Na noite dos dEUS, o show foi de Alexis Krauss
Num festival sem grandes cabeças-de-cartaz, como a organização reconhece, é natural que alguns dos melhores momentos surjam de outros nomes do cartaz. Aconteceu terça-feira com tUnE-yArDs, voltou a acontecer quarta-feira com os Sleigh Bells. (...)

Na noite dos dEUS, o show foi de Alexis Krauss
MINORIA(S): Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2012-08-16 | Jornal Público
SUMÁRIO: Num festival sem grandes cabeças-de-cartaz, como a organização reconhece, é natural que alguns dos melhores momentos surjam de outros nomes do cartaz. Aconteceu terça-feira com tUnE-yArDs, voltou a acontecer quarta-feira com os Sleigh Bells.
TEXTO: Na noite em que a chuva largou a vila minhota, para alívio dos festivaleiros que passaram duas noites encharcados, a banda de Alexis Krauss e Derek Edward Miller mostrou como uma boa ideia às vezes é suficiente para reivindicar um espaço estético. E a ideia dos Sleigh Bells é, dizemos nós, amplificar algumas características do rock para o homenagear, como se de um musical se tratasse. É isso que fazem a descomunal parede de amplificadores (Marshall, pois claro), os riffs de guitarra sacados do metal, a sexualidade de Alexis Krauss (moça excessivamente sexy) à solta com o seu casaco de cabedal, entre o punk de rua e a revista de moda, e as programações rítmicas pré-gravadas que ora lembram as batidas do hip-hop, ora emulam as baterias de metal e os seus excessos (como o pedal duplo). Foram vencedores, mesmo com a vocalista nitidamente rouca. Pela terceira vez em Paredes de Coura, como lembrou, em português, Tom Barman, os dEUS visitaram alguns clássicos, como Instant Street, e temas menos conhecidos, mas, nem nuns, nem noutros, conseguiram reacções efusivas – efeitos da sobreexposição em palcos portugueses? Pelo contrário, os The Temper Trap beneficiaram do efeito novidade e foram muito apreciados, mesmo que a pop que fazem seja verdadeiramente inofensiva. Na noite de concertos que contou com os Midlake a estabelecer uma ponte entre a folk-rock britânica dos anos 1970 e a melancolia dos Radiohead, os Digitalism mostraram como o filão Daft Punk continua vivo. Fizeram Paredes de Coura dançar e abriram a porta para outras propostas dançantes noite dentro. O Festival Paredes de Coura continua esta quinta-feira com Kasabian, Anna Calvi, Of Montreal, Gang Gang Dance, The Whitest Boy Alive, School of Seven Bells, entre outros.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave sexualidade moça
Lou Reed, o músico que transformou o rock
Olhou para o outro lado de espelho, o lugar que a moralidade burguesa se recusava encarar. Morreu um dos músicos mais influentes da história do rock. (...)

Lou Reed, o músico que transformou o rock
MINORIA(S): Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2013-10-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: Olhou para o outro lado de espelho, o lugar que a moralidade burguesa se recusava encarar. Morreu um dos músicos mais influentes da história do rock.
TEXTO: "Sou um triunfo da medicina, física e química modernas. Estou maior e mais forte do que nunca. O meu chen tai chi e um regime saudável trataram-me bem ao longo de todos estes anos", escrevia Lou Reed na sua página de Facebook no final de Maio. "Anseio estar em palco a actuar, e escrever mais canções para me ligar aos vossos corações e espíritos e ao universo, bem dentro do futuro", acrescentava. Ler esta nota, escrita quando foi revelado que Reed fora submetido a um transplante de fígado, tem agora um sabor particularmente amargo. O fundador dos Velvet Underground, autor de Walk on the wild side, Vicious ou Perfect day, ícone do rock"n"roll que o transformou profundamente, por trazer à superfície uma noção de perigo, de interdito e de marginalidade inexistente até à sua chegada, morreu na manhã de domingo, aos 71 anos. O médico responsável pelo transplante de fígado, Charles Miller, afirmou ao New York Times que Reed "morreu pacificamente, rodeado pelos seus entes queridos" - Reed era casado desde 2008 com a música e artista Laurie Anderson. O médico revelou ainda que fora admitido no início da semana passada no hospital de Ohio no qual fora efectuado o transplante, tendo regressado a Nova Iorque quando informado pela equipa médica do estado irreversível de uma não especificada doença de fígado. "Ele queria muito estar em casa", disse Miller. Ao Guardian, o agente inglês confirmou a notícia da morte, avançada em primeira mão pela Rolling Stone, declarando em seguida: "Estou muito perturbado. " Estamos todos. A dimensão de Lou Reed enquanto figura tutelar de tanto da música popular urbana das últimas cinco décadas é tal que algo tão definitivo quanto isto, a sua morte, parecia uma impossibilidade, como se a mortalidade não ligasse bem com o homem nascido a 2 de Março de 1942 em Nova Iorque, a cidade que o moldou e da qual retirou todos os impulsos criativos - "primeiro os meus pais, depois Nova Iorque", dizia ele no documentário de 1998 Rock"n"Roll Heart. Em reacção à sua morte, Lloyd Cole escreveu na sua conta do Twitter: "Sem Lou Reed não existiria David Bowie tal como o conhecemos. Eu? Seria provavelmente um professor de Matemática. " Brian Eno estava quase certo quando proferiu uma tirada célebre: que quase ninguém comprou os discos dos Velvet Underground, onde se fundou a lenda de Reed, quando da sua edição original, mas que todos os que os compraram formaram bandas. "Quase" porque os Velvet, e com eles Lou Reed, não se limitaram a fenómeno multiplicador de grupos rock. Reed foi influência marcante para o glam, para o punk ou para a new-wave, mas a força evocativa das suas letras, a música violenta na sua exigência perante o ouvinte, a postura confrontante e polémica ou o negro que vestia (é sempre essa a cor que lhe vemos, negro noite, negro mistério, negro perigo) tornou-o uma inspiração mais abrangente, das artes plásticas (não por acaso, os Velvet Underground nasceram verdadeiramente na Factory de Andy Warhol) ao cinema (não é a canção New age, de Loaded, o último álbum dos Velvet Underground, com a sua "gorda e loura actriz" que beijara Robert Mitchum, homenagem à idade de ouro de Hollywood?) ou à literatura (não foi o nome da sua banda retirado a um romance?, não dedicou ele o seu último grande álbum, The Raven, a Edgar Allan Poe?). Robert Wilson, o encenador, colaborou com ele em diversas ocasiões. Julian Schnabel, o artista e cineasta, ajudou-o a concretizar finalmente em palco, em 2008, a visão que tinha para Berlin, a trágica e dramática história de amor entre dois toxicodependentes, hoje considerado uma obra-prima, mas reduzido, à data da edição (1973), a "álbum mais deprimente de sempre". Irvine Welsh, o escritor escocês, expressava-lhe ontem o seu agradecimento - pela obra, por ter autorizado a inclusão de Perfect day na banda-sonora de Trainspotting. E ainda haverá, mundo fora, outro tipo de artistas a prestarem-lhe homenagem: múltiplas variações de Chico Fininhos a correrem as ruas ao som de Lou Reed, "sempre na sua", "sempre cheios de speed". A música foi a forma de expressão que escolheu quando, criança, se apaixonou pela aspereza do rock"n"roll e pelas harmonias vocais do doo-wop. Escolheu-a pela exclusão de tudo o resto. E tornou-se maior que ela. Em 2004, na revista Uncut, perguntavam-lhe o que tinha mudado desde os primeiros tempos. "Nada mudou", respondeu. "Tento fazer algo directo e verdadeiro. Fazer algo puro e sem filtros. É completamente real e isso é uma constante. Não é uma encenação, nunca foi uma encenação. " E por isso foi desde sempre e até ao fim, quando já estavam distantes os anos de boémia e excessos com todo o tipo de drogas (o tai chi, de que era praticante fervoroso, era por estes dias o seu vício), surpreendente, contraditório e imprevisível. Depois do renascimento artístico, patrocinado pelo fã David Bowie e protagonizado com o histórico segundo álbum a solo, Transformer (1972), o de Vicious, Satellite of love, Perfect day e de Walk on the wild side, a sua canção assinatura, vimo-lo sabotar a popularidade adquirida com Metal Machine Music", duplo álbum de experiências com feedback que deixou o mundo perplexo em 1975 - esforço vanguardista, provocação, simples brincadeira de mau gosto? Mais recentemente, surpreendeu ao reunir-se aos Metallica, banda charneira do thrash-metal, para gravar Lulu, álbum conceptual inspirado em peças do dramaturgo Frank Wedekind e considerado quase unanimemente um fracasso total. Seria também o seu último álbum. Um ponto final na carreira que, de certa forma, ilustra a sua muito nova-iorquina obstinação: Lou Reed fazia o que queria e quando queria, sem se preocupar com as expectativas que o rodeavam. De previsível, tinha o lendário temperamento irascível, capaz de levar às lágrimas os jornalistas mais experientes. Em tempos de colorido "paz e amor", quando o vimos surgir com os Velvet Underground, formados em 1965 com John Cale, Maureen Tucker e Sterling Morrison, mostrou o outro lado: o submundo violento e interdito de dealers e agarrados, a sexualidade sob todas as formas, a erupção de vida que pulsava no outro lado do espelho, para onde o conforto burguês e o moralismo hipócrita se recusavam a olhar. Quatro décadas depois, gravou (no álbum The Raven) Imp of the Perverse, baseado num conto de Poe, que questiona a nossa tentação pelo abismo. Por que somos atraídos para aquilo que sabemos ser-nos prejudicial? "Se existe algum ser humano que não tenha sentido isto, não o conheci", disse Lou Reed. Esta pulsão, este questionamento, atravessou grande parte da sua obra. Sobre o rock, disse: "Um acorde é bom. Dois acordes e já estás a abusar. Três acordes e já estás no jazz. " Era uma boutade, naturalmente. Reed era compositor complexo e prezava o virtuosismo, mas ilustrava na perfeição o impulso primitivo que dá ritmo e significado ao rock. O que Reed fez foi criar novos cenários e dar vida inesperada e corpo a esse impulso. O New York Times citava ontem uma entrevista conduzida pela jornalista Kristine McKenna. Dizia nela Reed: "Sempre acreditei que existe um incrível número de coisas que se podem fazer através de uma canção rock, e que se pode fazer escrita séria numa canção rock se o fizermos sem perder o ritmo. As coisas sobre as quais tenho escrito não seriam consideradas nada de mais se aparecessem num livro ou num filme. " Foi a sua grande virtude. Não dar seriedade literária ao rock, mas transformar-lhe a natureza. E por isso a sua obra ressoou tão fortemente. E por isso ouvimo-lo ainda: a voz nasalada, aquele canto que é quase discurso falado, ora urgente, ora lançado com desdém ou com abandono. Ouvimos e depois lemos: Lou Reed morreu. Lemos e não acreditamos.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave morte exclusão negro homem criança doença corpo sexualidade
Milhares de renovações e férias lançam caos para tirar cartão do cidadão
Nas últimas semanas a confusão tomou conta dos serviços do Cartão do Cidadão em Lisboa e no Porto, onde milhares de pessoas têm perdido muitas horas para tirar ou revalidar o documento. (...)

Milhares de renovações e férias lançam caos para tirar cartão do cidadão
MINORIA(S): Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2014-05-03 | Jornal Público
SUMÁRIO: Nas últimas semanas a confusão tomou conta dos serviços do Cartão do Cidadão em Lisboa e no Porto, onde milhares de pessoas têm perdido muitas horas para tirar ou revalidar o documento.
TEXTO: Já tinha passado a Páscoa quando começou o calvário de Teresa Duarte, uma empresária reformada de 68 anos. Foi na segunda-feira. De lá para cá, nos últimos três dias, já perdeu a conta ao dinheiro e às horas gastas. Para nada: neste momento voltou ao ponto de partida, a Loja do Cidadão das Laranjeiras, em Lisboa, e apesar de já estar à espera de vez há quatro horas, desde as oito da manhã, ignora quando será atendida. Ela e milhares de pessoas que, nas últimas semanas, se têm aglomerado em filas intermináveis para tirarem ou renovarem o cartão do cidadão, sem que os serviços consigam dar vazão a tantos pedidos. O organismo responsável pela emissão do documento, o Instituto dos Registos e do Notariado, admite o pandemónio em Lisboa, sobretudo nas Laranjeiras, mas nega-o no Porto. E promete haver melhorias já para a semana. Quando se enfiou no carro e rumou às Olaias, a um serviço que afinal tinha fechado em Dezembro, Teresa Duarte ainda se mantinha uma daquelas pessoas discretas e elegantes que não gostam de ser apanhadas a reclamar. O dia de segunda-feira havia de começar a transformar esse seu modo de ser, pelo menos por uns tempos. “A seguir vim aqui para a Loja do Cidadão das Laranjeiras. Quando cá cheguei, às 10h30, já tinham cancelado a entrega de senhas de atendimento”, dada a enorme afluência de gente. “Sugeriram-me ir à Loja do Cidadão de Chelas. Mas recuso-me a ir lá desde que fui assaltada no estacionamento — e além disso sei que também está sempre cheio, porque o meu filho andou duas semanas para tratar do cartão e só conseguiu porque depois partiu um pé e teve prioridade no atendimento. ”Para grandes males, grandes remédios. Em vez de rumar a Chelas, a empresária reformada meteu-se num táxi e foi para Odivelas, que a urgência em renovar o rectangulozinho de plástico era muita. “Também já não tinham senhas, fui para o Areeiro”. Só que estes serviços, apesar de pertencerem ao Instituto dos Registos e do Notariado, já não emitem o almejado cartão. Nesse dia foi para casa, mas na terça-feira voltou à carga, desta vez na Fontes Pereira de Melo. “Cheguei às 10h15 e deparei-me com uma fila enorme, também já não havia senhas. ” Diz que desorganizou de tal forma a vida que só conseguiu almoçar às 18h. Foi por isso que na quarta-feira chegou às Laranjeiras antes das oito da manhã, hora a que a fila de gente para entrar na Loja do Cidadão dá a volta aos edifícios e chega à Estrada da Luz. Agora que já é quase meio-dia e com a sala defronte dos guichets atafulhada de gente, confronta uma responsável da loja com as equívocas informações de um folheto informativo entregue aos utentes. Dele consta um número de telefone para agendar atendimento antecipadamente. Não vale a pena, explica uma recepcionista que teve de faltar ao emprego para vir outra vez para a bicha, desta vez para levantar o cartão: “Só tinham marcação para final de Maio. E se quisesse vir ao sábado, só para Julho ou Agosto. ” O apito sonoro marca o atendimento do 60. º utente da manhã, ainda nem soou o meio-dia. Os imprevidentes que só chegaram a esta hora têm mais de 250 números à sua frente. “Hoje estão a esticar isto um bocadinho mais que nos outros dias, mas as senhas devem estar a fechar”, avisa uma recepcionista. Na linha telefónica para marcação antecipada de atendimento um funcionário desabafa: “Neste momento há 50 pessoas em linha à espera e há quem desista a meio porque já não aguenta mais. ” As chamadas são cobradas à razão de 12, 3 cêntimos por minuto. Uma utente conta terem passado três semanas até conseguir que alguém respondesse do outro lado. Entretanto, foi gastando as folgas do trabalho para tentar a sua sorte nas repartições de Sintra e na Loja do Cidadão de Odivelas, sempre sem sucesso. “Ando com o cartão caducado. Espero que a polícia não me multe”, diz. E como a necessidade aguça o engenho, também já começaram a ser trocados nas redes sociais truques para ser atendido primeiro que o parceiro do lado. Um deles passa por recorrer ao balcão Perdi a Carteira, que tem sempre menos gente. Para o embuste funcionar, convém alegar que se perderam pelo menos dois documentos, avisa quem sabe. Mas afinal o que se passa? A explicação do presidente do Instituto dos Registos e do Notariado, António Figueiredo, lembra uma tempestade perfeita em que vários factores se conjugaram para gerar o caos, infernizando a vida aos utentes. Acontece que todos eles eram factores previsíveis, para os quais os serviços não se prepararam. Em primeiro lugar, aquele responsável fala da forma como, há cinco anos, foram emitidos em Lisboa cerca de 200 mil cartões do cidadão num curto espaço de tempo e com datas de fim de validade também muito aproximadas. Resultado: “Estão todos a caducar ao mesmo tempo. ” As férias da Páscoa e o encerramento da Loja do Cidadão dos Restauradores, no final de 2013, terão feito o resto. “Isto começou há uma semana e está muito localizado em Lisboa”, assegura.
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Palavras-chave filho bicha
A visibilidade e a invisibilidade de um movimento intuitivo
Anne Teresa de Keersmaeker faz as honras de pré-abertura do Alkantara Festival, esta terça-feira e depois na Fundação Calouste Gulbenkian. Partita 2, dançada com Boris Charmatz, é o encontro da carne com o desejo de fuga. (...)

A visibilidade e a invisibilidade de um movimento intuitivo
MINORIA(S): Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2014-05-12 | Jornal Público
SUMÁRIO: Anne Teresa de Keersmaeker faz as honras de pré-abertura do Alkantara Festival, esta terça-feira e depois na Fundação Calouste Gulbenkian. Partita 2, dançada com Boris Charmatz, é o encontro da carne com o desejo de fuga.
TEXTO: Quando, no final da noite de estreia de Partita 2 em Bruxelas, faz agora um ano, Boris Charmatz disse a Anne Teresa de Keersmaeker que a coreógrafa podia regressar a Fase e começar tudo outra vez, ela riu-se. Mas faz sentido. Quem tiver visto ou revisto, em 2012, no Centro Cultural de Belém, a primeira peça de De Keersmaeker, criada em 1982, e esta terça ou quarta-feira for ver Partita 2 ao Grande Auditório da Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, encontrará os mesmos princípios de construção sustentados numa presença em palco que se despe de convenções, que ensaia o risco na obstinação, que experimenta o improviso na forma. O que Boris Charmatz, que dança Partita 2 com De Keersmaeker, lhe disse – que “deveria ser possível voltar ao início” – é o desenho de uma linha que traça 30 anos de criação e que De Keersmaeker resumiu numa só ideia, tão simples como entranhadamente complexa: “My walking is my dancing [Como danço é como caminho]. ” Afinal, neste regresso “ao que pareceu esquecido durante 20 ou 30 anos”, De Keersmaker volta a mostrar como do concreto se faz imaterial – as linhas, movimentos simples, andar, um círculo –, algo que podemos ver em muitas das suas peças, até mesmo em peças mais barrocas, como Mozart Concert Arias (1993, que este mês foi integrada no repertório da Companhia Nacional de Bailado). Disse Charmatz que a coregrafia revela, agora tal como há 30 anos, que o discurso de Anne Teresa de Keersmaeker assenta numa “concepção arquitectónica e espacial única, sem desvios, sem que para cada gesto se construa um significado”. De Fase a Partita 2 vai um percurso imenso e intenso, variado e contrastante, aplicado na recusa da ornamentação do movimento e na artificialização do corpo do intérprete. Em palco, dois corpos (mais um, o da violinista Amandine Beyer, numa dança própria com o violino e, por vezes, marcando o espaço dos outros dois corpos) que experimentam modos de superação através de uma aproximação à exaustão pela repetição. Mas, vistos de fora, esses dois corpos (e o próprio espaço, iluminado por Michel François, artista visual que lança sobre a escuridão a luz de um projector que parece, também ele, dançar) trabalham a partir de uma lógica que é mais orgânica do que o maniqueísmo que a decomposição do movimento criada pela expectativa pode sugerir. No mesmo palco, aquilo que Charmatz define como a inteligência dela e De Keersmaeker considera ser a disponibilidade dele originaram, escrevia o PÚBLICO na altura da estreia, “o mais perfeito exemplo do encontro entre a sexualidade feita metáfora dele e o movimento como hipérbole do corpo que ela tem perseguido”, naquilo que “às vezes parece um duelo, outras vezes um gesto que se completa”. Mas nem sempre essa ideia de completude e de diálogo com a obra de um e de outro parecerá evidente. A ideia de trabalharem juntos não foi imediata. A carne dele e a evanescência dela não são necessária ou imediatamente compatíveis. Foi preciso esperar até 2011, quando Charmatz, então artista associado do Festival de Avignon, terminava as apresentações de Enfant (que esteve na Culturgest nesse ano) na Cour d’Honneur do Palácio dos Papas e a equipa de De Keersmaeker entrava para ensaiar Cesena (que Guimarães 2012 e o Alkantara Festival mostraram em 2012), peça que começava às cinco da madrugada. Essa espécie de passagem de testemunho intensificou uma convivência formal que decorria de frequentarem os mesmos sítios havia já vários anos. Mas enquanto, recentemente, a coreógrafa belga tem ensaiado, por entre peças de maior fôlego, momentos de quase reclusão – Keeping Still (2008, com Ann Veronica Janssens); 3Abschied (2010, com Jérôme Bel, esteve na Gulbenkian em 2012) – em que experimenta outros modos de reequilíbrio entre espaço, tempo e corpo, Charmatz tem criado fantasmagorias – Régi (2005, com Raimund Hoghe); La Danseuse Malade (2008, com Jeanne Balibar, esteve na Culturgest em 2009) – onde o corpo praticamente desaparece. Entre o desejo de visibilidade dela e o de invisibilidade dele, surge então Partita 2. Os corpos dos dois intérpretes agem sobre a partitura musical de Bach, uma Partita em D menor para violino solo (BWV 1004) feita para ser dançada. Mas o que De Keersmaeker e Charmatz fazem em palco é de outra ordem. Movimento sim, mas, sobretudo, evasão. Construção sim, mas, sobretudo, reconhecimento de um espaço. Presença sim, mas, sobretudo, um modo de intervenção que pede uma consciência do corpo, do espaço e do discurso que em tempos de aceleração da imagem – e do próprio tempo – surge quase como anacrónica.
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Palavras-chave carne espécie corpo sexualidade
Padre João Resina: o engenheiro de Deus
Havia quem não gostasse das homilias do padre João Resina, que morreu no dia 3, em Lisboa. Quando passou pela paróquia de Santa Isabel, em Lisboa, era escutado por agentes da PIDE, polícia política do Estado Novo, que tentava apanhá-lo nas críticas ao regime. (...)

Padre João Resina: o engenheiro de Deus
MINORIA(S): Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-06-12 | Jornal Público
SUMÁRIO: Havia quem não gostasse das homilias do padre João Resina, que morreu no dia 3, em Lisboa. Quando passou pela paróquia de Santa Isabel, em Lisboa, era escutado por agentes da PIDE, polícia política do Estado Novo, que tentava apanhá-lo nas críticas ao regime.
TEXTO: Os agentes colocavam-se junto das colunas de som, com gravadores. O padre João decidiu fazer o mesmo, para que a PIDE não inventasse acusações: escondia um gravador sob o altar. Antes do fim da missa, tirava discretamente a cassete e guardava-a. "Nunca em Santa Isabel houve tanta PIDE", recorda ao P2 José Maria Fontes, de 79 anos, sacristão durante 39 anos, até Janeiro de 2000. "Ficavam perto das colunas. " Ainda assim, João Resina não foi molestado pela polícia política. Vários amigos passaram a gravar as homilias. Já em democracia, alguém lhe pediu que escrevesse uma síntese. No final das missas, o padre passou então a dar, a quem pedia, a folha com o resumo. O hábito deu origem aos dois volumes de A Palavra no Tempo (ed. Multinova e Entrelinhas, respectivamente), que recolhem muitos desses textos. João Manuel Resina Rodrigues nasceu a 5 de Outubro de 1930, em Carnaxide (Oeiras). Em 1953, licenciou-se em Engenharia Química no Instituto Superior Técnico. Só depois decidiu ser padre: foi ordenado em 1959. O gosto pela ciência fê-lo regressar ao Técnico, onde deu aulas durante 30 anos e integrou o Centro de Física da Matéria Condensada. Publicou várias obras sobre Física e História e Filosofia das Ciências. Augusto Moutinho, de 71 anos, professor da Universidade Nova, foi seu colega no Técnico entre 1974 e 1979. "Apaziguava muitas coisas que, nas universidades, são sempre difíceis de resolver", recorda. Mas era, sobretudo, um homem de ciência. E ultimamente, conta, andava "muito entusiasmado" a traduzir os Princípios, de Isaac Newton. Em entrevista à Pública, a 8 de Abril de 2007, João Resina dizia: "Uma coisa é tentar compreender o universo. Para isso há a Física e a Biologia. Se quero saber se houve ou não big bang, se a vida evoluiu, não pergunto à Igreja, que não tem competências nessa matéria. (. . . ) A terceira pergunta é o que me é lícito esperar, qual o sentido de fundo disto tudo. Aí, encontro a questão de Deus. " Em 1969, na Bélgica, doutorou-se também em Filosofia. Enquanto padre, a sua acção desenvolveu-se na área de Lisboa: Moscavide, Belém, Santa Isabel, capelas do Rato e das Amoreiras, Cruz Quebrada e Campo Grande. Nesta última paróquia, coordenou a catequese infantil. "Tinha a intuição rara de que é uma fase muito importante e que não devia ser entregue apenas a senhoras bondosas", recorda Helena Presas, de 52 anos, responsável da catequese. "Achava que devíamos falar às crianças de questões como a sexualidade e a ciência, antes de elas aparecerem" na escola. Não aceitou os catecismos nacionais, por "não corresponderem às problemáticas dos miúdos". Por isso, foi fazendo adaptações, com a equipa, hoje com 60 pessoas. Respeito pelas criançasHelena Presas foi uma das pessoas chamadas por ele, tinha então 32 anos. Por causa disso, fez o curso de Teologia e deixou a profissão de fisioterapeuta. "Estimulava a estudar, formatou uma equipa", sem nunca recusar a ajuda de quem aparecesse. Não queria crianças infantilizadas. Pedia que não cantassem coisas como "guiados pela mão de Jesus". "Dizia para mudar a letra, porque Deus quer pessoas livres, não guiadas pela mão. Fazia-o por respeito às crianças. " Não sendo emotivo, gostava de levar as pessoas à fé pela beleza, pelo ritmo, pelo cuidado dos textos, recorda ainda a catequista. E discutia tudo à exaustão, incluindo modos de integrar os pais e de levar as crianças a realidades sociais diferentes: idosos isolados, pobres, crianças de bairros degradados. . . Nas missas dos mais novos, queria que houvesse alegria e que os gestos os envolvessem. "Adaptava os textos para que a linguagem se percebesse. " Palavras como alegria e amor eram repetidas nos curtos sete minutos que as suas homilias, enxutas, duravam (várias delas estão disponíveis em http: /www. igrejacampogrande. pt/liturgia_palavra. html). Não se inibia de reprovar opções da própria Igreja - numa das últimas homilias criticou a diplomacia do Vaticano. E condenava a economia baseada no lucro, que deixa tantos de fora. Uma queda, a 17 de Dezembro, pô-lo em coma, que uma cirurgia arriscada não evitou. Quatro dias antes, na última homilia, falara da alegria do Natal: "Houve tempo em que a religião parecia apostada em matar a alegria. Aquele tempo em que os pregadores em tudo viam pecado, só se entendiam com mandamentos e castigos, não acreditavam que a alegria e o bem pudessem andar de mãos dadas. A Bíblia é mais sensata. (. . . ) Quem ama a sério cumpre o bem, e portanto os mandamentos, de maneira espontânea e superior. (. . . ) À medida que crescemos para a vida e para Deus, o amor e a alegria podem andar cada vez mais de mãos dadas. "
REFERÊNCIAS:
Crónica de Nuno Ribeiro: O dia mais longo
Acabou! Não sei se tinha de ser, mas foi. Pior. À excepção dos raides de Fábio Coentrão, da presença de Tiago e do imenso Eduardo, pouco vibrei. (...)

Crónica de Nuno Ribeiro: O dia mais longo
MINORIA(S): Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-06-30 | Jornal Público
SUMÁRIO: Acabou! Não sei se tinha de ser, mas foi. Pior. À excepção dos raides de Fábio Coentrão, da presença de Tiago e do imenso Eduardo, pouco vibrei.
TEXTO: Os 90 minutos passaram sem grande entusiasmo. Quase com nostalgia. A da vitória de Portugal contra a Espanha no Europeu de 2004 que popularizou em Madrid o meu nome: Nuno. O autor foi, já adivinharam, Nuno Gomes. Terminou, em monotonia e resignação, o dia mais longo. Tudo começou de manhã bem cedo. O porteiro, a quem abri horizontes e paladares no Natal com uma garrafa de Porto, apressou-se a dar o toque. O homem quase corria. Arrastava o seu peso, ofegava para me fazer uma pergunta: "Quem ganha?". Por educação sorri. E jurei que Porto nunca mais. Foi o primeiro de muitos sorrisos. Diplomáticos, de início. De enfado, ao princípio da tarde. De raiva até chegar a casa e fechar a porta à chave. Até Juan, o do "Frontón", que, com colegas da bicha do desemprego, tomou conta de uma casa do comer possível a 8, 5 euros, perdeu a compostura de empresário em busca de cliente. "E logo à noite, como vai ser?", perguntou com sorriso matreiro. A minha reacção devolveu o gracioso para a máquina do café em cívica obediência ao cliente. Na parede, havia um cartaz novo: "Espanha/Portugal, vamos a eles". Eles, pensei, sou eu. Senti a angústia da solidão. Não tive tempo para me deprimir. Santiago, o meu amigo Santiago, decepcionou-me. "Então, como vai ser?". Também ele, caramba. Na redacção continuaram as perguntas. Nas mais diversas formas. A doce Carmen passou por mim, esticou o braço e com o punho direito fechado e fez um gesto repetido de goleada. Com Romero chegaram as provocações. "Com quem vais?", perguntou. Não respondi. E Vicente deve ter feito uma excursão pelo "Google". Falou-me de Olivença. Do Rei D. Sebastião. Patxu portou-se bem, Não esperava outra coisa. Porque jogou futebol, em miúdo, no Atletich de Bilbao. Uma lesão afastou-o. Sempre confessou que era mau à bola e sabe que há perguntas que não se fazem. Mas a coisa ia de mal a pior. Rafa, com gesto rasteiro que nunca perdoarei, propôs-me uma derrota honrosa: por um a zero. Nem o olhei. Até que chegou Iker. Um basco de Vitória. Habituado a ambientes hostis e a lidar com péssimos lugares comuns. Um perito em sobrevivência minoritária. Foi então que Gabi me perguntou: "Com quem vais?". Não tive tempo de responder. Iker antecipou-se. Com mestria ripostou: "Com a Hungria, claro". Por certo. Quando joga a Hungria?
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave educação homem desemprego bicha
Papa Bento XVI admite uso do preservativo para travar a sida
Pela primeira vez na história um Papa admitiu a utilização do preservativo “para reduzir “em certos casos” os riscos de contaminação” do vírus da sida, segundo um livro de entrevistas que será lançado na terça-feira. Excertos foram publicados este sábado no jornal do Vaticano. (...)

Papa Bento XVI admite uso do preservativo para travar a sida
MINORIA(S): Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-11-21 | Jornal Público
SUMÁRIO: Pela primeira vez na história um Papa admitiu a utilização do preservativo “para reduzir “em certos casos” os riscos de contaminação” do vírus da sida, segundo um livro de entrevistas que será lançado na terça-feira. Excertos foram publicados este sábado no jornal do Vaticano.
TEXTO: Não é uma revolução, mas uma porta entreaberta. Num livro-entrevista que será publicado terça-feira, o Papa Bento XVI mantém que não considera o preservativo "uma solução verdadeira e moral", mas admite a sua utilização em casos concretos: "Num ou noutro caso, embora seja utilizado para diminuir o risco de contágio, o preservativo pode ser um primeiro passo na direcção de uma sexualidade vivida de outro modo, mais humana. "A afirmação do Papa surge no livro Luz do Mundo, uma entrevista ao jornalista alemão Peter Seewald, que será publicado na terça-feira em Itália e vários outros países. Dia 2 de Dezembro estara à venda em Portugal (ed. Lucerna/Principia). No texto, o Papa acrescenta: "Pode haver casos pontuais, justificados, como por exemplo a utilização do preservativo por um prostituto, em que a utilização do preservativo possa ser um primeiro passo para a moralização, uma primeira parcela de responsabilidade para voltar a desenvolver a consciência de que nem tudo é permitido e que não se pode fazer tudo o que se quer. Não é, contudo, a forma apropriada para controlar o mal causado pela infecção por HIV. Essa tem, realmente, de residir na humanização da sexualidade. "Esta afirmação repete o que já outros responsáveis da Igreja - mesmo cardeais - tinham defendido como mal menor, mas nunca um Papa afirmara. Também a maior parte das instituições católicas que apoiam doentes infectados com o HIV-sida utilizam o preservativo, mesmo se não fazem dele a estratégia fundamental na luta contra a doença. A viagem a ÁfricaAlguns excertos do livro foram publicados este sábado por L'Osservatore Romano, jornal do Vaticano. Sobre o preservativo, o Papa começa por referir a viagem aos Camarões e Angola, realizada no ano passado, quando Bento XVI defendeu, como diz o jornalista, que "a doutrina tradicional da Igreja tinha revelado ser o caminho mais seguro para conter a propagação da sida". O Papa Ratzinger começa por responder: "A viagem a África foi totalmente ofuscada por uma única frase. Perguntaram-me porque é que, no domínio da sida, a Igreja Católica assume uma posição irrealista e sem efeito - uma pergunta que considerei realmente provocatória, porque ela faz mais do que todos os outros. " A Igreja no terrenoBento XVI defende que a Igreja "é a única instituição que está muito próxima e muito concretamente junto das pessoas" e que é ela quem mais faz "porque trata como mais ninguém tantos doentes com sida e, em especial, crianças doentes com sida". No avião para África, o Papa limitou-se à afirmação genérica: "A realidade mais eficiente, mais presente em primeira linha na luta contra a sida é precisamente a Igreja Católica, com os seus movimentos. " Mas, na ocasião, o Papa não referiu quaisquer números: mais de 1200 projectos de instituições católicas de apoio a doentes de sida atingem pelo menos 4, 5 milhões de pessoas; 3000 padres e freiras e 16 mil voluntários trabalham nessas instituições, que representam 25 por cento das que apoiam doentes de sida; nos países pobres, 60 por cento dos doentes são assistidos em instituições ligadas à Igreja. Agora, no livro-entrevista, o Papa retoma a sua "verdadeira resposta": a Igreja "não se limita a falar da tribuna que é o jornal, mas ajuda as irmãs e os irmãos no terreno". Bento XVI reafirma que não deu a sua opinião sobre o preservativo, mas afirmou apenas "- e foi isso que provocou um grande escândalo - que não se pode resolver o problema com a distribuição de preservativos". Declarações de Bento XVI: Abusos sexuais foram um choque
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave ajuda doença sexualidade
Católicos entre o "marco histórico" e o simples esclarecimento
As palavras do Papa Bento XVI, que admitiu que o preservativo seja utilizado, em determinadas situações, como forma de combate à propagação do vírus da sida, estão a suscitar reacções contraditórias em Portugal. (...)

Católicos entre o "marco histórico" e o simples esclarecimento
MINORIA(S): Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-11-23 | Jornal Público
SUMÁRIO: As palavras do Papa Bento XVI, que admitiu que o preservativo seja utilizado, em determinadas situações, como forma de combate à propagação do vírus da sida, estão a suscitar reacções contraditórias em Portugal.
TEXTO: Ana Vicente, do movimento internacional Nós Somos Igreja, considera a declaração "um marco" na história "de uma instituição que, dizendo defender a vida, promovia a morte". Isilda Pegado, da Federação Pela Vida, considera que Bento XVI se referiu ao assunto para "esclarecer" uma afirmação que fora "deturpada pelos jornalistas". A discussão iniciou-se sábado, com a publicação de excertos do livro Luz do Mundo, que hoje é publicado em Itália e que consiste numa entrevista do Papa ao jornalista alemão Peter Seewald. "Num ou noutro caso, embora seja utilizado para diminuir o risco de contágio, o preservativo pode ser um primeiro passo na direcção de uma sexualidade vivida de outro modo, mais humana", diz Bento XVI. Reconhecer o erroNa entrevista, mantém que não considera o preservativo "uma solução verdadeira e moral", mas o facto de admitir a sua utilização é saudado por personalidades ligadas à Igreja. "É uma afirmação libertadora, no sentido em que a verdade liberta", aplaudiu Frei Bento Domingues, teólogo, que, em declarações ao PÚBLICO, considerou que esta posição deveria ser objecto "de uma declaração formal de arrependimento, de reconhecimento do erro", pelo Vaticano. Ana Vicente dispensa o pedido de perdão em troca de "mais um passo": "Que a seguir o Vaticano aceite aquilo que o povo de Deus já pratica há muito tempo, o uso dos contraceptivos artificiais, cuja proibição não tem qualquer fundamento evangélico ou teológico", deseja. Não que desvalorize "este avanço", que na sua perspectiva "põe fim a uma situação de enorme hipocrisia". Agora, afirma, "os membros de instituições católicas em países flagelados pela sida já não têm de fingir que são contra o preservativo ao mesmo tempo que promovem a sua utilização". Isilda Pegado não entende a afirmação da mesma maneira. Não vê nela "mais do que uma clarificação da posição do Vaticano, que não é aquela que tem sido transmitida pelos jornalistas". Explica que, na sua visita a África, "o Papa não se pronunciou contra o uso do preservativo, limitou-se a afirmar o que sempre defendeu e que nesta entrevista continua a defender: que a Igreja é contra uma política de combate à sida baseada na distribuição de preservativos".
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave morte sexualidade
Falar de sexo é com colegas e não com pais
Apesar de os resultados do inquérito aos adolescentes indicar que estes se sentem mais à vontade para falar sobre sexo com os colegas, a coordenadora do estudo português para a Organização Mundial de Saúde defende mais educação sexual. (...)

Falar de sexo é com colegas e não com pais
MINORIA(S): Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-12-14 | Jornal Público
SUMÁRIO: Apesar de os resultados do inquérito aos adolescentes indicar que estes se sentem mais à vontade para falar sobre sexo com os colegas, a coordenadora do estudo português para a Organização Mundial de Saúde defende mais educação sexual.
TEXTO: Os alunos portugueses podem ter mentido nos inquéritos?A amostra é representativa dos 6. º, 8. º e 10. º anos. Não há nada [nenhum indicador] que nos diga que não é assim. Os alunos podem mentir à vontade, mas são amostras de cinco mil e não posso acreditar que me andam a pregar partidas desde 1998! Além disso, era difícil que todos mentissem para o mesmo lado. Há problemas que fazem muito barulho [ex: bullying], mas que não são universais. Os alunos iniciam a vida sexual mais tarde. Isso contraria a ideia de que ter educação sexual na escola pode levá-los a começar mais cedo?Estou preocupada porque eles atrasam o início da vida sexual mas não têm mais informação [do que antes]. Os jovens não privilegiam os pais nem os professores para falar de sexualidade ou de infecções sexualmente transmissíveis. A vontade de falar de sexualidade é com os colegas. A maioria diz que aprende via Internet ou televisão, o que é um risco. É muito difícil para um adolescente aos 11 anos ver o professor como seu interlocutor, mas se for assim desde os cinco anos, pode ser uma maneira de crescer na conversa natural e afectiva sobre sexualidade. Como olha para os cortes anunciados para a educação sexual nas escolas?Os problemas na saúde e na educação não são económicos, mas de desperdício, porque não aproveitamos o que já existe. Gostava de ver a classe docente a tomar poder sobre as suas competências e a resolver isto.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave escola educação adolescente sexual sexualidade
Eles não confiam na Net e são os últimos irredutíveis à porta do Colégio Moderno
São cada vez menos os que passam a noite à espera de inscrever os filhos numa escola privada. A maioria já recebe pré-inscrições pela Internet. A selecção vem depois. (...)

Eles não confiam na Net e são os últimos irredutíveis à porta do Colégio Moderno
MINORIA(S): Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: São cada vez menos os que passam a noite à espera de inscrever os filhos numa escola privada. A maioria já recebe pré-inscrições pela Internet. A selecção vem depois.
TEXTO: São quase nove horas da noite, o casal está sentado dentro do automóvel e espreita pelos vidros embaciados. No banco de trás, os casacos e a manta revelam a intenção de passar a noite. À frente, em cima do porta-luvas está uma lista com dez nomes e uma caneta presa. Noutros anos eram mais, muitos mais. "Duzentos. . . trezentos", conta o porteiro do Colégio Moderno, na manhã seguinte. São os nomes das pessoas que fazem fila para inscrever os filhos naquela escola privada de Lisboa. A bicha à porta do colégio deixou de fazer sentido desde que as pré-inscrições podem ser feitas pela Internet. No entanto, para esta dezena de pais que não arredou pé durante toda a noite, fazer fila é mais seguro do que usar os meios tecnológicos, acreditam. "O computador podia bloquear", justifica a mãe de João, pouco depois das 9h00 de ontem, satisfeita porque o filho foi o terceiro a ser inscrito para a turma dos três anos. "Pré-inscrito", corrige. Apesar de ser filha de uma professora do ensino público e ter feito a sua formação na escola pública, o Colégio Moderno é a primeira opção, "porque as coisas já não são como eram" e o ensino não tem a mesma qualidade, diz. Os pais "querem ter a tranquilidade de ter os filhos numa boa escola", justifica a directora Isabel Soares, por isso é que se organizavam, muitas vezes com uma semana de antecedência, à porta do colégio; faziam uma lista por ordem de chegada e confirmavam as presenças a cada três ou quatro horas. Noutros tempos, a pastelaria, em frente ao colégio, estava aberta durante a noite e até roulottes a servir refeições estacionavam ali, mas há três anos que deixou de ser assim, relata o porteiro. Má publicidade"Nós pelos filhos fazemos tudo, não é?", interpela a mãe de João, de sorriso rasgado. Como não tem ninguém naquela escola, o "sacrifício" pode compensar. Às seis e meia, o porteiro chega e distribui as senhas aos pais, respeitando a lista feita pelos mesmos. O seu horário de trabalho começa às oito, mas neste dia entra mais cedo "por pena", para os pais não estarem tanto tempo à porta, revela. Mas nem com a senha na mão os pais arredam pé. Já no dia anterior, a directora falou com eles, disse-lhes que não valia a pena ficar, que podiam fazer a pré-inscrição pela Internet ou que regressassem no dia seguinte. "Mas há dois ou três que continuam à porta porque querem garantir a vaga", dizia a directora, a meio da tarde de quarta-feira. "É constrangedor vê-los a dormir no carro e, hoje em dia, não faz qualquer sentido", desabafa, acrescentando que aquela "não é boa publicidade" ao colégio. Aqueles pais são os irredutíves, os que não ouvem a directora e que na manhã de ontem se recusam a falar e a ser fotografados pelo PÚBLICO, os que se fecham num círculo de sobretudos e chapéus-de-chuva a falar sobre o crescimento da China, ignorando os jornalistas, os que se refugiam nos carros de alta cilindrada quando a chuva cai com mais força. Na noite anterior, a mãe que estava no carro confessava: "Fazemos cada figurinha triste. . . ". No dia seguinte, o casal já não responde ao "bom dia" do PÚBLICO. "Ó minha senhora, de mim não leva nada", atira incomodado o cabeça do casal. A mulher evita falar convidando outros pais a ir à pastelaria. Até às sete e meia foram distribuídas 19 senhas. A partir das oito começam a chegar outros pais, os que ouviram o apelo de Isabel Soares no dia anterior, os que sabem que não há fila ou os de primeira-água. Vinte minutos antes da secretaria abrir, uma funcionária vem à rua distribuir fichas de pré-inscrição. Os primeiros a saírem, o casal que tinha a lista na noite anterior, fá-lo um pouco antes das nove, o horário definido para as pré-inscrições começarem pela Internet. "Já que fizemos este sacrifício que sejamos recompensados!", exclama a mãe de João, antes de atender o telefone ao pai, para o informar: "Já está! Agora vamos ver. . . "
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave filha escola filho mulher bicha