Criança detida por blasfémia no Paquistão
Uma criança paquistanesa está detida depois de ter sido acusada de desrespeitar o Corão. O caso da menor, filha de pais cristãos, está a suscitar a ira entre a população maioritariamente muçulmana, que exige que a criança seja punida. A lei paquistanesa prevê a pena de morte para alguns destes casos. (...)

Criança detida por blasfémia no Paquistão
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Mulheres Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2012-08-20 | Jornal Público
SUMÁRIO: Uma criança paquistanesa está detida depois de ter sido acusada de desrespeitar o Corão. O caso da menor, filha de pais cristãos, está a suscitar a ira entre a população maioritariamente muçulmana, que exige que a criança seja punida. A lei paquistanesa prevê a pena de morte para alguns destes casos.
TEXTO: Rimsha, que terá entre 11 e 12 anos e trissomia 21 ou síndrome de Down, foi detida na última quinta-feira em Mehrabad, um bairro em Islamabad habitado por perto de 800 paquistaneses cristãos, depois de uma multidão em fúria ter exigido que fosse punida. O que terá estado na origem da detenção da criança não foi ainda confirmado oficialmente. Um responsável da polícia local disse à agência noticiosa AFP, sob condição de anonimato, que a criança terá sido vista em público com páginas queimadas entre as quais se encontravam versos do Corão e outros textos islâmicos. Rimsha foi ouvida na sexta-feira em tribunal mas não terá conseguido explicar o que aconteceu e entendido as questões que lhe foram colocadas. Ficou em prisão preventiva durante 14 dias, ao fim dos quais deverá comparecer de novo em tribunal. O ministro paquistanês para a harmonia nacional, Paul Bhatti, citado pela BBC, sublinhou que a criança sofre de perturbações mentais e tudo indica que não terá “desrespeitado propositadamente o Corão”. Com base nos relatórios a que tive acesso, foi encontrada com um saco de lixo que também teria páginas do Corão”, acrescentou o responsável à estação de televisão britância. “O caso enfureceu a população local e uma multidão começou a exigir que fosse punida. A polícia esteve incialmente relutante em deter a menina mas cedeu perante a enorme pressão da multidão, que chegou a ameaçar que iria incendiar habitações de cristãos”, contou ainda o ministro. O Presidente paquistanês, Asif Ali Zardari, já ordenou que fosse aberto um inquérito à detenção da menor e entregou o caso ao ministro do Interior. A acusação de blasfémia feita a Rimsha pela maioria muçulmana levou a que muitos cristãos abandonassem temporariamente o bairro de Mehrabad, receando represálias, adianta a AFP. “Estes cristão estão refugiados em casa de familiares noutros bairros da cidade mas já começaram a regressar progressivamente a Mehrabad”, disse à AFP Tahir Naveed Chaudhry, de uma organização que representa as minorias no Paquistão. Tahir Naveed Chaudhry confirmou à agência noticiosa que Rimsha tem trissomia 21, associada a algumas dificuldades de habilidade cognitiva e desenvolvimento físico. As limitações mentais da criança são, no entanto, contestadas pela comunidade muçulmana, que asseguram que esta é "completamente normal" e que apenas tem um comportamento estranho. Fala sozinha e anda de uma forma peculiar, adiantou uma menina que afirma conhecer Rimsha citada pelo Guardian. A polícia é acusada de impedir que advogados ou outros representantes da sociedade civil visitem Rimsha. “O Fórum de Acção das Mulheres está escandalizado com a total falta de humanismo” neste caso, afirmou Tahira Abdullah, membro da organização de defesa dos direitos das mulheres, exigindo a libertação imediata da menina e que esta seja tratada com base na legislação para menores. O caso surge numa altura em que se debate a intolerância entre muçulmanos no Paquistão ou as leis contra a blasfémia do islão, que pode ser punida com a pena de morte. Activistas dos direitos humanos no país têm exigido uma reforma da legislação, nomeadamente a lei que prevê a prisão perpétua para quem seja acusado de desrespeitar o Corão. Em muitos casos, aqueles que são acusados de blasfémia são mortos em ataques de multidões. Um desses casos foi registado no mês passado, quando um homem acusado de blasfémia, mentalmente instável, foi capturado de uma esquadra da polícia para ser queimado vivo na zona de Bahawalpur, na província de Punjab. A BBC lembra que no ano passado, Shahbaz Bhatti, ministro dos Assuntos Internos, foi morto depois de ter defendido a revisão da lei sobre a blasfémia. Dois meses antes, o governador de Punjab, Salman Taseer, foi também assassinado após ter assumido a mesma posição.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave direitos morte lei humanos tribunal prisão homem comunidade criança mulheres morto
Guerra em Gaza provoca demissão no Governo britânico
Sayeeda Warsi, a primeira muçulmana a chegar ao executivo, considera "indefensável" o discurso de Londres sobre a morte de civis. (...)

Guerra em Gaza provoca demissão no Governo britânico
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Mulheres Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2014-08-05 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20140805170208/http://www.publico.pt/1665460
SUMÁRIO: Sayeeda Warsi, a primeira muçulmana a chegar ao executivo, considera "indefensável" o discurso de Londres sobre a morte de civis.
TEXTO: Sayeeda Warsi, secretária de Estado dos Negócios Estrangeiros e primeira mulher muçulmana num governo britânico, demitiu-se nesta terça-feira por considerar “moralmente indefensável” a posição assumida por Londres face à guerra em Gaza. “Com profundo pesar escrevi esta manhã ao primeiro-ministro para lhe apresentar a minha demissão. Não posso continuar a apoiar a política do Governo sobre Gaza”, escreveu Warsi na sua conta no Twitter. A advogada de origem paquistanesa era um dos rostos da modernização que David Cameron prometia quando em 2010 foi eleito primeiro-ministro. Nomeada para a Câmara dos Lordes, chegou a ser presidente do Partido Conservador, mas em 2012 foi despromovida, de ministra sem pasta a secretária de Estado dos Negócios Estrangeiros, e o seu afastamento da linha seguida pelo primeiro-ministro foi-se tornando cada vez mais claro. Descontente com o facto de Cameron não ter condenado abertamente os bombardeamentos de Israel contra a Faixa de Gaza, Warsi escreve na sua carta de demissão que “a abordagem e a linguagem” do Governo é “moralmente indefensável” e “não serve os interesses nacionais britânicos”, ameaçando “a sua reputação internacional e interna”. “Espanta-me que o Governo britânico continue a permitir a venda de armas a um país, Israel, que matou quase duas mil pessoas, incluindo centenas de crianças, apenas nas últimas quatro semanas”, escreve, pedindo um embargo imediato à venda de material bélico. O gabinete do primeiro-ministro lamentou a decisão de Warsi e agradeceu o seu “excelente trabalho”, mas Cameron, de férias em Portugal, ainda não se pronunciou. Desde o início da ofensiva, Londres tem pedido contenção aos dois lados, sempre sublinhando o direito de autodefesa de Israel, e o mais longe que foi na condenação à morte de civis ficou-se por uma breve declaração na segunda-feira em que disse reconhecer que a ONU tinha razões para repudiar o ataque a uma escola onde estavam abrigados refugiados palestinianos.
REFERÊNCIAS:
Entidades ONU
Jorge Sampaio: “Rever a Declaração Universal dos Direitos Humanos será abrir uma caixa de Pandora”
A Declaração Universal dos Direitos Humanos defende valores universais ainda por realizar em vários países. Sampaio defende que “a celebração deste septuagésimo aniversário deveria ser uma ocasião para lançar um alerta vermelho”. (...)

Jorge Sampaio: “Rever a Declaração Universal dos Direitos Humanos será abrir uma caixa de Pandora”
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Migrantes Pontuação: 6 Mulheres Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-11 | Jornal Público
SUMÁRIO: A Declaração Universal dos Direitos Humanos defende valores universais ainda por realizar em vários países. Sampaio defende que “a celebração deste septuagésimo aniversário deveria ser uma ocasião para lançar um alerta vermelho”.
TEXTO: Quando se comemoram os 70 anos da aprovação da Declaração Universal dos Direitos Humanos, questiona-se a necessidade dos 30 princípios que a compõem serem revistos e adaptados ao novo mundo trazido pela revolução tecnológica, em particular pela robotização. Uma preocupação da qual discorda o ex-Presidente da República e ex-secretário-geral do PS, Jorge Sampaio. “Não creio que seja de todo necessário e penso que seria uma má opção”, afirma ao PÚBLICO, garantindo: “Nos tempos que correm, rever a declaração será abrir uma caixa de Pandora com consequências imprevisíveis e, a meu ver, todas negativas. Evitemos um passo desnecessário. ”A hipótese de revisão da declaração é afastada também pelas outras personalidades ouvidas pelo PÚBLICO, Pedro Roseta, primeiro embaixador português na OCDE, antigo representante de Portugal no Conselho da Europa, ex-ministro e deputado à Assembleia Constituinte e à Assembleia da República pelo PSD, Jorge Miranda, deputado à Constituinte pelo PSD e constitucionalista, Ana Gomes, embaixadora e eurodeputada pelo PS, e António Cluny, magistrado que representa Portugal no Eurojust. “Não questiono o avanço tecnológico, mas há que ter atenção às consequências”, adverte Pedro Roseta, mesmo sem defender a revisão. Por seu lado, António Cluny considera que “ainda não estamos numa fase de perceber claramente o que poderá advir” da revolução tecnológica. E defende que a actualidade do documento se mantém uma vez que “podemos falar de robotização pelo lado dos efeitos sobre o trabalho ou pela genética, mas são sempre as questões que estão já na declaração”. Cluny sustenta mesmo que “aquele quadro ainda é muito importante e estruturante e tem de ser explorado na sua simplicidade básica que não está resolvida”. Igualmente Ana Gomes sublinha que “as mudanças tecnológicas existem, mas o ser humano não vai ser substituído, vai sempre ser necessário o julgamento humano”. Insistindo na ideia, afirma: “Não acredito que a inteligência artificial e o desenvolvimento tecnológico possam de alguma maneira dispensar a inteligência humana e o que está na declaração é para os humanos. ” A eurodeputada não deixa, porém, de salientar que “o desenvolvimento tecnológico, nomeadamente na informação, põe novos desafios por falta de regulação”, apontando que “a informação tem hoje uma ampliação maior com graves riscos de manipulação”, defende: “Não acredito na auto-regulação do Facebook. É preciso intervenção política para regular a nível global. Também na defesa da privacidade e na defesa dos cidadãos. ”Jorge Miranda considera que a declaração “continua a ter toda a actualidade”, foi e é “um esforço seguro para refazer o mundo com base em direitos universais”. O constitucionalista sublinha que “é um documento Juris Universalista e cujo artigo 1º continua a ser uma referência: ‘Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. Dotados de razão e consciência, devem agir uns aos outros em espírito de fraternidade’”. Ana Gomes completa a ideia de universalidade, afirmando que “a declaração é Jus Cogenes, é direito imperativo, não é um tratado, é de tal maneira fundamental que é direito internacional imperativo”. A eurodeputada garante que os Direitos Humanos “são valores universais, válidos seja qual for a religião, a cultura e a civilização”, o que os torna “inultrapassáveis, o que está ali, está escrito na pedra, não vai mudar, vai haver novas interpretações e ampliações em cada época, como tem acontecido”. Defensor do valor perene da declaração, Sampaio assume: “Se me é permitido o paralelismo com o conhecido mote ‘25 de Abril sempre’, diria: Declaração Universal, sempre!”