Um guia para o star-system português
Dantes, o sonho dos pais era que os filhos fossem doutores. Hoje querem que sejam famosos. É um mundo de ilusões, esse em que Renato Seabra e muitos jovens entram todos os dias. (...)

Um guia para o star-system português
MINORIA(S): Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2011-01-23 | Jornal Público
SUMÁRIO: Dantes, o sonho dos pais era que os filhos fossem doutores. Hoje querem que sejam famosos. É um mundo de ilusões, esse em que Renato Seabra e muitos jovens entram todos os dias.
TEXTO: Mal se entra no Fábulas, um dos cafés da moda no Chiado, é fácil reconhecer Elizaveta, mesmo sem nunca a ter visto antes: ela é modelo. Alta, magra e loira, tem, porém, outra característica que a torna inconfundível: a confiança no olhar. E, no entanto, Elizaveta Egorova, de 22 anos ("estou muito velha", diz ela), suspira de cansaço, porque terminou agora um trabalho de oito horas seguidas - uma sessão fotográfica intensa, extenuante e não-remunerada. A agência de modelos em que se inscreveu, a Just, pediu-lhe em cima da hora para fazer o trabalho. Só depois Elizaveta percebeu que era de graça. Mas acha natural, porque todos ficam a ganhar - a agência fez um favor a um cliente e ela ganhou mais umas fotografias para o seu book. "Se conseguir ter muitas fotografias bonitas, vou facilmente arranjar outros trabalhos. Moda, publicidade, festas. Não me importo de experimentar tudo. Tenho curiosidade, e preciso de ganhar dinheiro. "Elizaveta é russa, mas já aprendeu as regras do estranho star-system português: é preciso trabalhar sem ganhar, para depois se ser pago por actividades que não são trabalho. Por exemplo, as festas. São as chamadas "presenças", em que o modelo recebe um cachet para simplesmente estar lá. Noutra época, dir-se-ia depreciativamente que estava a "fazer ofício de corpo presente", por analogia com o defunto na missa por sua alma. Hoje, esse papel é quase sinónimo de estar vivo. "Não me importaria nada", diz Elizaveta, "de estar três horas por dia numa festa, para ganhar a vida". Há decerto empregos piores. Mas as festas rendem de maneiras diferentes, para os diversos personagens do sistema. Porque é de um sistema que se trata, bem organizado, com regras claras e eficácia comprovada. As festas são uma componente importante, a placa giratória onde tudo se joga. Depois articulam-se com as revistas cor-de-rosa, os programas de televisão, as agências de modelos, a Moda Lisboa e o Portugal Fashion. Há um percurso a trilhar e dificilmente se saltam etapas. É preciso estar numa festa, para se ser fotografado e aparecer numa revista. A seguir é-se contratado por uma agência de modelos e, por fim, chega-se à televisão. O sonho supremo já não é a moda, mas sim a televisão e, nesta, ser actor. Não por amor às artes performativas, mas para estar na televisão, que, por sua vez, não é um objectivo profissional, mas um veículo, um veículo para a fama. Esta é verdadeira ambição: ser famoso. E como se consegue? Eis um guia prático. "Bichos" e "bichas""Há três situações, três maneiras de se chegar à fama", explica Duarte Menezes, que é cabeleireiro e conhece a fundo os meandros do mundo das celebridades em Portugal. "A primeira situação é: uma cara bonita, um bocadinho loura, que apareça numa festa com as mamas à mostra. Durante meses só se fala dela. " Não falha. Mas é difícil. Tem de se saber jogar. É preciso ser-se convidado para as festas. Há duas maneiras: ou se cai nas boas graças de um relações-públicas (RP), ou se é amigo ou amante de alguém que nos leve. Os RP são peças-chave. São eles que organizam as festas e distribuem os convites. Elaboram as guests lists, das quais é fundamental constar. A partir daí, o caminho para a fama está aberto. E quem são esses RP? Poucos. Uma dezena, segundo Duarte Menezes. "Digo-lhe já os nomes deles: é a Maya, a Helga Barroso, a Marta Aragão Pinto, a Marta Wahnon. . . " Eles é que mandam. Decidem quem vai e quem não vai às festas, que podem ser a inauguração de uma loja, o aniversário de uma discoteca, a antestreia de um filme. O motivo pouco importa: é uma festa e é preciso estar lá.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave corpo
“Usem protector solar”, é o conselho de António Costa a ciclistas nus
Está agendado para este domingo. Mas a PSP pode entender que atenta contra a moral. A manifestação “Pedala o mais nu que conseguires” juntará ciclistas com pouca ou nenhuma roupa, em prol do ambiente e da utilização de meios de transporte não poluentes. (...)

“Usem protector solar”, é o conselho de António Costa a ciclistas nus
MINORIA(S): Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2011-06-26 | Jornal Público
SUMÁRIO: Está agendado para este domingo. Mas a PSP pode entender que atenta contra a moral. A manifestação “Pedala o mais nu que conseguires” juntará ciclistas com pouca ou nenhuma roupa, em prol do ambiente e da utilização de meios de transporte não poluentes.
TEXTO: O Governou Civil de Lisboa autorizou. O presidente da câmara, António Costa, limita-se a dizer: “O único conselho que daria [aos ciclistas] é que, com este sol, usem protector solar. ”Em declarações aos jornalistas no Arraial Pride, no Terreiro do Paço, em Lisboa, António Costa não quis pronunciar-se sobre se a marcha dos ciclistas sem roupa deve acontecer ou não, uma vez que a autorização da iniciativa é do Governo Civil de Lisboa, sublinhou. Mas o Governo Civil já fez saber que “será a autoridade policial a avaliar, no local e no momento da realização do desfile, se a iniciativa e a forma como a mesma será desenvolvida” incluem “actos contrários à moral, que determinem a interrupção da mesma”. A legislação que regula esta matéria diz que o desfile só poderá ser interrompido se se verificar a “prática de actos contrários à lei ou à moral ou que perturbem grave e efectivamente a ordem e a tranquilidade públicas”. Quanto ao naturismo, a lei diz que os espaços para a sua prática - como praias, piscinas e ginásios - carecem de autorização das “assembleias municipais”. Os participantes da World Naked Bike Ride vão reunir-se às 15h30 no Parque Eduardo VII. Uma hora depois o grupo de ciclistas em pelota segue em direcção a Belém, numa iniciativa semelhante àquela que se realiza anualmente em cidades como Madrid, Londres e Amesterdão, México ou Bruxelas.
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Palavras-chave lei
PSD faz diagnóstico da situação do país à troika
O PSD não apresentará medidas para ajudar a resolver a situação financeira do país no encontro desta manhã entre elementos da Comissão Europeia, do Banco Central Europeu e do Fundo Monetário Internacional com representantes do partido. Pedro Passos Coelho indica que o PSD se limitará a fazer um “diagnóstico da situação e a apresentar algumas linhas de força para o futuro”. (...)

PSD faz diagnóstico da situação do país à troika
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DATA: 2011-04-19 | Jornal Público
SUMÁRIO: O PSD não apresentará medidas para ajudar a resolver a situação financeira do país no encontro desta manhã entre elementos da Comissão Europeia, do Banco Central Europeu e do Fundo Monetário Internacional com representantes do partido. Pedro Passos Coelho indica que o PSD se limitará a fazer um “diagnóstico da situação e a apresentar algumas linhas de força para o futuro”.
TEXTO: O líder do PSD, que falava no início do Fórum da TSF de hoje, disse esperar que a troika possa “ajudar Portugal numa altura em que o país ficou sem condições financeiras para assegurar as suas obrigações internas e externas”. Mas para Passos Coelho o futuro Executivo terá que tornar proveitosa essa ajuda. “Espero que o Governo que sair das eleições possa aproveitar esta oportunidade para tirar o país desta recessão e abrir uma perspectiva de crescimento e oportunidade para o país”, sublinhou. No encontro que o PSD teve esta manhã com a troika, e no qual se fez representar pelos economistas Eduardo Catroga, que já este ano negociou com o Governo o Orçamento do Estado, Abel Mateus e Carlos Moedas, o sociais-democratas limitaram-se a fazer “um diagnóstico da situação e apresentar algumas linhas de força para o futuro”. “Nesta fase ainda não apresentaremos medidas”, indicou Passos Coelho, explicando que a própria troika só “na próxima semana terá medidas mais concretas e que serão inscritas no programa de ajustamento macroeconómico”. Para já, o dirigente do PSD defende que é obrigatório assegurar a transparência. “Não podemos mascarar as contas. Há um conjunto de esqueletos que tem que sair do armário e ficar em cima da mesa. Temos de partir de um diagnóstico sério e realista” para discutir a ajuda externa, elaborou no arranque do Fórum da TSF. PSD não vai bloquear ajudaPassos Coelho reafirmou que “o país está sob uma necessidade de emergência absoluta” e que “Portugal deveria ter pedido ajuda há mais tempo”. “O PSD não vai bloquear esta ajuda mas não deixará de transmitir a sua opinião. A austeridade vai ter que continuar mas não pode ser para as pessoas mas sim para o Estado, que precisa de emagrecer. Temos que apostar na economia e no emprego”, continuou. O presidente dos sociais-democratas disse ainda que uma ajuda intercalar “teria sido o mais desejável” para o país, uma vez que o quadro da ajuda externa será cumprido pelo próximo Governo. “Sabemos que isso hoje não é possivel”, reconheceu Passos Coelho, defendendo que o Governo que sair das eleições legislativas antecipadas de 5 de Junho deveria ter “a possibilidade” de definir como são cumpridos os objectivos da ajuda externa em 2012 e 2013. Questionado sobre se José Sócrates já respondeu às questões colocadas pelo PSD sobre a receita a despesa do Estado, Passos Coelho indicou que até às 09h de hoje ainda não tinha sido obtida qualquer resposta. Passos admite um valor limite para reformas pagas pelo EstadoQuestionado por um ouvinte durante o Fórum TSF sobre se iria acabar com “reformas milionárias” se fosse eleito primeiro-ministro, Passos Coelho referiu que “há muitas pessoas em Portugal que auferem reformas desproporcionadas aos descontos que fizeram no passado”. Depois, recordou que o seu partido defendeu no passado “uma limitação maior ainda para as reformas mais elevadas”, o que, sublinhou, não recebeu o acordo do PS. Admitiu que o anterior Governo socialista (2005-2009) realizou uma reforma da segurança social “incompleta”, apesar de ter apontado no sentido “correcto”. “Em segundo lugar, sempre defendemos que devesse existir uma reforma maior, mais ampla, das reformas, no sentido em que o Estado não pudesse assegurar a ninguém uma reforma superior a determinado valor”, afirmou Pedro Passos Coelho, dando depois o exemplo da Espanha, onde, referiu, esse limite é de “2. 500 euros”. “Significa isto o plafonamento, o que significa que as pessoas não fazem descontos para ter reformas superiores a esse valor. Julgo que, no futuro, vamos ter de encontrar uma solução parecida com esta”, acrescentou. Última actualização às 13h52
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Ministra da Saúde defende necessidade da Igreja “esclarecer a sua posição” sobre o preservativo
A ministra da Saúde, Ana Jorge, defendeu hoje, no âmbito do Dia Mundial de Luta contra a Sida, a necessidade de a Igreja Católica “esclarecer a sua posição” quanto ao uso do preservativo, essencial para evitar a transmissão. (...)

Ministra da Saúde defende necessidade da Igreja “esclarecer a sua posição” sobre o preservativo
MINORIA(S): Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-12-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: A ministra da Saúde, Ana Jorge, defendeu hoje, no âmbito do Dia Mundial de Luta contra a Sida, a necessidade de a Igreja Católica “esclarecer a sua posição” quanto ao uso do preservativo, essencial para evitar a transmissão.
TEXTO: “Neste dia mundial, era importante que a Igreja esclarecesse qual a sua posição”, disse Ana Jorge, na apresentação do livro “Crónicas de um vírus”, lançado pela associação Abraço, em Lisboa. A governante disse fazer “todo o sentido” que “todas as pessoas que são marcantes numa sociedade, como o líder da Igreja Católica, ” abordem o assunto. “Para isso é que se fazem estes dias, para chamar a atenção, para que pessoas que são imagens públicas possam alertar a comunidade em geral para este problema”, afirmou, sublinhando que uma posição esclarecedora do Papa é uma “ajuda grande” na luta contra a sida. Num livro de entrevistas publicado em Itália no mês passado, Bento XVI admitiu que o preservativo possa ser utilizado em determinadas situações como forma de combate à propagação do vírus da sida. No livro ("Luz do Mundo"), o Sumo Pontífice mantém que não considera o preservativo "uma solução verdadeira e moral", mas admite a sua utilização em casos concretos: "Num ou noutro caso, embora seja utilizado para diminuir o risco de contágio, o preservativo pode ser um primeiro passo na direcção de uma sexualidade vivida de outro modo, mais humana. " Na sequência das reacções às palavras do Papa, o porta-voz do Vaticano, Frederico Lombardi, salientou posteriormente que Bento XVI “não quis tomar posição sobre a questão do uso do preservativo em geral”, mas antes “sublinhar que o problema da sida não pode ser resolvido através da distribuição de preservativos”. Lombardi reconheceu, no entanto, que apesar de outros teólogos e eclesiásticos terem já defendido posições semelhantes, “até agora nunca tínhamos ouvido isto com tanta clareza vindo da boca de um Papa, ainda que de forma informal e não oficial”. Ana Jorge defende reforço da prevençãoOntem, confrontada com declarações da presidente da Abraço, Margarida Martins, segundo a qual a associação recebe cada vez mais pessoas infectadas, a ministra da Saúde declarou que “os números podem ser sempre trabalhados de forma diferente”. Segundo Ana Jorge, embora o número de novos casos esteja a descer, essa evolução não significa “que os que existam não possam procurar mais ajuda”. Para a ministra, os dois grandes desafios no combate à doença são continuar a reforçar a prevenção e os cuidados a ter pelos cidadãos, já que, como as terapêuticas são mais eficazes e se morre menos de sida, “perdeu-se o medo do contágio”. Por outro lado, apontou, há que apostar no diagnóstico precoce, simples e possível de realizar em muitos locais. As vendas do livro “Crónicas de um Vírus”, sobre o aparecimento e a evolução do VIH/Sida entre 1930 e 2010, revertem a favor das crianças apoiadas pela Abraço.
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Palavras-chave ajuda comunidade doença medo sexualidade
Napoleão Os mistérios de um tumor imperial
Qual foi a causa da morte de Napoleão? De Marilyn Monroe? De Beethoven? Ou de Ötzi, o homem do gelo? O PÚBLICO arranca hoje com a publicação de uma série de seis autópsias célebres que procuram descortinar o que provocou a morte de personalidades e figuras históricasDezassete pessoas, entre as quais oito médicos presentes na autópsia, na ilha britânica de Santa Helena; nada menos do que cinco relatórios desse exame post mortem; inúmeros trabalhos científicos, artigos, obras. . . e continuamos sem certezas sobre as causas da morte de Napoleão I. Quase duzentos anos após a sua morte, a 5 de Maio de 1821, aos 51 ano... (etc.)

Napoleão Os mistérios de um tumor imperial
MINORIA(S): Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2015-05-01 | Jornal Público
TEXTO: Qual foi a causa da morte de Napoleão? De Marilyn Monroe? De Beethoven? Ou de Ötzi, o homem do gelo? O PÚBLICO arranca hoje com a publicação de uma série de seis autópsias célebres que procuram descortinar o que provocou a morte de personalidades e figuras históricasDezassete pessoas, entre as quais oito médicos presentes na autópsia, na ilha britânica de Santa Helena; nada menos do que cinco relatórios desse exame post mortem; inúmeros trabalhos científicos, artigos, obras. . . e continuamos sem certezas sobre as causas da morte de Napoleão I. Quase duzentos anos após a sua morte, a 5 de Maio de 1821, aos 51 anos, o dossier médico do imperador continua a suscitar debates apaixonados entre os historiadores, os médicos e os investigadores. Tuberculoso, sífilis do estômago, epilepsia, úlcera ou cancro do estômago, ou mesmo envenenamento com arsénico. . . Ao longo de dois séculos, "a partir do relatório da autópsia, das Memórias das testemunhas e de outros elementos mais ou menos estabelecidos pela documentação, um número incalculável de hipóteses foi expresso quanto às causas da morte de Napoleão", escrevem os historiadores Thierry Lentz e Jacques Macé em A Morte de Napoleão (Perrin, 2012). Estes últimos desmontam a tese do "envenenamento", surgida nos anos 1960, na sequência de análises feitas aos cabelos do imperador. A 6 de Maio de 1821, 20 horas após ter exalado o último suspiro, ao cabo de uma agonia de oito semanas, o corpo de Napoleão passa sob o bisturi de Francesco Antommarchi. O cirurgião corso, um médico legista experimentado, tratara Napoleão nos dois últimos anos de vida deste. Foi o próprio Napoleão quem pediu para ser autopsiado, de forma a que o seu filho, o rei de Roma, seja alertado, no caso de ser detectado um tumor hereditário. No exílio desde 1815, nesta pequena ilha vulcânica no meio do Atlântico Sul que é Santa Helena, o imperador, que se queixava frequentemente de dores no aparelho digestivo, vivia obcecado com a hipótese de um mal de família. O seu pai morrera com menos de 40 anos, vítima de um "esquirro" (um tumor) do piloro. O primeiro relatório de Antommarchi, com data de 8 de Maio, é relativamente curto e consiste em 16 pontos. O seu conteúdo e o dos restantes relatórios são reproduzidos na obra dos médicos Jacques Bastien e Roland Jeandel, Napoleão em Santa Helena, Estudo Crítico das Patologias e das Causas da Sua Morte (Le Publieur, 2005). O coração e os pulmões são considerados em bom estado, o fígado "obstruído e com um tamanho maior do que o natural". Mas o médico legista chama sobretudo a atenção para as inúmeras anomalias a nível gástrico. O estômago "está parcialmente cheio de uma substância líquida escura, com um odor picante e desagradável" (tratava-se de sangue em decomposição) e albergava "uma úlcera cancerosa muito espalhada", com um "buraco" (perfuração) de 6 milímetros de diâmetro. Os outros dois relatórios, escritos nos dias que se seguiram à autópsia - um assinado pelos cinco médicos ingleses, o outro pelo adjunto do governador de Santa Helena -, concordam, com excepção de algumas nuances, com o de Antommarchi. Observação a olho nuNessa época, os diagnósticos dependiam do exame macroscópico, ou seja, a observação, a olho nu, dos tecidos. A anatomopotologia (análise ao microscópio), que permite definir com segurança a natureza das lesões, só se desenvolveu algumas décadas mais tarde. No caso de Napoleão, a missa parece estar encomendada: foi uma doença do estômago, ainda que seja impossível ter a certeza se se tratou de um cancro ou de uma úlcera. Mas dois relatórios redigidos posteriormente dissiparam essa certeza. O primeiro, assinado pelo cirurgião britânico Walter Henry, em 1823, foi o único a descrever um aspecto efeminado do imperador: "O pénis e os testículos eram muito pequenos e o conjunto do aparelho genital parecia explicar a ausência de desejo sexual e a castidade que, diz-se, teria caracterizado o defunto", acrescenta. Pura invenção de um inglês para ridicularizar post mortem um inimigo vencido ou realidade escondida, por pudor, pelos outros médicos? Esses traços femininos, que, ao que parece, divertiam o próprio Napoleão, permitiram evocar, em determinado momento, a hipótese de a glândula hipofísica do cérebro ter sido atingida. Mas é sobretudo o segundo relatório de Antommarchi, escrito em 1825, quatro anos após a autópsia, nas suas Memórias, que levanta questões. Aparentemente muito mais completo, pormenorizado e literário do que o primeiro, foi frequentemente considerado o documento de referência pelos especialistas. O médico legista faz mesmo uma análise craniológica do seu augusto paciente, deplorando não ter sido autorizado a dissecar o cérebro. O mais perturbador é o aparecimento, neste segundo relatório, de lesões inexistentes no primeiro, ou apresentadas de forma muito diferente. Um pulmão qualificado como normal em 1821 passou a ser tuberculoso; a descrição do estômago e do abdómen é consideravelmente mais rica. Mas há um problema. Ao estudarem de perto a literatura médica dos anos 1820-1825, os médicos Bastien e Jeandel tiveram a surpresa de encontrar um artigo de um colega francês, datado de 1823, que tinha "parágrafos inteiros" que eram idênticos "palavra a palavra" às descrições de Antommarchi, feitas dois anos mais tarde, em 1825. O médico legista de Napoleão era um plagiador e o seu relatório já não pode ser considerado uma referência, concluem Bastien e Jeandel. O estômago do imperadorMas, afinal, quais foram as causas da morte de Napoleão? A maioria dos especialistas afastou a hipótese do envenenamento por arsénico e inclina-se para uma morte natural. Mas permanece dividida quanto às circunstâncias. "Se existe um cancro, estava numa fase inicial e não pode ser visto como causa directa da morte", afirma o dr. Alain Goldcher, autor de Napoleão I, a Última Autópsia (edições SPM, 2012). Foi ao mergulhar durante 30 anos numa multitude de recursos bibliográficos, que dissecou linha a linha, que este apaixonado por Napoleão, generalista de formação, formou a sua certeza. "O que o matou foi uma anemia causada por repetidas hemorragias, cuja causa era uma úlcera no estômago, provavelmente devida a uma síndrome depressiva e a uma infecção antiga por Helicobacter pylon", sintetiza. Anatomopatologista especializado em tumores do aparelho digestivo, conhecedor também da história napoleónica, o professor Alessandro Lugli (Instituto de Patologia da Universidade de Berna) contribuiu para o debate recorrendo a métodos de investigação originais. O médico suíço visitou vários museus e tirou as medidas a 12 pares de calças usados por Napoleão em diferentes períodos da vida deste. A partir das medidas dessas peças de roupa, Alessandro Lugli e os seus colegas concluíram que o peso do imperador aumentou de 67 para 90 quilos entre 1800 e 1820, mas perdeu 11 quilos no seu último ano de vida. Uma perda de peso importante e rápida, "muito coerente com a evolução de um cancro do estômago", consideram, num artigo científico (Human Pathology, 2005). Mais recentemente, ao confrontar os dados estatísticos com os dossiers de mais de cem pacientes vítimas de úlceras benignas de cancro do estômago, Alessandro Lugli, com o apoio de uma equipa internacional, concluiu que Napoleão tinha sido vítima de uma forma rara de cancro ulcerado numa fase avançada. "Uma úlcera, mesmo que não tenha sido tratada, não pode ter este aspecto. O carácter maligno também pode ser verificado pelo exame macroscópico", garante, sublinhando que, hoje em dia, é difícil diagnosticar tumores neste estádio: menos de 50% sobrevivem um ano. O dr. Frederic Maître, anatomopatologista e legista, que saúda a demonstração do seu colega suíço, segue a mesma orientação. O estômago de Napoleão I - tal como o seu coração - está conservado num recipiente que repousa entre as pernas do imperador. Mais é pouco provável que o seu túmulo, que se encontra nos Inválidos desde 1840, venha a ser reaberto para permitir este exame.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave morte filho homem doença estudo sexual corpo pénis
Contrapposto: aos 18 anos, Íris filmou nus para “levantar questões”
Corpos nus, respirações ofegantes e sexo. Numa altura em que corpos nus com mais de 25 mil anos são censurados em nome do politicamente correcto, a curta-metragem Contrapposto, de Íris Souto, quer “levantar questões”. Para isso, mostra nus sem pudor e espelha a sexualidade sem complexos. “Queria que as pessoas saíssem da sala de cinema e se questionassem sobre o filme e sobre a sociedade”, explica ao P3 a realizadora de 18 anos, que quer “obrigar as pessoas a ver o que não estão habituadas” — mas que deveriam estar. É que “se o nu fosse mais aceite, muitos problemas das sociedades actuais resolviam-se”, defende. ... (etc.)

Contrapposto: aos 18 anos, Íris filmou nus para “levantar questões”
MINORIA(S): Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-11-30 | Jornal Público
TEXTO: Corpos nus, respirações ofegantes e sexo. Numa altura em que corpos nus com mais de 25 mil anos são censurados em nome do politicamente correcto, a curta-metragem Contrapposto, de Íris Souto, quer “levantar questões”. Para isso, mostra nus sem pudor e espelha a sexualidade sem complexos. “Queria que as pessoas saíssem da sala de cinema e se questionassem sobre o filme e sobre a sociedade”, explica ao P3 a realizadora de 18 anos, que quer “obrigar as pessoas a ver o que não estão habituadas” — mas que deveriam estar. É que “se o nu fosse mais aceite, muitos problemas das sociedades actuais resolviam-se”, defende. Enquanto toda a gente vê “o corpo de forma muito fechada”, Íris decidiu mostrá-lo sem filtros. O objectivo é “ser incómodo”, sobretudo porque “no cinema o nu ainda gera desconforto”, o que não acontece tanto com a pintura. A realizadora dá o exemplo dos gregos antigos que se serviam da pintura para representar as suas experiências sexuais. “Nas escolas não nos ensinam isso”, crítica Íris, actualmente em Inglaterra a estudar música, depois de três anos na Escola Artística Soares dos Reis. Sobre o futuro, afirma que gostava de conciliar as duas áreas: "O ideal era colocar a minha música nos filmes que produzo. ”O filme vai ser exibido no festival Porto/Post/Doc a 26 de Novembro, no Rivoli, pelas 16h30h, no âmbito de uma parceria com a Escola Artística Soares dos Reis. Por lá também será possível ver Cogumelos Pepperoni de Ana Carolina Silva.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave escola sexo corpo sexualidade
Secretário de Estado pede rápido esclarecimento do caso de Espinho
O secretário de Estado Adjunto e da Educação manifestou hoje esperança num rápido esclarecimento do caso que levou à suspensão de uma professora, em Espinho, acusada de abordar inadequadamente questões relacionadas com sexualidade e a vida privada dos alunos. "O ministério deve deixar às entidades que vão conduzir o inquérito total autonomia e independência", disse Jorge Pedreira, em Lisboa, quando questionado pelos jornalistas à margem de um encontro com a Plataforma Sindical de Professores. O governante apenas acrescentou que o Ministério da Educação aguarda "o rápido esclarecimento do assunto". Também o porta-... (etc.)

Secretário de Estado pede rápido esclarecimento do caso de Espinho
MINORIA(S): Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.333
DATA: 2009-05-20 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20090520180025/http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1381784
TEXTO: O secretário de Estado Adjunto e da Educação manifestou hoje esperança num rápido esclarecimento do caso que levou à suspensão de uma professora, em Espinho, acusada de abordar inadequadamente questões relacionadas com sexualidade e a vida privada dos alunos. "O ministério deve deixar às entidades que vão conduzir o inquérito total autonomia e independência", disse Jorge Pedreira, em Lisboa, quando questionado pelos jornalistas à margem de um encontro com a Plataforma Sindical de Professores. O governante apenas acrescentou que o Ministério da Educação aguarda "o rápido esclarecimento do assunto". Também o porta-voz da Plataforma Sindical, Mário Nogueira, se pronunciou sobre o caso, referindo tratar-se de uma excepção que deve ser acompanhada. "É uma situação de um claro desequilíbrio. Lamento as declarações, as atitudes, mas as condenações - a existirem - têm de ser no âmbito dos processos que estão previstos", disse. Mário Nogueira considerou adequada a medida de suspender a professora, incluindo para a própria docente, enquanto decorrer a averigauação. A professora, que lecciona na Escola EB 2/3 Sá Couto, de Espinho, foi sujeita a "suspensão preventiva" no âmbito de um processo disciplinar. A docente é acusada de abordar inapropriadamente questões sexuais da vida privada dos alunos, numa aula. Esta foi gravada, alegadamente por uma estudante do 7. º ano.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave escola educação sexualidade
A propósito do texto de Maria de Fátima Bonifácio
Equilibrar a recusa da censura com a abertura das nossas páginas a opiniões que não partilhamos é uma tarefa sempre difícil (...)

A propósito do texto de Maria de Fátima Bonifácio
MINORIA(S): Ciganos Pontuação: 6 Homossexuais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 7 | Sentimento 0.0
DATA: 2019-07-10 | Jornal Público
SUMÁRIO: Equilibrar a recusa da censura com a abertura das nossas páginas a opiniões que não partilhamos é uma tarefa sempre difícil
TEXTO: “Indigno”. “Vergonhoso”. “Insultuoso”. Durante este sábado, muitos leitores fizeram questão de protestar contra a publicação do artigo da historiadora Maria de Fátima Bonifácio com o título “Podemos? Não, não podemos”. Vários jornalistas do PÚBLICO e os membros eleitos do Conselho de Redacção juntaram-se a esse protesto, alegando que em causa está uma grave ofensa aos valores matriciais do jornal. O PÚBLICO orgulha-se da sua tradição de estar na linha da frente do combate ao racismo ou a qualquer tipo de discriminação baseada na cor da pele, na sexualidade ou no género. Torna-se por isso imperativo explicar o processo e as razões que levaram à publicação. E dar conta das consequências que esta opção tem de merecer para o futuro. O texto em causa está, no mínimo, nos limites do discurso de ódio, faz generalizações que põem em causa o combate à discriminação racial, usa linguagem insultuosa para diferentes minorias e coloca ênfase numa radical oposição civilizacional entre os “nós” europeus e os “outros”, africanos ou “nómadas”. Estão, por isso em causa, ideias, apologias e valores que o PÚBLICO contraria todos os dias, seja pelo trabalho dos seus jornalistas, seja pela abertura sem reservas que concede aos cidadãos de minorias visadas no artigo. Ainda assim, é consensual a ideia de que o PÚBLICO é um espaço plural de opinião onde com muita frequência se publicam textos que estão longe dos valores que defendemos. No caso em concreto estava em causa um texto de uma intelectual consagrada, cujas teses rejeitamos mas julgámos caberem nos limites da liberdade de expressão. Na nossa interpretação, a proximidade a teses racistas e xenófobas era evidente, mesmo que não se fizesse a defesa da segregação. O recurso ao discurso de ódio, de uns contra outros, estava na fronteira do admissível, mesmo sem que houvesse incitamento à sua prática. O uso destes argumentos para criticar uma intenção legislativa sobre quotas raciais no Parlamento ou no Ensino Superior anunciada por um deputado socialista induziu a apreciação das suas teses sobre ciganos ou africanos como utensílios de suporte a um legítimo protesto político. Não construíam o ângulo essencial do texto, apesar da proliferação de exemplos. Mesmo que essas teses hostilizassem a nossa linha editorial, considerámos que esses termos, ideias e valores eram aceitáveis no quadro da liberdade de expressão que assiste a uma colunista que é colaboradora regular do jornal e intelectual prestigiada na sua área científica. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Subestimámos assim o teor e tom dos argumentos em favor da crítica que a autora faz à possível adopção de quotas raciais. Considerámos que o direito a ofender, aceitável na interpretação genérica que fazemos da liberdade de expressão, justificava a publicação, mesmo sabendo que seria polémica e susceptível de levar muitos dos nossos leitores a questionar a nossa linha editorial ou o grau de tolerância que concedemos a ideias e valores que rejeitamos na nossa prática quotidiana. Reconhecemos que as expressões discriminatórias usadas remeteram a questão das quotas para a irrelevância. Ou seja, cometemos um erro de análise e de avaliação. Defendemos uma liberdade ampla de expressão dos nossos colunistas e de todos os que recorrem ao PÚBLICO para manifestar as suas ideias, visões, propostas ou críticas. Essa é uma marca de água do jornal e assim continuará a ser. Mas as reacções e episódios associados a esta polémica obrigam-nos a reforçar os critérios de exigência e selectividade. Principalmente quando em causa estiverem questões sensíveis como as que se associam à discriminação. Um jornal como o PÚBLICO é um espaço de convivência baseado em valores. A Direcção Editorial tem o dever de proteger esse espaço, evitando que esses valores sejam postos em causa. Lamentavelmente, não foi isso que aconteceu. Se há matéria na qual o PÚBLICO não pode deixar mensagens duvidosas aos seus leitores (e a todos os que o fazem diariamente) é sobre o lugar onde se encontra no combate ao racismo e à xenofobia. Aqui deixamos esta explicação para sublinhar sem margem para dúvidas esse nosso compromisso.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave racismo género sexualidade discriminação xenofobia
Foi você que pediu uma personal trainer do sexo?
Há uma nova profissão em crescimento. As personal trainers sexuais ensinam, ajudam e acompanham uma pessoa na sua vida erótica e amorosa. (...)

Foi você que pediu uma personal trainer do sexo?
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 11 Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Há uma nova profissão em crescimento. As personal trainers sexuais ensinam, ajudam e acompanham uma pessoa na sua vida erótica e amorosa.
TEXTO: Ana senta-se, abraçada às costas da cadeira, e começa a respirar. Tem 36 anos, cabelo louro, botas altas e um vestido vermelho, curto. Inspira com um ruído de sucção, expira com um som de prazer. Após três ciclos respiratórios, entra numa espécie de transe e, quando ouve o som da minha própria respiração, desata a chorar. Isto é o consultório de Cristina Mira Santos (casadevaluna. blogspot. pt), 42 anos, psicóloga, terapeuta, personal trainer do sexo. Ana vem regularmente, há quase um ano, a esta sala da Alma Cheia, um centro terapêutico alternativo na Rua dos Douradores, na Baixa de Lisboa. Começou com sessões de conversas, num formato em tudo semelhante a uma consulta de Psicologia, e foi avançando para outros, menos convencionais, modos de tratamento, segundo as indicações de Cristina, embora sempre com a sua própria anuência. As primeiras fases foram úteis para identificar os problemas e criar uma predisposição à cura, mas é no momento de agir, quando é preciso alterar atitudes, provocar uma transformação pessoal, que as ferramentas da psicoterapia clássica revelam os seus limites. É por pensar isto que Cristina decidiu há muito completar a sua formação no Instituto Superior de Psicologia Aplicada (ISPA) com cursos de massagens, ioga, nutricionismo e exercício físico, filosofias orientais e terapias alternativas. Principalmente a formação em Sexualidade Sagrada ministrada por Amala Shakti Devi, uma portuguesa habitante de Marvão chamada Amélia Oliveira, autodesignada “sacerdotisa consagrada ao amor erótico”, “terapêuta holística” e “maga do coração”. Cristina saiu deste curso de “maga curandeira” com o título de Sacerdotisa do Amor Erótico, ou Erotisa, e o nome de Eva Luna, sob o qual exerce hoje a sua actividade de terapeuta. Como psicóloga clínica, continua a ser Cristina Mira Santos, num esforço de não comprometer o nome profissional com práticas menos compreendidas pela comunidade científica. Na realidade, porém, as duas terapeutas são a mesma, e é nisso que reside a sua originalidade e competência específica. Combinando os conhecimentos da psicologia científica com as tradições da meditação oriental e da sexualidade sagrada, saberes dos índios americanos e de gurus como Osho (o indiano Rajneesh Chandra Jain, autor do conceito de “despertar da consciência”), Cristina construiu o que talvez seja um sistema próprio e único de cura, ou talvez de cura de males que a psicologia convencional e a medicina têm dificuldade em diagnosticar. Ana chegou aqui a conselho de uma amiga. Durante anos, não admitiu que tinha problemas. Os relacionamentos eram difíceis, isolava-se, não conseguia construir uma relação amorosa estável, e nos casos de curta duração o sexo era pouco compensador, não se entregava, não conseguia ter orgasmos. Compensou isto com a vida profissional. Dedicou-se intensamente e obteve êxito muito cedo, fundando uma empresa bem-sucedida. Constituiu um grupo de amigos, mas nunca muito próximos, não tinha nada que se parecesse com uma família. Normalmente não sentia falta disso, mas há certos momentos rituais em que a sociedade nos interpela e julga, como o Natal, a passagem de ano ou a Páscoa. Era doloroso estar sozinha nesses dias, sentia-se encurralada e confusa, chorava, mas não contava a ninguém, talvez nem soubesse o que contar. Houve problemas na infância e adolescência, Ana não os esquecera, mas acreditou que estavam ultrapassados. Avançara com a sua vida, tinha independência económica, carro e apartamento, boas roupas. De que se poderia queixar? Não se queixou, até aos 30 anos. Nessa altura começaram as crises. “Dei por mim sozinha na passagem de ano a perguntar a mim própria: ‘Qual é o teu problema? Porque não podes ser feliz como os outros à tua volta? Porque não consegues apaixonar-te? Porque é a tua vida um caos?’ Nessa altura, não aguentei mais. Entreguei os pontos. ”Quando procurou a psicóloga que a amiga recomendara, as queixas que apresentou confinavam-se porém ao universo profissional. Ana queria mudar de vida, deixar a empresa, dedicar-se a outra actividade, mas faltava-lhe coragem e motivação. Foi isto que disse. A sociedade oferece às mulheres a oportunidade de emancipação, mas não um papel em conformidade, na estrutura familiar. “Somos encorajadas a ter uma carreira profissional, mas à custa da família. Se queremos realização, temos de estar sozinhas. A verdade é que isso não chega e que os amigos não substituem uma família. ”Aparentemente opõem-se, o plano social e o íntimo, mas são as duas faces da mesma moeda. Pertencer a um grupo social discriminado será sempre um factor de risco de patologia e isolamento. Nas primeiras consultas, as conversas com Cristina trouxeram à superfície toda uma história de traumas e feridas. “Fui uma filha não desejada”, conta Ana. “A minha mãe não gostava de mim. Proibiu-me de ter namorados. Aos 16 anos, disse-me: “Nenhum homem te vai amar. Eles só te vão querer para despejar os tomates. ’ Desde os meus sete ou oito anos, fui violada pelo meu avô. Só na adolescência percebi que as outras meninas não faziam aquilo. ”Cristina recolhe conhecimentos e técnicas da tradição mística e religiosa para lidar com este tipo de problemas das suas clientes. A sexualidade sagrada, a religião da deusa-mãe fornecem material teórico e terminológico para colocar as mulheres numa posição de poder. Há um manancial de contributos, desde a filosofia do Mindfulness, inspirada no budismo, e que advoga a concentração nas sensações e consciência do momento presente, até às correntes do sex positive, que promove uma sexualidade sem limites, para a visão globalizadora da sexualidade. Cristina construiu um método ecléctico, a que chama “psicoterapia da consciência”, que consiste em “trabalhar a consciência corporal, ligar o corpo à mente, depois ao espírito”. Baseia-se na ideia de que “o corpo grava momentos, de stress, de felicidade, e há certas zonas do corpo em que se fixam esses registos, essas memórias”. Há também contributos da acupunctura, da digiopunctura, da massagem tântrica, da reflexologia, para criar um todo coerente, ou pelo menos convincente, para quem esteja a isso receptivo. Atribuir ao sexo natureza divina pode ser a única forma de afastar os sentimentos de culpa que lhe estão associados nas mentes de muitas pessoas. E o contacto físico com o cliente pode ser a única maneira de o libertar da racionalização a que submete as práticas sexuais, remetendo-o para uma lógica, uma sabedoria, do próprio corpo. As massagens, os abraços, as carícias fazem por isso parte dos tratamentos, bem como certas práticas difíceis de aceitar pela comunidade dos psicólogos e dos médicos, tais como a yoni healing, ou a lingam healing massagem vaginal ou peniana (yoni e lingam são os termos para vagina e pénis em sânscrito). Segundo a reflexologia genital, determinadas zonas na vagina e no pénis correspondem a determinados órgãos do corpo, pelo que o toque nuns pode afectar o funcionamento dos outros. Além disso, os genitais, principalmente a vagina, têm a propriedade de guardar a memória de acontecimentos, de tal forma que a massagem em certas zonas da vulva pode fazer reviver momentos traumáticos, compreendê-los e ajudar a pessoa a ultrapassá-los, pela aceitação e eliminação gradual da dor nesses pontos de registo. Este é um dos tratamentos a que Cristina submete as suas clientes, sempre com o seu consentimento e a sua colaboração. Foi o caso de Ana. “Eu compreendi que isto é uma coisa séria”, explica ela. “É uma actividade bonita, que me levou a conhecer-me a mim própria, a ligar-me ao meu próprio corpo. O sexo é uma coisa sagrada. ”Os tratamentos de Cristina levam frequentemente a uma libertação de emoções, a choro e riso, gritos de dor ou gemidos de prazer. Muitas vezes, as clientes descobrem novos pontos sensitivos no seu corpo e chegam a atingir o orgasmo. Cristina leva-as a isso, ensina-as. “É possível sentir um orgasmo de três horas”, diz ela. E tem consciência de que isto levanta várias questões. Uma delas é a da ética de um psicólogo, cujo protocolo não permite, por exemplo, tocar no corpo dos clientes, muito menos para lhes proporcionar prazer sexual. Outra questão é a eventual coincidência destas práticas com as da prostituição. Se alguém paga para ser estimulado sexualmente até ao orgasmo, o que distingue isto dos serviços de uma prostituta?Cristina não se ofende com a sugestão. “Em muitas sociedades, havia as prostitutas sagradas. Eu não tenho problemas em assumir essa designação. ” De qualquer forma, explica, há uma diferença: aqui, o objectivo não é procurar a satisfação sexual, em si mesma, mas antes aprender a conhecer o seu corpo, e até certas técnicas que poderão ser usadas para obter prazer sexual. O propósito é sempre educar, ajudar, guiar, curar. De certa forma, trata-se de uma nova profissão. Um terapeuta que ajuda a pessoa na sua vida sexual e amorosa. E na vida em geral, se considerarmos que ela é condicionada pelo sexo e o amor. Cristina aceita a designação de personal trainer sexual ou de personal coach sexual. Alguém, que pode ter formação em Psicologia, como é o seu caso, ou noutra área, que ajuda uma pessoa a tratar os seus problemas do foro sexual ou apenas a melhorar a sua vida sexual e relacional, através de ensinamentos, demonstrações, aconselhamento em termos de posições, técnicas, brinquedos ou concepções alternativas do erotismo. Mas sempre em função do caso particular, das características, da história, dos objectivos, expectativas e possibilidades de cada um. Tal como um treinador pessoal, ou coach, no desporto. É uma profissão que se tornou comum nos EUA e vários países europeus desde há pelo menos uma década, com os seus teóricos, os seus debates, as suas correntes. Carmo G. Pereira (carmogepereira. com) está mais próxima da linha do feminismo e dos estudos de género. Tem 32 anos, formação em Comunicação, um mestrado incompleto em Women Studies, frequenta também a pós-graduação em Sexologia e define-se como uma educadora sexual para adultos, consultora sexual e erótica, mas também não rejeita a classificação de personal trainer do sexo. “Não trabalho com patologias”, explica, uma vez que não tem formação clínica. Mas trabalha frequentemente em colaboração com psicólogos, psiquiatras e ginecologistas. Estes profissionais reencaminham para ela alguns dos seus doentes, quando entendem que isso lhes pode ser benéfico. O mesmo se passa com Cristina Mira Santos. “Os médicos e psicólogos têm cada vez mais consciência da necessidade de incorporar as terapias alternativas”, diz Carmo. “No meu caso, trabalho com o constructo social e uso os conceitos do feminismo. ” É a sua forma de devolver às mulheres o controlo sobre a sua própria sexualidade. Leva-as a compreender porque sentem vergonha em relação a certas práticas, a história dos comportamentos, as relações de poder subjacentes aos procedimentos sexuais. Além de consultas pessoais (quase sempre a mulheres, por vezes a casais, tal como sucede com Cristina, uma vez que há menor procura por parte dos homens), Carmo promove workshops de masturbação e de automassagem guiada, aulas de pompoarismo (treino dos músculos vaginais) e sessões de demonstração de vibradores e outros brinquedos sexuais, matéria em que é reconhecida especialista. Nos tratamentos pessoais, inclui as consultas, a massagem tântrica, o yoni healing. Ensina as mulheres a conhecerem o seu próprio corpo, a masturbarem-se, a procurarem outras formas de prazer para além do orgasmo. Considera que a educação sexual dos jovens é deficiente, ou inexistente, eivada de preconceitos e noções erradas. Isso traduz-se numa vida sexual pobre na vida adulta. “A educação sexual é feita com base na pornografia, o que, além de falsear a realidade, leva a frustrações, porque as pessoas comparam-se com o que vêem lá. As mulheres comparam as suas vaginas, os homens a sua performance. ”A masturbação, por exemplo, ainda é reprimida no caso das mulheres. “Surgem-me mulheres de 30, 40, 50 anos que não sabem masturbar-se, têm vergonha de o fazer. Uma não sabia localizar o seu próprio clitoris. ”Carmo ensina as mulheres a masturbarem-se, ou ensina os parceiros a tocarem-nas, e para isso faz demonstrações práticas: toca nas clientes, embora usando luvas de látex para o contacto genital. Para ela, a diferença entre isto e prostituição é que, no seu caso, “se trata de um toque terapêutico, não sexual”. Ainda que os clientes não apresentem qualquer patologia. Trata-se de melhorar o sexo. Não a performance, como pensam muitos dos que a procuram, mas o próprio âmbito e carácter do acto sexual, porque, ao contrário do que se pode objectar, “no sexo, não se nasce ensinado”. É preciso aprender, ainda que seja uma função natural humana, a menos que se assuma apenas a função reprodutiva do sexo. Carmo faz uma comparação: “Se tivermos um piano em casa desde a infância, decerto vamos experimentar tocá-lo, e aprender qualquer coisa. Mas o resultado será bem diferente se aprendermos sozinhos ou se tivermos um bom professor. ”Juliana está de pé, apenas enrolada numa toalha, de frente para Carmo, no gabinete de tratamentos da Ilha dos Amores, uma loja de “produtos românticos” na Rua de S. Bento, em Lisboa. É o início de uma massagem tântrica com yoni healing. O problema de Juliana, 34 anos, fotógrafa, heterossexual, mãe de ter filhos, é “ser demasiado proactiva” no que respeita ao sexo, dissera Carmo. Só dá, não tem capacidade de receber. “Como sou muito difícil de excitar e levar ao orgasmo, prefiro nem sequer tentar, e concentrar-me no prazer do parceiro”, explicara Juliana. O tratamento de hoje é o primeiro de uma série que pretende reverter isto. Juliana tem de aprender a receber. E os motivos profundos da sua incapacidade podem não ser apenas os que expressou. Carmo explicou previamente o que vai passar-se. Antes de se deitar na marquesa, completamente despida, terá de fazer exercícios respiratórios fixando a terapeuta nos olhos. Se não conseguir, pode fechá-los. Juliana não os aguenta abertos mais do que uns segundos. Respira ritmadamente, de mão dada com Carmo, que seleccionou uma música muito suave e acendeu algumas velas. A situação totalmente imposta cobriu Juliana de vulnerabilidade, deixando-lhe no rosto uma expressão incrivelmente triste. Abre e fecha os olhos, lutando com a sua própria angústia. Carmo beija-lhe a mão, deita-a na marquesa, nua, de barriga para cima, segura-lhe os pés. Acaricia-lhe as pernas, as coxas, num toque muito leve. A massagem prossegue, num toque tangencial por todo o corpo, que vai mudando de posição, trémulo e branco, exposto. Carmo cola a palma da sua mão à planta do pé de Juliana e fica assim muito tempo. Depois aproxima o rosto para lhe soprar nas nádegas e costas, enquanto com um dedo lhe toca a vulva. Carmo fecha os olhos, está quase em êxtase, ao contrário de Juliana, cujo corpo não evidencia a mínima reacção, mesmo durante a longa massagem da vulva, os lábios vaginais, o clitoris, com óleo de grainha de uva e pequenos vibradores nos dedos da massagista. “A palma da mão aberta é símbolo de ligação, de cuidado”, explica Carmo quando Juliana já se sentou na marquesa. “A nossa sociedade ensina a mulher a ser cuidadora. Ela tem de aprender a receber cuidado. Mas é muito difícil. ” Com Juliana, serão precisas, pelo menos, mais seis sessões de uma hora e meia, como esta. Não se libertou o suficiente para sentir prazer. Não era esse o objectivo, nem podia ser: existência de expectativas é inibidora. “Aqui não há expectativas”, diz Juliana. “É sensual, mas não sexual”, acrescenta, com um ênfase positivo no primeiro termo, negativo no segundo. Como se à palavra “sexualidade” viesse agarrado todo o guião da sociedade machista e a sensualidade estivesse liberta, disponível para todos, principalmente as mulheres. Para elas, a ausência de expectativas é o que permitirá avançar, mesmo que não saibam para onde. Os guiões da sexualidade estão definidos por, e para, homens. A sexualidade deles pertence-lhes e a das mulheres também. Pelo menos a que está caucionada e regulada. A outra, o verdadeiro poder sexual das mulheres, talvez se encontre no processo de descoberta para o qual as novas personal trainers do sexo são chamadas a intervir. Maria tem 62 anos e não foi para melhorar a sua vida sexual que procurou Carmo G. Pereira. Veio para uma consulta de pompoarismo com o objectivo de, explica, evitar vir a ter os problemas de incontinência urinária de que a sua mãe sofre hoje. A nossa sociedade ensina a mulher a ser cuidadora. Ela tem de aprender a receber cuidado. Mas é muito difícil. ”“Vamos fazer a primeira contracção, a segunda, a terceira”, vai indicando Carmo, que colocou uma mão na barriga de Maria. “A contracção do terceiro anel é que mexe com a barriga. ”Maria explica que teve um segundo parto complicado, que lhe deixou sequelas na musculatura vaginal. Carmo fornece-lhe vários instrumentos para usar em casa: umas bolas para introduzir e treinar os movimentos de contracção e sucção, um vibrador com pesos diferentes para segurar na vagina, em exercícios dez vezes por dia. No final da consulta, a terapeuta refere à cliente a possibilidade de alguns efeitos secundários. “Como vai haver uma maior atenção quotidiana a esta parte do corpo, e alguma estimulação, é provável que haja um aumento da libido. Sente-se preparada para isso?”“Não há problema”, responde Maria. “Tem de integrar isso na sua vida. ”Maria teve vários dissabores com médicos, desde a infância. Por isso tende a preferir terapias alternativas. “Sinto-me mal com antibióticos”, diz ela. “Consulto um especialista de medicina tradicional chinesa, tenho um osteopata, que também é o meu professor de ioga. ” E agora tem também uma personal trainer sexual. “Todas estas pessoas contribuem para o meu bem-estar. Quando vamos ao hospital, somos vistos por um médico, que nos manda para outro, e depois para um fisioterapeuta. Nenhum deles quer saber de nós, nem tem tempo para nos ouvir. Na medicina natural, não somos tratados como um número, mas como uma pessoa. Os tratamentos são personalizados, adaptados ao nosso caso. Como no ioga, em que os exercícios são adaptados às características de cada um. ”A terapeuta pediu-lhe para visualizar o interior do seu útero e descrevê-lo. “Uma tristeza, tudo escuro e fechado, muita mágoa”, disse Ana. “Estava tudo tão negro. Eu queria sair do meu corpo, de tanta dor que tinha. Depois foi como se tivesse parido o meu útero e o tivesse atirado para uma fogueira. Não queria ter aquela coisa negra cá dentro. ”Ana procurou Cristina porque estava desesperada. “Eu tinha chegado ao fim da linha. Só por isso vim aqui. Agora só lamento não ter vindo há mais tempo. Durante toda a minha vida, depois do que me aconteceu na infância, sinto que não segui em frente, apenas somei anos. ”Na aldeia onde vivia, ouvira a crença segundo a qual uma rapariga que não tivesse relações sexuais durante sete anos recuperaria a virgindade. Por isso, desde que o avô cessou o abuso, esperou sete anos até ter o primeiro namorado, na esperança de que o hímen estivesse miraculosamente reposto, e o rapaz não a rejeitasse. Mas foi ela que não conseguiu aceitá-lo a ele. Agora, mal começa a respiração extática, o exercício que a transporta para um estado alterado de consciência, desata a chorar escondendo o rosto com as mãos. “Não consigo olhar para ele, ele é um homem. ”Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Recompõe-se aos poucos, mas quando Cristina me pede para respirar também de forma sonora, o choro volta. “Ele quer fazer-me mal”, grita. “Não consigo. Está tudo bem, se ele estiver em silêncio. Mas não consigo ouvi-lo. ”Fiquei sem saber o que pensar da situação, da credibilidade das personal trainers do sexo e das pessoas que as procuram, mas a verdade é que o som da minha respiração me pareceu, até a mim, um pouco assustador. Após muito choro e convulsões, Ana adormeceu profundamente, esgotada. Minutos depois acordou, levantou-se e deu-me um abraço.
REFERÊNCIAS:
Religiões Budismo
Batman vs. Super-Homem, ou a crítica vs. os fãs – e a tristeza de Ben Affleck
O blockbuster é "o Donald Trump dos filmes de comics" e a maior estreia mundial de super-heróis – em Portugal, é a segunda estreia do ano. A crítica e os fãs estão outra vez distantes e Affleck já é um meme. (...)

Batman vs. Super-Homem, ou a crítica vs. os fãs – e a tristeza de Ben Affleck
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 2 Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-01-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: O blockbuster é "o Donald Trump dos filmes de comics" e a maior estreia mundial de super-heróis – em Portugal, é a segunda estreia do ano. A crítica e os fãs estão outra vez distantes e Affleck já é um meme.
TEXTO: A crítica não gostou de Batman vs. Super-Homem, Ben Affleck está triste com isso num vídeo popularíssimo e o filme continua a arrebanhar centenas de milhões nas bilheteiras. Nos últimos dias, é esta a história em torno da estreia de um dos grandes blockbusters do ano – contam-se espingardas no fosso entre a crítica e o público, a Internet brinca e as máquinas registadoras continuam a tinir. Este “é o Donald Trump dos filmes de BD” ou “uma tempestade perfeita” que envolve o ponta-de-lança de uma batalha entre estúdios?Ben Affleck, o actor que depois de ter ganho um Óscar de Melhor Filme foi trucidado pela Internet quando foi anunciado como o novo Batman, ouve o jornalista falar sobre as más críticas de Batman vs. Super-Homem. Henry Cavill, o Super-Homem, reage com um discurso que nem ouvimos porque Simon e Garfunkel começam a interpretar The sound of silence enquanto a câmara se aproxima de Affleck, silencioso e pesaroso, e que no final da resposta do seu co-protagonista só diz: “Concordo”. Nas primeiras 48h de vida da paródia do utilizador Sabconth à entrevista do Yahoo UK, o vídeo foi visto mais de um milhão de vezes. À hora de publicação desta notícia ultrapassa os 18 milhões de visualizações e já gerou versões infindas com outras músicas (como Atmosphere, dos Joy Division) ou com Affleck ladeado por colegas super-heróis muito mais felizes – Capitão América, Deadpool…Este último é responsável pela melhor estreia de 2016 em Portugal: um título tido como o antifilme de super-heróis que chamou aos cinemas 112 mil espectadores, segundo dados do Instituto do Cinema e do Audiovisual (ICA). Batman vs. Super-Homem fica-lhe pouco atrás, na segunda posição, com 100 mil espectadores de acordo com a mesma fonte oficial (a NOS, a sua distribuidora, reclamou segunda-feira para o filme o título de “melhor fim-de-semana de abertura de sempre de um filme de super-heróis” – contudo, os 20 mil espectadores que divulga a mais em relação aos números do ICA incluem a estreia em Portugal mas também as de Angola e Moçambique). No mundo inteiro, e até domingo, o filme tinha já arrecadado 378 milhões de euros. É a maior estreia mundial de sempre na bilheteira de um filme de super-heróis. Batman vs. Super-Homem é o “tipo de filme”, diz o crítico de cinema do PÚBLICO Jorge Mourinha, “que não está tão dependente de uma aprovação da crítica para fazer sucesso”. Está acompanhado por inúmeros êxitos de bilheteira mais ou menos recentes, dos Crepúsculos aos Transformers, passando pelo quarto Indiana Jones ou pelo terceiro Homem-Aranha e mesmo pelo mais antigo Ghost Rider, que não foram elogiados pelos críticos nem particularmente reconhecidos pelo público que vota em sites como o Rotten Tomatoes. Uma das críticas mais citadas é a de A. O. Scott no New York Times. Um homem que não gostou de Os Vingadores de Joss Whedon, uma adaptação bastante mais elogiada, mas que teve como amor de infância e empatia de adulto Star Wars, e que considera que o filme é como “as alegações iniciais de um julgamento muito longo”; “Snyder usa significantes de importância sem ter nada de importante para dizer”; “o entretenimento é mais um subproduto do que o objectivo”. Já na Variety, Ramin Setoodeh escreve, na tal alegoria em que Batman vs. Super-Homem é o Trump deste tipo de filmes, “que não há má imprensa que impeça um candidato fracturante de se tornar uma história de sucesso imparável” (na imprensa americana, as referências a Trump, o candidato a candidato republicano à Casa Branca que apesar de ser alvo de muitas críticas e de casos nos média continua a parecer dar voz ao descontentamento público, são muitas sobre o contexto deste caso). E o crítico e fã de comics Alex Abad-Santos considerou no Vox que o filme “é um crime contra quem gosta de comics”. O crescendo de crispação entre o que o público considera – e paga para ver – e o que a crítica defende tem-se agravado. No Metacritic, o agregador de críticas de profissionais e votos do público, a média da imprensa é de 44 (mista) contra 7, 4 dos espectadores (favorável), respectivamente; no Rotten Tomatoes, só 28% dos críticos gostaram, contra 72% do público. No caso de Star Wars: Despertar da Força, e a avaliar pelas mesmas plataformas, a crítica gostou mesmo mais do filme do que os fãs, e com percentagens muito elevadas. O homem-morcego e o homem de Krypton serão então só o mais recente exemplo da “guerra cultural entre a imprensa e o público”, como diz Setoodeh?A photo posted by Jason Momoa (@prideofgypsies) on Mar 27, 2016 at 4:38am PDTJason Momoa, o próximo Aquaman, sugeriu que era “hipócrita” criticar filmes destes quando não se é um fanboy. Mas nos sites de fãs ou especializados no universo dos comics e dos super-heróis as notícias sobre o tema também são seguidas de comentários com acusações de “haters” ou de parcialidade. Como recorda o Guardian, há fãs que acusam os críticos de estarem a soldo da Marvel Studios (da Disney). O filão dos super-heróis é tão rentável que se tornou numa luta corporativa. “A Warner está há anos a tentar erguer uma barreira contra a Marvel [Studios] e este filme tem o peso de ser a pedra basilar dessa estratégia”, contextualiza ainda Jorge Mourinha sobre a transferência para o cinema da rivalidade de papel entre a Marvel (X-Men, Quarteto Fantástico, Vingadores, Demolidor, Jessica Jones), comprada pela Disney, e a DC Comics (Aquaman, Flash, Arrow, Gotham), cujos direitos cinematográficos estão com a Warner. A polémica surge numa “tempestade perfeita”, diz o crítico português, criada também pelos “observadores que querem que estes filmes sejam levados a sério” (na esteira, no caso da Warner, dos Batman intelectualizados de Christopher Nolan), e por uma “indústria que quer o público do entretenimento descartável sem abdicar do público mais adulto”. Ainda assim, o responsável pela distribuição na Warner, Jeff Goldstein, disse aos jornalistas que o filme “não se leva a sério”. A isto junta-se a “obsessão pelos números – os filmes medem-se mais pelo dinheiro que fazem do que pela sua qualidade”, aponta Jorge Mourinha. Nesse campo, o filme parece ter um desafio à altura dos superpoderes dos seus protagonistas. Foi a quinta maior estreia de sempre nos EUA, mas a Variety noticia que o filme terá custado 250 milhões de dólares a fazer e mais 150 milhões a promover, pelo que terá de recuperar o investimento com receitas de bilheteira (e vendas de direitos televisivos, home video ou merchandising) acima dos 400 milhões, com o número de 800 milhões a ser mencionado pela revista especializada. Para Michael Cavna, crítico de BD e ilustrador, tudo se resume a “branding”, escreveu no Washington Post. “Hollywood é brilhante a vender-nos um nome que já reconhecemos. Uma familiaridade calorosa pode calar muita crítica. " Ou, nas palavras do analista do sector Paul Dergarabedian, “as críticas não importam. O Batsuit e a capa do Super-Homem são feitos de teflon”. No primeiro fim-de-semana, os fãs dos comics ou dos anteriores filmes das personagens são uma espécie de garantia nas salas. Batman e Super-Homem são uma marca, como os remakes são a recuperação de nomes que reconhecemos, ou as sequelas e os spin-offs. O embate entre ambos, além de ser uma história de culto nos comics, é um convite à ida ao cinema. Depois do pico da estreia, os bilhetes destes filmes continuam a vender-se a quem quer ir ver o mais recente filme de efeitos especiais e aventuras – os espectadores gostarão mais ou menos, mas se os números dos primeiros dias em Portugal são de top, Batman vs. Super-Homem: O Despertar da Justiça estreou-se em 122 salas e no mesmo período fez menos espectadores do que Deadpool, que estava em apenas 64 salas, assinala o Cinemax da RTP. E se a estreia mundial foi fulgurante, a Forbes já cita números que podem ser preocupantes para o futuro, monetariamente falando, do filme: fracos resultados no importante mercado chinês e, sobretudo, a maior quebra de sempre (55%) de um filme de super-heróis entre as sessões de sexta-feira, as primeiras, e as de domingo. Houve a Páscoa, sim, mas a queda nos números “aponta para a infeliz probabilidade de, fora os fãs da DC Comics, os públicos norte-americanos não gostarem muito do filme”, arrisca a revista, que num outro artigo cita fontes anónimas do sector que falam em boas vendas de bilhetes para visionamentos repetidos. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Segunda-feira foi um dia bom para o filme, apesar de também em queda, e os analistas consideram que Batman vs. Super-Homem vai continuar a ter sucesso. “As boas críticas sustentam um filme” na “quarta ou quinta semana", como descreve o analista de bilheteiras Jeff Bock, e elas são uma raridade. O efeito do passa-palavra pode determinar quão grande será o desfasamento entre os números, as críticas e as opiniões dos fãs nesta história. Notícia corrigida às 7h44 de 30 de Março: Quarteto Fantástico pertence à Marvel e não à DC
REFERÊNCIAS: