas de medir os efeitos do aumento do calor ou da redução da precipitação, trata-se de perceber, por exemplo, como é que as correntes atmosféricas e marítimas se irão comportar. No entanto, há um cenário que parece ser o mais provável para Portugal. Lima Santos descreve-o: "As zonas de Portugal que já são mais secas, o interior, sobretudo a sul, mas também o Centro e o Norte, vão-se tornar mais quentes e secas. O litoral vai sofrer algumas alterações, mas menores. O problema é que, nas zonas que já eram mais afectadas por um processo de desertificação, este vai acelerar. " Assim, "o clima que temos hoje no Alentejo central seria projectado para a zona de Coimbra, e o que existe no leste de Espanha passaria para o Alentejo". Isto representa não só condições mais duras para a produção, mas também o previsível aumento de pragas e doenças que vêm com o clima mais quente. Pedro Aguiar Pinto, professor no ISA e coordenador do grupo da agricultura no projecto Alterações Climáticas em Portugal, Cenários, Impactos e Medidas de Adaptação (SIAM, na sigla em inglês), vê as coisas de forma um pouco diferente. "Há teorias que dizem que estamos a viver um ciclo de aquecimento como outros que já aconteceram no passado. Na altura do Robin dos Bosques, por exemplo, havia vinha em Inglaterra. "No livro Portugal a Quente e Frio, as jornalistas Filomena Naves (Diário de Notícias) e Teresa Firmino (PÚBLICO) recordam algumas dessas grandes transformações climáticas que o mundo já sofreu: "Na Idade Média, entre os anos de 950 e 1250, vivia-se o chamado Pequeno Óptimo Climático: o hemisfério Norte foi muito quente e seco, com a Península Ibérica a ter um período bastante ameno. Naqueles tempos [Inglaterra] era cerca de um grau Celsius mais quente do que actualmente. Nessa altura foi possível plantar vinha e produzir vinho em Inglaterra", explicam, citando a tese de Ana Paiva Brandão, engenheira agrónoma da Agroges, empresa de consultoria agrícola em Cascais, e uma das autoras, com Aguiar Pinto, do estudo do SIAM para a agricultura. E, de acordo com o Instituto do Mar e da Atmosfera, Portugal também conheceu ciclos diferentes: se entre 1910 e 1945 houve um aquecimento, entre 1946 e 1975 registou-se um arrefecimento, voltando depois, a partir daí, um novo período de aquecimento. É por isso que Aguiar Pinto diz ter dificuldade em "alinhar com a generalidade da comunidade científica" quando se fala de aquecimento global. "Há um aumento da frequência dos fenómenos extremos [secas e grandes chuvadas]? Não tenho a certeza. Fala-se mais disso, daí a impressão de que acontece mais. " Mas, diz, faltam-nos registos para podermos comparar com um passado mais longínquo. "O nosso horizonte de medição é de desde meados do século XIX até agora. Antes disso, as medições não são fiáveis. "E, perante tanta incerteza, o que podemos esperar para a agricultura em Portugal? A vinha e o olival fazem parte da paisagem portuguesa e são produtos com um peso muito significativo para a economia nacional - representam três quartos do total das culturas permanentes do país, sendo que 43% das explorações agrícolas têm olival e 51% têm vinha. Quais são, então, os cenários?José Silvestre, investigador da Unidade de Investigação em Viticultura e Enologia do Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV), afirma: "Temos regiões vitivinícolas que já se encontram próximo dos seus limites em termos de resistência à falta de água e às temperaturas elevadas, como no interior Sul do país. Caso não existam medidas de adaptação, é certo que nessas regiões teremos uma quebra importante na produção de vinho. " Prevê, por isso, "uma deslocalização da área da vinha para mais próximo do litoral". Se olharmos para a Europa, então vamos ver a vinha a subir para norte. "Alguns estudos sugerem que o limite da cultura da vinha poderá expandir-se cerca de 180 quilómetros para norte por cada grau de aumento na temperatura média do