A casa da avó
Nunca conheci a minha avó sem o meu avô. Contudo, as casas dos meus avós foram sempre “a casa da avó”. (...)

A casa da avó
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Migrantes Pontuação: 11 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-07-17 | Jornal Público
SUMÁRIO: Nunca conheci a minha avó sem o meu avô. Contudo, as casas dos meus avós foram sempre “a casa da avó”.
TEXTO: Primeiro, houve aquele apartamento pequeno, às portas de Paris, cidade onde vivi a minha primeira infância, época longínqua durante a qual se formaram, cresceram e fincaram as raízes da relação visceral que vivi com a minha avó. Talvez por causa disso houvesse pouco ou nada que eu lhe pudesse esconder. Criança, adolescente ou mulher, as amarras que a ligavam a mim iam directamente à minha alma e tornavam-me transparente ao seu coração. Era com a força desse órgão transbordante que me via, me aconselhava, rezava por mim e me acompanhava, mesmo que estivéssemos fisicamente distantes uma da outra, como acabámos por estar grande parte das nossas vidas. Recordo o cheiro a madeira e a cera que emanava das escadas que era preciso subir para chegar à porta do pequeno apartamento dos meus avós. Para chegar à casa da avó. O corrimão brilhava com a luz que entrava pelas janelas altas e estreitas que acompanhavam a escadaria. Recordo o toque suave da sua madeira polida, sempre limpa, e o prazer que me dava olhar para baixo, pelo vão elegante, para observar a tijoleira preta e branca do pavimento, no rés-do-chão. Chegada ao segundo andar e aberta a porta do apartamento, era recebida por um dos primeiros cheiros a casa de que me recordo e que poderei recriar um dia, mas apenas em parte. Não me bastará misturar o aroma da laca Elnett ao perfume Aramis. Faltarão sempre os odores inimitáveis da pele dos meus avós. O cheiro do pescoço da minha avó, sempre o mesmo, desde as minhas memórias mais remotas até àquele dia, no hospital, quando teve ainda lucidez para me pegar nas mãos, falar comigo e abraçar-me. O cheiro doce a charneca algarvia de há cem anos, a erva-príncipe e a arcas onde se guardavam lençóis, amêndoas e figos secos. Avó, que bom foi eu ter encostado o meu nariz ao teu pescoço só mais uma vez. O corredor estreito desembocava na pequena cozinha, dominada por um grande frigorífico que se abria pondo o pé sobre um pedal de metal. Havia uma mesa onde se faziam todas as refeições e na qual me era oferecido um lugar à cabeceira quando estava de visita. Ficava, então, de frente para a janela, de onde se via o céu e os telhados e na qual se pendurava a gaiola de um canário saltitante, cantor, feliz. Nessa cozinha, a minha avó tirou-me uma fotografia a lavar a loiça, era eu tão pequena que precisava de uma cadeira para chegar à bacia. Deve ter chamado por mim antes de carregar no botão da Kodak (como chamava a toda e qualquer máquina fotográfica): “Xani!” Clic. Fiquei no retrato, a olhar para trás, sobre o meu ombro direito, a olhar eternamente para ti, avó. Nessa cozinha comi baguetes estaladiças ao pequeno-almoço, carregadas de manteiga que derretia no calor do pão acabado de cozer. E pães com chocolate e folhados de maçã ao lanche. E esparguete, que a minha avó regava com o seu molho de tomate caseiro. E omeletes de queijo acompanhadas de batatas fritas, que eram a especialidade do meu avô. Só em Portugal, muitos anos mais tarde, o vi a cozinhar uma outra coisa: sardinhas. Já a minha avó era uma cozinheira exímia que combinava o melhor da culinária portuguesa e da francesa, e até a de outras paragens. Lembro-me de a ver anotar com minúcia as instruções, em francês, de quem cozinhava na televisão a preto e branco, das suas colecções de revistas de culinária e dos recortes com receitas avulsas que ia recolhendo e guardando em pastas. Neste último Natal, avó, a ausência das tuas tartes de amêndoa e de maçã sobre a mesa da consoada foi um grito de saudade insuportável. Havia um quarto pequeno, uma cama de casal com uma colcha de veludo verde, uma única mesa-de-cabeceira, um duche exíguo para onde se entrava subindo um degrau e um espelho em frente do qual punha laca nos cabelos e pintava os lábios com batom antes de sair de casa, fosse para o que fosse. Caminhava na rua com a cabeça erguida e seguia confiante como quem encarna toda a dignidade do mundo. Era gentil, cumprimentava, sorria. O som dos teus tacões nos passeios de Paris, avó, e a minha mão na tua. A sala era a maior e mais luminosa divisão da casa. Um sofá, a televisão, uma vitrine com bibelots, uma mesa que se abria nas ocasiões especiais, mas que no dia-a-dia servia para apoiar o telefone e à qual se sentava para preencher, semana após semana, as apostas no Lotto e no Tiercé. Só que o dinheiro, esse, veio exclusivamente de 25 anos de trabalho como emigrante. Da janela da sala via-se o pátio interno do prédio e a janela da casa da concierge. Cá de cima, observava o canteiro redondo, relvado, afastando os cortinados translúcidos, e quando voltava a concentrar a minha atenção nos detalhes da sala, percorria com o olhar o padrão hipnótico do papel de parede, provavelmente colado nos anos 1960. Dourado sobre bege. Desenharia esse padrão agora, se mo pedissem. Era nessa sala que eu dormia, numa cama improvisada, feita com as almofadas do sofá colocadas no chão e impregnadas do cheiro dos meus avós. Era a minha cama dos longos meses de Julho quando, terminadas as aulas em Portimão, eu regressava a França. Regressava a tua casa, avó. Um Verão houve em que soube que aquela era a última vez. Os meus avós reformaram-se, guardaram os seus haveres em caixas de cartão, entregaram os móveis a uma empresa de mudanças e, no início de Agosto, entrámos no Renault do meu avô para regressar de vez a Portugal. Eu, pré-adolescente, sentada no banco de trás, olhei para o prédio, para a rua, enquanto o carro se afastava, ainda o dia não tinha nascido. Não quis chorar, mas levava um nó no peito que nunca desatei: não voltaria a entrar naquela casa pequena, recheada de memórias e cheiros primordiais. Paris já não era a minha cidade havia uns anos; agora deixava de ser a cidade dos meus avós, deixava de ser a cidade da casa da avó. Era o adeus definitivo a uma certa forma de felicidade. A casa que os meus avós foram habitar em Portimão — a nova casa da avó — é uma casa da família. Eu mesma já lá vivera com os meus pais e o meu irmão, no nosso regresso a Portugal. Reformada, com saúde, feliz por voltar à terra e com mais espaço, a minha avó expandiu-se nesta casa, que se encheu de gente e passou também a albergar um cão. No grande quintal onde eu brincara tanto, foram plantadas árvores de fruto, roseiras e ervas de cheiro para chás e temperos. Na sala, com o dobro do tamanho da de Paris, a mesa foi palco de almoços e jantares memoráveis, aqueles em que nos perguntava, deleitada, se a comida estava boa ainda antes de termos posto a primeira garfada na boca. Ninguém sabia receber como a minha avó. Uma refeição em sua casa era um acontecimento. Tudo era planeado com detalhe, das entradas às sobremesas, e a mesa posta com esmero porque seria o palco dos seus momentos predilectos: ver-nos comer, colher os elogios, explicar como se fazia. No Verão instalou-se o hábito de fazermos a sardinhada dos netos. Era quando o meu avô entrava em cena, de roda das sardinhas reluzentes, fresquíssimas, compradas de manhã bem cedo, e do fogareiro cujo carvão tinha de estar no ponto certo para receber o peixe sobre a grelha. Uma arte. E lá ia ele, do fogareiro para a mesa, da mesa para o fogareiro, transportando pequenas travessas de sardinhas assadas, sorrindo permanentemente. Por vezes parava, olhava para nós — na época, sete netos e um bisneto — e dizia: “Quem há-de morrer e deixar uns netos tão lindos. . . ”Sorríamos, convencidos de que tínhamos ainda todo o tempo do mundo. Nesta outra casa da avó reencontrei os objectos de Paris e descobri muitos outros, agora com espaço para serem expostos e para reclamarem a sua principal função: compor a cronologia da família, contar a nossa história, alimentar a memória e adiar o esquecimento. Surgiram as fotografias dos antepassados — a minha trisavó, o rosto onde me revejo; o meu bisavô, seu filho, fardado para defender território português, no Norte de Moçambique, durante a Grande Guerra —; os bordados feitos pela bisavó quando adolescente, emoldurados e pendurados na parede; os anéis, as pulseiras, os móveis herdados; um registo antiquíssimo do Sto. António, que passa de mães para filhas há várias gerações. Esta imagem centenária ocupou o lugar central de uma camilha no quarto dos meus avós e foi à sua volta que se multiplicaram outras imagens de Sto. António, vindas de várias partes do mundo, ao ritmo das viagens dos filhos, dos netos, dos amigos. Nunca a vi ajoelhada nas suas orações àquele homem bom, mas construí na minha cabeça essa imagem porque sei que pediu por mim, durante longas horas, no meu pior momento. Todos os dias agradeço esse milagre, avó. Os bisnetos que foram chegando e que visitavam a casa da avó ouviram o mesmo que eu quando era pequena: “Não se mexe nas coisas da avó. ” Todos obedecemos. Até ao dia em que a avó morreu, o avô também, e a casa teve de ser vazada, e nos vimos obrigados à violência da pior devassa. O Museu da Inocência, de Orhan Pamuk, foi o primeiro livro que li este ano. Conta a história do amor obsessivo de um homem que durante anos rouba e colecciona objectos da mulher que idolatra. Mais tarde, organiza um museu para expor esses mesmos objectos e contar a história do seu amor, um museu que existe mesmo, em Istambul, e que é um dos mais belos que alguma vez visitei. No início deste ano, avó, quando fui pela última vez à tua casa, foi deste museu que me lembrei. Tinha diante de mim — espalhada sobre a cama, o sofá, as cadeiras, as mesas, os móveis, o chão — a vida dos meus avós, retirada dos fundos dos armários, das gavetas, das caixas. As conquistas, as alegrias, as tristezas, as fragilidades: tudo exposto sem pudor. Mais de 90 anos de vida; mais de 70 anos de casamento. Os relógios da casa, desacertados, continuavam a medir um tempo que já não interessa. As roupas pareceram-me mortas, também. Toquei e peguei no que quis: os frascos de perfume a meio, as garrafas de licor por abrir, os óculos graduados abandonados, um porta-moedas castanho com um punhado de francos franceses, as centenas de fotografias guardadas em envelopes, os terços, as loiças, os estanhos. Aí, onde estás, importar-te-ão estes objectos? Terão ainda valor para ti? Estarás a repreender-me, sem que eu possa ouvi-lo, “não se mexe nas coisas da avó”?Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. É que a mim — que me emocionei às lágrimas no Museu da Inocência, sensibilizada pela devoção de um homem aos objectos da mulher que amou — tudo me pareceu, na casa que já não é a da avó, insensato. Passamos uma vida a apegar-nos a coisas e depois morremos e deixamos de herança uma saudade imensa que não encaixa na forma de uma fotografia emoldurada, de uma écharpe, de um bibelot, de uma chávena de chá ou de um livro. Creio que me emocionei no Museu da Inocência porque não conheci, nem amei, os seus protagonistas. Fiquei, apenas, sob o efeito da história bonita e do lugar peculiar. Mas na casa da avó que amei profundamente, rebelei-me contra os objectos inertes, que impunham uma presença arrogante, como se tivessem direito a estar ali, quando quem de facto importava, quem devia ocupar aquele espaço e o vazio no meu coração, quem eu queria tocar já tinha partido. No entanto, eu quis — todos nós quisemos — ficar com um pouco dos despojos da casa da avó. E assim, em diversas outras casas, se construíram pequeníssimos museus à maneira de cada um. Espalharam-se os objectos. Espalhar-se-ão até as roseiras. A morte expulsou-nos da tua casa, avó, mas o teu amor, que é a nossa casa, prolongar-se-á em nós.
REFERÊNCIAS:
O desgraçadismo foi sobrevalorizado
Em tempos, Pacheco Pereira cunhou a palavra “engraçadismo” para classificar aqueles que, como eu, utilizam o humor para falar de assuntos políticos, com uma superficialidade (diz ele) que impede uma genuína reflexão sobre os problemas do país. Hoje, eu queria devolver o cumprimento e acusar Pacheco Pereira de “desgraçadismo”, que podemos classificar como a utilização de um discurso catastrófico para falar de assuntos políticos, com um primarismo (digo eu) que impede uma genuína avaliação do estado do país. Não digo isto só para embirrar com Pacheco Pereira em vésperas de eleições, mas porque a sua atitude me pare... (etc.)

O desgraçadismo foi sobrevalorizado
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Migrantes Pontuação: 11 | Sentimento 0.0
DATA: 2015-10-01 | Jornal Público
TEXTO: Em tempos, Pacheco Pereira cunhou a palavra “engraçadismo” para classificar aqueles que, como eu, utilizam o humor para falar de assuntos políticos, com uma superficialidade (diz ele) que impede uma genuína reflexão sobre os problemas do país. Hoje, eu queria devolver o cumprimento e acusar Pacheco Pereira de “desgraçadismo”, que podemos classificar como a utilização de um discurso catastrófico para falar de assuntos políticos, com um primarismo (digo eu) que impede uma genuína avaliação do estado do país. Não digo isto só para embirrar com Pacheco Pereira em vésperas de eleições, mas porque a sua atitude me parece sintomática do desfasamento que existe entre a realidade do país e a narrativa que sobre ele foi sendo construída ao longo dos últimos anos. Todos estamos admirados com as sondagens, e há seis meses não se vislumbrava vivalma capaz de admitir em público a sua fé na vitória da coligação. Contudo, há uma diferença significativa entre o espanto e a incompreensão. Eu estou espantado, mas percebo. Já a esquerda da pátria, e a própria esquerda do PSD, não está pura e simplesmente a perceber o que lhe está acontecer. Afinal, como é possível que num Portugal espremido até à última gota de IVA, de sobretaxa de IRS, de 13º mês, de terrível precariedade e impiedosa austeridade, quatro em cada dez eleitores ainda se mostre disponível para votar em quem nos governou desde 2011? O povo embruteceu de vez?Não, o povo não embruteceu de vez, embora o mesmo não se possa dizer de quem decidiu resumir os últimos quatro anos de Portugal a uma espécie de “waste land” – para esses, Outubro pode bem vir a ser o mês mais cruel. Ao mesmo tempo que fomos sendo esmagados por um discurso mediático centrado em números de desemprego, programas de ajustamento, cortes, emigração, quedas de bancos e protestos de corporações descontentes, havia centenas de milhares de portugueses a fazer pela vida e a tentarem desenrascar-se sem a velha bengala do Estado, cada vez mais frouxa e desconjuntada. O desgraçadismo está muito sobrevalorizado. É verdade que boa parte dos portugueses que vão votar na coligação não estão satisfeitos com a governação de Passos Coelho e Paulo Portas. Eu próprio, no próximo domingo, vou votar PàF mais ou menos com a mesma convicção com que os comunistas votaram em Mário Soares em 1986. Trata-se de engolir, não direi um sapo, mas, pelo menos, uma rã. Só que não tenho alternativa à rã – não há um único partido que esteja a criticar a coligação por aquilo que ela merece ser criticada. Todos os políticos batem na tecla da austeridade, quando todos os não-políticos têm a perfeita consciência de que a austeridade era inevitável; toda a esquerda acusa o governo de ter ido além da troika, quando o maior erro do governo foi ter ficado aquém da troika. Tivesse alguém dito: “o governo perdeu uma excelente oportunidade para reformar o país”, e eu estaria ao seu lado. Mas não. Em toda esta campanha apenas se ouviu a conversa do desgraçadinho. Ora, para quem não é desgraçadinho, não se sente desgraçadinho e não está viciado em desgraçadismo, o discurso do queixume e as promessas de regresso a vacas gordas em prado ralo são muito pouco convincentes. O país mudou e o PS estava distraído. Acreditou que para ganhar folgadamente as eleições bastava, como dantes, sacar o voto do descontentamento. Enganou-se: desta vez, os descontentes não são todos iguais.
REFERÊNCIAS:
Papa pede à Europa para acolher os imigrantes que fogem dos conflitos na Líbia
Bento XVI lamentou hoje a guerra na Líbia e pediu à Europa para não deixar de acolher os imigrantes desesperados que fogem dos conflitos no Norte de África. Mais de cem mil pessoas assistiram à missa pascal na Praça de São Pedro. (...)

Papa pede à Europa para acolher os imigrantes que fogem dos conflitos na Líbia
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Migrantes Pontuação: 10 | Sentimento 0.8
DATA: 2011-04-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Bento XVI lamentou hoje a guerra na Líbia e pediu à Europa para não deixar de acolher os imigrantes desesperados que fogem dos conflitos no Norte de África. Mais de cem mil pessoas assistiram à missa pascal na Praça de São Pedro.
TEXTO: O Papa presidiu esta manhã à cerimónia religiosa numa Praça de São Pedro apinhada de gente e ornamentada com 42 mil flores brancas, oferecidas pela Holanda para simbolizar a esperança e o amor. Bento XVI, que proferiu as saudações pascais em 65 línguas, lembrou a tristeza das guerras, pobreza e sofrimento no mundo, especialmente no Norte de África. “Aqui, a alegria da Páscoa contrasta com o choro e os lamentos que surgem de tantas situações dolorosas: privações várias, fome, doenças, guerra, violência”, disse na sua mensagem “Urbi et Orbi” (“Para a Cidade e para o Mundo”). Referindo-se à Líbia, em guerra civil há três meses, o Papa apelou à diplomacia e ao diálogo em vez das armas e falou da importância da ajuda humanitária chegar a quem mais precisa dela. O Sumo Pontífice pediu respeito pelos direitos humanos no Médio Oriente e no Norte de África e apelou à Europa para acolher as pessoas obrigadas a fugir dos conflitos naquelas regiões do planeta. “Que as pessoas de boa vontade abram os seus corações e os recebam, para que as necessidades prementes de tantos irmãos e irmãs tenham resposta, num espírito de solidariedade”. Bento XVI também apelou ao restabelecimento da coexistência pacífica na Costa do Marfim, dizendo que o país “precisa urgentemente de trabalhar no caminho da reconciliação e do perdão” para sarar as feridas causadas pelas violências recentes.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave direitos guerra humanos violência fome ajuda pobreza humanitária marfim
"Pode entrar-se para a maçonaria mandando um email"
Em entrevista, Fernando Lima, grão-mestre do Grande Oriente Lusitano, demarca-se da maçonaria brasileira que apoiou Bolsonaro. (...)

"Pode entrar-se para a maçonaria mandando um email"
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Homossexuais Pontuação: 6 Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-30 | Jornal Público
SUMÁRIO: Em entrevista, Fernando Lima, grão-mestre do Grande Oriente Lusitano, demarca-se da maçonaria brasileira que apoiou Bolsonaro.
TEXTO: Há um ano e meio, Fernando Lima foi reeleito para um terceiro mandato na liderança do Grande Oriente Lusitano. O seu lema, durante a campanha, foi "Renovar a prosseguir" e uma das prioridades era aumentar o rigor e a exigência nos recrutamentos para a maçonaria. Defende que todos os maçons deviam dizer que são maçons. Consegue convencer os seus irmãos de que isso seria bom para a maçonaria? Acho que hoje já há uma tendência genérica de assumirem. Não estou a dizer que todos estejam convencidos ou que não pensem que haja constrangimentos na sociedade relativamente à assunção. Esta frase não é minha, inspirei-me sempre no António Arnaut e no António Reis: não há razão nenhuma para que os maçons hoje não se assumam. Houve uma proposta no Parlamento que defendia que os deputados deviam dizer se pertenciam à maçonaria, de que clubes de futebol eram sócios… Como viu isso? Mal. Um princípio fundamental das sociedades abertas é a liberdade de consciência, que é o respeito pelas convicções e crenças de cada um. Não temos de estar a criar anátemas sobre as pessoas para que revelem as suas convicções íntimas…É um mau princípio e falta de respeito pela consciência das pessoas. Mas não haveria assim mais transparência? Até vai ao encontro do que diz que os maçons deveriam assumir-se… Tão transparente como eu pedir a alguém que revele a sua orientação sexual. Eu tenho direito a violar a privacidade de alguém?Mas os maçons são acusados de trocarem favores entre si… Não existe… Eu não gosto de falar em maçonaria, há várias maçonarias. Estou a falar da maçonaria tal como eu a entendo aqui no Grande Oriente Lusitano. É uma instituição humana como outra qualquer. Naturalmente, aqui temos do melhor, temos pessoas que são menos boas e também temos algumas coisas que nem sempre nos abonam muito, como em qualquer outra instituição, seja na imprensa, seja nos tribunais… Eu não posso dizer que não haja dois ou três que façam coisas que face aos nossos princípios são reprováveis. Mas dizer que quem entra para a maçonaria é porque vai conspirar, vai trocar favores… Normalmente, essas pessoas resistem cá pouco tempo. Sabemos que algumas pessoas entram na maçonaria porque acham que aqui conseguem fazer uma carreira, conhecem pessoas… Aqui no Grande Oriente Lusitano dou-lhe quase a garantia de que quem pensa assim não está cá muito tempo. Foi reeleito há ano e meio com um programa que prometia mudanças. Tem conseguido fazer algumas mudanças, nomeadamente abrir mais a maçonaria ao exterior? Têm acontecido muitos debates, tivemos cá a Raquel Varela, o Pacheco Pereira…O Pacheco Pereira sempre defendeu que os deputados deviam ser obrigados a dizer se são maçons… Sim, mas ele quando cá vem lembra-se do avô dele que era maçon…Temos tido debates pelo país, discutimos aqui o Orçamento do Estado com membros da comissão parlamentar. Olhe, ainda há dias fiz um comunicado contra os valores e princípios que levaram à eleição de Jair Bolsonaro no Brasil. Mas Bolsonaro foi apoiado pela maçonaria brasileira. Já lhe disse que há maçonarias e maçonarias. Eu não me identifico com a maçonaria brasileira. Mas pode perguntar porque é que fizemos o comunicado a propósito do Bolsonaro e não fizemos a respeito de outras coisas. Mas temos feito muitos comunicados, às vezes em conjunto com a maçonaria europeia – as pessoas é que não notam – contra o facto de o parlamento da Sicília ter feito uma lei proibindo os maçons de ocuparem cargos públicos, o facto da Liga Norte do Salvini querer fazer uma lei a proibir as sociedades secretas, uma lei exactamente igual à nossa de 1935 (que ilegalizou a maçonaria) que, aliás, foi inspirada numa lei de Mussolini. Não sei se muita gente sabe isso. Em 1925, houve um debate entre o Gramsci e o Mussolini no parlamento italiano, porque o Mussolini propôs uma lei que nós viemos a copiar em 1935. Mas a aliança maçónica europeia tem protestado contra a situação na Hungria, onde a vida dos maçons não é fácil. Os maçons estão a ser perseguidos na Hungria? Não é perseguidos no sentido de serem presos, mas o ambiente é de tal modo claustrofóbico que têm alguma dificuldade em estar à vontade. Mas na Hungria também há perseguições anti-semitas. Na própria Polónia, a maçonaria tem tido algum retrocesso. Mas porque é que o Grande Oriente Lusitano fez um comunicado sobre o Brasil? Porque temos um património comum, que é a língua, temos uma ligação mais forte. E foi um maçon [D. Pedro] que fundou o Brasil… Foi um maçon que fundou o Brasil. E eu estar a ouvir coisas como uma mulher bonita é para ser violada… ou dizer “torturaram uns tantos, o melhor era ter morto aquela malta toda”. Isto para nós… e o voto não chega! O Hitler também foi eleito por voto. As democracias também são legitimadas pela forma como respeitam os direitos humanos. Estamos a assistir a um retrocesso? Olhamos para Donald Trump nos Estados Unidos, outro país fundado por maçons… É evidente que desde a Idade Média até agora o mundo tem progredido muito. Não é isso que está em causa. Há 70 anos o mundo era horrível… Há muitas coisas que têm evoluído. Mas a sensação que tenho é que nos últimos 20 anos – e estou a citar Pacheco Pereira, veja onde eu já cheguei – tivemos retrocessos civilizacionais graves relativamente àquilo que se conquistou nos últimos 200. Por exemplo? Esta coisa das democraturas [democracia ditadura], como eu gosto de chamar. . . estas ditaduras meio disfarçadas que existem por aí, dos Trump, dos Bolsonaro, a Hungria, já para não falar do Sudeste Asiático. Os direitos humanos são uma temática que aqui no Grande Oriente Lusitano nós discutimos muito que é o problema do pós-humanismo e o transumanismo. A inteligência artificial, as nanotecnologias, as biotecnologias. O que vai ser o mundo daqui a 50 anos? Somos robôs? Será que passaremos a poder programar os nossos filhos? Haverá um momento em que teremos de dizer aos cientistas: a partir daí, parou. Eu quero continuar a amar, a morrer, a gostar dos meus filhos, a ter afectividade, a ter lágrimas nos olhos. Isto é que é ser humano. Eu não quero viver até aos 200 anos. E as novas tecnologias acentuam ainda mais aquele que é o maior problema do mundo, a desigualdade social. Nós, maçons, somos humanistas. Queremos um progresso que não acabe com a Humanidade. Diga-me uma coisa, como é que se entra para a maçonaria. Imagine que eu queria entrar – eu não quero – como é que fazia? Temos uma maçonaria feminina muito interessante, atenção…Mas como é que se faz? Ia falar com um amigo maçon? Normalmente é por indicação de um amigo ou conhecido. Mas também pode mandar um e-mail. Pode-se escrever um e-mail? Pode escrever um e-mail a dizer que gostava muito de entrar para o Grande Oriente Lusitano. No seu caso, como isto é uma obediência masculina, era mais complicado (risos). Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Pronto, se fosse homem. Nomeávamos aqui dois ou três maçons – a gente chama-lhe aqui sindicância –?, não é no sentido da investigação, é falar com a pessoa, o que faz na vida, repescar um bocadinho a antiga frase que os maçons diziam, que para a maçonaria só entram “homens bons e de bons costumes”. (Risos) É uma frase onde cabe tudo (risos). Eu tenho aqui alguns maçons que entraram assim. Mandaram um e-mail? Sim, sim. Ou por carta ou por e-mail. Mas não se faz uma investigação como aquelas para entrar no SIS? Não, é uma conversa. Como é que se chama, o que faz na vida, quais são os seus princípios morais, os seus valores. Não passa disto.
REFERÊNCIAS:
Étnia Asiático
The Gifted, a série de super-heróis que não fecha os olhos aos problemas sociais da América
É mais uma adaptação das histórias eternizadas nas bandas desenhadas de super-heróis da Marvel para os ecrãs de televisão: The Gifted regressa para a segunda temporada e tenta reflectir no seu enredo a perseguição a minorias nos EUA – mas desta vez são os mutantes que estão em fuga. (...)

The Gifted, a série de super-heróis que não fecha os olhos aos problemas sociais da América
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Homossexuais Pontuação: 6 Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.011
DATA: 2018-10-06 | Jornal Público
SUMÁRIO: É mais uma adaptação das histórias eternizadas nas bandas desenhadas de super-heróis da Marvel para os ecrãs de televisão: The Gifted regressa para a segunda temporada e tenta reflectir no seu enredo a perseguição a minorias nos EUA – mas desta vez são os mutantes que estão em fuga.
TEXTO: Entre dezenas de séries em que os superpoderes são protagonistas, The Gifted faz da diversidade e da luta pelas minorias a sua bandeira. A série da Fox e da Marvel, criada por Matt Nix, surge num universo ficcional em que os X-Men desapareceram e em que os mutantes (humanos com superpoderes, concedidos pelo gene X) se vêem obrigados a lutar contra leis cada vez mais restritas que lhes vão retirando o acesso à saúde e à cidadania, atirando-os para a clandestinidade. A segunda temporada de The Gifted estreia-se esta segunda-feira, dia 8, na Fox, e os 13 episódios serão exibidos todas as segundas, às 23h05. “Uma das coisas que fazemos bem é reflectir a sociedade”, garante o actor britânico Stephen Moyer numa entrevista colectiva num hotel londrino, quando questionado sobre a influência de acontecimentos políticos em The Gifted. “Não há outra forma de se fazer isto numa série sem que seja uma espécie de reflexo do que se passa hoje em dia. Mas também não há maneira de reflectir aquilo que está a acontecer actualmente nos Estados Unidos, porque a realidade muda a cada dois minutos”, brinca o protagonista, sem receio de criticar a Administração norte-americana. Nesta série, Moyer interpreta Reed Strucker, um procurador que prende mutantes, mas passa a defendê-los depois de descobrir que os seus dois filhos têm poderes. “Acho que é essa a essência dos X-Men quando foram criados há anos; é uma representação daquilo que estava a acontecer no movimento dos direitos civis. Portanto, sejam questões de religião, de raça ou de orientação sexual, os X-Men são um reflexo daquilo que a sociedade é”, assevera Moyer. A diversidade do elenco de The Gifted tem sido, aliás, reconhecida pela crítica e pelos próprios actores: na série há personagens negras, latinas, asiáticas, nativo-americanas e personagens que sofrem bullying ou que lidam com doenças mentais. Nesta segunda temporada, as questões políticas ganharam força e o compromisso dos produtores é olhar para os dois extremos do espectro narrativo: os mutantes que lutam contra a humanidade e os que acreditam ser possível fazer-se uma aliança com os humanos. A juntar a isso há uma nação norte-americana cada vez mais polarizada, com o aumento de manifestantes de extrema-direita que criam grupos antimutantes e a favor dos direitos humanos (e aqui “humanos” exclui quem tem superpoderes). De um lado há organizações de apoio a mutantes e, do outro, comícios em que os políticos se mostram abertamente contra os mutantes — e dizem ser urgente prendê-los e despojá-los dos seus direitos. O próprio criador da série, Matt Nix, admite à revista Hollywood Reporter que “não é preciso um olho de lince” para se perceber as semelhanças entre os Serviços Sentinela (os que perseguem os mutantes) e os raides do ICE (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras norte-americano, que têm separado crianças das suas famílias que imigram ilegalmente na fronteira dos EUA com o México). Na série, tenta-se mostrar essas semelhanças sem ditar o que está certo ou errado. “Expõe-se o assunto, mas não dizemos o que se deve pensar. Mostramos as personagens que existem neste universo, mas não fazemos comentários”, sintetiza Stephen Moyer. “Explicamos porque é que as personagens são como são, em vez de simplesmente dizermos aos espectadores: ‘Isto é errado. ’ Deixamos que os espectadores decidam. ”A actriz norte-americana Natalie Alyn Lind (a filha mutante da personagem Reed Strucker ), que também fez parte do elenco da série Gotham, da DC Comics, acredita que houve uma transposição para a série daquilo que ela vê acontecer hoje nos EUA: “Há uma categorização das pessoas, uma atribuição de rótulos, sem que lhes seja verdadeiramente dada uma chance de se defenderem. ”Antes de protagonizar o “pai de família” em The Gifted, Stephen Moyer encarnou o vampiro Bill Compton, na série True Blood (HBO). Na entrevista que deu em Londres, o actor britânico refere que The Gifted é facilmente comparável a True Blood, uma série em que os vampiros ficam à margem da sociedade humana, lutando pelos seus direitos. A série produzida por Matt Nix surge numa onda de adaptações das histórias eternizadas nas vinhetas de banda desenhada da Marvel para os ecrãs de televisão: Inhumans, Jessica Jones, Luke Cage, Iron Fist, Legion, O Demolidor, O Justiceiro, Os Defensores, os Agentes S. H. I. E. L. D. — passando grande parte destas séries no Netflix. A produção destas narrativas sobre mutantes parte também da DC Comics, que produz séries como Arrow, Gotham (também da Fox), The Flash, Black Lightning, Krypton, e espera-se ainda a chegada de Titans (renovada para uma segunda temporada ainda antes de se estrear). Para os dois actores entrevistados, The Gifted difere de todas as outras séries que têm surgido no universo de super-heróis precisamente por se focar nas desigualdades sociais e na ambiguidade das personagens – que não são necessariamente boas ou más, o que é perceptível na origem das suas motivações –, integrando arqui-inimigos e superpoderes na narrativa, mas não se centrando apenas neles. Isso, de resto, não é incomum no universo Marvel — tome-se o exemplo da narrativa em torno de Magneto (que na série se pressupõe ser o pai de Lorna Dane). Entre tantas produções do género, pode tornar-se difícil para uma série com muitas personagens e com um enredo que já vai longe da premissa inicial manter a atenção dos espectadores. No arranque da segunda temporada nos Estados Unidos, The Gifted teve menos espectadores do que na estreia da primeira temporada: foram 4, 8 milhões de espectadores na primeira temporada (em 2017) e 2, 6 milhões na segunda, o que corresponde a uma perda de 45% de audiência entre as duas premières. A série é de super-heróis (ou de superpoderes, já que a fronteira entre quem é herói e quem é vilão é ténue), mas tem a sua dose de drama familiar. Na primeira temporada, a família é precisamente a força que faz avançar o enredo —o casal Reed e Kate (Amy Acker) descobre que os seus dois filhos têm superpoderes (uma espécie de telecinética e manipulação molecular) e vêem-se obrigados a fugir do Governo e a procurar auxílio numa rede de mutantes clandestina (chamada Mutant Underground). No final da temporada, essa rede de mutantes divide-se e as duas facções resultantes passam a estar em guerra entre si. Não temendo a sua herança genética, o filho Andy (Percy Hynes White) separa-se então da família e decide juntar-se ao Inner Circle, o exército de mutantes que quer destruir os humanos e que pertence à antiga organização terrorista Hellfire Club. Tal como na primeira temporada da série, no enredo continuam a existir referências ao ataque de 7/15 (15 de Julho) — em paralelo com o 9/11 (11 de Setembro) — no Texas, em que uma marcha de apoio a mutantes se transformou numa manifestação violenta em que morreram milhares de civis, agravando a repulsa e apreensão pela comunidade mutante. Ainda que nunca tenha sido tornado claro na série, Matt Nix já mencionou em entrevistas que este evento está associado ao desaparecimento dos X-Men do universo ficcional em que decorre The Gifted. As telepatas irmãs trigémeas Frost – nas bandas desenhadas da Marvel as irmãs são mais do que três clones – funcionam como elemento catalisador no final da primeira temporada e continuam a ser importantes nesta segunda temporada, cuja acção se muda de Atlanta para Washington D. C. As clones são comandadas por uma nova presença feminina, a poderosa Reeva Payge, interpretada por Grace Byers. A entrada de Reeva, uma mulher negra, dá um novo contexto a todas as discriminações retratadas na série: antes de ser odiada por ser mutante, Reeva diz num dos episódios que já era odiada pela cor da sua pele. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Afastando-se da narrativa base das bandas desenhadas da Marvel e dando um lado mais humano à herança dos superpoderes, continua a ser nestes pormenores que a série tenta transportar para os ecrãs televisivos o espírito de activismo político e de igualdade social que preenche as páginas de quadradinhos dos X-Men. O PÚBLICO viajou a convite da Fox
REFERÊNCIAS:
Entidades EUA
Queridos, toca a acordar – um conselho de Edward Albee
Ricardo Neves-Neves estreia no Teatro São Luiz um texto mal-amado de Edward Albee, Encontrar o Sol. Numa praia em que nada se parece passar, o sol expõe medos, mentiras e arrependimentos. (...)

Queridos, toca a acordar – um conselho de Edward Albee
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Homossexuais Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-02-15 | Jornal Público
SUMÁRIO: Ricardo Neves-Neves estreia no Teatro São Luiz um texto mal-amado de Edward Albee, Encontrar o Sol. Numa praia em que nada se parece passar, o sol expõe medos, mentiras e arrependimentos.
TEXTO: Pouco antes do final do primeiro ensaio corrido de Encontrar o Sol, o encenador Ricardo Neves-Neves sentiu-se a ficar sem um pingo de sangue na cara. “Como quando se recebe uma má notícia”, compara o próprio. A má notícia, no caso, era que, chegado à cena 18 das 21 que compõem a peça escrita pelo dramaturgo norte-americano Edward Albee em 1983, concluiu, agora que via o texto tomar vida diante de si, que ainda não tinha acontecido nada até àquele momento quando restava mais um par de cenas para a peça se finar. Essa momentânea falta de sangue a irrigar-lhe o rosto correspondia à súbita emergência do pânico de que talvez se tivesse precipitado ao sugerir a Aida Tavares, directora do São Luiz, levar à cena o texto de Albee. Produção: Teatro do Eléctrico Encenação: Ricardo Neves-Neves Actor(es): Cucha Carvalheiro, Custódia Gallego, Luís Gaspar, Marques d'Arede, Romeu Costa, Rita Cruz, Tadeu Faustino, Tânia Alves Cenografia: Tiago Pinhal Costa Tradução: João Paulo Esteves da Silva Direcção musical: João Paulo Esteves da Silva Figurinos: José António Tenente Texto: Edward Albee Teatro Municipal São Luiz, Lisboa, Quarta a Sábado, de 17 de Fevereiro de 2017 a 25 de Fevereiro de 2017 às 21h Teatro Municipal São Luiz, Lisboa, Domingo, de 17 de Fevereiro de 2017 a 25 de Fevereiro de 2017 às 17h30Nessa que terá sido uma das reuniões mais fáceis da sua vida, à pergunta sobre o que gostaria de apresentar na sala lisboeta, Neves-Neves atirou duas hipóteses: Encontrar o Sol e um texto da sua autoria. “E a Aida, em vez de me fazer uma contra-proposta do género ‘Muito bem, mas vê lá se não queres fazer aqui um Gil Vicente para escolas’, respondeu que faria um em 2017 e o outro em 2018. ” A ideia de Albee não era nova, daí que, mesmo se apresentada de forma impulsiva, estivesse na ponta da língua – pelo menos desde 2012. Esse seria, na verdade, o annus mirabilis de Ricardo Neves-Neves, quando num curto período definiu cinco anos de programação do Teatro do Eléctrico. Foi quando se pôs a caminho de Barcelona para realizar um workshop com o inglês Simon Stephens, de onde saiu a primeira versão da peça que o afirmou como autor, Mary Poppins, a Mulher que Salvou o Mundo; foi quando Simon lhe deu a ler os textos de Martin Crimp que montou no espectáculo Menos Emergências; foi quando partiu para Avignon com obras de Copi e de Karl Valentin sugeridas por Jorge Silva Melo na bagagem – o primeiro Copi, A Noite da Dona Luciana, estreou-se em 2016, e seguir-se-á um texto de Valentin no Teatro da Trindade; foi quando leu e se entusiasmou com Encontrar o Sol, peça mal-amada de Edward Albee. Ao apontar para esta peça de um lote de 12 a 15 que gostaria de fazer no imediato, Neves-Neves assume que foi um risco. “Nem estava bem a perceber onde me estava a meter”, desabafa. “Podia ter feito uma proposta que fosse muito mais confortável, fazia uma farsa muito divertida, com muita cor e à partida talvez pudesse ter melhores resultados. . ” Ao agir por impulso, não teve sequer tempo para premeditar qualquer ruptura com os textos que tem vindo a fazer. Mas é fácil de perceber que o tom que o encenador empresta a Albee não adere com a mesma efervescência ao teatro desenfreado de que o Ípsilon dava conta por alturas da estreia de A Noite de Dona Luciana, à sua forma estonteante de pôr as peças em andamento, empurrando-as e voltando a empurrá-las até perderem o equilíbrio e quase se estamparem. Só que não se estampavam, antes se abandonavam a essa vertigem e embalavam o público numa euforia que apenas no final parecia ceder ao cansaço e descer ao tom menor que o encenador assume como uma atracção involuntária. Depois de o sangue lhe fugir da cara, Neves-Neves demorou-se a pensar sobre “esta questão de não se estar a passar nada” em grande parte da peça. E lembrou-se do caso de uma amiga que, “num dia aborrecido igual a todos os outros, teve um acidente que a deixou com muitos problemas de locomoção” e um desejo persistente de voltar aos seus dias aborrecidos. “Esta peça é também sobre esta coisa de nada acontecer, de se falar sobre o passado e projectar o futuro, em que o presente parece ser nada, e depois tudo acontece num estalar de dedos. ” Encontrar o Sol, acredita, vive da iminência e da surpresa das más notícias. A felicidade, a ser alguma coisa, talvez seja esse momento imediatamente anterior, num esplendor de vulgaridade. Edward Albee morreu em Setembro de 2016, aos 88 anos, na sua casa em Montauk. Tendo estreado a primeira peça, The Zoo Story, em 1958, Albee tornar-se-ia, como apontava o obituário do New York Times, o depositário da “tocha da dramaturgia americana” que lhe havia sido legada por Eugene O’Neill, Arthur Miller e Tennessee Williams. Pouco depois, era já um seríssimo caso de sucesso com o primeiro espectáculo para a Broadway, Who’s Afraid of Virginia Woolf? O jornal citaria ainda Albee: “Todas as minhas peças são sobre pessoas que perdem oportunidades, desistem demasiado novas, chegando ao final das suas vidas com arrependimentos daquilo que não fizeram, por oposição às coisas que fizeram. A maioria das pessoas passa demasiado tempo a viver como se nunca fosse morrer. ”É exactamente isso que transborda do monólogo de Henden diante de um grupo de peixinhos – o CoLeGaS, coro da ILGA, que reforça a costela musical que Neves-Neves imprime ao texto e impede que os actores, nos seus momentos de desolada solidão, se dirijam ao público. Henden é o elemento mais velho dos quatro casais em palco, passou a marca dos 70 anos, e fala da morte não como um destino próximo mas como uma presença íntima que se infiltra nos seus dias há três ou quatro décadas. Daí que o encenador oiça o monólogo como um recado deixado a quem vive os seus 30 ou 40 anos. “Para o Henden aquilo já não é uma novidade”, diz. “Oiço mais o Albee a dizer-nos ‘Oh queridos, vá, toca a acordar’. ”Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Esta peça é também sobre esta coisa de nada acontecer, de se falar sobre o passado e projectar o futuro, em que o presente parece ser nada, e depois tudo acontece num estalar de dedosEm Maio passado, quatro meses antes da sua morte, Albee aprovou o projecto de cenário, figurinos e elenco do espectáculo, num processo especialmente moroso – um ano e três meses – para que Encontrar o Sol possa estrear-se dia 17 no Teatro São Luiz, em Lisboa, onde ficará até dia 25, seguindo depois para o Theatro Circo, em Braga, a 3 de Março. Não tendo havido qualquer contacto directo com o autor, também não estaria nas cogitações de Neves-Neves inquiri-lo sobre o texto. Aquilo que o encenador faz em Encontrar o Sol é, na verdade, sublinhar as dúvidas sugeridas por Albee, deixá-las a marinar numa aparente superfície que, em pequenos rasgos, deixa desprender uma imprevista profundidade. Neves-Neves gosta do potencial violento da praia, da sua obediência a ciclos marcados pela natureza, de ser “um sítio de mentira”, das relações indefinidas e do jogo social que dita sempre as regras pouco claras do que vai germinando à beira-mar. E diz-se seduzido por uma estrutura de texto que “está 25 anos à frente, igual à de quase todas as peças escritas no século XXI, num acto e feita de micro-cenas”. Gosta disso e que o texto lhe segrede precisar de uma certa preguiça e um algum tédio que são próprios da praia. O contrário daquilo que Ricardo sabe ser – “um bocado histérico e nervoso”.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave morte mulher social género circo pânico
La Rebelión leva a revolução ao centro do Porto
Cruza o tempo e o espaço e dedica-se a homenagear movimentos e personalidades revolucionárias. Desde livros a acessórios, quadros e vestuário, La Rebelión leva o mundo inteiro para o centro do Porto. (...)

La Rebelión leva a revolução ao centro do Porto
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Homossexuais Pontuação: 6 | Sentimento -0.1
DATA: 2018-07-18 | Jornal Público
SUMÁRIO: Cruza o tempo e o espaço e dedica-se a homenagear movimentos e personalidades revolucionárias. Desde livros a acessórios, quadros e vestuário, La Rebelión leva o mundo inteiro para o centro do Porto.
TEXTO: Che, Marx, Frida, Joplin, Fidel, Assange, Lennon e Marley. Da política à arte, estes nomes evocam figuras emblemáticas que habitam agora na Rua de Cedofeita, bem no centro do Porto. La Rebelión é a "primeira loja portuguesa" a dedicar-se exclusivamente à comercialização de produtos inspirados em movimentos activistas e personalidades revolucionárias. Mais do que livros, vestuário, acessórios e objectos utilitários ou de decoração, este espaço que cruza o tempo e o espaço oferece a quem o visita a possibilidade de conhecer grupos e organizações reaccionárias, como a Animal Liberation Front e o Exército Zapatista de Libertação Nacional. No fundo, La Rebelión é um local de homenagem a quem ficou na história pelo esforço em mudar consciências e o status quo. “Na pintura e na arte temos Frida Khalo, na música John Lennon, Janis Joplin, Raul Seixas e Bob Marley — que no fundo não são só compositores, mas pensadores também”, enumera a proprietária, Tita Alvarez. Che Guevara, Fidel Castro, Karl Marx ou o Subcomandante Marcos constituem algumas das figuras do panorama político, a par de Julian Assange e dos grupos Anonymous e Zeitgeist. Começaram por vender simplesmente artigos de comércio justo relacionados com grupos ou personalidades, mas agora vão mais longe. “Por exemplo, a Frida Khalo é mexicana e as pessoas querem saber mais sobre o México, então estamos a pegar em peças do folclore mexicano, como a Santa Muerte, La Catrina do Dia dos Mortos e peças Maias e Aztecas. ”La Rebelión apoia ainda a causa LGBTI e tem uma secção dedicada à geração “beat” e ao “flower power”, assim como um conjunto de livros do “grande visionário e inventor” Júlio Verne, peças de “steampunk” e vestuário militar associado às guerrilhas revolucionárias. Quis o acaso que abrisse portas nem mais nem menos no Dia da Liberdade (25 de Abril) e, de segunda a sábado, quem toma conta da pequena loja é Marco. Há uns anos acolheu Tita no Chile e recentemente mudou-se para Portugal. Sendo mapuche – comunidade indígena original do Chile e da Argentina —, acaba por se tornar “uma personagem exótica” e a cara da La Rebelión. O sentimento que deu origem à La Rebelión foi “o amor pela humanidade” e “a esperança num mundo melhor” e Tita mostra-se surpreendida com o sucesso deste espaço, que se quer “do povo e para o povo”. Na loja, já fez amizades e ouviu histórias inesperadas, por exemplo de um ex-combatente sandinista e de um jovem com uma fotografia tirada ao lado do líder do movimento zapatista. “Houve uma guia turística de Barcelona que entrou com um grupo de australianos e ficou parada, de boca aberta e a olhar para os quadros, até que começou a chorar”, recorda a proprietária. “Contou que tinha raízes de reivindicação e activismo e que nunca tinha visto algo assim”, acrescenta. Ainda Maria Celeste (Tita, desde sempre) mal falava e já acompanhava o avô, foragido da Guerra Civil espanhola, em comícios e manifestações. “O meu pai chamava-me rebelde porque era muito contestatária”, afirma, com um largo sorriso no gosto. “É uma coisa que faz parte de mim, se me tirassem isso não era a Tita. ”Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. A maior parte dos produtos são importados de pequenas cooperativas locais de comércio justo que compram directamente ao produtor e, por isso, conseguem praticar preços acessíveis: há livros a custar menos de três, crachás a 1, 5 euros e t-shirts a 14, 95 euros. “Já aconteceu uma ou duas pessoas entrarem aqui na loja e dizerem ‘Então vocês são anticapitalistas e abrem uma loja?’, e eu pergunto se eles acham que se quiséssemos ficar ricos abríamos uma loja como esta”, conta, com Tommy, o cão, ao colo. Para já, as receitas de La Rebelión são “para pagar as contas” (e “tê-las debaixo de olho”), mas Tita garante que no futuro pretende doar anualmente uma percentagem do lucro a organizações com cujos valores se identifica. No futuro, o objectivo é continuar a "apostar nos movimentos e nas pessoas que fazem o mundo andar" e promover actividades culturais, artistas e associações de solidariedade — sempre com o espírito de rebeldia presente.
REFERÊNCIAS:
Entre os actos
Virginia Woolf, intimamente e profundamente, ao longo dos anos. (...)

Entre os actos
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Homossexuais Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-06-11 | Jornal Público
SUMÁRIO: Virginia Woolf, intimamente e profundamente, ao longo dos anos.
TEXTO: Virginia Woolf decidiu por fim à vida num gélido dia de Março de 1941. “Sinto que estou a enlouquecer de novo”, escreveu ela num bilhete para o marido, Leonard Woolf. A instabilidade psicológica, a guerra, o pavor da que se supunha iminente invasão nazi e o facto de Leonard ser judeu contribuíram para a sua descida aos infernos. Virginia morreu, a Guerra terminou, a família e os amigos recuperaram lentamente da perda e, em 1953, Leonard decidiu publicar extratos do diário que a mulher mantivera entre 1915 e o ano da sua morte, com a intenção de dar a conhecer a genialidade de Virginia. Optou por uma escolha de excertos ligados ao processo de escrita que, para ela, era como uma longa e por vezes penosa caminhada, feita de dúvidas, de exaltação e de triunfos. Autoria:Virginia Woolf (Trad. e prefácio de Jorge Vaz de Carvalho) Relógio D’Água Ler excertoNessa primeira edição — A Writer’s Diary — Leonard não incluiu muitos dos textos mais pessoais, tendo o cuidado de, confidenciou, “restaurar a reputação (de Virginia)”. Hoje, pode parecer estranho que uma das mais importantes escritoras do século XX estivesse em perigo de ser esquecida mas, na altura, tanto o público como os críticos pouco ou nada se interessavam pela sua obra e, com o seu desaparecimento, Leonard achou que havia um risco de ver a obra da mulher a diluir-se no prolífero legado de um conjunto de personalidades — escritores, artistas, políticos, economistas — seus contemporâneos. Em 1977, Anne Olivier Bell — casada com o sobrinho de Virginia, Quentin Bell, com quem também escreveu uma famosa biografia da escritora publicada em 1972 — iniciou uma edição alargada dos Diários, publicados em cinco volumes, com cuidadosas e extensas anotações e um prefácio onde chamava a atenção para uma narrativa onde se encontram “os prazeres e as contrariedades diárias, as grandes alegrias e as grandes dores”. Esta versão, que surge agora em português, merece leitura atenta, porque nela se encontra uma “chave mágica” que ilumina, despudoradamente, a obra da autora, tudo o que ela absorveu e vivenciou e que transpõs para os livros, o testemunho directo do processo, sempre angustiante, da elaboração de cada romance, conto, crítica literária. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. É penoso darmo-nos conta que a mulher que nos fala jovialmente da sua vida social, das conversas, dos risos, dos vestidos, dos chapéus, das ruas de Londres cintilantes à chuva, dos pássaros, das casas, da pintura, da luz, do dinheiro — Virginia apreciava o conforto que um relativo desafogo financeiro lhe proporcionava — do amor de, e por, Leonard conhecerá a decadência física e mental que a empurrará para um acto desesperado. O seu mundo, tão rico, admirável, tão “artístico”, tão fecundo, tão densamente povoado de gente brilhante parece distante do seu “eu” interior, temeroso, inseguro, sujeito a humores extremados. No entanto, mesmo nos momentos mais sombrios arranja forças para descrever o seu estado: numa entrada, em Setembro de 1926, analisa “o horror… a chegar… uma vaga dolorosa inchando em volta do coração” (pág. 304) e reconhece que a “depressão não resulta de uma coisa concreta, mas do nada” (pág. 305). E continua afirmando o seu desejo de “estar morta” — a morte como qualquer coisa “activa, positiva, como tudo o mais, excitante; e de grande importância — como uma experiência. A única que nunca descreverei” (pág. 307), enquanto vai anotando — como se pudesse ser uma observadora exterior a si própria — a “vaga que cresce… fracasso. Fracasso, a vaga rebenta. Já não consigo enfrentar este horror”. Palavras duras e cruas, como se fossem escritas com o corpo todo. O que é que fica da leitura deste Diário? Admiração, compaixão, perplexidade, dúvidas, revolta, a descoberta dos passos de um processo criativo, a intimidade com alguém cuja genialidade se impõe, naturalmente. Como sombras, acompanhamos Virginia no seu mundo, tanto interior como exterior. Conhecemos as suas casas, o percurso dos seus passeios, a sua fé em Leonard, a cumplicidade com a irmã, Vanessa; as amizades literárias com Tom (T. S. Elliot) e Morgan (E. M. Forster), a intimidade com Lytton Strachey — com quem pensou casar , apesar de ele ser homossexual — e com o cunhado, Clive Bell, o objecto de um flirt que desencadeou uma tempestade entre as duas irmãs; a rivalidade/inimizade /amizade com Katherine Mansfield, quase o seu alter ego; a paixão física por Vita que admirava pelos seus modos , as suas pernas de gazela, o à vontade aristocrático, embora não se coibisse de notar a sua fraca inteligência e mediocridade literária; o desprezo (e inveja) em relação a Joyce que ela não quis publicar na Hogarth Press; a sua feroz ironia e o exercício da “má língua”, característica dos membros do Bloomsbury Group; as suas convicções socialistas, apoiadas por Leonard, em permanente confronto com o seu elitismo intelectual; a sua energia maníaca — a trabalhar na editora, a escrever sem parar, a proferir conferências, a viajar, a receber amigos — e as suas crises de depressão que a isolavam do mundo; a sua necessidade de se destacar e a sua paralisante timidez; o seu desejo de simplicidade e a atracção pelo fausto e pelos poderosos. Este Diário é uma obra-prima que rivaliza com o de Samuel Pepys — que, na Inglaterra da Restauração, descreveu minuciosamente as convulsões sociais em larga escala e os detalhes comezinhos da sua vida doméstica — e com os de Rousseau, Chateaubriand, Stendhal, Thomas Hardy e Ruskin, que Virginia particularmente apreciava. Woolf revela-se, aqui, íntima e profundamente, ao longo dos anos, desde mulher ainda jovem — embora comece cedo a dizer-se velha — até esses fatídicos dias em que a sua mente perdeu amarras e desistiu de lutar. . . e de escrever.
REFERÊNCIAS:
Use-IT Porto: Um mapa para os viajantes jovens que querem visitar o menos óbvio
É um mapa gratuito feito por locais para um "público desinibido e interessado" que procura fazer uma viagem mais autêntica e alternativa q.b.. "Que não quer ver a Torre dos Clérigos e a livraria Lello e ir para casa", resume o editor Carlos Mesquita. Porto é a mais recente cidade portuguesa a aderir (...)

Use-IT Porto: Um mapa para os viajantes jovens que querem visitar o menos óbvio
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Homossexuais Pontuação: 6 | Sentimento -0.02
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: É um mapa gratuito feito por locais para um "público desinibido e interessado" que procura fazer uma viagem mais autêntica e alternativa q.b.. "Que não quer ver a Torre dos Clérigos e a livraria Lello e ir para casa", resume o editor Carlos Mesquita. Porto é a mais recente cidade portuguesa a aderir
TEXTO: Quando visita uma cidade estrangeira e fica a acampar no sofá de um amigo, há sempre aquele momento em que, a meio do pequeno-almoço, entre uma torrada e um café, ele rabisca num guardanapo um roteiro improvisado, repleto de locais imperdíveis que não aparecem nos guias turísticos convencionais. Os mapas Use-IT são precisamente isso, a materialização desse momento. “É só um guardanapo maior, mas a ideia é essa”, diz Carlos Azeredo Mesquita, autor desta expressiva analogia e ideólogo da chegada desta rede internacional ao Porto e a outras cidades portuguesas. “É isso que tu queres ter. É sentires que trataram bem de ti. ”Depois da primeira edição em 2011, o Use-IT Porto tem, desde Novembro, uma segunda versão, com uma tiragem de 50 mil exemplares. Todo em inglês, é um mapa irreverente, totalmente gratuito, “feito por locais” para “viajantes jovens”, como a capa anuncia. E isso nota-se em tudo: no design de Carlos (o editor), nas ilustrações de Bruno Borges, mas principalmente nas várias sugestões turísticas “fora da caixa” (há, por exemplo, uma lista de espaços artísticos independentes, como o Sismógrafo e o Espaço Mira), nas preciosas dicas das secções D. I. Y. Food ou Act Like a Local (os visitantes tanto aprendem a cozinhar bacalhau desfiado com grão como a usar “morcão” e “carago” e a seguir o “kissing protocol”) e nas muitas histórias que adicionam um certo “colorido” à cidade (não vamos desvendar muito, mas a surpreendente história de Henriqueta Emília da Conceição faz parte da apresentação do Cemitério Prado de Repouso). A selecção dos locais nunca é muito “óbvia” até porque o objectivo passa por chegar a um “público desinibido, interessado, que não quer ver a Torre dos Clérigos e a livraria Lello e ir para casa”. Que procura fazer uma "viagem mais autêntica", "cool" e "alternativa" q. b. Por isso, entre os sítios mais comuns e quase obrigatórios, há outros, como as lojas Mon Père e Cru, os restaurantes, para diferentes ocasiões, Nabos da Púcara e Rei dos Galos, os bares Cave 45 e, no completo roteiro LGBT, Syndikato e até as “ilhas” do Bairro Herculano. Fora do centro também há vida: estão lá as praias de Gaia, Matosinhos, Foz. “Um mapa como este tem um impacto económico real: está a direccionar pessoas para sítios que provavelmente não receberiam muitas pessoas”, enfatiza Carlos, para quem uma das maiores vantagens do Use-IT é também “aliviar pressão de sítios que já são hiper-visitados”. Afinal, considera, o turismo "não tem de ser forçosamente delapidador da cidade": "Pode ser consciente e mudar vidas". Um mapa que muda viagensPara Carlos, a entrada na rede internacional Use-IT deu-se há seis anos, quando ainda estava a estudar Design Gráfico e foi passar férias à Polónia. Em Varsóvia, uns amigos deram-lhe um destes mapas da cidade, editado por essa altura. “Varsóvia não é nada amigável, não é acolhedora”, recorda o jovem artista de 28 anos, que em 2010 venceu o BES Revelação. “Puseram-me este mapa na mão e mudou completamente a minha viagem. Adorei a cidade. ” De regresso ao Porto, e como ferveroso adepto do “couchsurfing”, recebia imensa gente em casa e dava por si a contar sempre as mesmas histórias, a dar as mesmas dicas, não sabemos se ao pequeno-almoço. Decidiu, então, propor à rede Use-IT, sediada em Bruxelas, criar o mapa da sua cidade. Os mapas são sempre fruto de iniciativas locais como esta. A organização belga apenas estabelece determinados critérios que têm de ser cumpridos, de modo a haver uma unidade entre os vários mapas existentes na Europa (são quase 30, mas vários estão em desenvolvimento). O financiamento, porém, vem sempre do turismo das cidades, de modo a assegurar a "independência" dos conteúdos. Foi o que aconteceu no Porto. Editado pela associação cultural Calote Esférica, de Carlos e Maria João Macedo, o Use-IT foi financiado pelo Visit Porto — a própria directora do departamento de Turismo usou um destes mapas em Praga e ficou convencida. “Não é um trabalho de voluntariado”, avisa o editor, orgulhoso, visto que toda a a equipa envolvida no projecto foi paga segundo os valores de mercado, o que, nos dias que correm, começa a ser raro. Se o financiamento se mantiver, será renovado e reescrito ao fim de um ano. “É uma pedra de toque do projecto. A informação muda, os locais mudam, não faz sentido manter um projecto como este vivo mais do que um ano. ” E, de facto, algumas informações já estão desactualizadas: a Feira da Vandoma, por exemplo, entretanto realiza-se em Campanhã e o histórico Cardoso Cabeleireiro mudou-se para uma nova loja, umas portas abaixo. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Os turistas, garante Carlos, já descobriram o Use-IT. Falta a cidade, berço de um “mercado explosivo de Airbnb”, saber que ele existe. As vantagens são reais, diz o editor, citando um estudo feito pela rede internacional em 2014: 10% dos 2404 inquiridos disseram ter ficado mais uma noite numa cidade por causa do mapa e 79% planeavam ir no ano seguinte a um dado local só por causa do mesmo. Um outro objectivo é editar novos mapas em Braga e Guimarães, cidades que já os tiveram em 2012 a propósito da Capital Europeia da Juventude e Capital Europeia da Cultura respectivamente, e quem sabe em Coimbra. “Neste momento ter uma rede minhota faria todo o sentido, mas não tem sido muito fácil. Depende sempre do turismo local”, admite o editor. O Use-IT Porto pode ser encontrado em todos os postos de turismo do Porto (por vezes a pedido), nos quase 50 “hostels” existentes na cidade e é também distribuído através dos gabinetes Erasmus das faculdades. Também está disponível para impressão no site e, para os menos analógicos, há uma “app” gratuita, disponível, para já, apenas para iPhone. Mas com uma particularidade curiosa: é possível passear um cão virtual pela cidade. Basicamente, no mapa digital, há um ícone com um simpático cão que passeia por um dado roteiro, fora do centro turístico. Se o visitante decidir fazer esse trajecto, ou seja, passear o cão, ainda pode fazer amigos, descreve Carlos: “Se vires alguém a olhar para o telefone e a fazer o mesmo percurso que tu é porque provavelmente estão a passear o mesmo cão. Tendo em conta que este mapa também se direcciona a viajantes solitários ou que não estão em grupos é uma forma de criar alguma interacção. A seguir podes dizer: vamos passear o cão. . . em conjunto?”Ver mais em p3. publico. pt
REFERÊNCIAS:
Costa contra “arco da governação”: Invasão Marciana em marcha!
Costa, o “grande perdedor” das eleições, reverteu os motores da derrota astral contra o planeta Marketing Brasileiro da PàF e o próprio PS. (...)

Costa contra “arco da governação”: Invasão Marciana em marcha!
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Homossexuais Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Costa, o “grande perdedor” das eleições, reverteu os motores da derrota astral contra o planeta Marketing Brasileiro da PàF e o próprio PS.
TEXTO: Humanidade que ainda celebra o 5 de Outubro: isto passou-se no terceiro planeta do sistema solar, ano 2015. As mãos de um Presidente em fim de mandato tremiam como pastéis. Segurava o comando do televisor nas mãos e, quando acabava a reportagem, voltava atrás e via-a de novo: um senhor esquisito, que ainda há dias sorria e encolhia os ombros, bem-disposto, ao assumir uma dura derrota, continuava a dizer coisas incompreensíveis: “Não acho saudável que as principais forças políticas, salvo situações de emergência… eu até já disse, salvo uma invasão de marcianos… partilhem responsabilidades governativas, porque isso diminui a possibilidade de geração de alternativas e acho que não favorece a democracia. ” Cavaco Silva pediu a Maria que o ajudasse a identificar o homem que falava na rua escura. — Quem é aquele senhor que está a sorrir e a encolher os ombros?— É o António Costa, o líder do Partido Socialista. — Ah. — O que perdeu as eleições. — Ah. Mas eu conheço-o?— Foi candidato a primeiro-ministro. — Ah. Mas espera lá. . . O novo primeiro-ministro conheço-o eu bem. É o Passos Coelho. — Até já te reuniste com ele, sim. — Pois, esse rapaz eu conheço bem. E recebo-o. Não recebo qualquer um. É o meu primeiro-ministro. Este diz que é contra o conceito do “arco da governação”. Como é que se chama exactamente o senhor?— Olha, Aníbal, já são muitos anos. Os teus assessores que te expliquem que eu vou dormir!Depois de um briefing com os assessores, Cavaco teve uma vertigem chamada realidade e chamou Costa, de emergência, ao Palácio de Belém. Costa encolheu os ombros, sorriu, acabou a sandes de ovo e foi. Desde a noite das eleições que era só o que fazia: encolhia os ombros, sorria, acabava a sandes de ovo e lá ia reunir-se com um tipo qualquer que precisava muito de falar com ele. Cavaco Silva recebeu-no no gabinete de crise. Trazia vestido o uniforme de Comandante Supremo das Forças Armadas e um laser-phaser multifásico nas mãos. Para mostrar que a arma funcionava, queimou as rosas da jarra com um raio laranja. Costa encolheu os ombros e sorriu, ou melhor, sorriu e encolheu os ombros. — Isso é uma maneira de tratar as rosas muito atípica. — Temos de estar preparados!— Então diga lá. Já ando um pouco cansado de encontros e ainda me falta o Bloco, segunda-feira, se não adiarem outra vez. Um quer uma coisa, o outro quer outra coisa, e uma pessoa começa a pensar, olha-me este. . . ainda agora andava a dizer cobras e lagartos de mim e agora quer batatinhas e eu já sou um tipo do caraças e. . . — Já contactei a União Europeia e a NATO e a ONU e, mais importante ainda neste planeta Terra, como o senhor bem sabe, o Eurogrupo! Temos de aguentar a primeira vaga do assalto!— Assalto? Aos 600 milhões das pensões, imagino. — O assalto da invasão marciana! Temos de fazer já um Bloco Central da PàF com o PS ou a humanidade desaparece como. . . como. . . como o BES e a minha maioria absoluta!Costa sorriu, encolhendo os ombros. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. — Estou à espera que me explique o que acaba de dizer e espero que isso contribua para a construção de uma boa solução para a prática política. — Nunca percebo o que você diz. — Olhe, é recíproco. — Senhor, hum, opositor, estou a falar da invasão de Marte, dos marcianos. Do Planeta Vermelho. Dos comunistas. Não podemos brincar com coisas sérias. Temos de fazer um Bloco Central para proteger o mundo. — Ponho algumas condições que, enfim, veja lá se pode corresponder. . . A esquerda à esquerda do PS descobriu que eu sou de esquerda, coisa que nunca lhes tinha passado pela cabeça. De repente somos todos amigos e eles já nem se odeiam uns aos outros nem aos socialistas. Resultado: chamam-me para segurar nas mãos um Arco da Governação Popular. E como estão todos piores do que estragados consigo. . . Ei, o que é que está a tirar do bolso?— Alho, sal e um frasco de água benta. O crucifixo da campanha do Pedro não chega. Dispare lá. — Viragem da política de austeridade. — Ai. — Aumento do salário mínimo. Reposição das pensões e reformas. — Ai, ai. — Copos vaginais. — Ai!!!— Espere, isto é o PAN dos animais. Mas pronto, por que não? Há algum problema em oferecer copos vaginais para salvar o planeta da poluição da invasão dos marcianos?! Isto não é para rir, percebeu, exijo copos vaginais!— Ok, ok, já acabou?— Ahhh. . . Combate à precariedade laboral e a reversão da privatização da TAP e outras. Aposta no Serviço Nacional de Saúde e na Educação Pública. — Meu Deus, a galáxia treme. — Alteração à alteração da lei do aborto e. . . o que é que eu tenho aqui mesmo debaixo da língua? Ah. . . adopção por casais gay. — Começo a pensar que mais vale ser queimado vivo pelos marcianos. Vade retro!Costa encolheu os ombros sorrindo. — Não desmaie, também pode ser que o PS, no fim, faça tudo ao contrário. É que eu sou um marciano bastante atípico, sabe?
REFERÊNCIAS: