Teresa Lobo: “A mulher pode fazer tudo aquilo que se prepare para fazer”
Maria Teresa Cárcomo Lobo faleceu no Rio de Janeiro a 8 de Dezembro, aos 89 anos. O PÚBLICO republica online o destaque sobre ela que editou a 5 de Agosto de 2002. Para a história ficou como a primeira mulher a integrar um governo em Portugal: foi subsecretária de Estado com Marcello Caetano. Um grande passo, que aparece apenas como uma etapa de uma vida cheia de realizações e de projectos. (...)

Teresa Lobo: “A mulher pode fazer tudo aquilo que se prepare para fazer”
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 10 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-29 | Jornal Público
SUMÁRIO: Maria Teresa Cárcomo Lobo faleceu no Rio de Janeiro a 8 de Dezembro, aos 89 anos. O PÚBLICO republica online o destaque sobre ela que editou a 5 de Agosto de 2002. Para a história ficou como a primeira mulher a integrar um governo em Portugal: foi subsecretária de Estado com Marcello Caetano. Um grande passo, que aparece apenas como uma etapa de uma vida cheia de realizações e de projectos.
TEXTO: Aos 73 anos, Maria Teresa Cárcomo Lobo tem entre mãos duas tarefas de monta — levar a cabo o seu doutoramento e coordenar o levantamento da Carta Judiciária do Brasil para a UNESCO. São mais dois passos de uma vida de desafios que a si mesma, desde que ainda jovem afirmava, em Luanda, a sua certeza de que ia cursar Direito: “Não sei quando vou, nem como vou, mas eu sei que vou. ” Tanto que aos 59 anos acabou por ser juíza federal do Rio de Janeiro. Isto, depois de ser gestora, advogada, consultora, deputada à Assembleia Nacional e subsecretária de Estado da Saúde e da Assistência do primeiro Governo de Marcello Caetano. Hoje, desdobra-se em aulas, livros, artigos, palestras e conferências e é uma intransigente defensora da paridade no exercício de cargos. Até porque acha que a mulher possui uma visão mais abrangente da sociedade do que o homem, fruto do facto de ser mãe. Sustenta que a educação seja feita em função de pessoas e não de homens e mulheres, dando assim origem a um outro tipo de sociedade. E lança um desafio às mulheres — o de não se inibirem perante a possibilidade do exercício do poder político: “Estou no poder porque sou competente. E porque sou competente estou aqui e vou desempenhar esse lugar na integralidade das suas exigências. ”Está a preparar a tese de doutoramento na Universidade Católica de Lisboa sobre. . . “A condição jurídica da mulher na União Europeia”, fazendo a interligação entre a posição jurídica da mulher no quadro da Comunidade e em cada um dos Estados-membros. Como vê o papel da mulher em relação ao poder?Sempre me preocupei muito com o papel da mulher. Na minha família fomos educados numa perspectiva de que não há limites à mulher. A mulher, como o homem, têm de se realizar na plenitude das suas faculdades. Nós somos cinco, três raparigas e dois rapazes, e fomos educados com absoluta igualdade de obrigações, a maior liberdade e a máxima responsabilidade também. Então, sempre pensei que não havia qualquer limite para a mulher. Para isso, porém, é preciso que haja políticas públicas bem definidas a esse respeito, que haja o apoio das autoridades públicas, das empresas privadas, numa palavra, da sociedade como um todo. Essa sua atitude perante a vida, que vem da sua educação, permitiu-lhe criar condições para desempenhar cargos de poder, deputada, subsecretária de Estado, juíza. Sim, o juiz no ordenamento brasileiro é um órgão de soberania. Pelo que viu, pelo que viveu, pensa que há, de facto, entraves sociais e obstáculos à participação da mulher na política?Há, sem dúvida. Um dos pontos que vou tocar na minha tese é precisamente a participação nas estruturas do poder. É evidente que a abertura dada pelos canais oficiais à participação da mulher vai reflectir também um novo tipo de sociedade, de homem, de governante. Hoje, não podemos prescindir em absoluto das energias vitais de uma nação e a mulher é uma das energias mais vitais. Agora, é preciso dar-lhe condições para que haja essa compatibilização. Por isso é que, em relação ao campo específico da maternidade, devem existir derrogações no sentido de uma discriminação positiva. Os entraves são postos só pelos homens ou também pelas mulheres?Também pela mulher. Ela se autocensura, se autolimita, não encara com naturalidade a sua ascensão ao poder, o que deve fazer com firme determinação, ou seja: “Estou no poder porque sou competente. E porque sou competente estou aqui e vou desempenhar esse lugar na integralidade das suas exigências. ”Esses obstáculos são fruto de. . . Da tradição, da educação, sobretudo da educação. Como vê o facto de a educação atribuir logo às meninas e aos meninos um papel social?É um erro de base. Vai depender, portanto, da própria estrutura familiar, como aconteceu connosco. Naquela altura, havia, por exemplo, colégios para raparigas e colégios para rapazes e o meu pai pôs-nos logo num colégio misto: vão estar juntos rapazes e raparigas porque é a preparação para a sociedade. E cada mulher e cada homem tem que ser entendido como uma entidade que tem que se desenvolver. É a pessoa em si. É o respeito pela própria pessoa, devendo arriscar o que for necessário com esse objectivo. Eu, por exemplo, quando fui fazer o concurso para juiz federal, arrisquei muito. Isso foi nos anos 80. Foi em 1987, tomei posse em 1988. Tive que fechar o escritório, vivia da minha advocacia. Tinha algumas economias, poucas, mas equacionei o problema em termos de ser empresária de mim mesma. E, se os empresários correm riscos, eu vou correr este risco investindo na carreira da magistratura federal. Diziam: “Ah, mas você depois pode ir para o Nordeste?” “Eu vou para o Nordeste, porque é que não hei-de ir?” Já quando eu estava no Banco Nacional Ultramarino (BNU), em Moçambique, corri a ex-colónia toda, desci às minas de carvão do Moatize, no Norte, corri aquelas estradas todas, independentemente de ser mulher. Ali eu não era mulher, era uma funcionária, uma técnica do BNU. É assim que eu raciocino. Essa igualdade, a paridade é possível?É possível, leva o seu tempo, porque tem que se partir da educação de base, na família, a educação depois a nível oficial, nos liceus, nos programas, na questão dos papéis que são atribuídos a cada um, no fundo a da dimensão do género, não há masculino e género feminino. E em todas as políticas temos que ter a participação da mulher, porque ela vai trazer uma visão própria, porque ela realmente é reprodutora, ela é que vai dar origem à continuação da espécie. Não se pode esquecer isso. As tentativas de promover a igualdade são ou não muitas vezes decorativas?Pôs o dedo na ferida. Há a questão do modismo. É preciso que a mulher não se deixe utilizar para cargos políticos apenas para dar uma satisfação a, muitas vezes, um modismo político, no sentido de que é conveniente ter uma mulher num cargo importante na vida política nacional. Mas no Brasil há quotas. Há quotas. Aqui a lei não passou?Não. Ah, não passou. Mas em França passou. É a tal coisa, desigualar para igualar. É uma coisa passageira, temporária. Para que a mulher se convença da sua capacidade. Às vezes a mulher, como já referi, é usada para fins eleitoreiros ou meramente conjunturais. É aproveitado o facto de ela ser mulher, sem que a isso corresponda a competência, a própria assunção por ela de novos poderes, de um novo papel. Há dias, li um discurso da comissária europeia para os assuntos da mulher que dizia isso: a mulher deve precaver-se quanto a ser utilizada como uma pedra de xadrez. A mulher pode usar esse ser usada para se afirmar ou não? Se for isso, até estimamos. Vamos aproveitar todas as possibilidades de nos afirmarmos. Mas, muitas vezes, isso não acontece. Muitas vezes, a mulher aparece só para aparecer, para fazer de boi de piranha, como se diz no Brasil. E aí perde ela e perde também o género feminino. Por uma má actuação de uma mulher vai-se logo fazer a generalização. As mulheres são mais observadas do que os homens?Muito mais. Em todo o mundo. No Brasil, hoje já há uma grande abertura, temos imensas juízas, algumas governadoras, mas estão aparecendo prefeitas, que estão tendo um papel importante. Aos poucos a sociedade está reconhecendo a tal dimensão do género nas políticas públicas. O que acha das quotas?Como disse no depoimento ao PÚBLICO, em 2000, eu acho que é importante temporariamente. Porque se não os partidos fecham as portas às mulheres. Como um instrumento. Exactamente. Há muitas mulheres em órgãos de poder social, mas, depois, o salto para o poder político executivo não acontece. Porquê? A senhora, que esteve lá, como vê esta dificuldade?Vai depender muito do perfil da mulher e da sua convicção quanto às suas reais possibilidades. Portanto, é uma questão de pessoas, de personalidade, não de sexo. Fundamentalmente é uma questão pessoal. O que é preciso também é que a mulher não se sinta diminuída, se fez uma opção de não participar na vida pública e de se dedicar só aos seus deveres familiares. É uma questão de opção. E qualquer das opções tem que merecer respeito. O que é preciso é que uma mulher que não está a exercer uma função pública — ou porque optou, ou porque, pelas circunstâncias, ficou só restrita ao lar — desenvolva a sua sensibilidade através de participação em trabalhos comunitários, que esteja atenta ao mundo que a rodeia, político, social, económico e cultural, para se desenvolver como cidadã, porque é a principal veiculadora dos valores de cidadania para os seus filhos. Está a falar da função de educadora da mãe. É importantíssimo. A educação de base familiar tem que ser devidamente potencializada. As sociedades investem nisso? Por exemplo, aqui em Portugal, investe-se muito pouco no papel de formação da família e da mulher. Fala-se muito em família, num sentido anacrónico e bafiento, algo pesado. Mesmo a nível mundial, a família é usada muitas vezes esquecendo o papel fundamental da célula familiar e o papel a mulher. A própria família tinha de ser muito potencializada e ajudada para que possa, como família, exercer o seu papel social. A família como todo ou reconhecendo os indivíduos lá dentro?Não, não. Com o indivíduo lá dentro. Até que ponto a diferença de sensibilidade entre homens e mulheres influencia e afasta as mulheres do poder? Há quem diga que o poder é uma coisa para a sensibilidade masculina. Não concordo. Tudo depende do que se entende por poder e por sensibilidade. É claro que a mulher tem a sua visão, até mais abrangente do que o homem, porque ela é mãe. Se nós hoje vivemos numa sociedade globalizada, em que tudo tem que ser equacionado sob um ângulo abrangente, a mulher está mais bem preparada do que o homem, porque ela tem uma visão mais abrangente. Não me parece ser uma questão de sensibilidade. A política também tem que ser sensível. Hoje temos que ter o ser humano no cerne das nossas preocupações, das políticas. Portanto, não concorda que há uma espécie de uma razão inata que afasta as mulheres do poder?Não, não, não, em absoluto. E temos exemplos de grandes políticas em que a sensibilidade feminina não impediu que elas fizessem aquilo que os interesses nacionais naquele momento exigiam. É o caso da Margaret Thatcher defendendo as Malvinas. É o caso da Golda Meir, é o caso da Indira Gandhi. Mas as mulheres exercem o poder de modo igual aos homens?Acho que não. É a igualdade na diversidade. O maior contributo dela é trazer a visão mais abrangente, mais profunda do que o homem. Como li há dias, a mulher é o traço de eternidade na movediça qualidade. Essa é a grande questão que está a ser debatida na própria União Europeia. Acabar com todo e qualquer resquício de discriminação, sem pôr em causa que há uma diferença, até de natureza. Mas isso não deve ser utilizado para subestimar ou obstaculizar a posição da mulher. A mulher pode fazer tudo aquilo que se prepare para fazer. Se for ser política, é política, se tiver que passar revista à guarda de honra, ela passa revista à guarda de honra, se for preciso pegar numa espingarda para se defender, ela pega na espingarda para defender o seu país, o seu lar, seja o que for. A mulher é um ser completo e é preciso que essa completude seja traduzida, que os poderes públicos, que as políticas públicas lhe dêem essa possibilidade. A mulher tem que atingir esse estado com a maior naturalidade, como se fosse normal. Eu estou aqui porque sou um ser humano e tenho capacidade. E essa naturalidade desarma as pessoas, abala preconceitos pré-constituídos. Ficou chocada quando ouviu Durão dizer que a Europa estava sem rumo e sem timoneiro. Pasma com a falta de convicção e de interesse pela União Europeia que grassa em Portugal. Assim como se preocupa com o atraso português. E garante que o desenvolvimento e a democracia passa pela educação. O que faz o equilíbrio das sociedades? Quais são as apostas para o desenvolvimento?A prioridade é a educação. A educação é fundamental, é a trave mestra, a pedra angular do desenvolvimento e é uma das grandes manifestações da democracia. A educação a todos os níveis e abrangendo toda a comunidade. É evidente que, quando digo educação, tenho de contemplar um universo maior, a saúde, o meio ambiente, a habitação, tudo isso eu englobo no conceito de educação. Isso é fundamental para que um país se possa desenvolver. A justiça é também uma coisa que me preocupa muito. Num país como o Brasil, em que a justiça é um órgão de soberania, o magistrado tem um papel de extraordinária importância no desenvolvimento. Essa é hoje uma das grandes preocupações do Banco Mundial, a justiça como um factor indispensável para o desenvolvimento; uma justiça que não seja corrupta, que não seja ineficiente, que procure tanto quanto possível não demorar a decisão do caso. Justiça como fiscalizadora?E garantidora da cidadania. Norberto Bobbio diz uma coisa muito certa: o problema do nosso tempo não se resume à outorga de direitos. Porque os direitos estão outorgados em quase todas as cartas constitucionais do mundo, está lá, está declarado. O problema maior é efectivar esses direitos e a efectivação cabe ao poder judiciário. Outro problema é o da formação. Hoje, o juiz não pode olhar só para o cenário nacional, tem de ter uma visão internacional. A senhora tem-se dedicado muito às questões da economia. Não se pode dissociar o direito da economia hoje. Do seu trabalho resulta que aponta como paradigma para o desenvolvimento da América Latina muito mais o modelo da União Europeia do que o modelo dos EUA. Porquê?Na América Latina não há uma cultura de integração, nem vontade política. A II Guerra deixou a Europa exaurida e não havia outra solução, outra alternativa, se não unir-se. Na América Latina não há essa solidariedade, o abrir mão de algumas coisas em proveito de outras. Acha mesmo o modelo europeu melhor?Acho, desde que se adapte à economia sul-americana. Para mim, o paradigma do Mercosul será a União Europeia, guardadas as devidas distâncias, atendendo ao próprio ritmo do desenvolvimento. Isso exige uma grande preparação. É preciso preparar não só os dirigentes, como os advogados, como os promotores, como os juízes. O papel do Estado ainda se justifica ou deve ficar tudo na mão do livre arbítrio do mercado?Não. Tem de haver essa presença do Estado. Mas também da sociedade civil através das ONG. É preciso que se dê importância aos novos actores e não se resumir tudo só no Estado. Mas o Estado não pode deixar de ser regulador e fiscalizador. O desenvolvimento é sempre um desenvolvimento integrado, um todo em que não se pode separar o económico do social. Como disse no II Colóquio Internacional de Direito Tributário em Buenos Aires, a economia social deve ser considerada um factor produtivo, na medida em que dá sustentabilidade à sociedade da informação, a qual se deve caracterizar pela sua capacidade de reduzir a exclusão social e de criar novas oportunidades para todos os grupos, ou seja, a finalidade social deve merecer a mesma importância que se dá à sustentabilidade económica, uma vez que sistemas de protecção social sólidos e de boa qualidade são parte necessária do desenvolvimento económico. Quanto tempo esteve sem vir a Portugal?Vim duas ou três vezes só. Como é que vê o país?Primeiro vejo um grande desenvolvimento de infra-estruturas, estradas, auto-estradas. Não tenho elementos, mas o que tenho lido nos jornais é que há graves problemas na educação, na saúde. E o facto de, no relatório do PNUD, Portugal vir em 28º lugar?É extremamente preocupante. Eu acompanho quando o Conselho da União Europeia faz considerações sobre a economia de cada um dos Estados-membros. No fim do ano, a crítica a Portugal foi bastante incisiva quanto ao défice público. E o líder do PS, Ferro Rodrigues, já disse que avaliaram mal, sobrestimaram as receitas e subestimaram as despesas. O país com maior défice é Portugal. Depois há outra coisa, o primeiro-ministro dizer que a Europa está à deriva. Eu fiquei assim um pouco chocada, confesso. Porque é fundamental ganhar a confiança dos cidadãos. O cidadão tem que ter confiança na União Europeia, tem que saber que é parte da UE, que está no centro das preocupações da UE. Por que, se não tiver esse concurso do cidadão, nenhum projecto de integração vai avante. As pessoas não sentem que fazem parte de um projecto. É isso que eu noto. Há dias falei com dois juízes desembargadores e eles disseram-me assim: “Ah, nós não sabemos quase nada de direito comunitário, nem está nas nossas preocupações. ” Fiquei um pouco admirada. É preciso fazer esse grande esforço. As faculdades, as escolas têm que preparar para, mantendo a individualidade portuguesa, o perfil histórico, dar-lhe dimensão europeia. Não tenho visto uma convicção muito forte de que isto é Europa. E dizer que a Europa está à deriva, não tem timoneiro, isso, então, causa-me uma certa perplexidade, por que Portugal é membro da União Europeia, fazendo, portanto, parte da equipagem do barco europeu. O que é para si a lusofonia?É de uma importância extraordinária. E que também não está a ser devidamente potencializada, nem perspectivada. E falo pelo Brasil. Temos a CPLP, mas não se vê nada de concreto, de palpável. Hoje faz um evento, amanhã faz outro evento. É só retórica. Era importante, porque isso é uma força nossa. Num mundo de globalização, era extraordinário que o sentido da lusofonia fosse devidamente equacionado, traduzido em realizações concretas. Então teríamos o indivíduo lusófono que tinha os pés na América, na Europa, na África e, com Timor, também na Ásia. Que entende por realizações concretas?Por exemplo, vamos fazer a harmonização da linguagem jurídica, dos próprios conceitos jurídicos, dos impostos. Eu sugeri à Universidade Cândido Mendes que uma das teses de mestrado fosse precisamente a harmonização fiscal na CPLP. Foi aceite. Três ou quatro mestrandos ficaram entusiasmados. Mas não houve a mínima receptividade dos países. Só Angola mandou a legislação. A dinamização cabia à secretaria-geral da CPLP que tem sede aqui em Lisboa. O que é que está fazendo? Não fazem nada. “Vai haver negros que vão ascender politicamente"Juíza federal, Maria Teresa Lobo orgulha-se das conquistas que as novas gerações da justiça brasileira têm conseguido no combate à corrupção. Já sobre o racismo diz que ele é mitigado, mas reconhece que, apesar das quotas, ainda está por conseguir a ascensão dos negros brasileiros aos cargos de poder político. Benedita da Silva teria sido eleita governadora do estado do Rio de Janeiro, se tivesse sido ela a candidata logo de início, sendo mulher, negra e favelada?Possivelmente sim, porque o eleitorado do Rio de Janeiro é extremamente Interessante em termos de abertura. Benedita tem grande simpatia popular. É uma mulher equilibrada, de bom senso, afável, que se expressa muito bem, nunca deixando de lado a dimensão social dos problemas, até porque ela já os viveu. Então na escolha do poder político não se coloca o problema do racismo no Brasil?De uma maneira geral, não. E certamente não no Rio de Janeiro. Aí, até pode intervir como um factor positivo. A Benedita é negra, é favelada, mas conseguiu superar as condições adversas e afirmar-se no cenário político nacional. Mas há racismo no Brasil?Não se pode negar que existe, mas em meu entender é um racismo mitigado. Envergonhado?Talvez. Acha isso positivo, o ser envergonhado? Comparando com a sua experiência em Moçambique, passaram 30 anos, mas. . . Não, não é positivo. Mas mostra, pelo menos, haver consciência do preconceito e de uma visão errada do racismo em termos de uma discriminação indevida e injusta. Havia racismo em Moçambique?Mais ostensivo. Por que há tão poucos negros em cargos de poder?Essa é uma realidade inegável. Todavia, está em curso uma política de discriminação positiva através de fixação de quotas para negros nas universidades, nos serviços públicos, para que se desigualem as condições de acesso para se chegar a uma efectiva igualdade. O importante é haver condições para uma igualdade de oportunidades. Uma igualdade material e não meramente formal. É paradigmático, por exemplo, que sendo São Salvador da Bahia a maior cidade negra fora de África. . . Salvador é uma mescla de culturas com predomínio da cultura negra, onde existe uma grande aculturação, porque o negro da Bahia é um negro que se estima, que não tem preconceitos de inferioridade. Mas quem é o poder na Bahia? António Carlos Magalhães e os seus sucedâneos?Não se pode negar a grande influência de António Carlos Magalhães e a sua grande penetração no meio popular. Trata-se de um político carismático, mas nada disto tem a ver com o racismo, sendo talvez um resquício do coronelismo de outros tempos. Como disse, estabeleceram-se quotas para negros, citando neste ponto o Supremo Tribunal Federal que já adoptou a política de quotas. No poder político nada. Quando é que se teve um ministro federal negro no Brasil? Já tivemos governadores, senadores, diplomatas. Ministro acho que não, nenhum. É estranho, não é?Por enquanto. Mas em futuro não muito distante não haverá obstáculo a essa ascensão, porque é inegável uma evolução nesse sentido. Não tarda, hão-de aparecer brasileiros negros no executivo, no exercício das mais altas funções. É evidente que precisamos de ter mais negros no poder, mas não por serem negros, mas por serem competentes e integrarem a sociedade brasileira. Vai haver negros que, pelos seus méritos, vão ascender politicamente. E a corrupção?Existiu e existe, como aliás em todo o mundo. No Brasil, o que importa ressaltar, é que não predomina já aquele sentimento de impunidade que existia. Temos, no Brasil, um Ministério Público muito actuante composto de jovens decididos, embora por vezes, movidos pelo seu ideal, extrapolem no exercício das suas atribuições, o que, porém, é preferível à omissão e à inércia. O mesmo sentido de ética está também presente no poder judiciário, embora, como é evidente, haja excepções. Está em vigor uma lei de responsabilidade fiscal que é um grande passo em frente — os administradores não podem ultrapassar um determinado limite, são responsáveis por isso. Já não é permitida a situação de, nos últimos meses de governo, gastar indiscriminadamente deixando uma herança bastante negativa para o próximo. Há uma lei também muito severa, a lei do colarinho branco, relativa a crimes do sistema financeiro. Acresce também uma imprensa investigativa que bastante tem contribuído na denúncia de casos de corrupção. A qualidade do jornalismo brasileiro é reconhecida. Ele é que levanta a ponta do icebergue, embora, por vezes, exagere nessa ânsia investigativa. Outro aspecto importante no combate à corrupção é a quebra do sigilo bancário e do sigilo fiscal autorizada por decisão judicial fundamentada. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Também já há prisões, não é?Temos personalidades de vulto presas. Quem é que esperava ver, por exemplo, o ex-presidente do Senado ser preso e algemado? Também existem juízes presos sem qualquer regalia. Onde é que há uns anos isso era possível? Há uma mudança de mentalidade e para isso contribuiu muito esta nova geração de magistrados e procuradores e a actuação da imprensa. Como julga que é possível vencer a ruptura entre o Brasil do Nordeste e o do Sul? Há um hiato que se nota até na altura das pessoas, por causa da fome, da subnutrição. O Brasil não é um país, é um continente, com todo o seu arsenal de desigualdades que sempre marcam o Norte e o Sul. Perderam-se, infelizmente, oportunidades excelentes de transpor esse hiato, mas a percepção de que o Brasil tem de se firmar no comércio mundial está levando o Governo a olhar mais cuidadosamente o Nordeste no seu grande potencial de crescimento de que cito a agro-indústria e o turismo. O Nordeste foi, sem dúvida, prejudicado pelo sistema do coronelismo. É a herança portuguesa. Sim, a sua parte menos positiva. O que importa é sobrelevar os pontos positivos e eliminar os negativos dessa herança. Isso é que faz uma nação, que não enjeita o seu passado na construção do seu futuro.
REFERÊNCIAS:
O português João Fernandes está na lista dos 100 mais influentes da arte
Revista Art Review publicou a sua lista Power 100 e João Fernandes, o subdirector do Museu Rainha Sofia, está a meio da lista, juntamente com o director da instituição – é o único português no top. (...)

O português João Fernandes está na lista dos 100 mais influentes da arte
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 10 | Sentimento 0.5
DATA: 2018-11-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Revista Art Review publicou a sua lista Power 100 e João Fernandes, o subdirector do Museu Rainha Sofia, está a meio da lista, juntamente com o director da instituição – é o único português no top.
TEXTO: A revista Art Review publicou esta semana a sua lista Power 100, que identifica a cada ano as pessoas mais influentes do mundo da arte, e a 51. ª posição é ocupada pela dupla de directores do Museu Rainha Sofia, em Espanha: o director Manuel Borja-Villel e o subdirector João Fernandes. O português é uma das novas entradas deste top, a par do movimento #MeToo, do poeta e crítico Fred Moten e da artista Nan Goldin. Os dois responsáveis pelo museu madrileno, um dos mais importantes museus de arte contemporânea da Europa – onde está a Guernica de Picasso –, são elogiados por serem os “chefes do radical Rainha Sofia” e porque “resistem ao apelo da exposição blockbuster”. Manuel Borja-Villel é director do museu desde Janeiro de 2008 e João Fernandes juntou-se-lhe em 2012, depois de ter dirigido o Museu de Serralves desde 2003. Sob esta direcção, diz a Art Review, o Rainha Sofia “tem um desígnio mais radical” – a revista acrescenta que “Fernandes foi um activista comunista de relevo na sua juventude” – “numa altura em que o capitalismo ameaça reduzir os públicos a ‘autómatos consumidores e obedientes’”, como disse este ano, e cita a revista, o próprio Borja-Villel. São destacadas exposições como aquela que dedicaram ao sul-africano William Kentridge, ao americano George Herriman, a Fernando Pessoa, à espanhola Dora García, ao artista luso-brasileiro e activista Artur Barrio ou ao dadaísmo russo, no fundo uma programação que tem dado espaço a “nomes cujo trabalho não é necessariamente ubíquo no circuito de museus nacionais”. Manuel Borja-Villel e João Fernandes estão a meio de uma lista de 99 personalidades e um movimento – o #MeToo, que ocupa a terceira posição na lista de 2018, é o único movimento numa lista encimada pelo galerista David Zwirner e pelo pintor Kerry James Marshall e de que constam ainda Miuccia Prada (20. ª), Ai Weiwei (quinta), os galeristas Iwan e Manuela Wirth (sexta), Hans Ulrich Obrist (sétimo) ou Nan Goldin, uma nova entrada para uma artista veterana que agora se destaca também pelo seu activismo na área do mecenato e contra a família Sackler, gigantes da indústria farmacêutica ligados ao fabrico de opiáceos e ao apoio às artes.
REFERÊNCIAS:
Étnia Africano
Factor “i”: o factor europeu que Portugal ignora
Para o nosso futuro político (europeu e português) tão importante como o factor “e” (economia) vai ser o factor “i” (imigração). (...)

Factor “i”: o factor europeu que Portugal ignora
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 Migrantes Pontuação: 9 | Sentimento 0.0
DATA: 2015-05-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: Para o nosso futuro político (europeu e português) tão importante como o factor “e” (economia) vai ser o factor “i” (imigração).
TEXTO: 1. Quando comparado com o resto da Europa, seja mais rica, seja mais pobre, Portugal não sofre com o problema da imigração. Entendamo-nos. Há em Portugal sérios problemas sociais ligados às comunidades imigrantes, há também motivos para preocupação com o racismo e a discriminação, há seguramente questões ligadas à integração e ao respeito pela identidade, há relação do assunto com o desemprego e há fundados temores dos efeitos da concentração da população migrante em bairros periféricos. Mas não há qualquer possibilidade de compararmos a dimensão, a profundidade e o enraizamento político deste fenómeno com o que se passa no resto da Europa. Não estou apenas a falar da Alemanha, da Holanda, da Suíça, da Bélgica, da Noruega, da Dinamarca, da Áustria, da Finlândia e da Suécia. Nem estou sequer a falar dos destinos crónicos do Reino Unido ou da França, onde o tópico está mais quente do que nunca. Basta olhar para o que se passa em Espanha, na Hungria, em Itália ou até na Grécia para compreender que o tema da imigração marca tão ou mais fortemente a agenda política do que o tema da crise económica e financeira. Não há, por isso, paralelo entre a percepção que em Portugal se tem desta realidade e o verdadeiro impacto que ela tem em grande parte dos países europeus. 2. O principal factor de crescimento e de reforço sustentado da direita radical, em muitos dos países europeus, não é propriamente o desemprego ou a crise económica que lhe anda associada. É justamente, ao invés do que muitos julgam e pensam, o confronto “civilizacional” com as comunidades migrantes – em particular, está bom de ver, com aquelas que mais distância têm dos padrões e tradições tipicamente ocidentais. É evidente que o efeito conjugado da crise com a afluência cada vez maior de populações “estrangeiras” potencia a dimensão e a gravidade dos problemas. Em países tantas vezes admirados pela sua tolerância e capacidade de acolhimento como a Suíça ou a Noruega, a direita mais radical já contribui directamente para as soluções de Governo (com todas as consequências que isso acarreta). Olhe-se também para o impasse político que vive a Suécia, hoje refém de uma direita xenófoba, que aumentou exponencialmente a sua representação nas eleições de Setembro, forçou uma demissão do novo Governo e ameaça replicar um resultado relevante nas eleições que vão agora repetir-se. 3. As notícias de ontem sobre as novas “segundas-feiras” alemãs em que os manifestantes saem à rua para gritar palavras de ordem contra os imigrantes e, em especial, os imigrantes de fé muçulmana são deveras inquietantes. Tanto mais que, ao contrário do que sempre tentou e jurou Angela Merkel, agora já há um partido – a Alternativa para a Alemanha (AfD) – que, de um modo mais ou menos velado, vai pegando nessas e noutras bandeiras. A situação da França é talvez a mais preocupante, dada a relevância que tem vindo a assumir um partido tão extremista e nacionalista como é a Frente Nacional e a visibilidade e aceitação que tem sido capaz de recolher a sua líder, Marine Le Pen. Mesmo assim, não deixa de ser altamente problemática a deriva do Reino Unido, alavancada pelo UKIP, pois contesta não apenas a imigração enquanto tal, mas a simples ideia de liberdade de circulação no espaço europeu. Ainda na semana passada a imprensa do Reino Unido se “escandalizava” com o recrutamento significativo de pedreiros portugueses a 1200 euros por semana, por manifesta falta de mão-de-obra britânica. O caso é especialmente grave porque já contaminou o discurso do Partido Conservador e até do Partido Trabalhista. E, por outro lado, tem vindo a dar alento a alguns sectores apoiantes do Governo alemão para revisitar o tema da liberdade de circulação de trabalhadores dentro da União Europeia. Ponto que, aliás, também tinha sido tocado e volta a ser – nesta segunda incarnação da liderança da UMP – por Nicolas Sarkozy. 4. Nos países do Sul, a situação pode ainda tornar-se mais explosiva. Com a perspectiva, agora tornada séria, de a extrema-esquerda poder vir a vencer eleições na Grécia, a radicalização do processo político pode acelerar-se. Com efeito, uma polarização declarada entre a esquerda radical do Syriza e a extrema-direita da Aurora Dourada pode levar a Grécia para um conflito político de natureza muito diferente daquele que é próprio das democracias europeias. A emergência do Podemos em Espanha, especialmente se alguma vez vencesse eleições, levaria os nossos vizinhos para uma deriva política altamente conflituosa. As forças mais conservadoras da velha Espanha levantar-se-iam, algumas das pulsões “independentistas” ganhariam fôlego e as condições para uma reabilitação de um direita radical instalar-se-iam. Na verdade, não é preciso reflectir muito para perceber que a extrema-direita e a extrema-esquerda são aliadas tácticas e que cada uma delas se alimenta mais facilmente, se a outra for uma ameaça real e efectiva.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave imigração concentração racismo desemprego discriminação
Esta América termina no Texas mas do outro lado "también hay sueños"
Entre El Paso, no estado norte-americano do Texas, e Ciudad Juárez, no estado mexicano de Chihuahua, não há sinais de uma multidão de imigrantes a invadir os Estados Unidos sem documentos. (...)

Esta América termina no Texas mas do outro lado "también hay sueños"
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 Migrantes Pontuação: 9 | Sentimento -0.12
DATA: 2016-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: Entre El Paso, no estado norte-americano do Texas, e Ciudad Juárez, no estado mexicano de Chihuahua, não há sinais de uma multidão de imigrantes a invadir os Estados Unidos sem documentos.
TEXTO: Wile, “como em Wile E. Coyote”, cruza as ruas de El Paso e Ciudad Juárez no seu táxi amarelo há 11 anos, sempre a partir do lado norte-americano da fronteira, porque foi aqui que nasceu e cresceu. Habla español como a maioria dos habitantes de El Paso, no Texas, e tal como muitos deles atira o candidato do Partido Republicano para o caixote dos “ignorantes que não sabem falar”. Mas quanto mais ele fala enquanto conduz, mais se percebe que Wile é uma estranha espécie de Hillary Clinton possuída pelo “demónio” Donald Trump: vai votar nela, mas concorda que é preciso reforçar a fronteira com a terra onde os seus pais nasceram e ainda vivem. “Hillary Clinton tem um projecto sério para a comunidade latino-americana e tem 30 anos de experiência, por isso é claro que vou votar nela”, diz Wile enquanto tenta decidir se abre as janelas do táxi ou deixa o ar condicionado ligado, que este calor do Deserto de Chihuahua perdoa conversas sobre política mas é implacável com quem gosta de manter a t-shirt tão branquinha como quando ela saiu de casa logo pela manhã. A viagem de uma zona afastada do centro de El Paso até às portas de Ciudad Juárez vai bem, obrigado, graças a um dia sem muito trânsito e à experiência de Wile – “como em Wile E. Coyote”, repete com uma gargalhada. Mas há tempo suficiente para falar sobre essa rara mistura por estas paragens: um eleitor americano, filho de mexicanos, que vive na fronteira onde Donald Trump promete construir um muro “grande e lindo” e que só não pensa em votar nele porque lhe dá vontade de rir quando o ouve falar: “Há vezes em que não se percebe nada do que ele diz. ”“Mas concordo com o que o Trump diz sobre a imigração ilegal. Há muitas pessoas a tentar passar a fronteira, e é preciso controlar isso. Muitos deles podiam entrar nos Estados Unidos com um documento que custa umas centenas de dólares, mas preferem pagar milhares para entrarem aqui. Não devem vir fazer coisa boa. A maioria são pessoas que foram deportadas por terem cometido crimes e depois têm de voltar a entrar por outros meios”, diz este eleitor de Hillary Clinton com discurso de Donald Trump. Fala no geral, e sobre outros pontos ao longo da fronteira, porque aqui entre El Paso, no estado norte-americano do Texas, e Ciudad Juárez, no estado mexicano de Chihuahua, não há sinais de multidão alguma de imigrantes a invadir os Estados Unidos sem documentos, como diria o candidato do Partido Republicano. Os poucos arranha-céus de El Paso não chegam para fazer cócegas a este horizonte azul a perder de vista no calor do deserto, e o mais difícil nesta cidade norte-americana do Texas é não conseguir ver Ciudad Juárez do outro lado da fronteira. São irmãs, El Paso e Juárez. E nem sequer são duas irmãs zangadas e de costas voltadas só porque o Governo dos Estados Unidos as separou com uma gigantesca vedação de aço no final da década passada – são, apesar disso, duas irmãs inseparáveis que se encontram todos os dias, a cada hora, a cada minuto, para fazer compras de um lado e do outro, para trabalhar, para comer, para dormir. Ainda em El Paso mas já com a Ponte Internacional Paso del Norte ali ao fundo ao virar da esquina, por onde entram e saem a pé ou de carro 20 mil pessoas por dia, Juan Carlos Guzman tenta votar pela primeira vez para as eleições presidenciais nos Estados Unidos, apesar dos seus 55 anos de idade e 20 anos de vida e trabalho no lado norte-americano da fronteira. “Acabo de me tornar cidadão americano e estas eleições estão a ser muito interessantes”, diz Guzman à entrada do Tribunal do Condado de El Paso, um dos 27 sítios onde os cidadãos locais podem votar desde segunda-feira passada – o dia grande é 8 de Novembro, mas muitos estados já abriram as portas a quem não pode ou não quer deixar tudo para a última hora. As máquinas de voto estão no 3. º piso, 11 cubículos azuis dispostos lado a lado, com um estreito corredor a separá-los das mesas em que os coordenadores vão explicando as dúvidas dos eleitores. O calhamaço em papel amarelo que serve de exemplo para o que espera Juan Carlos Guzman quando entrar na cabina de voto electrónico diz muito sobre a força de vontade que é preciso ter para votar aqui – Partido Democrata ou Partido Republicano? Donald Trump/Mike Pence, Hillary Clinton/Tim Kaine, Gary Johnson/William Weld, Jill Stein/Ajamu Baraka, ou outro qualquer no espaço que diz “write in”? E depois seguem-se páginas e páginas de candidatos a responsáveis disto e daquilo, em todo o sítio e mais algum no condado de El Paso. Antes de sair de casa para preencher isto tudo até ao fim, é melhor confirmar duas vezes se não ficou uma chaleira ao lume. Guzman bem esperou, sentado numa pequena sala atafulhada de caixotes, montanhas de papel, dossiers, toques de telefone a cada minuto, duas fotocopiadoras que não páram de justificar a sua compra, e onde um trabalhador tenta de forma quase patética furar uma parede sem fazer muito barulho. Logo na estreia como eleitor norte-americano, Guzman recebeu uma carta em casa a dizer que havia uma irregularidade qualquer, mas quando chegou a esta sala dedicada a esclarecer os cidadãos, a secretária disse-lhe ali daquele cantinho para onde foi atirada que afinal não havia irregularidade alguma. Mas a espera valeu a pena pelo quadro com uma jarra azul e três flores vermelhas pendurado ao lado da porta, sem assinatura mas de autoria bem conhecida: “Te quiero Mami. ”Só este tempo de espera, mais a cópia do gigantesco boletim de voto, fê-lo desistir por hoje e prometer voltar mais tarde, a outro local de voto. Mas garante que vai votar, e não tem problemas em dizer bem alto em quem e porque motivos. “Como se costuma dizer, os Clinton são dois por um, e duas cabeças pensam melhor do que uma. E o outro senhor anda um pouco desorientado. Nós, latinos e hispânicos, todos os imigrantes, fizemos deste país um país mais forte”, diz Guzman sem deixar dúvidas de que Donald Trump não conta com o seu voto. Ainda assim, e tal como o taxista Wile, este mexicano nascido em Ciudad Juárez e naturalizado norte-americano há pouco tempo também compreende o reforço da fronteira. “Antes era muito mais fácil passar a fronteira de forma ilegal, mas tudo mudou com os atentados de 11 de Setembro de 2001. Eles têm razão, é o país deles e devem cuidar dele. Cada país tem o direito de cuidar da sua fronteira”, diz, ainda sem ter interiorizado que este agora também é o país dele. Mas às eleições deste ano juntaram-lhe “muito picante”, diz Guzman – Clinton tem motivado muitas pessoas a votar, mas Trump não lhe fica atrás, “ao dar corda aos racistas, que estão a aproveitar o momento para saírem da toca”. O reforço desta e de outras zonas de fronteira é muito anterior à entrada em cena de Donald Trump – o candidato do Partido Republicano promete construir o tal muro “grande e lindo” ao longo de toda a fronteira, mas entre El Paso e Ciudad Juárez há uma vedação com cinco metros de altura lançada por George W. Bush e terminada por Barack Obama, que acompanha as curvas do famoso Rio Grande, aqui tão pequeno e vazio que se atravessa sem se molhar os sapatos. A caminho de Ciudad Juárez pelos corredores pedonais da Ponte de Santa Fé, mais conhecida como Paso del Norte, depois de se pagar os “50 cents” da praxe porque para ir ao México todos os santos ajudam e até empurram, a multidão que se vê é de vendedores ambulantes, empenhados lavadores de pára-brisas e até um trio de jovens com tuba, saxofone e bateria que serpenteiam entre as filas de automóveis. É ali que ganha a vida quem não pode ir até ao outro lado da fronteira, no Texas, para esperar todos os dias por uma carrinha americana com propostas para quem não tem autorização de trabalho. A meio da ponte, o barulho dos helicópteros norte-americanos que sobrevoam esta zona dia e noite e a fila interminável de jipes da guarda fronteiriça encostados à vedação de 200 em 200 metros não abafam as palavras pintadas já no lado mexicano, em letras bem grandes para se ver lá do céu: “De este lado también hay sueños. ”Chega-se a Juárez pela enorme avenida com o mesmo nome, e de repente há uma explosão de cores, cheiros e sabores, de lojas com música mais alta do que a vedação, de pequenas tendas como num gigantesco mercado onde não se percebe o princípio nem o fim. A brutal guerra dos cartéis da droga em Juárez, entre 2008 e 2012, perdeu-se na memória das notícias, mas o medo do seu regresso sente-se de cada vez que alguém olha por cima do ombro, como acontece várias vezes a Juan Hernandez, nascido aqui mas criado ali, do outro lado da fronteira, e que aceitou voltar à cidade mexicana – apenas por um dia. O centro da cidade está apinhado de gente, velhos, novos, crianças com uniformes de colégio, autocarros a cair aos pedaços enquanto se arrastam pelas ruas cheias de buracos. Ainda há muitos cartazes a perguntar se alguém viu esta criança que desapareceu há anos, ou esta mulher de que ninguém sabe há meses. Mas há uma vida impensável em 2010, quando quem saía de casa geralmente era para matar ou morrer – oficialmente foram assassinadas 3622 pessoas, quase dez por dia, tantas nestas ruas onde agora se ouve o ídolo Juan Gabriel a cantar “Probablemente ya de mí te has olvidado / Y mientras tanto yo te seguiré esperando”. Passar para o outro lado, para El Paso, é fácil para quem tem documentos, apesar dos olhares altivos e desconfiados de muitos agentes norte-americanos, mas também se arranja alguma coisa às escondidas da “la migra”. Se não se conhecer ninguém, basta ficar parado no fim da Avenida Juárez, às portas do Paso del Norte, a olhar para um lado e para o outro, um desconhecido desperta sempre atenções. A conversa começa bem. Juan diz a dois jovens que este rapaz aqui ao lado quer ir para os Estados Unidos mas não tem documentos. Sim, sem problema: paga 500 dólares agora, levamo-lo para um hotel do outro lado e só paga os outros 500 dólares quando lá chegarmos. Mas a coisa começa a correr mal quando se torna evidente que só um deles fala, fala e fala e não pára de falar; o outro limita-se a olhar para este rapaz aqui ao lado de cima a baixo. Enquanto se encena uma conversa sobre se a coisa vai para a frente, os dois jovens desaparecem e Juan abre a passada até chegar ao primeiro táxi que encontra: “Los Zetas, eles agora mandam aqui e devem ter pensado que és um undercover. ”Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. De volta a El Paso, a entrada é mais difícil, porque para ir aos Estados Unidos poucos santos ajudam. Na zona onde os agentes da fronteira fazem perguntas, revistam a roupa e retêm os telemóveis, e onde não se pode falar com as outras pessoas na mesma situação, uma mulher sussurra um número de telefone, e pede por favor “que não se esqueça”. É para dizer à filha que ficou ali e que dali já não sai. À direita, os agentes vão fazendo o seu trabalho de forma lenta e sempre com tempo para um momento de boa disposição: “Olha, chegou mais uma data deles, são uns seis ou sete, pai, mãe e filhos. Trata tu disso. ” À esquerda, pelo menos quatro pequenas salas cheias de mães e de filhos, que brincam e saltam descalços em cima de finos colchões verdes. Ficaram ali e dali já não saem, pelo menos para os Estados Unidos. Depois de um “boa tarde e tenha um resto de bom dia”, o agente que nos abre a porta para El Paso, e que estranhamente não se chama nem Lopez nem Aguirre, decide ficar um pouco mais à conversa sobre as eleições. E sim, Wile “como em Wile E. Coyote” e Juan Carlos Guzman, ele também diz que vai votar em Hillary Clinton.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave trabalhador guerra filha imigração filho tribunal mulher comunidade criança medo espécie ilegal
Macron reafirma responsabilidade de França na deportação de judeus
Netanyahu esteve na cerimónia dos 75 anos da “Rafle du Vél’ D’Hiv”, operação em que polícia francesa deteve milhares de judeus que enviaria para Auschwitz (...)

Macron reafirma responsabilidade de França na deportação de judeus
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 Migrantes Pontuação: 9 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Netanyahu esteve na cerimónia dos 75 anos da “Rafle du Vél’ D’Hiv”, operação em que polícia francesa deteve milhares de judeus que enviaria para Auschwitz
TEXTO: Pela primeira vez, um chefe de Governo de Israel participou na evocação da gigantesca rusga de 16 e 17 de Julho de 1942, quando mais de 13 mil judeus franceses, incluindo 4, 115 crianças, foram detidos antes de serem enviados para campos de concentração. A presença polémica de Benjamin Netanyahu foi a grande novidade do 75. º aniversário da operação conhecida como “Rafle du Vél’ D’Hiv”. “Foi a França que organizou o ‘rafle du Vél’ D’Hiv’. Nem um único alemão participou”, afirmou o Presidente francês, Emmanuel Macron, explicando estar na gare de Grenelle de Paris para “que se perpetue o objectivo evidenciado por Jacques Chirac em 1995”. Chirac foi o primeiro chefe de Estado a reconhecer a responsabilidade francesa nas perseguições e na deportação de 42 mil judeus franceses pelo regime de Vichy só em 1942 – destes, apenas 811 regressaram no fim da guerra. O Presidente Macron criticou, sem a nomear, a líder da extrema-direita, pelas recentes “subtilezas” e “palavras de compromisso”. Em Abril, durante a campanha para as eleições presidenciais, Marine Le Pen, presidente da Frente Nacional, disse que “se há responsáveis, são os que na época estavam no poder, não a França, não é a França”. O regime de Vichy, afirmou este domingo Macron, “não era certamente todos os franceses mas era o governo e administração de França”. Enfiados em autocarros, a maioria dos judeus levados das suas casas foram reunidos no velódromo d’Hiver, entretanto demolido. Outros ficaram detidos num campo de internamento nos arredores da capital. Passado uma semana eram levados para campos de detenção em território francês, antes de serem enviados para campos de extermínio, a maioria para Auschwitz. No lugar da antiga pista de ciclismo existe agora a Praça dos Mártires-Judeus-do-Vél’-d’Hiv, onde teve lugar a cerimónia de “comemoração das vítimas dos crimes racistas e anti-semitas do Estado francês e homenagem aos Justos de França”. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. “Estou aqui para chorar as vítimas”, disse o primeiro-ministro de Israel, tratado por “caro Bibi” por Macron, perante uma audiência que incluiu grupos de judeus e sobreviventes do Holocausto. “Há 75 anos, uma escuridão pesada desceu sobre esta cidade… Parece que os valores da revolução francesa – igualdade, fraternidade, liberdade – foram esmagados debaixo do peso do anti-semitismo. ”Várias vozes se ergueram em França contra a participação de Bibi. “A presença de Netanyahu deixa-me um pouco desconfortável”, disse o ex-embaixador de Israel no país, Elie Barnavi. “Esta história não tem nada a ver com Israel”. A União dos Judeus Franceses para a Paz, organização pró-palestiniana, considerou o convite “chocante” e “inaceitável”, mas a mais conhecida associação de grupos de judeus, a CRIF, participou nas cerimónias. Netanyahu, que começou por falar em francês antes de passar ao inglês, descreveu o convite que lhe foi feito por Macron como “um gesto muito, muito forte”, “testemunho da amizade antiga e profunda entre França e Israel”. Depois das cerimónias de evocação das vítimas, os dois dirigentes tiveram o seu primeiro encontro de trabalho.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave guerra campo concentração igualdade deportação
Podemos culpar Sarkozy, Merkel e Cameron pelo clima que provocou atentados de Oslo?
Os atentados terroristas do norueguês Anders Breivik, que mataram 76 pessoas, serão uma chamada à responsabilidade dos líderes europeus que, sobretudo desde os atentados do 11 de Setembro nos Estados Unidos da América, se renderam à retórica anti-imigração e islamófoba dos partidos da Nova Extrema-Direita, em ascensão por toda a Europa? A resposta aproxima-se a passos largos do "sim". (...)

Podemos culpar Sarkozy, Merkel e Cameron pelo clima que provocou atentados de Oslo?
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 Migrantes Pontuação: 9 | Sentimento 0.0
DATA: 2011-07-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: Os atentados terroristas do norueguês Anders Breivik, que mataram 76 pessoas, serão uma chamada à responsabilidade dos líderes europeus que, sobretudo desde os atentados do 11 de Setembro nos Estados Unidos da América, se renderam à retórica anti-imigração e islamófoba dos partidos da Nova Extrema-Direita, em ascensão por toda a Europa? A resposta aproxima-se a passos largos do "sim".
TEXTO: "O discurso da direita conservadora tornou-se mais duro nas questões da identidade nacional e da imigração", disse ao PÚBLICO o politólogo francês Jean-Yves Camus, do Instituto de Relações Internacionais e Estratégicas, especialista em nacionalismos e extremismos na Europa. E isso aconteceu, sublinha, "sem haver relação com a crise [económica e financeira]. Não há extrema-direita a sério em Portugal nem na Irlanda, e a Noruega é rica. "Esta mudança nos discursos dos políticos ditos mainstream, não extremistas, os que participam plenamente no jogo da democracia, "está ligada ao contexto do pós-11 de Setembro de 2001 e à impressão de que a Europa está em guerra contra a imigração e o Islão", sublinha Camus, por e-mail. Nas 1500 páginas do seu manifesto, que são ao mesmo tempo um diário e um manual de instruções para uma revolução que impeça a cultura e a civilização europeias de serem subjugadas pelas cedências dos "marxistas" ao multiculturalismo - uma expressão idêntica a Islão e a imigração, na interpretação de Breivik - encontram-se ideias que soam a loucura, mas também outras que não andam assim tão longe das que temos ouvido na boca dos políticos europeus. Integração e racismoHá muitos exemplos recentes no discurso e na prática política europeia da recusa de aceitar imigrantes, sejam eles muçulmanos ou de uma outra Europa, não reconhecida como a "Ocidental". Se não vejamos: a expulsão dos migrantes romenos de França e a sugestão recente, por Madrid, de que poderia excluir imigrantes romenos do mercado de trabalho espanhol, já a partir de Agosto; os barcos que naufragam no Mediterrâneo carregados de gente como se fossem formigas tragadas pelas ondas, amontoando-se na ilha de Lampedusa, com a Itália a reclamar ajuda da União Europeia e os outros 26 países a tentarem virar-lhe as costas (só na primeira metade deste ano, 25 mil imigrantes provenientes da Tunísia e da Líbia chegaram às costas italianas); a imposição pela Dinamarca de mais controlos fronteiriços nas alfândegas, para manter afastados do país "criminosos da Europa de Leste e migrantes económicos ilegais". Mas há de facto motivos para esta ansiedade em relação à chegada de imigrantes e à perda da identidade europeia, o afogamento da cultura e da civilização europeias pelo Islão que tanto atormentavam Breivik (e não propriamente da perda da identidade norueguesa em si)?"A globalização apaga as referências culturais e identitárias de muitos europeus. Vêem chegar muitos imigrantes não europeus, mas há também uma maior mobilidade das pessoas, a mundialização da informação, o sentimento de que o passado era mais estável, mais positivo", diz Jean-Yves Camus. Alana Lentin, socióloga política da Universidade do Sussex (Reino Unido), tem um pensamento mais crítico sobre esta inquietação. Para ela, serve mais como uma forma de exclusão: "A ideia de que existe algo chamado "cultura europeia" que se está a perder é um anátema", responde, por e-mail, esta especialista em estudos do racismo na Europa. "Primeiro, não existe uma cultura comum que una os europeus - algo que pudemos constatar na reacção à crise da dívida soberana, quando a maior parte dos cidadãos demonstraram não sentir que tinham de fazer sacrifícios por outros países", diz. "E depois há toda a retórica que põe a ênfase na integração dos imigrantes. Mas integrar-se em quê, quando nem nós próprios sabemos o que nos une ou nos define?", interroga a investigadora. "Este discurso sobre a integração só serve para mascarar a incapacidade dos políticos para declararem abertamente sentimentos racistas, embora actuem de formas racistas", afirma. Responsabilizar políticos
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave guerra imigração cultura exclusão ajuda racismo ansiedade
Finlandeses decidem hoje se querem virar à direita e mudar clima político no país
As previsões para amanhã apontam para violentas rajadas de vento na Finlândia. É um cenário do FMI (Finish Meteorological Institute), que pode também ser uma metáfora política. A direita nacionalista conseguiu colocar a Europa e a imigração no centro dos debates; quando escolherem hoje o novo parlamento, os finlandeses vão dizer se querem uma mudança drástica no clima nacional. (...)

Finlandeses decidem hoje se querem virar à direita e mudar clima político no país
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 Migrantes Pontuação: 9 | Sentimento 0.142
DATA: 2011-04-17 | Jornal Público
SUMÁRIO: As previsões para amanhã apontam para violentas rajadas de vento na Finlândia. É um cenário do FMI (Finish Meteorological Institute), que pode também ser uma metáfora política. A direita nacionalista conseguiu colocar a Europa e a imigração no centro dos debates; quando escolherem hoje o novo parlamento, os finlandeses vão dizer se querem uma mudança drástica no clima nacional.
TEXTO: Se as sondagens estiverem certas, o partido Verdadeiros Finlandeses irá quase quadruplicar o seu número de deputados (agora tem seis). Pode não bastar para fazer sombra à Coligação Nacional, que lidera as intenções dos eleitores - embora os 21, 2 por cento previstos sejam insuficientes para governar sem alianças. Mas também é possível que os resultados dos nacionalistas sejam de tal forma expressivos que obriguem a que os seus temas sejam incluídos nas preocupações do próximo Governo. Especialmente se vier a integrar o executivo. A Coligação Nacional, membro da actual aliança no poder chefiada pelo Partido do Centro (que deverá tornar-se na segunda força do país, com 18 por cento), é um partido de centro-direita que apoia tanto a imigração como a União Europeia e os planos de ajuda financeira aos países da zona euro em dificuldades. Jyrki Katainen, líder da Coligação e actual ministro das Finanças, foi obrigado várias vezes a defender os resgates financeiros como fonte de estabilidade do euro. Mas a firme contestação do Verdadeiros Finlandeses - e do Partido Social Democrata, de centro-esquerda - levou a que tema ocupasse uma grande parte da campanha. E fez temer que o pacote de auxílio a Portugal estivesse em risco, uma vez que o Parlamento finlandês pode chumbar a verba que caberá a Helsínquia transferir. Para Kaisa Korhonen, investigadora do Instituto Finlandês de Relações Internacionais (FIIA), o apoio ao radicalismo dos Verdadeiros Finlandeses explica-se com "factores que se aplicam a toda a Europa", diz ao PÚBLICO por email. "Os partidos políticos no centro, direita ou esquerda não têm conseguido atrair o eleitorado com novos programas económicos e soluções sociais que pareçam suficientemente eficazes para garantir o bem-estar de todos os cidadãos". Pelo contrário, adianta Korhonen, "cada vez mais eleitores sentem que os políticos estão desligados da realidade onde vivem. Nesta situação, líderes carismáticos e terra-a-terra, que dão respostas simples e a impressão de que estão realmente a escutar as pessoas, roubam mais facilmente votos aos partidos tradicionais - e atraem aqueles que antes não votavam". Parece ser este o caso do líder do Verdadeiros Finlandeses. Timo Soini deverá conseguir catapultar o partido, que chegou a estar em segundo lugar nas intenções de voto para as eleições de hoje. Mas defende uma política económica de esquerda, ressalva a investigadora. "O seu discurso económico é anti-elitista e contra o laissez faire liberal. Consequentemente, a igualdade social não é totalmente rejeitada, mas é fortemente apertada para incluir apenas "finlandeses". Ainda assim, o líder não quer que o partido seja descrito como racista". As preocupações da extrema-direita com a imigração podem ser difíceis de compreender atendendo ao facto de que representa apenas 3, 1 por cento da população de 5 milhões. "Nós temos realmente falta de imigrantes para tomar conta da nossa sociedade", comentou à AFP o ainda ministro da Habitação e membro da Coligação, Jan Vapaavuori. "Finlandeses primeiro"Mas a questão teve particular destaque porque, "no contexto nórdico, o desmantelamento dos Estados-providência, com apoio social generoso, causa preocupação", adianta Kaisa Korhonen. "À medida que aumentam os fossos salariais, aumenta também a sensação de insegurança. Que, por sua vez, leva a procurar alguém a quem atribuir as culpas e, por menos lógico que pareça, esse alguém são os "outros", os imigrantes". O slogan do partido nacionalista tem sido, precisamente, "finlandeses primeiro". Muitos no país ter-se-ão identificado com ele. "Uma fatia cada vez maior do eleitorado começou a aceitar que a solidariedade é limitada apenas aos "finlandeses" porque estão preocupados com a forma como o país está a evoluir e acham que os partidos políticos tradicionais não estão a fazer o suficiente para a corrigir", explica ainda a analista.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave imigração ajuda social igualdade racista
14 imigrantes morreram na Macedónia a tentar chegar à União Europeia
Afegãos e somalis foram esmagados por um comboio durante a viagem para alcançar a Hungria através da rota dos Balcãs. (...)

14 imigrantes morreram na Macedónia a tentar chegar à União Europeia
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 Migrantes Pontuação: 7 | Sentimento 0.0
DATA: 2015-05-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: Afegãos e somalis foram esmagados por um comboio durante a viagem para alcançar a Hungria através da rota dos Balcãs.
TEXTO: Pelo menos 14 migrantes do Afeganistão e da Somália morreram esmagados por um comboio na Macedónia quando tentavam entrar na União Europeia através da rota dos Balcãs, por onde dezenas de milhares de cidadãos de países como o Afeganistão e a Síria tentam chegar à Europa por terra, através das fronteiras da Turquia com a Bulgária e a Grécia. Para além das travessias do Mediterrâneo a partir do Norte de África, cada vez mais pessoas em fuga da guerra, da pobreza e de regimes repressivos em África e na Ásia tentam entrar na Europa pelo Leste – um caminho mais longo mas considerado menos perigoso do que a travessia do Mediterrâneo. Muitos fazem uma curta mas ainda assim perigosa travessia de barco entre a Turquia e as ilhas gregas, de onde tentam depois continuar de barco até Itália ou a pé através da Macedónia. Depois de chegarem à Macedónia, tentam passar a Sérvia para chegar à Hungria, que já faz parte da União Europeia. Não há certezas quanto às nacionalidades das 14 pessoas que morreram na noite de quinta-feira, por volta das 22h30 (hora local, 21h30 em Portugal continental), mas outros migrantes disseram às autoridades da Macedónia que entre as vítimas há cidadãos do Afeganistão e da Somália. O acidente ocorreu nas proximidades de Veles, uma cidade no centro da Macedónia com cerca de 45. 000 habitantes. O porta-voz da polícia, Ivo Kotevski, disse à agência Associated Press que os migrantes faziam parte de um grupo maior, com cerca de 30 a 40 pessoas – oito deles escaparam ilesos e ficaram à espera das equipas de socorro, e os restantes terão fugido do local. Os oito que ficaram para trás foram levados para Veles, para serem ouvidos pelo Ministério Público. "O maquinista viu um grupo com dezenas de pessoas em cima da linha e tentou travar o comboio e accionou a sirene. Alguns conseguiram sair a tempo, mas não foi possível parar o comboio. Os que ficaram foram atingidos e atropelados", disse um representante do Ministério Público da Macedónia citado pela agência Reuters. O comboio que atingiu os migrantes fazia uma ligação internacional entre a cidade grega de Salónica e a capital da Sérvia, Belgrado. Os migrantes percorrem esta linha porque é precisamente essa a rota que fazem para tentarem chegar à Hungria, e porque é dessa forma que conseguem mais facilmente escapar à polícia. Nos últimos dois meses do ano passado, outros seis migrantes morreram em acidentes semelhantes na Macedónia. A maioria das pessoas que tentam chegar aos países da Europa Ocidental através da rota dos Balcãs é originária da própria região, principalmente do Kosovo. Segundo os dados da agência europeia Frontex, desde o início do ano foram identificadas nesta rota 32. 421 pessoas – 22. 606 kosovares, 3963 afegãos e 2742 sírios. "Ao contrário de outros cidadãos dos Balcãs ocidentais, os nacionais do Kosovo não foram abrangidos pelo regime de isenção de vistos para a entrada na União Europeia, e por essa razão optaram por entrar ilegalmente na Hungria, onde pediram asilo", lê-se no site da Frontex. A Sérvia autoriza a entrada de viajantes com passaportes emitidos pelo Kosovo desde 2012, apesar de não reconhecer este país como independente. Após apanharem um autocarro para Belgrado, os kosovares tomam outro para Subotica, junto à fronteira com a Hungria, onde pedem asilo, com o objectivo final de partirem para a Alemanha ou para a Áustria. Mas a grande maioria destes pedidos de asilo está a ser recusada. O número de pessoas que tentam entrar na União Europeia através desta rota tem aumentado de forma significativa desde 2010 – de 2370 nesse ano, para 4. 650 em 2011, 6. 390 em 2012, 19. 950 em 2013 e 43. 360 no ano passado.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave guerra pobreza
Um herói sem documentos: imigrante salvou criança e vai receber nacionalidade francesa
O jovem de 22 anos de origem maliana não hesitou e salvou uma criança de uma possível queda de um quarto andar. Agora, é o próprio Emmanuel Macron que lhe garante a naturalização. (...)

Um herói sem documentos: imigrante salvou criança e vai receber nacionalidade francesa
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 Migrantes Pontuação: 7 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-05-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: O jovem de 22 anos de origem maliana não hesitou e salvou uma criança de uma possível queda de um quarto andar. Agora, é o próprio Emmanuel Macron que lhe garante a naturalização.
TEXTO: Saiu do Mali em 2013 e chegou a França há alguns meses, sem documentos. Quando viu uma criança em apuros, na iminência de cair de uma varanda no quarto andar de um prédio no 18. º bairro de Paris, Mamoudou Gassama não hesitou: escalou o prédio e salvou-a. Pela sua coragem, foi recebido por Emmanuel Macron no Palácio do Eliseu que lhe gabou a valentia. "Todos os papéis vão ser regularizados", assegurou Emmanuel Macron, no rescaldo do encontro com Gassama, no Palácio do Eliseu, cita o jornal Le Parisien. O Presidente francês propôs também que fosse posta em marcha a naturalização, que o jovem de 22 anos aceitou, conta o Le Monde. Tudo aconteceu no sábado passado, pelas 20h, de acordo com os bombeiros parisienses, e está documentado num vídeo que se tornou viral nas redes sociais. Mamoudou Gassama, jovem maliano de 22 anos, não pensou duas vezes quando viu a criança a balançar de uma varanda: “Não pensei, salvei-o”, contou o próprio à televisão francesa BFMTV. “Consegui alcançar a varanda e, graças a Deus, salvá-lo. ”Quando os bombeiros parisienses chegaram ao local, o menino, de quatro anos, já estava a salvo. “Por sorte, alguém fisicamente apto teve a coragem de salvar a criança”, disse um porta-voz dos bombeiros à agência AFP. Os dois foram levados para o hospital na sequência do salvamento. “O homem queixava-se do joelho e a criança estava em estado de choque”, indicaram os bombeiros ao Le Monde. Os pais não estariam em casa no momento do incidente. O pai acabou por ser detido por incumprimento de obrigação parental. A mãe não se encontra no país. A criança está actualmente ao cuidado de uma instituição de acolhimento. A coragem valeu a Mamoudou Gassama a alcunha de “Homem-aranha do 18. º” em referência ao bairro onde aconteceu o salvamento (também conhecido como Butte-Montmartre) e o agradecimento de várias figuras políticas francesas. Emmanuel Macron agradeceu-lhe pessoalmente, nesta segunda-feira, no Palácio do Eliseu. O “Homem-aranha do 18. º” vai receber ainda uma medalha de ouro pelo acto de coragem e um certificado assinado pelo chefe da polícia parisiense. O jovem de 22 anos vai ainda integrar os bombeiros-sapadores de Paris. Depois de ser recebido no Eliseu, Gassama dirigiu-se a Montreuil, uma comuna nos subúrbios de Paris onde vive desde que chegou a França, e foi anunciado que se tornaria “cidadão de honra da cidade de Montreuil”, escreve o Le Parisien. A presidente da Câmara de Paris, Anne Hidalgo, escreveu no Twitter que lhe ligou a agradecer o acto. No tweet que escreveu, elogiou a coragem do homem. “Ele contou-me que chegou há alguns meses do Mali e que sonha fazer vida aqui. Respondi-lhe que o seu acto heróico foi um exemplo para todos os cidadãos e que a cidade de Paris está obviamente disponível para o apoiar nos seus esforços de se estabelecer em França”, lê-se no tweet. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. O porta-voz do Governo francês, Benjamin Griveaux, escreveu no domingo, no Twitter: “Este acto de uma imensa bravura, fiel aos valores de solidariedade da nossa República, deve abrir-lhe as portas na nossa comunidade nacional”. “Mamoudou Gassama lembra-nos que as pessoas em situação irregular são seres humanos, com (…) imensa coragem, da qual fazem prova durante a perigosa viagem com destino à Europa”, sublinhou por seu lado a organização SOS Racismo. “Uma coragem que continuam frequentemente a manifestar aqui [França]”, realçou a organização, antes de solicitar “ao ministro do Interior para regularizar a situação do senhor Gassama”.
REFERÊNCIAS:
Lista definitiva da Coreia do Sul com dez jogadores emigrantes
O selecionador de futebol da Coreia do Sul, Huh Jung-moo, divulgou hoje a lista definitiva de 23 convocados para o Mundial 2010, na qual se incluem dez jogadores que alinham em ligas estrangeiras. (...)

Lista definitiva da Coreia do Sul com dez jogadores emigrantes
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 Migrantes Pontuação: 7 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-06-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: O selecionador de futebol da Coreia do Sul, Huh Jung-moo, divulgou hoje a lista definitiva de 23 convocados para o Mundial 2010, na qual se incluem dez jogadores que alinham em ligas estrangeiras.
TEXTO: Os médios Koo Já-cheol, do Jeju United, e Shin Hyung-min, do Pohang Steelers, bem como o avançado Lee Keun-ho, do Jubilo Iwata (Japão), foram excluídos da lista provisória. Antes da divulgação da lista, Kwak Tae-hwi, do Kioto Sanga, do Japão, foi substituído por Kang Min-soo, do Suwon Samsung, devido a lesão. A seleção sul-coreana está a estagiar na Áustria desde a semana passada, onde a 4 de Junho disputa um particular com a Espanha, um dia antes de viajar para a África do Sul. Os sul-coreanos estão integrados no grupo B do Mundial 2010, juntamente com a Argentina, a Grécia e a Nigéria. A Coreia do Sul ocupa o 47º lugar do "ranking" da FIFA. Em 2002, no Mundial que organizou conjuntamente com o Japão, alcançou as meias-finais. Lista definitiva dos 23 jogadores:- Guarda-redes: Lee Woon-jae (Suwon), Kim Young-kwang (Ulsan) e Jung Sung-ryong (Seongnam). - Defesas: Lee Young-pyo (Al Hilal, Ara), Kim Dong-jin (Ulsan), Cho Yong-Hyung (Jeju United), Kim Hyung-il (Pohang), Lee Jung-soo (Kashimam, Jap), Kang Min-soo (Suwon), Cha Du-ri (Friburgo, Ale) e Oh Beom-seok (Ulsan). - Médios: Park Ji-sung (Manchester United, Ing), Lee Chung-yong (Bolton, Ing), Ki Sung-yong (Celtic, Esc), Kim Jung-woo (Gwangju), Kim Nam-il (Tomsk, Rus), Kim Jae-sung (Pohang) e Kim Bo-kyung (Oita, Jap). - Avançados: Park Chu-young (Mónaco, Fra), Ahn Jung-hwan (Dalian, Chn), Yeom Ki-hun (Suwon), Lee Dong-gook (Jeonbuk) e Lee Seung-ryul (FC Seul).
REFERÊNCIAS:
Tempo Junho