. Cluny explica que “a declaração marca um ponto de viragem e a inclusão na agenda mundial de um conjunto de valores” que “não são relativos", o que representou “um subir de patamar de concepções da humanidade”. Por outro lado, a sua aprovação “produziu uma dinâmica”, que “em conjunto com outros documentos posteriormente aprovados, como a Carta da Europa, levou à criação de organismos que começaram a intervir de maneira efectiva na afirmação prática e concreta de valores da declaração”. Assim, frisa o magistrado, “do plano teórico e utópico, passou-se para a positivização dos direitos”. E conclui: “Estou no Eurojust e tenho de trabalhar com a produção do Tribunal Europeu de Direitos Humanos e do Tribunal Europeu de Justiça, vejo como são produzidas decisões que têm implicações directas na vida das pessoas. ”Também Roseta salienta que “a declaração é proclamatória”, mas “a partir da aprovação houve um movimento muito importante de concretização”. Uma força que advém das raízes do documento, explica, lembrando que os valores ali incluídos espelham o espírito “da declaração americana e, depois, da francesa, mas também os valores do cristianismo e o ideário de São Paulo, para quem todos são iguais”. A declaração foi, assim, “a mãe de outras convenções e tratados”, sintetiza, acrescentando que ela “é universal, une os povos e os espaços mas também o tempo, é a solidariedade com outros hoje, mas também com as gerações vindouras”. O primeiro embaixador português na OCDE sublinha ainda que a declaração contém um ideário que “continua a ser inspirador, foi e é positivo por tudo o que desencadeou: o direito ao desenvolvimento, o direito à diferença contemplado pelo conceito de que somos todos iguais, mas todos diferentes. ” A que aduz “a preocupação pelo destino da humanidade, a consciência de que estamos todos no planeta. Eu não posso ter direitos se os outros não têm. ”Sampaio adverte que, “no entanto, nada está garantido e, mesmo se desde 1948 a declaração foi completada com inúmeras convenções, protocolos, planos de acção e agendas que permitiram avanços significativos, assiste-se hoje a uma perigosa evolução tendente não só a desvalorizar o sistema multilateral que tem assegurado o progresso na realização dos Direitos Humanos, mas também a desacreditar os próprios direitos e o princípio da sua universalidade, inalienabilidade e inviolabilidade”. Razão pela qual o ex-Presidente defende que “a celebração deste septuagésimo aniversário deveria ser uma ocasião para lançar um alerta vermelho e ao mesmo tempo ser um grito de alerta”. A necessidade de levar o reconhecimento dos Direitos Humanos a todos é advogada também por Roseta. “Há muito a fazer, é preciso a sua promoção em todo o mundo, numa perspectiva de desenvolvimento e de respeito ambiental”, diz, questionando: “Onde está a Igualdade quando ainda há escravatura e ainda existe a situação que existe com tantas mulheres?”Sem desvalorizar o muito que há para fazer, Ana Gomes defende que “nunca vivemos numa época perfeita, nunca há perfeição nos Direitos Humanos”. Mas lembra o muito que foi conseguido. “Os direitos das mulheres, que não estavam assim formulados na declaração, hoje estão adquiridos, não realizados, mas adquiridos desde a Conferência de Pequim em 1995”, frisa a eurodeputada, advertindo: “Não quero apagar os aspectos positivos que resultaram da evolução que os Direitos Humanos tiveram. ”Além do que está por realizar, as personalidades ouvidas pelo PÚBLICO salientam ainda os riscos que os Direitos Humanos correm hoje em dia. “Há claramente” riscos de regressão “e, mais do que riscos, há já regressões tangíveis atestadas por inúmeros factos”, afirma Sampaio. Cluny alerta para que “há sempre todos os riscos de retrocesso, até porque a história da humanidade não é linear”. E explica que “há corredores que percorremos a velocidades diferentes, há questões que não estão asseguradas” e defende que “há áreas da sociedade que já evoluíram tanto que não percebem que há coisas básicas que não estão satisfeitas”. Desenvolvendo a ideia dos vários ritmos e dos vários universos sociais, culturais e mentais que coexistem na mesma sociedade, Cluny sublinha: “O perigo existe, e pode vir até de inventarmos demasiados direitos, há novos direitos que são importantes, mas nem todos essenciais ou básicos. ” Ora, afirma o magistrado, “as contradições provocadas pela defesa desses novos direitos têm sido usadas pelos movimentos populistas para os contrastar com a falta de realização de direitos essenciais que muitos ainda sentem mesmo na Europa. ” Concluindo: “Não podemos fazer o discurso dos Direitos Humanos para elites culturais e deixar de lado as pessoas com necessidades básicas. Os Direitos Humanos podem regredir porque o discurso em sua defesa pode tornar-se insuportável para quem não tem direitos, isto mesmo na Europa. ”Os retrocessos nos Direitos Humanos são salientados por Jorge Miranda. “Estamos a assistir a ataques do nacional populismo, do fascismo, dos regimes comunistas capitalistas, o problema dos refugiados, os efeitos das novas tecnologias na comunicação social”, afirma o constitucionalista, acrescentando ainda que “permanecem as desigualdades Norte-Sul e na Europa continua a haver desigualdades”. Concluindo que “a ideia de pôr fim às desigualdades entre as pessoas continua válida, mas é preciso combater por ela mais do que há dez ou vinte anos”. A regressão é também apontada por Roseta que lembra, contudo que, “por ser um texto proclamatório, a declaração teve uma aplicação desigual no tempo e no espaço”. Logo quando foi aprovada, “recebeu 40 votos a favor e oito abstenções da União Soviética e outros países do Pacto de Varsóvia, mas também da Arábia Saudita e da África do Sul”, ou seja, “houve países que se colocaram logo de fora”, a que se juntaram os “outros que nasceram da descolonização”. Além de que “há países em que houve regressão” e “, mesmo países subscritores, onde tem havido violações gravíssimas”. O primeiro embaixador português na OCDE destaca os casos “da Turquia, de África, das ditaduras, dos países islâmicos” e cita também a situação actual nos EUA. Mas há uma outra dimensão de risco que Roseta considera “paradoxal”. No mundo de hoje, “há uma emergência de falsos valores de uma hierarquia de valores desajustados”. Pelo que “o maior risco é esta afirmação grotesca do primado do indivíduo, que se sublima através do nacionalismo”, quando, garante, “é uma contradição querer ser individualista e liberal e ao mesmo tempo nacionalista”. Pelo que adverte para a necessidade de combater “o perigo da continuação da ideologia do triunfo, que leva ao esquecimento da responsabilidade e do serviço ao outro”. Por sua vez, Ana Gomes defende que “há regressão porque alguns países-chave, em particular os EUA, estão hoje a pôr em causa esses Direitos Humanos”. E aponta como retrocesso “a presidência de Donald Trump e o que ele diz sobre imigrantes, para mais no país que foi o grande defensor dos Direitos Humanos, desde o impulso de Eleanor Roosevelt [mulher do Presidente dos EUA, Franklin Roosevelt]. ” Mas a eurodeputada salienta que “houve sempre quem os quisesse pôr em causa” e garante que “estamos numa fase de regressão, mas isso não vai pôr em causa a declaração, será uma fase certamente passageira, porque quanto mais se sente a falta dos Direitos Humanos, mais se faz para compensar essa falta”. Frases“Nos tempos que correm, rever a declaração será abrir uma caixa de Pandora com consequências imprevisíveis e, a meu ver, todas negativas. Jorge SampaioNão acredito que a inteligência artificial e o desenvolvimento tecnológico possam de alguma maneira dispensar a inteligência humana e o que está na declaração é para os humanos. Ana Gomes“É um documento Juris Universalista e cujo artigo 1º continua a ser uma referência: ‘Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. Dotados de razão e consciência, devem agir uns aos outros em espírito de fraternidade’. Jorge MirandaÉ universal, une os povos e os espaços mas também o tempo, é a solidariedade com outros hoje, mas também com as gerações vindouras. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Pedro RosetaAs contradições provocadas pela defesa desses novos direitos têm sido usadas pelos movimentos populistas para os contrastar com a falta de realização de direitos essenciais que muitos ainda sentem mesmo na Europa. António Cluny
REFERÊNCIAS:
Religiões Cristianismo
O momento dos Sessenta: nem apolíneo, nem dionisíaco
Devem os sessenta e “1968” ser tomados como catalisadores de mudança social ou como sintomas de dinâmicas já em andamento? Ou devem ser tomados antes como um momento de reforço do conservadorismo, não de ruptura? São muitas as questões que ainda hoje se encontram por responder. As respostas, quaisquer que sejam, devem decorrer do estudo de contextos sociais e históricos específicos, não da celebração acrítica ou da crítica infundada. (...)

O momento dos Sessenta: nem apolíneo, nem dionisíaco
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Migrantes Pontuação: 6 Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 6 Homossexuais Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-06-21 | Jornal Público
SUMÁRIO: Devem os sessenta e “1968” ser tomados como catalisadores de mudança social ou como sintomas de dinâmicas já em andamento? Ou devem ser tomados antes como um momento de reforço do conservadorismo, não de ruptura? São muitas as questões que ainda hoje se encontram por responder. As respostas, quaisquer que sejam, devem decorrer do estudo de contextos sociais e históricos específicos, não da celebração acrítica ou da crítica infundada.
TEXTO: Em Israel, os anos Sessenta foram marcados pela “Guerra dos Seis Dias”, não por expressões de protesto juvenil ou profundas transformações sociais. A geração que é invocada, ainda hoje, é a de 67, não a de 68. A guerra ocupa e agita a memória colectiva e o modo como os Sessenta são interrogados. Não são os aspectos frequentemente associados às dinâmicas transformadoras dos sixties que estão no centro dessa interrogação. Tanto ali como nos países árabes envolvidos mais directamente no conflito – Síria, Egipto e Jordânia –, a década foi marcada por outros acontecimentos e deixou outros legados. Mas, apesar disso, há certos aspectos comuns que podem ser identificados. Por exemplo, no que diz respeito a formas de criativa expressão política e cultural. O acontecimento militar não deixou de motivar agendas pacifistas. Abie Nathan, conhecido activista israelita, falhou a missão de paz na sua viagem, não autorizada, ao Egipto em 1966, pilotando o seu avião Shalom 1 (“Paz 1”). Foi deportado por Nasser e preso à chegada a Israel. Não obstante, persistiu. Num país que apenas viu uma segunda estação de rádio ser permitida em 1960, fundou a rádio-pirata Voz da Paz em 1973, transmitindo desde o Navio da Paz, que comprou com a ajuda de John Lennon. Apenas deixou de transmitir a sua mistura de música pop com mensagens pacifistas, em árabe, hebraico e inglês, em 1993. Em 1977, organizou o enterro de brinquedos militares que previamente destruiu, alguns num programa de televisão. Terá gastado 4 mil dólares (3, 4 mil euros) a comprá-los. Em 1978 iniciou a sua primeira greve de fome, em oposição aos colonatos israelitas. Ao longo dos anos, participou activamente no apoio a vítimas de guerra e desastres ambientais, do Biafra à Nicarágua. Num outro sentido, o compromisso juvenil com o projecto sionista foi sendo objecto de questionamento crítico activo. O investimento na doutrinação dos jovens por parte das autoridades israelitas e as correspondentes expectativas de alinhamento ideológico e normativo, de forte cariz nacionalista, foram confrontados com vigor. A “geração expresso”, apodo de Arthur Koestler que Yizhar Smilanski, escritor e político israelita, colou depreciativamente aos jovens israelitas em 1960, não parecia responder aos mesmos incentivos. Para S. Yizhar (nom de plume) eles queriam algo “forte, rápido e barato”. O seu ataque aos “poetas da anexação” envolvia disputas literárias. Mas era muito mais que isso: era uma denúncia do aparente desinteresse pela defesa intransigente do colectivo “nacional”. Em 1961, por ocasião de dois encontros entre David Ben-Gurion e vários jovens intelectuais dos kibutz, entre os quais Amos Oz, o corte geracional no que dizia respeito à relação entre missão nacional e desenvolvimento pessoal era notório. A “geração de 48”, a que participou na “guerra da independência”, era vista como não tendo sucessora à altura. Para Ben-Gurion, era preciso “dizer-lhes como é”. Mas a resposta, dada pelo historiador Muki Tsur, era clara: “Por vezes ignoramos o facto que uma sociedade com a sua própria vida, as suas experiências, os seus próprios desejos, está a emergir nesta terra”. Era preciso dar-lhe voz. Contudo, em 1967, outros clamores se ouviram, parecendo anunciar uma nova geração, capaz, finalmente, de honrar a de 1948. Tal não impediu, claro, que expressões de descontentamento furassem o tom celebratório e vitorioso que predominava em Israel. A publicação do livro Siach Lochamim (“O sétimo dia”), três meses depois do fim da guerra, foi talvez o exemplo mais importante. Composto por inúmeros testemunhos de jovens, da “geração de 67”, reflectindo sobre os efeitos da guerra, o livro tornou-se um best-seller. Foi traduzido para várias línguas. Em 2015 tornou-se um documentário, que resultou de mais de 200 horas de gravações, Censored Voices. Ambos revelam o pulsar de uma sociedade em (relativa) transformação, marcada por inúmeras contradições, mas a dialogar, de modo crescente, com outros contextos. Sim, os Beatles foram impedidos de visitar o país em 1965, por não corresponderem aos critérios artísticos e culturais vigentes. Mas, em 1966, o governo liderado por Levi Eshkol aboliu o regime de conscrição e organização militar que vigorava desde 1948. Movimentos políticos de contestação como o socialista Matzpen começavam a ter alguma projecção pública. 1968 viu o surgimento de um primeiro canal de televisão, ainda que controlado pelo governo. No mesmo ano, Hanoch Levin, um dos mais importantes poetas e encenadores israelitas dirigiu uma peça de cabaré em Telavive: You, I and the Next War. Esta ecoava Brecht, escarnecia do nacionalismo jingoísta e do ethos militarista e lamentava a glorificação da morte. Veiculava ainda uma contestação às orientações colectivistas predominantes. O individualismo era valorizado, em detrimento do sacrifício em nome de um destino colectivo futuro. Um ano mais tarde, Yaakov Rotblit escrevia o hino do movimento pacifista israelita, Shir LaShalom (“Uma canção para a paz”). Em 1971, emergia uma organização de protesto em Jerusalém intitulada Black Panthers, composta por imigrantes judeus de segunda-geração provenientes do Norte de África e do Médio-Oriente. Com óbvia inspiração transatlântica e com alguma capacidade de recrutamento e projecção pública, denunciava as dinâmicas de desigualdade sócio-económica, de notória raiz étnica, que atravessavam a sociedade israelita, condenando os judeus Mizrahim (ou “orientais”) a posições de subalternidade, sobretudo face aos Asquenazes. Todos estes exemplos não significam, longe disso, o sucesso do movimento pacifista ou o gradual, mas imparável, efeito das energias transformadoras dos sixties ou de “68” na sociedade israelita. O pacifismo foi marginal. O feminismo também: as mulheres parecem ter tido um lugar residual nos movimentos de protesto de então. O questionamento do nacionalismo foi igualmente pouco saliente. A Nova Esquerda era olhada com enorme desconfiança. Nem os elogios de alguma esquerda aos kibutz era vista como aliciante. De facto, a mesma desconfiança era dirigida a todos os argumentários que propalavam qualquer espécie de comunitarismo: muita da juventude israelita lutava contra tendências colectivistas e privilegiava a realização pessoal. A fractura geracional foi, também, pouco significativa. Numa palavra: houve e não houve “1968” em Israel. Esta é a história a contar, uma que resiste a operações de simplificação histórica ou memorial. Ressalvando as numerosas diferenças, análises semelhantes podem ser feitas a respeito do Egipto, dos territórios da Palestina, da Síria ou do Líbano. Inúmeras ambiguidades, consequências inesperadas ou improvisações podem ser identificadas. Vários realinhamentos ideológicos e políticos ocorreram, nem sempre de leitura clara. Todas estas dinâmicas foram em parte estimuladas pela guerra. Mas foram decerto condicionadas, e muito, por circunstâncias locais, algumas de longa gestação. Por exemplo, nestas sociedades, questões associadas às relações de género e à sexualidade emergiram com algum vigor no debate político, em parte em razão de tentativas de compreender o desfecho negativo de 1967. O caso do polémico livro de Sadiq Jalal al-Azm, Al-Nakd al-Dhati Ba’da al-Hazima (“Auto-crítica depois da derrota”), publicado no rescaldo do conflito (1968), é particularmente revelador. O conflito criou um espaço de mobilização crítica considerável, que partilhava alguns tópicos comummente associados aos sixties de outras paragens. Sadiq Jalal al-Azm propunha visões secularistas e a igualdade de género como sendo fundamentais para a transformação significativa do “mundo árabe”. Ao mesmo tempo oferecia um diagnóstico crítico das causas da derrota (hazima). Os bloqueios vários das respectivas sociedades, a começar pela questão das mentalidades, eram, no seu entender, as verdadeiras causas da hazima. Não é de estranhar que, anos mais tarde, tenha sido um dos críticos mais ferozes do Orientalismo de Edward Said. No Líbano, a “libertação sexual” acompanhou o retrocesso da moralidade conservadora, parcialmente decorrente da agenda modernizadora e secularizadora que, de modo diverso, percorria o “mundo árabe” nos sessenta e, de modo mais evidente, após 1967. Mais uma vez, o processo deveu mais aos efeitos do conflito do que propriamente à difusão de uma onda global de contestação. Mais, a dita “libertação” decorreu, em parte, à custa de uma degradação da condição da mulher, ainda presa numa sociedade patriarcal e de privilégio masculino. A vincada desigualdade de género filtrou a mudança de valores, gerando consequências para alguns inesperadas, por muitos (homens) aproveitadas. Por vezes, a “libertação” de uns acarreta apenas a redefinição do que aprisiona outros. Essa mesma sociedade que, em razão das notórias dificuldades financeiras e dos persistentes condicionalismos religiosos e morais, não oferecia estruturas médicas capazes de responder ao acréscimo de abortos com um mínimo de condições. E, tal como no “ocidente”, ao contrário da vulgata que a romantiza ou a diaboliza, a “revolução sexual”, grande parte das vezes decorrente sobretudo de formas legalistas de “emancipação”, teve um impacto muito desigual, em função de diferentes universos sociais, culturais e económicos. Quem tinha acesso privilegiado às tecnologias contraceptivas? Quem as podia pagar?Outras manifestações críticas ocorreram nestas sociedades, revelando a dificuldade em destrinçar o sentido de certos fenómenos sociais. A “geração Nakba”, na Palestina, foi questionada, de modo recorrente e crescentemente organizado. A criação da Frente Nacional para a Libertação da Palestina e da Frente Democrática para a Libertação da Palestina são apenas dois exemplos. Esta última teve os sírios Sadiq Jalal al-Azm e Saadallah Wannous como fundadores. Wannous, famoso dramaturgo, foi responsável pelo chamado teatro de politização, que visava torná-lo num instrumento de mudança social e política comprometido, resgatando-o, ao mesmo tempo, ao que considerava ser uma letargia criativa. Um pouco por toda a Síria (e o “mundo árabe”), o campo artístico foi afectado por novos olhares e vozes. O mesmo sucedeu com a multiplicação de tendências modernizadoras no campo político e social. No Egipto, ao lado de revoltas estudantis, beneficiárias das consequências políticas da revolução de 1952 e depreciadoras da dimensão política e militar do envolvimento do país, a revista iconoclasta Galliri 68 (“Galeria 68”) congregava visões críticas, políticas e artísticas, em resposta, sobretudo, ao desfecho de 1967. Motivações políticas, artísticas, sexuais, estéticas, sociais, ideológicas, económicas e até pessoais interagiam. Não podem ser reduzidos nem à guerra, nem à apropriação linear de ventos externos de mudança. É a sua combinação variável e o seu contexto que contam. Que significado tiveram os sessenta e 1968 para quem estava num dos campos de refugiados – por exemplo os de Wadi Dlails ou Baquar, na Jordânia – após o conflito de 1967? O que significou para os milhares de refugiados a visita de Jean-Paul Sartre e de Simone de Beuavoir a Gaza, em Março de 1967? Que fizeram eles com termos como “alienação” ou “conflito de gerações”? Talvez as respostas a estas perguntas sejam bem mais importantes do que enclausurar a história dos sessenta entre o preto e o branco, ou entre leituras que neles tudo ou nada vêem. Entre a mitologia e a memorialização. O que significaram os “sessentas” é uma pergunta que se pode colocar tendo por referencial múltiplas geografias e temas. Feita a pergunta a um “ocidental”, esta seria a década em que a psiquiatria se viu fundamentalmente abalada nos seus alicerces. Simbolizada pela aglomeração de pacientes em unidades de dimensões consideráveis e pela utilização de técnicas como a lobotomia e a aplicação de electro-choques, a psiquiatria viu a sua legitimidade posta em causa. Intelectuais como Michel Foucault ou praticantes como Ronald Laing forçaram o repensar profundo das noções de saúde e doença mental e do que era, de facto, o “normal”. Contribuíram para o que outro psiquiatra cunhou vagamente como anti-psiquiatria. Resultado de tendências várias de desconfiança em relação à obediência cega à autoridade, de combate à coerção e ao controlo, o movimento desenvolveu-se um pouco por todo o mundo “ocidental”. Olhando para a icónica figura do hospício como um aparato de disciplina social, espelho de uma sociedade que visava, de forma insidiosa e rotineira, controlar não só a esfera pública como também a privada, figuras como Laing questionaram concepções estabelecidas sobre doenças como a esquizofrenia. Denunciaram os mecanismos de construção social que estavam associadas ao seu diagnóstico e ao seu putativo tratamento. Propuseram ainda hipóteses alternativas de lidar com o sofrimento psíquico. Livros como One Flew Over the Cuckoo's Nest (1962) de Ken Kesey (que participou em estudos governamentais envolvendo drogas alucinogénias) ou o relato do percurso biográfico da irmã de John F. Kennedy, que sofrera uma lobotomia que a deixaria institucionalizada para o resto da vida, são apenas dois exemplos de episódios que espelham os desafios que a psiquiatria enfrentou. Este é, em traços largos, um possível resumo da história da psiquiatria enquanto objecto de debate público nos anos sessenta. Ela promove uma ideia de ruptura e crítica de consensos vigentes. Mas esta é uma história incompleta. Noutras latitudes, o questionamento da psiquiatria seguiu outros caminhos. Em 1961, a Primeira Conferência Psiquiátrica Pan-Africana decorreu em Abeokuta (Nigéria), tendo como um dos principais organizadores Thomas Adeoye Lambo. Lambo foi o primeiro nigeriano a receber formação em psiquiatria e, mais tarde, ocupou o cargo de director-geral adjunto da Organização Mundial da Saúde. A conferência visava olhar para o impacto das importantes transformações sociais e económicas que marcavam a generalidade do continente, resultado em parte dos esforços do colonialismo tardio, e prosseguido pelos Estados pós-coloniais, de “modernizar” as sociedades africanas. Mas a descolonização plena era o que estava em jogo. Não se tratava apenas da criação de um novo hino e de uma nova bandeira. O trabalho dos chamados “etnopsiquiatras” coloniais tinha contribuído para o reforço de um conjunto de categorizações sobre a mente e a saúde mental dos africanos. Postulava que a esquizofrenia seria mais prevalecente entre os africanos dado o seu carácter “primitivo”, logo infantil. Entre estes, os chamados “destribalizados”, ou seja, os que tinham abandonado as suas comunidades “tradicionais”, constituíam um caso de particular preocupação. Situados num limbo entre “tradição” e “modernidade”, aparentavam ser presas fáceis. Em sentido contrário, a depressão, asseverava-se, era menos frequente em africanos por força do seu carácter pouco dado à auto-reflexividade. A explicação colonial para a situação mental dos “africanos” fundava-se numa crença da importância dos factores culturais face à saúde psíquica de grupos humanos diferenciados. O que Lambo e outros procuraram fazer foi abanar as bases deste princípio. Por exemplo, o facto de nos poucos hospícios existentes na Nigéria colonial não haver praticamente espaço para tratamento – estes eram essencialmente espaços de repressão – fazia com que todos aqueles que tivessem um comportamento “desadequado” ou violento fossem classificados como esquizofrénicos. Eram esses que maioritariamente eram internados e, logo, entravam nas estatísticas, aumentando de forma extraordinária, e errada, as taxas de prevalência da esquizofrenia nas sociedades africanas. Ao mesmo tempo, dado que a depressão não apresentava necessariamente um perigo para a ordem pública, raramente era registada. Os dados coloniais a partir dos quais estes problemas eram interpretados eram mais que questionáveis. Lambo e outros procuraram “universalizar” a doença mental, negando uma especificidade africana. Através de estudos baseados numa psiquiatria transcultural, envolvendo casos das mais diversas partes do mundo, procuraram demonstrar que a doença mental era, e é, parte integrante da natureza humana, a sua incidência e prevalência não sendo essencialmente afectadas por factores raciais (culturais ou biológicos). Mais do que debater a fiabilidade dos estudos feitos por estes psiquiatras nigerianos que, reforce-se, estavam plenamente integrados em redes transnacionais de especialistas, os seus esforços são uma importante janela para uma visão poliédrica sobre a forma como os anos 60 podem ou não ser pensados como época de ruptura, e sobre que tipo de ruptura. Estes casos demostram vários aspectos fundamentais para a compreensão dos problemas que o estudo dos sixties e de 1968 suscitam, finalmente a ser interrogados com um módico de rigor. Através da inquirição de múltiplas fontes e não sobretudo ou apenas dos testemunhos dos diretamente envolvidos ou interessados na gestão do seu significado. As novas investigações lidam melhor com a espessa retórica política e ideológica, pública e publicitada, de então e de hoje. Como afirmou Gerry DeGroot, “depois da década ter morrido, reemergiu de novo como religião”. Os Sessentas têm sido mais rigorosamente contextualizados, por relação com processos históricos contemporâneos como as dinâmicas de emancipação do dito “terceiro mundo” ou a competição bipolar entre modelos de modernidade. As suas cronologias e principais manifestações têm sido revisitadas. Tornam mais fácil resistir à dramatização, glorificação, ou singularização do ano ou da década. Alguns destes aspectos foram tratados, com originalidade e propriedade, por Arthur Marwick, no seu The Sixties. Cultural Revolution in Britain, France, Italy, and the United States, 1958-1974 (1998). Apesar do foco em dinâmicas culturais, arriscando com isso a parcial despolitização do período, o seu livro sublinhou dois aspectos importantes. Reiterou os benefícios da comparação, método correctivo de discursos de excepcionalidade, tão importantes na mitologização e memorialização enquanto instrumentos para formação e preservação de identidades sociopolíticas ou geracionais. Demonstrou ainda a necessidade de redefinição dos enquadramentos cronológico e social a partir dos quais a “revolução cultural” pode ser escrutinada. Como a propósito da “libertação sexual” no Líbano, uma reflexão sobre as transformações culturais do período tem de interrogar todo o campo sociocultural, não apenas os espaços restritos da vanguarda ou das elites. Marwick perscruta o quotidiano de quatro sociedades, identifica temporalidades distintas, mobiliza diferentes observatórios sociais, aborda diversas práticas culturais. Transformou, de modo decisivo, o estudo dos sixties, chamando a atenção para a centralidade dos símbolos, rituais e performatividade do protesto, das estratégias comunicacionais, das disputas identitárias. Talvez tenha falhado na capacidade de alargar a análise a outros contextos que não os “ocidentais”, mas resgatou os sessenta da alta-cultura, da alta-política (mesmo a protagonizada por pretensos “subalternos”), do grande acontecimento. Mutações nas normas sociais e práticas culturais ou nos padrões de consumo foram tão ou mais decisivas na definição dos “longos sessenta”. Indo um pouco mais longe: devem os sessenta e “1968” ser tomados como catalisadores de mudanças societais ou como sintomas de dinâmicas já em laboração? Ou, como alguns argumentam, um momento de intensificação conservadora? Ou devem ser antes escrutinados a partir do estudo do confronto político e social entre as forças da mudança e as do status quo? As respostas, quaisquer que sejam, decorrem necessariamente dos contextos sociais e históricos precisos sob análise. Por exemplo, nos EUA, 1968 é também o ano da morte de Martin Luther King e de Robert Kennedy, ou do “cerco de Chicago”, que captou a atenção de Norman Mailer. Sucedendo a The Armies of the Night, que um ano antes se debruçara sobre o movimento contra a guerra no Vietname, o seu Miami and the Siege of Chicago lançava um olhar crítico sobre a sociedade, interpelando esta a partir do rico observatório das convenções democratas e republicanas no Verão de 1968. E a década começou com a criação da Young Americans for Freedom, vincadamente conservadora, guiada pelos princípios consagrados pelo Sharon Statement, lavrados em casa de William F. Buckley em 1960. Buckley, cuja fulgurante projecção pública muito deveu à série de confrontações televisivas e literárias com Gore Vidal, popularizou a combinação entre conservadorismo social, liberalismo económico e anti-comunismo que pautaria o pensamento republicano até aos anos 80. Da África do Sul à Grécia, a repressão foi a norma, não a excepção. No plano da sexualidade, os motins do Stonewall Inn (1969), em Greenwich Village, Nova Iorque, foram um evento relevante na demorada conquista de direitos civis e sexuais pela comunidade homossexual. Mas o seu impacto não foi imediato. Não beneficiou todos igualmente. E muito menos foi global. Mesmo se nos ativermos aos grupos sociais normalmente enunciados como sendo as forças motrizes dos sixties, como as mulheres e os estudantes, reconsiderações e matizações talvez sejam necessárias. Como interpretar, por exemplo, o poderoso movimento de mulheres que surgiu no Brasil no início dos anos 60 tendo por fim contestar o governo reformista de João Goulart? Movimentos como a Campanha da Mulher pela Democracia multiplicaram-se um pouco por todo o Brasil, tendo por padrão partilhado a participação política de mulheres que se apresentavam como cristãs, como mães de família, e da nação, ou seja, reforçando papéis de género conservadores, contra o ateísmo comunista. Poucos dias antes do golpe de 1964, uma série destas organizações, de São Paulo a Curitiba, convocou uma poderosa Marcha da Família com Deus pela Liberdade, descentralizada, agrupando centenas de milhares de mulheres que protestavam contra o governo. Construíram as suas próprias redes transnacionais de protesto. Em 1967, realizaram o I Congresso Sul-Americano da Mulher pela Democracia, no Rio de Janeiro. Gravações, panfletos e técnicas usadas pelas activistas brasileiras foram partilhados com as suas congéneres chilenas, que lhes deram bom uso, como é sabido, nas manifestações contra Salvador Allende, mais tarde. E que dizer da Frente de Acção de Estudantes Anti-Comunista da Indonésia que preparou o terreno para a repressão brutal (meio milhão de mortos) que se seguiu à tentativa de golpe de 1965? Antes, envolveram-se em rixas contra o poderoso Partido Comunista da Indonésia, ao mesmo tempo que levavam a cabo iniciativas que visavam boicotar produtos culturais estrangeiros. Depois, prestaram-se não poucas vezes ao trabalho sujo de repressão que os militares lhes delegavam. Donde, só se pode concluir que reduzir a década à iniciativa de uns ou de outros é miopia. Compreender as tensas e por vezes ambivalentes relações entre o poder estabelecido, qualquer que ele fosse, mais ou menos conservador, e as forças de contestação e protesto tem-se tornado um ponto central na literatura. Mais, de que modo causas globais (como o movimento contra a guerra no Vietname) se articularam com reivindicações mais específicas, relativas a dissensões locais, com uma outra história e significado? Ou, ainda, como é que dinâmicas locais se apropriaram, negociaram o sentido prático, deram uso instrumental aos ventos de mudança do exterior?Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. As respostas as estas questões mostrarão certamente a variedade de cronologias e dinâmicas de contestação ou preservação de uma dada “ordem social”. Relativizarão grandes narrativas e explicações supostamente claras. Dificultarão ainda a recorrência de perspectivas difusionistas. A tendência para homogeneizar dinâmicas de protesto político, cujas motivações e sentidos são frequentemente interpretadas como elementos de uma contestação global contra as sociedades capitalistas, tem de ser devidamente calibrada. A defesa de uma relação significativa óbvia entre acontecimentos importantes que ocorreram em 1968 – da “Primavera de Praga” ao “massacre de Tlatelolco” no México, passando pela afirmação do Black Consciousness Movement na África do Sul – tem que ser matizada. O mesmo sucede com a consideração desse ano como o ano de todas as consumações: a sobrevalorização de acontecimentos, sobretudo os publicamente marcantes, impede a compreensão dos processos que lhes estão associados, ainda que menos visíveis. Até porque a memória, amiúde, sobrepõe-se à compreensão histórica do sentido e peso dos acontecimentos. Investigações recentes no Brasil, por exemplo, demonstram como o ano de 1968, marcado por importantes protestos estudantis (e que coincidiu com o endurecimento da ditadura através do Ato Institucional Número 5), foi inscrito na vaga de protestos globais desse ano, ainda que a importância dessas articulações tenha decorrido em grande parte de memórias construídas posteriormente e menos de uma experiência quotidiana de interacção transnacional. Em contraste, a recordação do papel das mulheres conservadoras na criação e consolidação da ditadura tem desaparecido parcialmente da memória, processo desde logo operado pelas próprias protagonistas. Como escrevemos acima, a maior parte destes casos revela que é na compreensão da combinação variável entre ideias e repertórios de acção, de proveniência vária, que se encontra o desafio. A compreensão do modo como os tópicos dos sessenta foram globalizados e nacionalizados ao mesmo tempo requer outros instrumentos de análise.
REFERÊNCIAS:
Religiões Ateísmo
O que revelam os véus
Há outras possibilidades e caminhos de interrogação da “controvérsia do véu”, mais atentas aos contextos históricos, recusando simplismos e essencialismos, menos politizadas, mas sem deixar de ser políticas. Talvez sejam menos apelativas para a propaganda e os zelotes de serviço, mas são certamente mais rigorosas e humanas (...)

O que revelam os véus
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Migrantes Pontuação: 6 Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 6 Homossexuais Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-07-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: Há outras possibilidades e caminhos de interrogação da “controvérsia do véu”, mais atentas aos contextos históricos, recusando simplismos e essencialismos, menos politizadas, mas sem deixar de ser políticas. Talvez sejam menos apelativas para a propaganda e os zelotes de serviço, mas são certamente mais rigorosas e humanas
TEXTO: Na Bulgária, a desagregação do império soviético criou novos problemas de administração pública de modalidades de culto e expressão cultural, durante décadas remetidas para o espaço privado e, em muitos casos, fortemente vigiadas e constrangidas, senão mesmo violentamente suprimidas. O caso da heterogénea população muçulmana, com uma presença significativa e secular no território, é exemplar. Exemplar é também a problemática relacionada com o uso do “véu” pelas jovens muçulmanas, no que nos diz sobre o facilitismo interpretativo com que muitas vezes se abordam certos processos e práticas sociais. Por exemplo, essa opção significou e pode significar a procura por uma identidade individual autónoma, distintiva, de natureza política, social ou religiosa. Pode ser um rito de passagem em universos sociais distintos. Ou um símbolo de inscrição “urbana” e recusa de uma vinculação simbólica e material ao mundo rural. Nada que incomode quem não hesita, nem hesitou, a equacioná-lo com uma identidade histórica colectiva, sem fissuras. A tensão entre o domínio da expressão individual, relativamente livre, e as tentativas de imposição de um sentido político e cultural unívoco, mais amplo e profundo, é evidente. Isso não impede que muitos dos mais acérrimos proponentes e oponentes do uso do véu ignorem, de modo recorrente, o primeiro aspecto. Opções estilísticas — simplificando, uma escolha entre a minissaia e várias formas de encobrimento — tendem a ser tomadas ora como símbolos de um “ocidente” decadente e desorientado ou de um “oriente” atávico e despótico. São vistas como expressões de (i)moralidade, de identidades colectivas concorrentes, cristalizadas por uma trajectória histórica sem espinhos. Tornaram-se poderosas armas de arremesso político, como se detivessem alguma propriedade mágica para transformar realidades políticas e socioeconómicas desagradáveis. Como se não fossem também formas de expressão individual decorrentes de uma miríade de motivações. Num contexto de gradual integração europeia da sociedade búlgara, com várias transformações sociais, políticas e económicas associadas, estas questões tornaram-se ainda mais visíveis. Um caso singular protagonizado por duas adolescentes em Smolyan, junto à fronteira com a Grécia, espoletou um debate nacional em 2006. Perante a sua vontade em juntar um hijab ao vestuário escolar, foram proibidas de o fazer, por autoridades locais e nacionais. Em razão da sua persistência e do envolvimento de organizações não governamentais, como a União para a Cultura e Desenvolvimento Islâmicos que se dirige essencialmente aos pomaks (descendentes de búlgaros que se converteram ao islão durante o domínio otomano), o ministro da Educação apropriou-se do argumentário esgrimido em França para sustentar a sua posição. Uma queixa foi depositada na comissão búlgara de protecção contra a discriminação. Como em muitas outras situações, a linguagem dos direitos humanos e da liberdade de expressão foi usada como justificação pela União para contrariar a interdição do véu. Após décadas de políticas de “assimilação” forçada e de limitação religiosa por parte do regime comunista, o problema era colocado como sendo de liberdade. Os direitos religiosos sobrepunham-se aos direitos das mulheres. O problema da igualdade de género emergiu nos debates, mas foi consistentemente desvalorizado pelas partes em disputa. O caso em questão foi aproveitado para promover formas mais comprometidas de pertença religiosa, ou mesmo de reforço de uma visão “purificada” desta. Várias publicações, produzidas para a população pomak, eram claras na afirmação das obrigações morais das mulheres (por exemplo, estrita obediência à hierarquia religiosa e às suas interpretações das escrituras) e na dimensão pecaminosa de não se cobrirem. A polícia da fé era também a polícia da moda. O véu não era apenas um símbolo (como seria a cruz). Acima de tudo era tomada como um dogma religioso e um elemento constituinte de uma relação individual com o divino. A estrita observância a ambas, para além do mais, significava a recusa da decadência ocidental, simbolizada pelo uso generalizado da minissaia, inclusive nas regiões pomak. Como em muitas outras circunstâncias, as forças nacionalistas e conservadoras não enjeitaram a oportunidade. As comunidades muçulmanas seriam as responsáveis pelas árduas condições sociais e económicas que decorreram da “transição” política. A associação da pobreza a regiões pomak (sempre essencializadas de um ponto de vista cultural) foi explorada com insistência. Para gáudio destes e de outros grupos, seguramente desconfortáveis com a comunhão de opinião, em 2006, a dita comissão apoiou a decisão do ministério, chegando a punir a União por incitar à conflitualidade étnica. A possibilidade de banir qualquer símbolo religioso em escolas gerou uma contestação significativa, ironicamente proveniente em larga medida dos sectores cristãos maioritários. Em 2016, a Bulgária baniu o uso público de niqabs e burqas, numa proposta liderada pela coligação nacionalista da Frente Patriótica. O argumento securitário, incluindo o da maior visibilidade dos sistemas de vigilância pública, foi avançado como fundamental. O que foi prontamente disputado, entre outras vozes críticas, pela Amnistia Internacional, que considerou a medida uma clara violação dos direitos da mulher à liberdade de expressão e de religião. De pouco serviu. Nem “robôs islâmicos”, nem “objectos sexuais”Em 2005, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos sancionou positivamente a proibição dos véus nas universidades turcas. Leyla Sahin, oriunda de uma família praticante, confrontou a Universidade de Istambul com a sua vontade de usar o véu na vida escolar. Foi proibida de o fazer, em Fevereiro de 1998, apesar de invocar a Convenção Europeia dos Direitos Humanos, nomeadamente os artigos que garantem a liberdade de profissão de fé, proibição de discriminação e liberdade de expressão. Sahin personificou — tal como, décadas antes, Sule Yüksel Senler, jornalista, activista e autora do romance de culto sobre o assunto Huzur Sokagi (Rua da Serenidade) — o que um especialista intitulou “feminização simbólica da política de direita”. Em 2008, tornou-se parlamentar, como representante do Partido da Justiça e do Desenvolvimento turco (AKP), de Recep Tayyip Erdogan. O apoio do tribunal europeu deveu-se em parte ao facto da conciliação do uso obrigatório do véu por questões religiosas, e enquanto decorrência de liberdade de expressão, com os princípios de igualdade de género, pilar declarado, mas escassamente protegido, da Convenção Europeia dos Direitos Humanos, ser vista como improvável. Também em 2008, o AKP aprovou duas emendas constitucionais, ratificadas pelo então presidente Abdullah Gül, com o objectivo de revogar a proibição do uso do véu no ensino superior e no sector público, que fora decretada pelo Tribunal Constitucional em 1989. Tal ocorreu com o apoio do Partido do Movimento Nacionalista, um partido de extrema-direita, ultranacionalista. Para regozijo do principal opositor político do processo, o Partido Republicano do Povo (advogado de preceitos secularistas e que encarava as emendas como demonstração dos verdadeiros objectivos do AKP, ou seja, a islamização do regime político), o Tribunal Constitucional anulou essas emendas. Essa decisão, é óbvio, não implicou o esmorecimento do tema. O impasse continuou, sempre num contexto de um ambíguo processo de potencial adesão à União Europeia, que certamente condicionou a “controvérsia do véu”. No seio deste debate, um movimento particular não recebeu o protagonismo que talvez merecesse. Tratou-se de uma iniciativa intitulada “Nós Olhamos Umas Pelas Outras”, que procurou romper com a partidarização calculista do assunto. Fruto de uma coligação de extracção ideológica diversa, criada precisamente em 2008, entre sectores feministas, grupos LGBT e activistas religiosos (nomeadamente a ONG islâmica Organização para os Direitos das Mulheres Contra a Discriminação), o movimento declarava recusar o conjunto de estereótipos públicos que tornavam as mulheres que usavam o véu ou em “robôs islâmicos” ou em “objectos sexuais”. Ou “ignorantes, fanáticas, maliciosas” ou “exibicionistas, sedutoras”. Num caso, recusavam o racismo associado; no outro, o sexismo. A nota de imprensa era clara: “Nós, mulheres, crentes e não crentes, veladas ou não, mulheres que agem de acordo com os direitos e liberdades das mulheres, nós somos contra os que dizem: ‘Se tu existes, então eu não’. ” E continuava: “Nós, as mulheres, rejeitamos o controlo sobre os nossos corpos em nome do modernismo, do secularismo, da república, da religião, da tradição, dos costumes, da moralidade, da honra ou da liberdade. ” Uma citação de Hannah Arendt, “Ignorar uma pessoa condu-la a duvidar da sua própria existência”, encerrava o esclarecedor texto. Sem perder o alcance eminentemente político, a estratégia passava por despolitizar a identidade, não deixando que a discussão ficasse entrincheirada nas antigas disputas entre mundividências “kemalistas” e “islâmicas”. As primeiras, geradas pelo reformismo de Mustafa Kemal Atatürk contra o passado otomano e a favor de uma relativa “ocidentalização” da sociedade turca desde a fundação da República, em 1923, tendem a reduzir a questão do véu a um mero instrumento de incompatibilidade “cultural”. Se nas primeiras décadas da República, marcadas pela abolição do califado e da Sharia e pela chamada Lei do Chapéu, que substituiu o fez ou tarbush, o desvelar era tomado como uma recusa da tradição e do ruralismo empobrecedor, em finais do século, o velamento era tomado como um desafio simbólico à autoridade estatal. As segundas, forjadas na tensa acomodação do islão a um contexto secularista, numa sociedade maioritariamente muçulmana (sunita), tendem a interpretar e a promover o velamento como demonstração clara de lealdade religiosa e compromisso cultural. Talvez seja um truísmo necessário dizer que, ao longo do tempo, o significado e as práticas do velamento mudaram consideravelmente. Há usos do véu que procuram o apagamento das conotações religiosas. Outros revelam de modo claro o abandono da suposta sobriedade “tradicional” no que diz respeito às cores e padrões. Este movimento feminino procurava evitar deixar-se prender no atoleiro do “choque de civilizações” e da política do medo e do controlo social. Mas o delicado encontro de opiniões por parte dos sectores coligados enfrentou vários desafios. E soçobrou. A pressão de sectores religiosos ultraconservadores contra o envolvimento da comunidade LGBT no movimento foi um deles. Outro foi o apoio que alguns dos grupos muçulmanos que dele faziam parte concederam às intoleráveis palavras de Selma Aliye Kavaf contra a homossexualidade, proferidas em 2010, enquanto era ministra dos Assuntos das Mulheres e da Família pelo AKP. Estes factores, entre outros, resultaram na marginalização do “Nós Olhamos Umas Pelas Outras” no interior do movimento feminista, predominantemente kemalista. Mas o seu insucesso não deve implicar a desvalorização do que mostraram ser concebível: outras possibilidades e caminhos de interrogação da “controvérsia do véu”. Talvez menos apelativas para a propaganda e os zelotes de serviço, mas certamente mais rigorosas e humanas. Fé, piedade, privacidade, disfarce, autodefesa, negação. . . Estudos recentes sobre a questão do véu em África revelam aspectos comuns. O significado e o sentido das práticas de velamento variam historicamente, social e geograficamente. Por exemplo, dinâmicas reformistas na educação ou momentos de significativa transformação político-económica suscitam novas codificações e re-significações do seu uso. Essas práticas decorrem ainda de múltiplas motivações e propósitos, muitas vezes reduzidos a interpretações superficiais e facciosas. Em Zanzibar, onde os usos do véu têm uma longa história pré-colonial e remetem para dinâmicas de distinção social complexas, a revitalização da prática do niqab, em substituição do tradicional buibui, parece estar mais associada a formas de estetização do quotidiano e a mecanismos de preservação da privacidade do que a processos de intensificação de fidelidade religiosa. Nada disto obsta à identificação de um padrão semelhante por todas as regiões com presença muçulmana significativa em África e pelo Médio Oriente, demonstrando ligações religiosas difíceis de desprezar. A circulação das normas religiosas percorre caminhos similares às das normas e opções estéticas e de estilo de vida, ainda que com algumas diferenças óbvias. Para os refugiados Oromo (oriundos da Etiópia), no Quénia, o véu preto (abaya) também permite mecanismos sociais tendentes à preservação da privacidade. O disfarce possibilita estilos de vida de outro modo menos exequíveis (sair à noite, por exemplo) ou encena uma superficial integração, facilitadora de oportunidades sociais várias num contexto desfavorável e estranho. Tem ainda a vantagem de dificultar a vigilância de agentes etíopes infiltrados nos campos e fora deles. No Senegal, a justificação dos usos do véu pelas mulheres oscila entre a obrigação da fé e o livre exercício de escolha e autonomia individual, num processo de negociação de papéis sociais e familiares. Na Nigéria, os usos do véu resultam de uma tentativa de diminuir a vulnerabilidade social e “moral” das mulheres, sem deixar de estar associado a afirmações estéticas. É ainda imperioso acrescentar que, como em muitas outras geografias e contextos, as práticas de velamento não são necessariamente constantes, diárias. Ajustam-se a circunstâncias sociais, às suas recompensas e aos seus riscos simbólicos e materiais. Não podem ainda ser interpretadas como significando a ausência de disputas, por vezes acérrimas, no interior de comunidades muçulmanas sobre os pressupostos e o impacto do uso do véu. Este último é por vezes objecto de fortíssima contestação, em função de posições sociais ou diferentes pertenças étnicas, por exemplo. As distinções entre mundos urbanos e rurais é a este respeito muito importante. Acresce ainda que as práticas de velamento não parecem determinar, em si mesmo, qualquer grau de autonomia ou dependência social das que as observam. Ler nelas, necessariamente, expressões de total independência ou, pelo contrário, de subjugação é escassamente confirmado pelas investigações empíricas disponíveis. O riquíssimo livro colectivo coordenado por Elisha P. Renne, Veiling in Africa, é esclarecedor em todos estes sentidos. As modas e as práticas do velamento resultam de relações dinâmicas, por vezes paradoxais e amiúde pouco claras, entre religião e política, “ética e estética”, “piedade e beleza” e “sobriedade e atracção”. Entre relativa autonomia e submissão, podemos acrescentar. Tudo isto atravessado por dimensões geracionais, educacionais, económicas, de estatuto social, entre outras. Com notórias diferenças, só compreensíveis quando descemos aos contextos locais e os compreendemos comparativamente e na sua intersecção com processos que os extravasam, muitas das dinâmicas de descarada instrumentalização política e de distorção interpretativa identificadas nestes três casos são comuns a muitos outros associados à questão do velamento. As “novas” mulheres “novas”Foi contra estas tendências que Joan Wallach Scott escreveu The Politics of the Veil (2007). Figura central da historiografia contemporânea, não apenas por ter insistido na centralidade da questão de género na problematização histórica, Scott debruçou-se sobre a intensa polémica que se instalou em França, em 2004, a propósito do uso do véu nos estabelecimentos escolares. Insuspeita de qualquer simpatia pela prevalência de sociedades patriarcais e reconhecidamente empenhada na luta contra as desigualdades de género, a autora obriga-nos ao desconforto de repensar respostas fáceis a problemas complexos. Desde logo, recusando um uso essencialista e a-histórico dos conceitos. Por exemplo, a usual distinção entre “tradição” e “modernidade” que acompanhou todo o debate é solidamente questionada. É-o com recurso a um exercício simples, mas em grande medida ausente neste debate público: como é que as adolescentes que pretendiam usar véu nos espaços públicos justificavam a sua decisão? Ao contrário do que se possa pensar, muitas delas faziam-no contra a vontade dos pais e dos círculos familiares próximos. Outras porque encontravam no gesto a recuperação de uma espiritualidade que julgavam perdida. As motivações não eram homogéneas. Essa recusa de se enredar em essencialismos não resulta apenas de uma razão heurística: ela existe porque o uso de abstrações decorre de lógicas de natureza política, eivadas de nacionalismo e discriminação. A necessidade de evitar acusações de discriminação numa base étnica ou religiosa fez com que o próprio articulado da lei de 2004 proibisse o uso de qualquer símbolo religioso ostensivo, potencialmente afectando cristãos ou judeus. Mas a oposição entre laicidade e confessionalismo, que inflamou a opinião pública francesa, respondia claramente à crescente islamofobia no país. Os próprios ciclos de erupção da discussão do véu respondiam a agendas de natureza política orientadas em função da questão muçulmana: a ascensão da Frente Nacional nos anos 80, a possibilidade de um governo fundamentalista argelino nos 90, e o contexto posterior ao 11 de Setembro de 2001. Em todos estes casos, a pressão proveniente da extrema-direita levou, voluntária ou involuntariamente, os sucessivos governos de centro-direita ou centro-esquerda, a incorporar alguns dos argumentos das franjas (o que se está a tornar recorrente nos dias que correm, diga-se). O véu, que não tapa o rosto, o niqab ou a burqa passaram a ser tudo uma e a mesma coisa. O mesmo sucedeu com palavras como “imigrante”, “árabe” ou “muçulmano”. O véu, ao mesmo tempo, unifica e dispersa. Os que o usam são fechados numa “comunidade” projectada como inimigo interno e externo, descontrolada, insidiosa. Esses “indesejáveis”, mais ou menos definidos, foram amalgamados num grupo inassimilável, independentemente de sondagens, à época, mostrarem que apesar de a maioria ser contra a proibição, não era necessariamente favorável ao uso do véu. Dispersa, no sentido em que os múltiplos usos quotidianos, as diversas motivações políticas, religiosas, estéticas, os vários condicionamentos económicos e sociais são indistintamente agrupados num único e poderoso símbolo, que tudo explica e determina, “o véu”. Lendas sobre o secularismo, donde decorreria o compromisso da República com a igualdade de género, foram retroprojectadas no passado, não obstante as limitações ao sufrágio universal feminino até 1945 e a persistência de escolas separadas por sexo até bastante tarde. A guerra “cultural” foi tão longe quanto desvalorizar o problema evidente das profundas desigualdades desenhadas ao longo de linhas raciais e religiosas. Ou ao ignorar que, por exemplo, a melhor forma de combater formas de opressão das mulheres seria precisamente através da escola, a mesma escola que podia agora ser vedada na decorrência da nova lei. Os mesmos que decretam o fim das ideologias em nome de um “choque de civilizações” revelam-se lestos a ignorar as consequências práticas do chauvinismo em marcha. Entenda-se, a escolha não é entre a apologia do véu e uma qualquer defesa irredutível da “tradição” e, por outro, a interdição de qualquer manifestação de diferença cultural, definida em função de uma “modernidade”, também ela imaginada. Trata-se, antes, de promover um debate política e historicamente informado, onde aos principais visados e visadas lhes seja dada voz. Centrais nesta história, os legados da França imperial. A articulação da “missão civilizadora” francesa com a edificação de estereótipos e preconceitos em torno da organização familiar, de género e da sexualidade das populações muçulmanas é tão longa quanto a conquista e ocupação da Argélia, na primeira metade do século XIX. As sociedades magrebinas eram tidas como particularmente lúbricas e viciosas. É uma história que se estendeu até à Guerra da Argélia, quando o véu e a poligamia eram apresentados como sinónimos do obscurantismo promovido pelo nacionalismo da Frente de Libertação Nacional. A tutela modernizadora de uma “Argélia francesa” seria a última oportunidade da mulher emancipada. De resto, estas imbricações entre género e diferença cultural podem ser encontradas em muitas histórias imperiais europeias, da abolição do Sati (a prática de queimar viúvas juntamente com os maridos recém-falecidos), na Índia do século XIX, à consolidação de uma representação da família africana como sendo marcada por uma divisão desigual do trabalho, que acabaria por legitimar várias formas de trabalho compelido masculino. Mas esta não é uma história redutível ao moderno colonialismo europeu. A constituição da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, por exemplo, levantou novos problemas ao recém-constituído governo bolchevique, principalmente nos Estados da Ásia Central. Também aqui, a oposição entre “obscurantismo islâmico” e “modernidade”, especificamente socialista, se manifestou agudamente. A necessidade de criar uma “Vida Nova” com uma “Mulher Nova” tinha de confrontar o putativo atavismo das populações locais. O potencial do “véu” como gatilho simbólico foi calculado. Quando, em 1927, foi lançado pelo Partido Comunista da União Soviética aquilo que foi designado como o Hujum (ataque), no Uzbequistão, milhares de mulheres foram incitadas a queimar publicamente os seus véus (paranjis), iniciativas apresentadas pelas autoridades como actos de livre vontade. Tal supostamente resultava do papel esclarecido que desempenhavam os seus militantes e de uma política mais vasta que pretendia educar e trazer ao espaço público as mulheres uzbeques. Mas, mais uma vez, as subtilezas são cruciais. Antes do lançamento do Hujum já algumas mulheres se tinham mobilizado para largar os seus paranjis, fazendo parte de um grupo mais vasto de reformadores sociais e clérigos que entendiam que o uso do véu representava uma distorção da Sharia. Aliás, como sucedia ao mesmo tempo em movimentos similares, patrocinados pelo Estado em países como a já referida Turquia, o Irão ou o Afeganistão. A luta das autoridades soviéticas não era apenas contra o mullahs conservadores, mas também contra estes proponentes de uma “modernização” diferente. A afirmação do poder do novo Estado soviético não foi um factor de importância desprezável nesta batalha pela “secularização”, que envolveu coacção e violências várias que obrigaram mulheres a queimar os seus paranjis em cerimónias públicas (sendo que muitas delas logo o voltaram a usar, pelo menos em privado). Com violência responderam também clérigos e homens uzbeques que, no rescaldo da Hujum, assassinaram mais de 2 mil mulheres que tinham largado o véu. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. A tentação de criar uma “mulher nova” não foi, no entanto, exclusivamente socialista ou colonial. Nem foi sempre uma forma de imposição de normas sociais pelo Estado. No contexto da Coreia ocupada pelo Japão no início do século XX, a afirmação da mulher num espaço em profunda transição, tanto nos campos como nas cidades, graças às políticas imperiais de modernização e de abastecimento alimentar da metrópole, assumiu contornos de particular relevo, especialmente em face do importante cisma em torno da soberania coreana. Por exemplo, nos anos 20, quando algumas mulheres coreanas decidiram adoptar um corte de cabelo curto (bobbed air) como forma de afirmação do seu espaço social, foram visadas pelas críticas tanto dos nacionalistas coreanos, que as acusavam de distorcer os papéis tradicionalmente atribuído aos géneros e com isso colocar problemas à afirmação nacional, como de uma estranha coligação entre estes e as autoridades imperiais japonesas, unidos pelo temor à ocidentalização. As disputas estendiam-se a outros aspectos, do controlo da natalidade e das práticas de casamento precoce à produtividade das mulheres, passando pela multiplicação de folhetins eróticos na sociedade coreana. Nacionalistas anticoloniais e imperialistas, de formas e com resultados diferentes, não deixaram de mobilizar um importante aparato retórico que essencializava factores culturais como legitimadores de um determinado lugar social da mulher. Em suma, a interconexão entre aquilo que é esperado serem os papéis do género e os discursos sobre a “tradição” e a “diferença cultural” tem uma profunda história, e manifesta-se globalmente, em diferentes contextos. Num momento em que termos como “integração” e “assimilação” parecem ganhar nova vida, apesar do seu passado questionável, estudar a história desta relação, os seus usos instrumentais, o carácter poliédrico das disputas que cada um deles encerra, pugnar por uma visão democrática que, sem descurar princípios, não ignore as consequências práticas de cada medida, recusar essencialismos e realmente escutar aquelas que mais têm a perder (e a ganhar), talvez não seja pedir demais. Os autores da série História(s) do Presente são investigadores do Centro de Estudos Sociais — Universidade de Coimbra. Através da revisitação crítica de 12 livros, ao longo de 12 meses, a série História(s) do Presente recupera um conjunto de processos históricos que modelaram inequivocamente o nosso presente. Da longa persistência de modelos de organização concentracionária em “campos” durante o século XX, à recorrente ameaça, proveniente de vários sectores, sobre os fundamentos racionais do conhecimento, passando pelas preocupações relativas ao crescimento demográfico ou à sustentabilidade do planeta, a série oferecerá ao leitor uma visão mais poliédrica dos passados que construíram o mundo como o conhecemos hoje. Para acompanhar sempre no primeiro domingo de cada mês, no P2, caderno de domingo do PÚBLICO
REFERÊNCIAS:
Partidos LIVRE
O Vox não é um partido de extrema-direita, diz Nuno Melo
Partido anti-imigração espanhol é, para o cabeça-de-lista do PP às europeias, um “partido de direita”, (...)

O Vox não é um partido de extrema-direita, diz Nuno Melo
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 6 Migrantes Pontuação: 9 | Sentimento 0.0
DATA: 2019-06-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Partido anti-imigração espanhol é, para o cabeça-de-lista do PP às europeias, um “partido de direita”,
TEXTO: O cabeça-de-lista do CDS-PP às europeias, Nuno Melo, considera que o partido espanhol Vox não é um partido de extrema-direita e admite que ele venha a integrar a mesma família política europeia que CDS e PSD. “O Vox estará para o Partido Popular [espanhol] como a Aliança está para o PSD”, afirmou Nuno Melo, em entrevista à Lusa, referindo-se à recém-formada Aliança, de Pedro Santana Lopes, que considera “uma dissidência” do PSD. Uma comparação que Paulo Sande, cabeça-de-lista da Aliança às europeias, considera “desnecessária” e errada. Para Nuno Melo, candidato a um terceiro mandato no Parlamento Europeu nas eleições de 26 de Maio, “o Vox é catalogado de extrema-direita”, mas, quem assim o afirma, devia “conhecer o programa do Vox” e “ler o programa do Vox”. Em várias ocasiões, o Vox declarou como “inimigos” o independentismo catalão, a imigração e o feminismo. O alvo preferencial é a imigração, propondo deportações e um “muro intransponível” em Ceuta e Melilla. Como escreveu no PÚBLICO Jorge Almeida Fernandes, o Vox assume a xenofobia e, em nome da Espanha “católica”, denuncia uma suposta “invasão islâmica”. Nacionalista, copia de Donald Trump um lema: “hacer España grande otra vez”. Nuno Melo defende, contudo, que o Vox é uma “deriva do PP”, um “partido de direita” – e não de extrema-direita. “O presidente do Vox era do PP, é um basco, filho de um histórico do PP, que no essencial, tem a agenda política do PP com duas diferenças fundamentais, que tem que ver com as tradições, que mobilizam muito em Espanha: a festa taurina e a caça. E depois, uma outra circunstância que levou a que fosse considerado radical, a questão das autonomias”, afirma. Para o eurodeputado e vice-presidente do CDS-PP, “90% do que está no programa do Vox encontra-se no [programa do] PP”, tal como “nos Cidadãos encontra muito do PSOE e do PP”. “O Vox beneficia de uma intuição ou percepção do eleitorado no sentido que o PP também não foi dando as tais respostas para problemas sentidos, beneficia também dos escândalos de corrupção que afectaram o PP, como afectaram o PSOE, beneficia de uma instabilidade geopolítica que tem muito a ver com a Catalunha, com esta forma do governo que, para permitir a ascensão do Pedro Sánchez, vai buscar antigos etarras e radicais independentistas catalães”, enumera como elementos de um “caldo [que] potencia o surgimento do Vox”. Para Melo, o Vox “é uma deriva do PP”, “um partido de direita”, “talvez à direita do CDS em Portugal, mas é um partido de direita”. “Volto a insistir, leiam o programa do Vox. Não vão pelos títulos, nem pelos rótulos”, afirma. “Verão que é um partido europeísta, um partido que defende muito o que defende o PP, muito o que defende o PSOE, e tem estas três circunstâncias”. “Não estranharia, por exemplo, que o Vox viesse no final a entrar no PPE”, admite, referindo-se à maior família política europeia, o Partido Popular Europeu (PPE), de que fazem parte o CDS e o PSD. Questionado sobre a permanência no PPE, embora suspenso, do Fidesz, do primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, admite que “gostava que o partido ficasse”, porque isso “significava que se tinha verificado que não violava os princípios fundacionais do PPE e que se tinha comprometido com esses valores em relação ao futuro”. “Ao demonizarmos o Fidesz não ganhamos nada […] Devemos é, pelo contrário, fazer tudo para que o Fidesz se recoloque na linha da moderação”, defende, acrescentando preferir “ter o Fidesz a ultrapassar problemas, mas mantendo-se preso às democracias e àquilo que elas significam”. “O que fizemos foi um sinal muito claro em relação ao Fidesz e em relação a Viktor Orbán. […] Teve um custo político […] com os socialistas e toda a esquerda de pé a aplaudir. […] Mas o que fizemos foi por uma razão de princípio”, sublinha. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. E critica os socialistas europeus, e particularmente o PS, por não ter atitude semelhante em relação à Roménia, à Eslováquia ou a Malta. “O que se passa hoje na Roménia e muito pior do que se passa na Hungria. E temos a comissária romena [Corina Cretu] a vida dar a mão para salvar o Pedro Marques”, acusa, referindo-se à notícia, divulgada pela SIC, de um vídeo da comissária elogiando o cabeça de lista do PS, Pedro Marques. “Ou seja, em vez de censurar o governo da Roménia, o PS pede ajuda e dá-lhe a mão”, censura. “Não está a ver propriamente o PPE, o CDS ou o PSD, a pedir a quem seja para vir cá vir dar a mão na nossa campanha. ”
REFERÊNCIAS:
Partidos PS PSD Partido Popular Europeu
Sorrir, apesar do desemprego
O PÚBLICO reencontrou três das quatro famílias que acompanhou durante dois anos da crise. O trabalho precário e intermitente persegue Sandra, as filhas de Clara e José emigraram e Adriana desistiu da agricultura, o seu sonho. (...)

Sorrir, apesar do desemprego
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 6 Migrantes Pontuação: 9 | Sentimento 0.0
DATA: 2014-05-17 | Jornal Público
SUMÁRIO: O PÚBLICO reencontrou três das quatro famílias que acompanhou durante dois anos da crise. O trabalho precário e intermitente persegue Sandra, as filhas de Clara e José emigraram e Adriana desistiu da agricultura, o seu sonho.
TEXTO: Sandra Fonseca, sorri, apesar do desemprego lhe ter voltado a bater à porta. “Tem de vir conhecer a minha casa”, diz, lembrando que o filho, de 14 anos, ganhou direito à privacidade: “tem um quarto só para ele”. Para trás, ficou a romântica história de um amor e uma cabana, que acabou em violência doméstica. A última vez que o PÚBLICO falou com Sandra, há cerca de dois anos, foi através de um telefonema a pedir ajuda: “O Luciano [ex-companheiro] pôs-me fora de casa”, disse. A relação chegara ao fim, e não tinha onde ficar. Os serviços de Apoio à Vítima e a câmara de Faro, na altura, intervieram – recebeu alojamento temporário numa pensão, depois na Santa Casa da Misericórdia de Albufeira. Por sua iniciativa, encontrou emprego numa unidade hoteleira da zona turística, mas regressou a Faro ao fim de alguns meses para trabalhar num lar de idosos. Alugou quarto e reconquistou a independência. No passado mês de Dezembro, ao fim de ano e meio de contratos a prazo, foi dispensada. “Tinham-me avisado, desde o início, de que não punham ninguém no quadro”, justifica. O regresso ao desemprego – situação que conhece desde há cerca de três anos, altura em que deixou o snack-bar que geria – foi aproveitado para frequentar um curso de formação profissional em geriatria, aperfeiçoando os conhecimentos que já possuía nesta área. Na semana passada, colocou um anúncio no Facebook a informar que presta serviços de apoio a idosos ao domicílio. “Já tive muitos like, mas ainda não tenho clientes”, disse. A vida profissional e emocional de Sandra Fonseca segue em altos e baixos como as marés do mar que a rodeia. Mas não é mulher para desistir. “Tem uma grande força de vencer”. Quem o diz é Luciano, deixando transparecer um lamento por ter perdido a companheira. Viviam numa barraca, com chapas de cinzo, às portas de Faro, faltava o dinheiro para o essencial, mas aparentavam estar unidos pela paixão. Ele, desempregado, beneficia de uma pensão de invalidez, de pouco mais de 200 euros, por ter perdido uma perna num acidente de viação. “Ainda nos encontramos, tomamos café, somos amigos”, conta, evitando falar nos motivos que levaram à separação. Desde há oito meses, o coração de Sandra abriu um postigo para uma nova relação. Com o actual companheiro, vive num casa de campo em Mar e Guerra, a meia dúzia de quilómetros da cidade, rodeada de laranjeiras, com um enorme terraço. “O meu filho, aqui, tem um quarto só para ele. Quando estava no outro lado [na barraca] tinha um pano a servir de parede, numa divisão única”. A esta boa nova fase da vida, Sandra gostaria de juntar o que ainda lhe falta. “Só me falta mesmo é trabalho”, sublinha. Sandra Fonseca, que é originária de uma família do Porto e foi viver para Faro há cerca de duas décadas, testemunha hoje a outra face dos anos da crise, que afectou os filhos e está agora a chegar aos pais. A mãe, que também trabalha na área da geriatria, e o pai, mecânico, estão a passar por grandes dificuldades. “Os meus pais estão em vias de ter que entregar a casa ao banco – pagam mais de 800 euros de prestação por mês, e como o meu pai sofreu um grande corte no salário, não se estão a aguentar – gostaria de os poder ajudar, mas não posso. ”Foi neste apartamento T2, situado perto do campus universitário da Penha, e agora em risco, que se recolheu, aos 29 anos, por altura do fim de uma relação amorosa. Para sobreviver, fez limpezas na Universidade do Algarve e nos luxuosos empreendimentos turísticos de Vale do Lobo e Quinta do Lago. Luciano, ex-emigrante nos Estados Unidos, entrou então na sua vida, quase por acaso. “Uma espécie de terapia”, diz, a lembrar os primeiros encontros no café, quando falavam de motos e da liberdade que representava viajar, de cabelos ao vento, em cima de duas rodas. Da paixão pelas motorizadas até à decisão de irem viver juntos foi a distância de um clique. Um dia, o amor derrapou numa curva da vida. Ficou a amizade. Entretanto, um novo companheiro apareceu e Sandra voltou a sorrir, ainda que desempregada. “O dinheiro não é tudo, mas dava-me jeito ter trabalho e poder pagar as minhas próprias contas”, remata. Clara e José: “Ninguém consegue sentir raiva o tempo todo”Na sala onde também prepara as aulas, no centro de Coimbra, Clara Moura hesita, à procura da palavra certa. Está mais serena do que há três anos, apesar de não ter recuperado a qualidade de vida que possuía em 2010 e nem sequer a esperança de que isso venha acontecer. Mas recusa-se a falar em “conformismo” ou a ver-se como uma pessoa “instalada”, “resignada” ou “apática” em relação à realidade, que continua a preocupá-la. Chumbadas todas as hipóteses, conclui que “talvez”, se tenha, simplesmente, “cansado”: “Ninguém consegue viver com raiva o tempo todo, acho que é isso…”, arrisca.
REFERÊNCIAS:
Prisões portuguesas entre as sobrelotadas da Europa
Situação melhorou, mas 13 serviços prisionais ainda lidam com falta de espaço na Europa (...)

Prisões portuguesas entre as sobrelotadas da Europa
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 6 Migrantes Pontuação: 5 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-02-20 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20170220024912/https://www.publico.pt/n1725484
SUMÁRIO: Situação melhorou, mas 13 serviços prisionais ainda lidam com falta de espaço na Europa
TEXTO: A sobrelotação está a diminuir nas prisões, mas ainda se verifica num em cada quatro serviços prisionais europeus e o de Portugal é um deles, indica o relatório anual do Conselho da Europa sobre estatísticas penais, que foi divulgado esta terça-feira, mas refere-se a 2014. De acordo com o documento a que o PÚBLICO teve acesso, em 2011, a Europa tinha em média 99 presos no lugar de 100. Já em 2014, tinha 94 no lugar de 100. Treze serviços prisionais, num total de 51 analisados, lidavam com um problema de sobrelotação. As maiores taxas de ocupação registavam-se na Hungria, na Bélgica, na "Antiga República Jugoslava da Macedónia”, na Grécia, na Albânia, em Itália, e em Espanha (prisões administradas pelo Estado), na Eslovénia, na França, em Portugal, na Sérvia, na Roménia e na Áustria. A 31 de Dezembro de 2014, Portugal, com dez milhões de habitantes, contava 14. 003 presos, mas só tinha capacidade para acolher 12. 591, o que quer dizer que registava uma taxa de ocupação de 111, 2%. A realidade não melhorou. No primeiro dia deste mês, o país contava 14. 277 reclusos, o que quer dizer que a sobrelotação se agravou, alcançando agora 112, 1. De acordo com o relatório, a taxa de população prisional tem vindo a diminuir: passou de 134 por cada 100 mil habitantes em 2013 para 124 por cada dez mil habitantes em 2014. Com uma taxa de 127, 8, Portugal ocupava a 23ª posição. Encabeçavam a lista de países com maior taxa de encarceramento, a Federação Russa, a Lituânia, a Letónia, o Azerbaijão, a Estónia, a Ucrânia, a Polónia, a Moldávia, a Turquia, Eslováquia, Albânia, Hungria. Lembra o relatório que os países podem estar fora daquela lista e registar superlotação em prisões específicas. No caso de Portugal, é menor a sobrelotação registada nas cadeias de complexidade de gestão de grau elevado. Na Área Metropolitana do Porto, por exemplo, há quase sempre sobrelotação em Custóias e quase nunca na feminina de Santa Cruz do Bispo. “A sobrelotação cria enormes obstáculos à reabilitação de reclusos e, portanto, à melhor protecção da sociedade da criminalidade”, disse o secretário-geral do Conselho da Europa Thorbjørn Jagland. “Também pode violar os direitos humanos. Congratulo-me com os progressos alcançados na redução da sobrelotação nas prisões. Os Estados que ainda a têm devem fazer mais para eliminá-la, incluindo a aplicar medidas alternativas à prisão". No final de 2014, havia 1. 212. 479 pessoa sob vigilância electrónica nos 45 países analisados. Só 6, 7% ainda não tinham sido julgadas, o que, no entender dos autores do relatório, “mostra que as medidas não privativas de liberdade são ainda pouco utilizadas”. Naquele ano, 1. 373, 912 pessoas entraram no sistema de supervisão e 1. 134. 567 saíram. Conforme a Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, no final de 2014, em Portugal estavam 752 pessoas sob vigilância electrónica. No final do ano seguinte, 921. Este crescimento deve-se por inteiro à medida de proibição de contactos no âmbito de crimes de violência doméstica. Há novas aplicações mas também longa permanência no sistema. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. O relatório indica ainda que os presos estrangeiros representaram 21, 7% da população prisional da Europa. Na maior parte dos países da Europa Central e Oriental, a proporção de reclusos estrangeiros não ultrapassava 10%. Era na Europa Meridional e na Ocidental que os estrangeiros estavam sobrerepresentados (25% para 96% da população prisional). Em Portugal, no final de 2014, havia um total de 2469 reclusos estrangeiros, o que significava 17, 6% da população prisional. Tinham, sobretudo, nacionalidade de Cabo Verde, Angola, Guiné-Bissau, Roménia e Espanha. A maior parte respondia por crimes de droga. Em toda a Europa, os crimes relacionados com drogas continuavam a ser aqueles que mais pessoas levavam à prisão (16, 5%). Seguem-se os crimes de furto (14%), roubo (13, 1%) e homicídio (12, 3%). Portugal não é excepção. Os reclusos expiam, sobretudo, penas relacionadas com estupefacientes, furto, roubo e homicídio.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave direitos humanos homicídio violência prisão doméstica feminina
Maria José Costeira: Sem medo de afrontar o poder
No auditório de um hotel a estrear na Figueira da Foz, os juízes que assistem ao encontro anual do Conselho Superior da Magistratura aguardam com expectativa o discurso do secretário de Estado da Justiça. Muitos dirigem as novas comarcas e nesta altura, em meados de Setembro de 2014, enfrentam uma situação deveras insólita: o sistema informático dos tribunais crashou há duas semanas, em pleno arranque da reforma judiciária, fazendo parar quase todo o serviço. Ignora-se quando poderão os tribunais voltar à normalidade. As 26 páginas do discurso do governante estão repletas de estatísticas e de elogios às políticas... (etc.)

Maria José Costeira: Sem medo de afrontar o poder
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 6 Migrantes Pontuação: 5 | Sentimento 0.0
DATA: 2015-05-01 | Jornal Público
TEXTO: No auditório de um hotel a estrear na Figueira da Foz, os juízes que assistem ao encontro anual do Conselho Superior da Magistratura aguardam com expectativa o discurso do secretário de Estado da Justiça. Muitos dirigem as novas comarcas e nesta altura, em meados de Setembro de 2014, enfrentam uma situação deveras insólita: o sistema informático dos tribunais crashou há duas semanas, em pleno arranque da reforma judiciária, fazendo parar quase todo o serviço. Ignora-se quando poderão os tribunais voltar à normalidade. As 26 páginas do discurso do governante estão repletas de estatísticas e de elogios às políticas de justiça seguidas pelo Governo. Mas as referências ao problema que todos querem saber quando será resolvido – e que ainda há-de durar mais um mês – são escassas e vagas, como se a questão não passasse de um pormenor sem importância. Sentada na plateia com várias colegas de profissão, Maria José Costeira não se contém: levanta-se e sai porta fora, indignada perante a atitude do secretário de Estado. Nenhum outro juiz segue os passos da então secretária-geral da Associação Sindical de Juízes Portugueses. Quando o interminável discurso chega ao fim o governante é aplaudido de forma morna, mais por educação do que por convicção. Não é a primeira vez que a magistrada dá mostras de não temer afrontar os poderes instituídos. Em 2013 a magistrada não hesitou em intimar o Banco de Portugal a enviar-lhe uma cópia da acusação do processo de contra-ordenação contra o ex-presidente do BPP, João Rendeiro, e restantes administradores, que o regulador se recusava a entregar-lhe, alegando segredo de supervisão. A magistrada do Tribunal do Comércio de Lisboa deu um prazo de cinco dias para lhe ser entregue uma cópia do documento. "Não se consegue perceber a argumentação do Banco de Portugal, nem tão-pouco a invocação do segredo de supervisão", escreveu a juíza, que acabou por condenar o banqueiro. Quando estava à frente do Tribunal de Comércio de Lisboa, em 2008, descreveu de forma eloquente a falta de meios com que se confrontava: “Se eu fosse estrangeiro, não investiria em Portugal”. As insolvências, a propriedade industrial e o direito da concorrência são as suas áreas de especialidade. Nascida no Porto há 47 anos, a nova presidente da Associação Sindical de Juízes Portugueses estudou em Coimbra e tem 23 anos de magistratura. Casada e com duas filhas, venceu as eleições por um número de votos idêntico ao do seu antecessor, Mouraz Lopes, por quem foi apoiada. É a primeira mulher no cargo, e nessa qualidade terá de lidar com outras detentoras de posições tão ou mais relevantes na justiça portuguesa: desde logo a ministra Paula Teixeira da Cruz, que termina o mandato daqui a seis meses, mas também a procuradora-geral da República e a bastonária dos advogados.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave tribunal educação mulher
Crianças portuguesas estão a emigrar para trabalhar
O comissário do Conselho da Europa para os direitos humanos alertou hoje que há crianças portuguesas a emigrar para trabalhar por causa da crise e famílias a retirar idosos das instituições para beneficiar das suas reformas. (...)

Crianças portuguesas estão a emigrar para trabalhar
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 6 Migrantes Pontuação: 10 | Sentimento 0.0
DATA: 2012-07-10 | Jornal Público
SUMÁRIO: O comissário do Conselho da Europa para os direitos humanos alertou hoje que há crianças portuguesas a emigrar para trabalhar por causa da crise e famílias a retirar idosos das instituições para beneficiar das suas reformas.
TEXTO: Os alertas do comissário Nils Muiznieks surgem num relatório que resulta de uma visita a Portugal, entre 7 e 9 de Maio, durante a qual se debruçou sobre o impacto da crise e das medidas de austeridade sobre os direitos humanos. “Durante a sua visita, o comissário foi informado de que, desde o início da crise, tem havido casos de crianças a migrar por motivos de trabalho para outros estados-membros da UE”, pode ler-se no relatório de 18 páginas. O documento acrescenta, citando especialistas, organizações da sociedade civil e sindicatos ouvidos pelo comissário, que “a crise financeira, o aumento do desemprego e a diminuição das fontes de rendimento das famílias devido às medidas de austeridade levaram as famílias a fazer novamente uso do trabalho infantil, nomeadamente no sector informal e na agricultura”. Recordando que o país já regista uma elevada taxa de abandono escolar, o comissário apela às autoridades portuguesas que monitorizem a evolução deste problema e que não descontinuem programas que visam prevenir o trabalho infantil. O responsável refere, por exemplo, ao Programa Integrado de Educação e Formação, que visa prevenir o trabalho infantil, alertando ter sabido, durante a sua visita, de que este “poderá ser descontinuado”. Nils Muiznieks manifesta também preocupação com relatos de que a pobreza infantil está a aumentar em Portugal, como consequência do aumento do desemprego e das medidas de austeridade, nomeadamente os cortes nos abonos de família. O comissário teme que as medidas de austeridade dos últimos dois anos ameacem seriamente as melhorias alcançadas na última década e apela às autoridades que tomem particular atenção ao possível impacto da crise no trabalho infantil e na violência doméstica contra as crianças. Isto porque “uma situação socioeconómica cada vez mais difícil para as famílias, que são sujeitas a elevados níveis de ‘stress’ e pressão, pode resultar em sérios riscos de violência doméstica contra as crianças”. O risco de violência doméstica afecta também os idosos, alerta o responsável, que diz ter tido conhecimento de que muitos casos de violação dos direitos humanos, incluindo violência, “resultam de famílias que estão a retirar os idosos das instituições e a levá-los para casa para poderem beneficiar das suas pensões. “Interlocutores do comissário que trabalham com idosos relataram um aumento dos casos de extorsão, maus-tratos e, por vezes, negligência depois de idosos com problemas de saúde serem retirados das instituições”, especifica o texto, que cita números da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima que atestam um aumento de 158% no número de casos de violência contra idosos entre 2000 e 2011. O comissário reconhece que o programa de emergência social, lançado pelo governo no ano passado, inclui uma série de medidas que visam mitigar os efeitos da austeridade nos idosos, mas considera que, sozinhas, estas medidas “podem não ser suficientes para responder de forma abrangente às crescentes dificuldades que enfrentam muitos idosos”.
REFERÊNCIAS:
Entidades UE