ar", diz Silvestre. Também o Leste da Europa poderá vir a ter condições mais favoráveis à vinha. Assim, conclui, "será de esperar alguma competição com os países do Norte da Europa, embora com vinho com características diferentes". A boa notícia é que esta tendência será acompanhada, eventualmente, por uma redução da competição com os países do Sul. Quanto à diminuição da chuva, Aguiar Pinto também manifesta dúvidas. "Em Portugal, há um decréscimo da chuva no Verão e um aumento no Inverno. Globalmente não há menos chuva. " E, como prova de que falar de tendências pode ser enganador, compara 2012, "um ano extremamente seco, muito abaixo da média", e 2013, que "está a ser chuvoso, muito acima da média". Precisamente, diz Teresa Avelar - responsável pela coordenação da Estratégia de Adaptação da Agricultura e das Florestas às Alterações Climáticas em Portugal Continental (documento já elaborado e em fase de aprovação) do Ministério da Agricultura, Mar e Ordenamento do Território -, entre as características das alterações climáticas estão a imprevisibilidade e o aumento dos fenómenos extremos. "Os dias de muito calor, os ventos fortes e as secas têm tido uma frequência muito grande nas últimas décadas", e o cenário que se apresenta é de "impactos graves para a agricultura e a floresta". Não estamos a falar de um futuro longínquo. "As alterações climáticas já estão a acontecer e já estamos a ter de as gerir. " Por isso, é preciso agir para prevenir situações mais complicadas. No entanto, os técnicos enfrentam um problema: "O conhecimento está muito no princípio, é fundamental melhorá-lo. "Muito importante para nos prepararmos será "conhecer o património genético existente no país, animal e vegetal", explica Teresa Avelar. "É importante preservá-lo para que possa ser aproveitado em termos de melhoramentos genéticos. "É isso que se está a fazer, por exemplo, no departamento de olivicultura do INIAV, em Elvas. Em cima da uma mesa na sala de António Cordeiro estão uma série de caixinhas com caroços de azeitonas. Todos são diferentes - uns maiores, outros mais pequenos, outros ligeiramente curvos na ponta - e têm sido recolhidos junto de agricultores no âmbito de um projecto que visa precisamente recuperar essa diversidade genética que se estava a perder. Desde o final dos anos 1960 que aqui, nestes campos junto a Elvas, o Estado tem estudado o comportamento das diferentes variedades de olival. As coisas mudaram bastante no país a partir do final da década de 90, início do século XXI, quando surgiu "um interesse crescente pela olivicultura" e um aumento muito significativo do número de olivais. A paisagem, sobretudo no Alentejo, encheu-se de olivais intensivos e superintensivos, e entraram no país algumas variedades estrangeiras, sobretudo vindas de Espanha. E foi precisamente a partir do século XXI que começaram a aparecer programas de melhoramento genético do olival. O que António Cordeiro nos mostra agora é um olival superintensivo que o INIAV plantou para ver como se adaptam as diferentes variedades. Aponta para uma árvore, com muitos ramos virados para baixo - os "lançamentos tombados". É o exemplo de uma variedade que, apesar de ter várias vantagens, não se adapta bem ao regime superintensivo. "Quando der fruto, o peso destes ramos vai ser ainda maior, enquanto esta outra, aqui ao lado, tem os ramos para cima e vai suportar frutos com menor peso", explica. Num superintensivo é importante, por exemplo, perceber que tipo de copa a árvore vai formar para ver se é mais aberto ou fechado e se permite ou não que o sol entre por entre os ramos (se não permitir, não se desenvolvem frutos nos ramos interiores e a produtividade é muito menor). São muitos os factores a ter em conta na avaliação das vantagens e desvantagens de cada variedade. Entramos agora numa estufa para Cordeiro nos mostrar como há variedades que são precoces na floração e como isso pode ser determinante se pensarmos num cenário de alterações climáticas, em que as culturas poderão ter de ser adiantadas ou atrasadas. Há aqui a cobrançosa, a galega, variedades que estão espalhadas por todo o território nacional, mas também outras, menos conhecidas, que são sobretudo variedades regionais. Mas trabalha-se também com variedades espanholas, israelitas, turcas, e outras, para avaliar as qualidades e defeitos de cada uma. "Estas são todas meias-irmãs", diz o investigador, indicando um conjunto de pés que resultam do cruzamento de uma mesma árvore-mãe, galega, e de diferentes "pais", numa polinização livre. Notam-se já pequenas diferenças no formato das folhas, na distância dos entre-nós, que provam que o "pai" teve aqui alguma influência e introduziu um elemento novo. Qual delas no futuro se vai mostrar mais resistente e com maior capacidade de adaptação é o que António Cordeiro espera ver. O mesmo trabalho com vista ao melhoramento genético está a ser feito noutros países, conta. Os espanhóis já conseguiram criar uma nova variedade, a chiquitita, os israelitas criaram duas, os italianos têm estado a tentar mas ainda não apresentaram nenhuma variedade nova que, reunindo características cruzadas de outras variedades, se apresente mais resistente a doenças, pragas e alterações climáticas. A boa notícia, afirma Cordeiro, é que "a oliveira é uma espécie bem adaptada à seca". Quando não há água, ela "adapta-se reduzindo ao mínimo a sua actividade fisiológica" e, quando chove, recupera muito rapidamente. Tendo em conta que o olival em Portugal é essencialmente de sequeiro (embora os superintensivos precisem de rega, que deve ser feita gota a gota), o que há a fazer é apostar em variedades que sejam mais resistentes a essa falta de água. E assim podemos acreditar que o azeite não desaparecerá das nossas mesas. Tal como o vinho, aliás. As preocupações e medidas aqui são bastante semelhantes. "Devemos ter em consideração que estamos a plantar hoje vinhas que vão produzir durante as próximas décadas, logo que irão sofrer os impactos das alterações climáticas", avisa José Silvestre. "Isso deve obrigar a um esforço de reflexão dos viticultores, nomeadamente na escolha de solos com maior capacidade de armazenamento de água, na plantação de porta-enxertos e castas mais resistentes à seca, na escolha das regiões para novas plantações, etc. "Até agora, os estudos incidiram sobretudo sobre a rega da vinha, com um número de castas reduzido. Mais recentemente, conta Silvestre, começou-se a estudar o impacto das alterações climáticas no seu todo. "O trabalho está numa fase inicial e os resultados existentes são para um número reduzido de castas. " Mas Portugal tem "um vasto leque de castas à disposição - estão autorizadas 340, das quais 240 são nacionais. "É um património riquíssimo, que importa valorizar" - e estudar. O INIAV tem a Colecção Ampelográfica Nacional, onde estão plantadas e estudadas cerca de 720 castas, um "património genético que tem despertado o interesse quer de outros países quer de produtores nacionais". Um exemplo curioso dessa colaboração é o que está a ser feito pela Herdade do Esporão, que instalou uma vinha de dez hectares com 180 castas, em que um dos objectivos é precisamente avaliar a capacidade de adaptação das castas às alterações climáticas. Se pensarmos para lá do olival e da vinha, que cenários se prevêem para as outras produções? "As culturas de sequeiro e as zonas de pastagens serão as mais afectadas pelas alterações climáticas", afirma Teresa Avelar. Estamos a falar, portanto, de carne e cereais. Os animais, aliás, correm o risco de ser afectados de duas formas: pela perda de qualidade das pastagens (no caso dos que são criados em regime extensivo) e pela diminuição da disponibilidade de cereais. De qualquer forma, Lima Santos lembra que "os sistemas extensivos produzem pouca carne por hectare, mas fixam carbono" e isso é algo que começa a ser cada vez mais valorizado, inclusivamente em termos de financiamentos comunitários. "Há habitats que são garantidos por sistemas agrícolas extensivos e actualmente a União Europeia paga muitos milhões por isso. "Há, no entanto, diferenças entre o trigo e o milho. "O milho é sempre mais produtivo", diz Francisco Avillez, um dos mais respeitados especialistas em questões de agricultura em Portugal, coordenador científico da empresa de consultoria Agroges. "Mas também é mais exigente do ponto de vista da água. " Por outro lado, acrescenta Ana Paiva Brandão, também da Agroges, "o milho é mais eficiente a fixar o dióxido de carbono [essencial para a fotossíntese], e o trigo não é tão eficiente, pelo que vai beneficiar de uma maior concentração de CO2 na atmosfera", resultante do aquecimento global. A tese de doutoramento de Ana Paiva Brandão (de 2006) centrou-se, em grande parte, no milho e no trigo, e conclui que há uma "tendência geral para a perda de produtividade", embora com comportamentos diferentes em função das zonas. As ondas de calor podem ser fatais para os cereais, e a redução da amplitude térmica significa também menos produtividade, com dificuldades na fase de enchimento do grão. O SIAM II, de 2006 (segunda parte do projecto SIAM, iniciado em 1999), indicavauma redução no milho entre os 11% e os 26%, no trigo entre os 6% e os 22%, e no caso do arroz entre os 55% e os 70%. Enfrentamos então um futuro sem arroz? Ou pelo menos com um grau de dependência externa de arroz muito superior ao actual (sendo Portugal um país de consumidores de arroz)?No território nacional, o arroz faz-se em terrenos alagados e daí ser muito sensível às alterações climáticas. Mais uma vez, tudo vem ter a uma palavra: água. "O arroz precisa de imensa água, por cada quilo produzido gastamos uma quantidade de água brutal", afirma Lima Santos. Mas, também aqui, Pedro Aguiar Pinto tem uma perspectiva diferente: "Hoje o arroz fica limitado ao nível do Mondego. Já se fez no Vouga. Se subir a temperatura, pode-se voltar a fazer no vale do Vouga, ou seja, pode-se subir o limite norte do arroz. " E mesmo para zonas muito secas do interior Sul, Aguiar Pinto tem sugestões: "Podia-se cultivar algodão no Sul de Portugal. " Assim como culturas do Norte de África. "Marrocos sempre produziu trigo. Podíamos ter trigo, tâmaras, amendoim. " De qualquer forma, conclui, "temos água, o Alqueva cheio dá para dois anos". O milho também tem uma grande dependência (embora menor) da água. "A mesma água que gastamos a produzir um hectare de milho, podemos distribuí-la por 20 hectares de trigo, que é menos produtivo mas permite utilizar mais solo. Podemos pensar em substituições de culturas", diz, por seu lado, Lima Santos. Curiosamente, o sorgo, que é o quinto cereal mais importante no mundo, depois do trigo, arroz, milho e cevada, é uma das espécies que têm revelado maior tolerância ao efeito da temperatura. Outra solução, que teria implicações directas na nossa alimentação: poderíamos, continua este especialista, reduzir o consumo de carne. "Usamos o milho e o trigo sobretudo para a alimentação animal e importamos boa parte do trigo. Se consumíssemos uma parte da produção vegetal directamente, talvez não precisássemos de importar alimentos. " Ou seja, é mais eficiente comer o milho directamente do que sob a forma de bife. As melhores notícias, neste panorama, são as que dizem respeito à fruta e aos legumes. "A nossa zona sem geadas, que é hoje uma pequena faixa ao longo do litoral, vai alargar-se muito mais para dentro. Isto significa que uma boa parte do litoral português vai ter menos geadas, o que em termos de hortícolas é uma vantagem que vamos ter de saber aproveitar", continua Lima Santos. Os citrinos, em particular, têm pouca exigência de horas acumuladas de frio, o que significa que não precisam de Invernos muito rigorosos. Isso pode ser bom, e significar uma melhoria na produção tanto de citrinos como de espécies como figueiras e nespereiras. "A nossa saída agrícola são os hortofrutícolas", reforça Aguiar Pinto. "E com as alterações climáticas continua a ser. E até nem precisamos de estufas. Temos uma costa fabulosa, sem geadas todo o ano. Os holandeses conseguem fazê-las mas gastam imenso em aquecimento. Em Portugal, o potencial de produção tem tendência a aumentar. "No entanto, é preciso ter cuidado com os fenómenos extremos, sobretudo com as grandes ventanias e chuvadas que tendem a destruir abrigos e estufas nos hortícolas, e com os efeitos de escaldão na fruticultura. As conclusões dos peritos, a partir dos dados existentes até agora, é a de que se avizinha um cenário preocupante para a zona mediterrânica, mas ainda há muito que se pode fazer para o minimizar. Em primeiro lugar: reter água. "Só com a cultura de regadio é que temos condições de competitividade", garante Pedro Aguiar Pinto. Mas desde que tenham água há várias culturas, nomeadamente o milho, que se adaptam bem ao calor. Quanto às culturas de sequeiro, Francisco Avillez avisa: "Vão precisar de ser apoiadas na fase final em anos em que não chova. "A solução passa por aproveitar o previsível aumento de chuva durante o Inverno para se utilizar essa água, em culturas que tenderão a ser menos de sequeiro e mais de regadio, nos meses mais quentes. "Não conseguimos fazer agricultura sem água e precisamos de água para alimentar os animais. O que fizemos até agora foi apostar em barragens, mas devíamos pensar em coisas de menor dimensão, mais descentralizadas. Nas zonas onde não tivermos água de todo não vai ser possível fazer agricultura, por isso temos de pensar em pôr lá água de outra forma", defende Lima Santos. Outra estratégia - que já é usada pelos agricultores -, referida por todos os especialistas, é a de alteração das épocas de sementeira. "Se continuarmos a semear o milho na mesma altura, vamos ter menor produtividade e gastar mais água", explica Aguiar Pinto. "Devíamos recuar. Se anteciparmos um mês, a produção aumenta e gastamos menos água de rega. " Na sua tese, Ana Paiva Brandão estudou precisamente o efeito desse tipo de ajustamento em culturas como o milho e o trigo nas diferentes regiões. E Teresa Avelar, do MAMAOT, também frisa que esta é uma área que tem de ser muito aprofundada. A outra é a investigação das tais variedades tradicionais que, diz Teresa Avelar, em princípio, "serão menos afectadas pelas oscilações de temperatura e disponibilidade hídrica". "Há que recolher, e ver até que ponto é preciso melhorar ou alterar essas variedades. "Não são só as variedades mas também as práticas tradicionais que devem ser recuperadas, sublinha Avillez. "Abandonámos muito as rotações de culturas, caminhámos no sentido da monocultura, fizemos mal a mecanização, preocupámo-nos pouco com a estrutura do solo. " As plantas geneticamente melhoradas precisam de muitos químicos e com isso foi-se destruindo a fertilidade dos solos. Agora, "o solo tem de passar a ser o centro das nossas preocupações". Para isso, é preciso muito desenvolvimento experimental e apostar numa agricultura de precisão, que permite por exemplo usar a água e os nutrientes apenas onde são necessários. Quanto às variedades tradicionais, "se admitirmos que o que estamos a viver [em termos de alterações climáticas] é um regresso ao que tínhamos há anos, então as variedades tradicionais fazem sentido", segundo Avillez. Muitas variedades tradicionais "terão os genes de resistência às pragas e à secura", acredita Lima Santos. O problema é que "há pouco trabalho sobre os recursos genéticos e as frutas, por exemplo, estão a desaparecer a um ritmo enorme, sem termos sequer um inventário completo". Mas, mais uma vez, faltam-nos certezas. Avillez acredita contudo que "os factores económicos têm tido muito mais peso no abandono das sementes tradicionais" do que as alterações climáticas. Aguiar Pinto concorda: "Hoje o que influencia os projectos agrícolas é o valor da produção. Para a agricultura, o que conta é a política interna - que é muito mais volátil que as alterações climáticas. "Política e pragmatismo. Em Portugal e fora de Portugal. Lima Santos lamenta que nos últimos tempos o mundo fale muito mais em adaptação do que em mitigação das alterações climáticas. Uma mudança que considera "dramática" porque significa assumir que não vamos conseguir travar as alterações climáticas. A notícia de que o Canadá e os EUA vão explorar os xistos betuminosos para extrair petróleo do interior da rocha "dá-nos petróleo e gás natural para mais 200 anos" e isso atrasa todo o processo de combate às alterações climáticas - mais uma vez porque os interesses económicos entraram em jogo, e são muito mais fortes do que as boas intenções. O que é que isso significa em relação ao que os portugueses terão nos seus pratos no futuro? Ninguém arrisca previsões. Teremos vinho, possivelmente mais a norte e talvez com características um pouco diferentes. Azeite também. Muita fruta e legumes. Desejavelmente menos carne. É possível que a batata ganhe terreno ao pão e às massas. "Não temos de ter uma perspectiva de redução da produção. O esforço é para que se continue a produzir o que hoje se produz", diz Teresa Avelar. Mesmo assim, parece ser um daqueles casos em que faz todo o sentido a máxima do italiano Tomasi de Lampedusa, autor de O Leopardo, o livro que Visconti adaptou ao cinema: "Se queremos que tudo permaneça como está, é preciso que tudo mude. "
REFERÊNCIAS:
Apontar e salvar a cultura da flecha e da besta
Nas profundezas das montanhas ao longo da fronteira entre a China e a Birmânia, o aldeão Zhang Lisu (26 anos) afia as flechas da sua besta, preparando-se para uma caçada. Para Zhang e muitos outros Lisu, uma minoria predominantemente cristã que habita a região de fronteira, a besta é uma parte indispensável de uma cultura que remonta a 200 aC. Num país que muitas vezes proíbe a venda de facas de cozinha durante alguns momentos da política nacional, ainda é normal ver esta etnia carregar abertamente a arma em público. Apesar de uma velha proibição de caça, a aplicação da lei permanece negligente e Zhang e os seus ... (etc.)

Apontar e salvar a cultura da flecha e da besta
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 6 Animais Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-05-28 | Jornal Público
TEXTO: Nas profundezas das montanhas ao longo da fronteira entre a China e a Birmânia, o aldeão Zhang Lisu (26 anos) afia as flechas da sua besta, preparando-se para uma caçada. Para Zhang e muitos outros Lisu, uma minoria predominantemente cristã que habita a região de fronteira, a besta é uma parte indispensável de uma cultura que remonta a 200 aC. Num país que muitas vezes proíbe a venda de facas de cozinha durante alguns momentos da política nacional, ainda é normal ver esta etnia carregar abertamente a arma em público. Apesar de uma velha proibição de caça, a aplicação da lei permanece negligente e Zhang e os seus amigos ainda caçam aves e roedores por desporto — antes da proibição, a caça era grossa e incluía ursos e javalis. À medida que os jovens se mudam para áreas urbanas para trabalhar, os mais velhos temem que a besta esteja em vias de extinção. Por isso há quem promova o tiro como desporto, procurando atrair novos praticantes. "A cultura da besta do nosso povo deve entrar nos Jogos Nacionais da China, nos Jogos Asiáticos e nos Jogos Olímpicos!", sublinha Cha Hairong, presidente da Associação de Bestas da cidade de Liuku, comprometido com a preservação dessa cultura.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave lei cultura minoria extinção aves
Há uma cidade na China que quer ficar parecida com o Porto
Anshun quer aproveitar a morfologia do seu terreno para se aproximar de cidades europeias. O Porto surge como exemplo num jornal chinês, que revela o apoio de São João da Madeira ao projecto (...)

Há uma cidade na China que quer ficar parecida com o Porto
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 5 Animais Pontuação: 6 | Sentimento 0.2
DATA: 2012-11-13 | Jornal Público
SUMÁRIO: Anshun quer aproveitar a morfologia do seu terreno para se aproximar de cidades europeias. O Porto surge como exemplo num jornal chinês, que revela o apoio de São João da Madeira ao projecto
TEXTO: Anshun é uma cidade no Sudoeste da China com 2, 96 milhões de habitantes espalhados por 9267 quilómetros quadrados e que vive sobretudo do turismo - ou não tivesse a maior queda de água do país. Mas Anshun quer mais para aumentar as receitas e alargar a capacidade hoteleira que já não chega para as encomendas. Quer aproveitar os socalcos do seu território para ficar parecida com cidades europeias. E o exemplo surge na edição de domingo do jornal China Daily. A foto que aparece para ilustrar as intenções é um "postal" do Porto com o rio à vista. É conhecido o gosto chinês pela criação de réplicas de cidades europeias. Há vários exemplos no país - imitando a Veneza dos canais ou Barcelona. E Anshun não quer ficar atrás. Captar a atenção dos turistas europeus é o motivo que, neste momento, move a cidade chinesa. Nos planos, está a criação de um parque de diversões com 60 hectares, uma espécie de cidade europeia em miniatura, com atracções de vários países. Em Portugal, as atenções recaíram nas touradas. O Centro Hípico Dom Cavalo, em Leiria, está envolvido no projecto. Miguel Condeço e Cidália Cardoso não querem, por enquanto, revelar pormenores. A presença da Dom Cavalo é, no entanto, dada como certa no empreendimento chinês, ficando responsável por montar espectáculos equestres à portuguesa com tourada, abrir escolas de equitação e criar cavalos lusitanos em Anshun. A vontade de importar touradas, segundo o China Daily, já despertou o interesse de empresas espanholas. Uma praça de touros sairá entretanto do papel com uma capacidade para 6000 espectadores. O projecto chinês, que deverá estar concluído nos próximos dez anos, prevê ainda um investimento imobiliário: construção de hotéis de luxo, restaurantes, cinemas, centros comerciais. Yang Kaihua, director do Huangguoshu Scenic Area Working Committee, citado pelo China Daily, fala na construção de uma cidade europeia. "Esperamos que o projecto atraia mais de quatro milhões de turistas todos os anos e, portanto, venha a gerar mais receitas para a economia local", sustenta. No ano passado, graças a 18, 5 milhões de visitantes (um por cento estrangeiros), a receita com o turismo rondou os 2, 3 mil milhões de euros. São João da Madeira está de olho em Anshun, mas não no parque de diversões. Há um processo de geminação em curso entre as duas cidades. "Sou presidente de câmara há 11 anos e nunca promovi nenhuma geminação, mas se o vier a fazer será, com certeza, com uma cidade chinesa", adianta ao PÚBLICO Castro Almeida, presidente da câmara são-joanense. "É para a China que temos de divulgar o nosso potencial produtivo. É uma zona do mundo demasiado importante e cheia de oportunidades, mas que tem passado ao lado das nossas prioridades", acrescenta. Aveiro também terá ligações a Anshun. Na próxima semana, o vice-reitor da Universidade de Aveiro, Carlos Pascoal Neto, viajará para a região de Guizhou, onde está Anshun, para assinar um protocolo com a universidade, no sentido de proporcionar em Portugal uma especialização na área do turismo a grupos de 20 a 30 alunos chineses. Um ensino pós-graduado que, neste momento, a região não possui. A colaboração de Aveiro deverá entretanto esticar-se a Anshun. "Em Anshun, está a ser feito um grande investimento em hotelaria e a Universidade de Aveiro está disponível para apoiar a criação de uma escola de turismo", revela o vice-reitor. Mandarim nas escolas de São João da MadeiraA partir de Janeiro do próximo ano, os alunos do 3. º ano das escolas primárias de São João da Madeira começam a aprender mandarim. No início do ano lectivo de 2013/2014, as crianças dos 3. º e 4. º anos do 1. º ciclo das nove escolas primárias do concelho também aprenderão chinês. O Departamento de Línguas e Culturas da Universidade de Aveiro assume a coordenação científica e pedagógica ao garantir os professores, maioritariamente chineses.
REFERÊNCIAS:
Jannis Kounellis (1936-2017), um dos maiores da arte povera
Nasceu na Grécia, viveu e criou em Itália, onde se tornou numa das figuras centrais daquele movimento artístico que foi um dos mais marcantes do pós-guerra. Morreu esta quinta-feira aos 80 anos. (...)

Jannis Kounellis (1936-2017), um dos maiores da arte povera
MINORIA(S): Animais Pontuação: 6 | Sentimento 1.0
DATA: 2017-02-18 | Jornal Público
SUMÁRIO: Nasceu na Grécia, viveu e criou em Itália, onde se tornou numa das figuras centrais daquele movimento artístico que foi um dos mais marcantes do pós-guerra. Morreu esta quinta-feira aos 80 anos.
TEXTO: O artista grego-italiano Jannis Kounellis, um dos mais destacados nomes da arte povera e um dos seus mais fiéis defensores, morreu em Roma esta quinta-feira, onde vivia desde os anos 1950. Tinha 80 anos. Foi em Itália, ao lado de nomes como Michelangelo Pistoletto, Alberto Burri ou Giuseppe Penone, que construiu a sua obra plástica no seio de um dos movimentos mais marcantes da arte do pós-guerra. Ficou conhecido pela utilização de materiais não convencionais (troncos, fogo, sacos, cavalos, pássaros), afirmando-se no meio da vaga de contestação que varreu a arte europeia depois da Segunda Guerra Mundial, naquilo que o crítico italiano Germano Celant viria a sintetizar como arte povera, ou arte pobre. Foi nesse contexto que contribuiu para interrogar e amplificar os limites da arte contemporânea, situando muitas das suas obras nos interstícios entre arte e vida, natureza e cultura, e ajudando a mudar o entendimento do que pode ser (ou não) classificado como arte. É talvez um dos nomes mais conhecidos da arte contemporânea que lidou com materiais perecíveis, degradáveis ou orgânicos. Apesar de se situarem entre os territórios da escultura, da instalação e da performance, referia-se sempre aos seus trabalhos como “pinturas” e considerava-se um pintor. “Tudo o que faço é pintura, mesmo se não toco num pincel”, afirmava, sublinhando que provinha dessa tradição e dessa forma de pensar, tal como toda a arte contemporânea tal como ela foi redefinida em 1917 pela Fonte de Marcel Duchamp: “Rembrandt é pintor, mas também Duchamp o é. ” Sobre o diálogo que estabelecia com o espectador e, em alguns casos, com o divino dizia. “Todos os artistas acreditam em Deus, por um simples motivo: Deus é a razão da síntese. ”Nascido na Grécia a 23 de Março de 1936, mudar-se-ia para Itália em 1956, tinha então 20 anos, para estudar na Academia de Belas Artes de Roma, onde viria a permanecer até ao fim da sua vida. Foi aí que expôs pela primeira vez em 1960, numa galeria romana (La Tartaruga), já aí sendo perceptível a sua singular forma de interpretar a arte, recorrendo a poucos e simples elementos, questionando a ideia de arte como indústria de criação de objectos estéticos, pensando instalações ou esculturas a partir da dissolução da forma, da destruição e da aspereza. Mas foi depois, quando se especializou na combinação de materiais orgânicos e inorgânicos nas suas obras, que veio a alcançar projecção. No final dos anos 1960 surpreendia quando nas suas instalações combinava vigas de ferro e animais vivos, ou troncos de madeira com carne de matadouro. São desse período alguns dos trabalhos mais afamados como Untitled (12 horses), com 12 cavalos dispostos na galeria Attic de Roma (um trabalho que viria a ser recriado em Nova Iorque há dois anos), transformando o local num espaço onde a vida real, a arte e a ficção convergiam, ou uma porta murada com pedras criada em 1969, simbolizando o isolamento com o mundo exterior. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Nos anos 1970 começou a circular internacionalmente, com diversas exposições importantes, em Colónia ou Londres, por exemplo, e representou Itália na Bienal de Veneza em 1972. Nas décadas de 1980 e 1990 perdeu alguma visibilidade, mas a partir dos anos 2000 voltou a ser alvo de grande atenção na cena artística global. Em 2013, quando o Vaticano teve pela primeira vez um pavilhão nacional na Bienal de Veneza, entre os artistas para o representar estava Jannis Kounellis. Muitas das suas obras estão integradas em algumas das colecções institucionais mais importantes do mundo, como as do Guggenheim, do MoMA ou da Tate Modern – em Portugal, está representado nas colecções do Museu de Serralves, no Porto, e do Museu Colecção Berardo, em Lisboa. Por cá integrou também várias exposições colectivas, a última das quais no ano passado, quando o Museu de Serralves apresentou a exposição The Sonnabend Collection. Meio Século de Arte Europeia e Americana. Part 1.
REFERÊNCIAS: