“Na Galiza instalou-se uma narcocultura”
Passou-se da ostentação à discrição. Do marketing social dos “narcos” a uma quase opacidade de costumes. Mas o tráfico de droga continua. A Justiça aposta na pista do dinheiro para acabar com a lavagem. Operações a que Portugal não esteve imune. (...)

“Na Galiza instalou-se uma narcocultura”
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Ciganos Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-06-21 | Jornal Público
SUMÁRIO: Passou-se da ostentação à discrição. Do marketing social dos “narcos” a uma quase opacidade de costumes. Mas o tráfico de droga continua. A Justiça aposta na pista do dinheiro para acabar com a lavagem. Operações a que Portugal não esteve imune.
TEXTO: É a história do narcotráfico galego a que Nacho Carretero descreve ao longo de 295 páginas em Farinha (edições Desassossego), um livro que depois de dez edições e 30 mil exemplares vendidos está apreendido em Espanha (ver texto abaixo). Tem um título fácil: Fariña, no original, Farinha em português, uma das designações cifradas da cocaína. O relato começa em finais do século XIX, na raia seca como berço do contrabando com o outro vizinho peninsular, e desagua numa costa de 1498 quilómetros recortada por enseadas, com desembocaduras tentaculares nas rias e em portos de abrigos naturais. Foi na costa que, do contrabando do tabaco se passou ao narcotráfico, numa aproximação ditada pelo domínio comum do castelhano entre os clãs da Galiza e os cartéis colombianos de Cali e Medellin. “Na Galiza instalou-se uma narcocultura”, sintetiza Carretero ao P2 a evolução da trama. As actividades ilícitas na raia galego-portuguesa ilustram a história e as vicissitudes económicas dos dois países. Não é por acaso que os territórios de Portugal e Espanha confinantes com a fronteira são dos mais pobres de cada nação. O ilícito era sobrevivência em Espanha e exercício de desenrasca em Portugal. Do contrabando de bens de primeira necessidade após a Guerra Civil (1936/39): quando a luz eléctrica de Portugal ofuscava as aldeias galegas iluminadas por lamparinas, o aroma do café era conforto e a penicilina uma urgência escassa do outro lado. Era uma economia paralela, a única possibilitada pela pobreza e ditada pela emergência, numa peculiar aproximação do mercado ao consumidor, em que o mercador – Portugal – supria pelo contrabando as misérias de um país devastado pela guerra e pela fome. Os velhos da raia ainda contam a história. Um vizinho cruzava diariamente a fronteira entre a Galiza e Portugal de bicicleta, carregando sempre um saco ao ombro. Cada vez que atravessava a raia, a Guarda Civil mandava-o parar e perguntava-lhe o que levava no saco. O homem, paciente e educado, mostrava sempre o conteúdo. ‘É só carvão’, explicava. E os agentes, ofendidos, deixavam-no passar. No outro lado a cena repetia-se: a Guarda Fiscal portuguesa (conhecida pelos “guardinhas”) também revistava o saco do homem e deixavam-no continuar a pedalar. A mesma cena repetiu-se durante anos perante o mal-estar crescente dos guardas fronteiriços. Não só eram incapazes de encontrar material de contrabando como em cada nova revista sujavam o uniforme de carvão. (…) O segredo do homem da raia esteve à vista ao longo de todos esses anos. Era um contrabandista de bicicletas. Este relato, do qual Nacho Carretero não conhece a origem e a veracidade, passou de geração em geração no imaginário galego. Lenda? Justificação? É uma espécie de ode. Nele respira a astúcia face à norma, o engenho contra a ordem, está a desobediência de mãos dadas com a sobrevivência. A partir dos anos 50, com menos carências básicas em Espanha, o contrabando passa a mercadorias que não são de primeira necessidade: sobresselentes de automóveis, cobre, lenços, arame, cola…Uma década depois, há uma inversão. A raia é procurada pelos desertores da guerra colonial a caminho do exílio. Os “carneiros”, como na Galiza são apelidados os contrabandistas reconvertidos a passadores, cobravam 131 euros pelo salto de um mancebo. Mas é no tabaco que vem de Portugal que as redes centram o seu negócio e moldam a sua estrutura. “Quando os contrabandistas galegos têm poder, as multinacionais do tabaco aliam-se a eles, passando-lhes material defeituoso e excedentário, ou seja, nos anos 50 os galegos trabalharam para os portugueses e, depois, superaram-nos, convertendo-se em distribuidores de tabaco em grande escala”, explica Carretero. Um negócio rentável, como refere o autor. Na década de 80 do século passado, 1/3 do tabaco ilegal que entrava na Europa era movimentado pela Galiza. As Finanças espanholas estimam, aliás, que por ano deixaram de cobrar o equivalente a 60 milhões de euros em impostos. E, entre 1980 e 82, as 150 tabacarias galegas deixaram de vender por ano cinco milhões de euros de tabaco legal. Esta mudança de escala dá-lhes fortaleza económica. Converteu os contrabandistas em donos daquilo tudo, em ícones de sucesso, em beneméritos sociais – um cocktail previsível. “O contrabando de tabaco em 1970 e 1980 não estava mal visto, dava emprego aos jovens de uma região que se considerava abandonada e maltratada por Madrid. Para os políticos locais, era bom ter proximidade destes líderes da comunidade”, constata Nacho Carretero. Os contrabandistas eram líderes de comunidade nas suas mais diversas facetas. Farinha dá exemplos: da reconstrução de um telhado da igreja às festas patronais – que chegaram a ser adiadas um dia para as traineiras ocupadas no contrabando do Winston regressarem a tempo de desfilar engalanadas; o apoio, patriarcal, aos que eram presos, das custas dos advogados às necessidades da família. Foi assim que uma sociedade paralela se construiu à margem dos poderes do Estado. E corroeu-o. Como sempre, os políticos correram atrás do prejuízo. “O maior contrabandista de tabaco era Vicente Otero, amigo íntimo de Manuel Fraga Iribarne (fundador da Aliança Popular, antecessora do PP, um dos pais da Constituição espanhola e presidente do governo regional durante anos), que financiou campanhas”, revela Carretero. “Um juiz disse-me que todos os partidos tinham sido financiados pelo contrabando e, mais tarde, pelo narcotráfico”, explica. Numa comunidade pobre, com problemas estruturais que a manta do Estado não cobria, uma resplandecente economia paralela ilegal dava trabalho aos locais, entrava nos partidos e convivia com a ordem institucional apurada em eleições livres. “Então havia um prometedor jovem que presidia à deputação de Pontevedra que não gostava nada que [os contrabandistas] “Terito”, “Nene” e outros estivessem tão perto (alguns dentro) do partido. Aquele díscolo chamava-se Mariano Rajoy e enfrentou Manuel Fraga devido a estes estreitos laços que o patrão tinha com os contrabandistas. Fraga não gostou do relevo de Rajoy e deu-lhe um conselho que já faz parte da história popular da Galiza: “Mariano vai para Madrid, aprende galego, casa-te e tem filhos”, relata o autor em Fariña. E assim Rajoy fez. O confronto com o chefe Iribarne ficou na memória de quem foi, até há pouco, presidente do Governo espanhol. Rezam as crónicas que o livro lhe foi oferecido quando apareceu nos escaparates, em 2015, por Pablo Iglésias, líder de Podemos. Depois da leitura, Mariano escreveu a Nacho Carretero. Caro Nacho. Obrigado por Fariña, já o li. Está muito bem documentado. Imagino que terá levado muito tempo a escrever e é um bom contributo. Oxalá não tenhas de voltar a escrever sobre o tema. Seria uma boa notícia. Um forte abraço. Muito obrigado. Mariano Rajoy. Assim agradeceu quem liderou até há uma semana o executivo espanhol. Rajoy, sempre acusado de falta de reflexos na sua acção política, quando era um jovem a começar carreira, teve a intuição do problema – de que os poderes do Estado, a economia informal e as actividades clandestinas não eram bom par de dança. Tinha razão. “Quando o tabaco perde valor, aparece uma mercadoria mais rentável, o haxixe e, depois, a cocaína”, prossegue o autor. “O salto para o haxixe e a lavagem de dinheiro na Suíça estreita os laços com os narcos marroquinos, argelinos e sírios. ” Internacionaliza os galegos, abre-lhes horizontes, quando, em finais dos anos 70 e princípios dos 80 [do século passado], era aplicada a mesma legislação do contrabando ao narcotráfico. “Afinal tinha o mesmo risco e, sobretudo, mais lucro”, destaca Carretero. Só a partir de 1982 o contrabando de tabaco passou a ser delito, até então era uma falta. Foi esta a equação que levou os contrabandistas de tabaco, “os senhores do fume” como eram conhecidos, a darem o salto qualitativo. O primeiro a entrar foi Sito Miñanco. Preso em 1984 em Carabanchel, nos arredores de Madrid, teve contacto com detidos do grupo de Pablo Escobar, do cartel de Medellín. Tinham algo em comum: era no Panamá que Escobar lavava o dinheiro da cocaína e Miñanco os proveitos do contrabando de tabaco. Não apenas os islamistas se radicalizam nas prisões – no velho presídio de Carabanchel, segundo o autor, Sito Miñanco, a quem já tinha sido sugerida a mudança de ramo, toma a decisão. Na cela ao lado tinha contactos fáceis com os fornecedores, dinheiro nos mesmos paraísos fiscais para a lavagem e um modus operandi comprovado, com barcos de pesca em alto-mar, lanchas rápidas a poucas milhas da costa, os todo-o-terreno para o transporte e uma completa infra-estrutura em terra: “estacas”, vigilantes, esconderijos e favores comprados nas forças de segurança. E um incomensurável mercado à sua espera. Recorda Nacho Carretero que no início dos anos 90 do século XX a Drug Enforcement Administration, a DEA norte-americana, que então começou a trabalhar com os espanhóis, estimava em quase 80% a cocaína a circular na Europa que entrava pela Galiza. Os barcos de pesca vindos da Colômbia fundeavam a 200 milhas das águas internacionais, onde acorriam lanchas cada vez maiores e mais potentes com pilotos treinados durante décadas no contrabando de tabaco e conhecedores de cada rocha das rias (ver infografia). De Espanha os fardos rumavam aos consumidores finais no Reino Unido, França, Itália, Suécia, Polónia, Letónia e Rússia. Tudo corria bem aos narco galegos que exibiam a sua riqueza com o mesmo à vontade que frequentavam os corredores do poder. “Têm uma impunidade total, ostentam a riqueza, conduzem Ferraris, são os reis da Galiza, têm contactos políticos, corrompem as autoridades, beneficiam de um marketing social”, lembra Carretero. Só no final dos anos 80 parte da sociedade galega começa a reagir devido à geração perdida, os jovens mortos e afectados pelo consumo”, salienta. “São os protestos das Mães contra a Droga, que despertam os meios de comunicação e as forças da autoridade. É a pressão da sociedade civil que leva à Operação Nécora”, reconhece. Na madrugada de 12 de Junho de 1990, o juiz Baltazar Garzón, o magistrado Antidroga Javier Zaragoza e responsáveis da polícia desencadeiam uma operação sem precedentes. Na noite de 11 de Junho, colunas policiais partem de Madrid no maior sigilo. Na esquadra central da Polícia Nacional de Santiago de Compostela amontoam-se agentes entre densas nuvens de fumo e de dúvidas. A ordem de partida é dada, ainda o dia não nascera. Chegados às carrinhas, os agentes encontram no volante um sobrescrito com o destino e as ordens. Que grande confusão que arranjámos. Foi esta a confidência de Garzón a Zaragoza contemplando o início da marcha das furgonetas, com agentes armados de metralhadoras. O objectivo era apanhar os narcos em pijama. E assim aconteceu. “No julgamento, a maioria viria a ser absolvida devido a problemas processuais, mas posteriormente houve novas investigações e acabaram quase todos por ser condenados”, recorda Nacho Carretero. “No entanto, a Operação Nécora foi a primeira reacção das autoridades que, finalmente, perceberam que a Galiza se estava a aproximar da Sicília, com autarcas processados, políticos nas proximidades das redes, uma teia de advogados em trânsito entre os narcos e a política; travou-se o poder político dos narcotráficos”, admite o autor. Daí o drama galego não ter a densidade dos relatos de Roberto Saviano sobre a Itália meridional. Mas houve um antes e depois no despertar das consciências na Galiza e em Espanha. Aos gritos de “Garzón, vales un montón” (Garzón vales muito) as Mães contra a Droga concentraram-se às portas dos paços e dos castelos convertidos em mansões onde residiam os barões da droga, desfilaram pelas ruas vitoriando o primeiro grande golpe e desafiaram os esbirros dos clãs. A luta de sofrimento pelos danos que a droga infligira aos seus filhos tivera uma primeira consequência – e reconhecimento. Comecei a ler, ele estava sentado com a mão na testa e a cabeça baixa. Não se movia. Quando terminei, levantou a cabeça e vi que estava a chorar. Este é o relato de Carmen Avendaño de uma reunião com Manuel Fraga Iribarne, presidente da Xunta da Galiza, o governo regional. Carmen, uma das Mães contra a Droga, acabara de expor ao governante a situação dos jovens dizimados. Anos antes, Fraga reagira mal ao reparo de Rajoy pela sua amizade com o contrabandista “Terito”. Os bens dos traficantes foram apreendidos, das frotas sumptuosas aos iates, os pasos e vinhedos ficaram sob administração judicial. Nos leilões são apenas admitidas sociedades que foram escrutinadas, para evitar a recompra. A classe política reagiu mas sem linearidade. Em 2013, El País publicou uma foto do Verão de 1995 do actual presidente da xunta, Alberto Nuñez Feijóo, e então número dois da Secretaria de Saúde da Galiza, no iate de Marcial Dorado, “um senhor do fume”, condenado pela venda do barco South Sea, que viria a ser utilizado para uma descarga de cocaína, e por lavagem de dinheiro. “É verdade que Marcial Dourado foi um contrabandista de tabaco, mas isso não quer dizer que não se dedicasse ao narcotráfico”, afirma a sentença da Audiência Nacional. Mesmo na Galiza, peritos afirmam que Marcial foi dos poucos que não passaram dos maços de tabaco para os fardos de cocaína, o que não converte o contrabando em actividade legal. Há cinco anos, Nuñez Feijóo disse que a amizade era pessoal, que não estava a par dos negócios de Marcial e que cortaram em 2003. Feijóo é um dos nomes no totobola espanhol para a direcção do PP depois do abandono de Rajoy. “Hoje, a política separou-se do narcotráfico, a convivência pode ser mortal para uma carreira política, mas a Galiza continua a ter tolerância para com o narcotráfico”, lamenta Nacho Carretero. “Na Galiza instalou-se uma narcocultura, os colombianos sempre apostaram nos galegos, confiam nas suas alianças, continua a entrar coca, mas os narcos são agora discretos e a sociedade não os apoia”, prossegue. O tráfico continua, mas mudaram procedimentos. “Os narcotraficantes agora não entram em contacto com a droga, o que a Justiça tenta é seguir o rasto do dinheiro, a lavagem do dinheiro. É muito difícil condenar alguém por narcotráfico, procura-se a condenação por lavagem de capitais e fuga ao fisco”, explica. Um clássico que já vem do tempo de Al Capone. Mas mantém-se o narcotráfico. “Na Galiza, a droga entra por lanchas, no Sul de Espanha em contentores de quatro a seis toneladas, mas agora os galegos são narcotransportadores, ficam com entre 20% a 30% da coca que vendem novamente aos colombianos, que, depois, a colocam em Espanha e pela Europa”, explica. Como sempre, fica droga na Galiza. “Há um acesso fácil e muito consumo de coca”, destaca Carretero. Também se mantém um atlas de geografia de conveniência, consoante o tipo de estupefaciente: “A Galiza está na rota da cocaína, o haxixe vem do Norte de África, a heroína tem origem no Afeganistão, é distribuída pela Turquia e entra na Europa pela Itália, Grécia e Holanda. ” É igualmente mantida uma prática de décadas. “Os grandes traficantes galegos nunca estiveram próximo da heroína, nos anos 80 diziam que matava muita gente, mas houve casos em que deram o seu beneplácito a contactos com clãs búlgaros e russos e com algumas famílias ciganas que a distribuíam por toda a Espanha”, adianta. A confiança mútua, que leva os narcos galegos a confiar a vida de um mensageiro aos clãs colombianos, enquanto a droga não chega ao destino, não vigora com os grupos do Leste. Também é diferente a língua. Durante mais de 50 anos no século XX, o contrabando mais rentável, o do tabaco, animou a raia. “Os galegos trabalharam muito tempo com os portugueses – aliás, em 1983 muitos fogem para Portugal, para a casa dos seus sócios do outro lado da fronteira”, recorda Carretero. Deste lado da fronteira também houve o salto. “Há estruturas em Portugal com ligações ao narcotráfico galego. Basta recordar o Minho Connection de Manso Preto”, prossegue. De resto, no âmbito das investigações preliminares à Operação Nécora, o juiz Garzón esteve no Porto a investigar a passagem de cocaína para Espanha através do Norte de Portugal. A proximidade, a porosidade da fronteira e o hábito ditaram outras situações, reveladas em Farinha. Cascais foi uma das escalas do iate de Marcial Dorado, no Verão de 1995, com Nuñez Feijóo no deck. Uma paragem ocasional, sem significado para além do interesse turístico, embora Dorado fosse detentor de uma empresa vinícola e de quatro quintas em Portugal. Também foi por motivos ímpares, de segurança, que Ricardo Portaballes, confidente de Garzón na Operação Nécora, viveu em Portugal e talvez por aqui ainda esteja. Mas há factos com outra casuística. Luis Falcón, “Falconetti”, com 73 anos e já retirado do negócio, passou do tabaco ao haxixe. Nos anos de 1980, quando lhe negaram uma licença urbanística no município de Vilanova de Arousa, colocou uma pistola em cima da mesa e disse ao alcaide que sempre poderia trazer uns tipos de Portugal para lhe dar uma ensinadela, o que custava apenas um milhão de pesetas. A obra avançou. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Josefa Charline Pomares, filha do patriarca Manuel Charline Gama, foi detida em 2001 no Porto e condenada em Espanha a 11 anos de prisão. Dirigiu o clã dos Charlines a partir do Norte, entre 1994 e 2000, onde tinha uma empresa de vinhos. Já o chefe dos Romas, Ramiro Vásquez Roma, um marinheiro de Cambados que prosperou no negócio de embarcações de recreio, preso em 2007, estendeu a Viana do Castelo a sua actividade de construtor de lanchas. No estaleiro minhoto, construiu uma potente embarcação de 25 metros, a pedido de um grupo de traficantes marroquinos. A venda de Fariña está proibida em Espanha, pouco depois do aparecimento nos escaparates da 10. ª edição do livro, devido a uma providência cautelar aceite por uma juíza de Collado-Villalba, nos arredores de Madrid. Na acção interposta em Janeiro de 2016, o antigo alcaide da localidade galega de O’Grove, José Alfredo Bea Gondar, que fora eleito pelo Partido Popular, acusa Nacho Carretero de ter ferido a sua honra e pretende 500 mil euros de indemnização. A juíza ordenou também o encerramento da página web de apoio a Carretero entretanto aberta. O julgamento tem início a 21 de Junho. No livro, há duas referências a Bea Gondar, relativas a uma investigação do juiz Baltasar Garzón, que o acusou de ter alugado um carro, guiado por um colombiano, onde seguiam 30 quilos de cocaína. O autarca foi acusado de narcotráfico pela Audiência Nacional, sentença depois revogada pelo Tribunal Supremo, ao ser declarado inválido o depoimento de uma testemunha, o que não consta da edição. Mais tarde, o político viria a ser condenado sem possibilidade de recurso por um delito de lavagem de dinheiro. “Se ele me tivesse pedido a correcção, há uns meses atrás teria concordado. Hoje, com o pedido de uma indemnização de 500 mil euros, é claro que o seu interesse é económico”, afirma o autor. “Tudo isto, quando ele não é uma personagem importante. Foi julgado e depois absolvido e mais tarde novamente julgado e condenado por lavagem de dinheiro”, prossegue. “A apreensão do livro surpreendeu-nos”, refere Nacho Carretero. Trata-se de uma medida não usual em Espanha, onde, desde a transição democrática de finais dos anos 70 do século passado, seis obras foram apreendidas por ordem judicial. “Estamos a par dessa providência cautelar em Espanha, mas confiamos na Justiça portuguesa para o mesmo disparate não se repetir por cá. Não é a proibir livros que se chega à verdade, e os portugueses cada vez aceitam menos a impunidade com que os criminosos se passeiam pelos tribunais”, disse ao P2 Luís Corte Real, director-geral do grupo Saída de Emergência, a que pertence a editora Desassossego. Uma série televisiva de dez episódios tendo como guião Fariña foi entretanto exibida no canal espanhol Antena3 TV. “Foi emitida, gerou controvérsia e debate, mas nada judicial”, comentou Nacho Carretero.
REFERÊNCIAS:
Étnia Búlgaros
Na sala do 5.º C as provas de aferição não são motivo para nervos
Não contam para a nota. Nem chumbam. Mas são um verdadeiro teste nacional ao que os alunos sabem. Cerca de 100 mil do 5.º ano de escolaridade, com 10, 11 anos, fazem nesta quinta-feira a sua primeira prova nacional. Exames a sério só no 9.º. (...)

Na sala do 5.º C as provas de aferição não são motivo para nervos
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Ciganos Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Não contam para a nota. Nem chumbam. Mas são um verdadeiro teste nacional ao que os alunos sabem. Cerca de 100 mil do 5.º ano de escolaridade, com 10, 11 anos, fazem nesta quinta-feira a sua primeira prova nacional. Exames a sério só no 9.º.
TEXTO: É um teste “para ver se sei tudo”. É um teste “para decidir se passamos”. Na sala do 5. º C da Escola Básica Paula Vicente, do Agrupamento de Escolas do Restelo, em Lisboa, as opiniões dividem-se sobre as provas de aferição que vão fazer este mês. A primeira é já nesta quinta-feira e vai estar em avaliação História e Geografia de Portugal. A 12 de Junho será a vez de Matemática e Ciências Naturais, dois conteúdos curriculares na mesma prova, o que é também uma das novidades deste ano. Para cerca de 100 mil alunos do 5. º ano será a primeira vez que realizam uma prova nacional. No ano lectivo passado deveriam ter feito o exame do 4. º ano de escolaridade, mas esta avaliação foi abolida pela actual equipa do Ministério da Educação. Na aula do 5. º C discute-se agora se a prova de aferição conta ou não para a nota. André já sabe que não, mas muitos dos seus colegas ainda pensam que sim. Foi uma das estratégias adoptadas pela professora de Matemática e Ciências Naturais, Ana Gaspar, para que os alunos valorizassem a prova de aferição. Oficialmente esta não conta para a nota final, mas no princípio do ano lectivo Ana Gaspar combinou com os pais que isto não se diria aos alunos. Com idades entre os 10 e os 11 anos, numa sala com vista para o Tejo, os 17 que no início desta semana compareceram à aula de Matemática (faltaram três) tinham 90 minutos pela frente de preparação da prova. Já haviam treinado antes, mas sem ocupar as aulas inteiras. Depois do teste final da disciplina, contudo, Ana Gaspar decidiu intensificar os preparativos. Diz que os alunos não têm evidenciado nervosismo em relação às provas de aferição. Quando questionados pelo PÚBLICO, eles também não falam de nervos, mas mais uma vez as opiniões dividem-se. Os melhores alunos estão com vontade de fazer esta avaliação e alguns deles mostram-se mesmo aborrecidos por não terem tido hipótese de fazer os exames nacionais do 4. º ano. Já outros vão dizendo que “não têm vontade” de realizar a prova, acham que ela “é muito grande”. “Matemática para mim é fácil, por isso não me importo, mas gostava que também houvesse exame a Educação Física”, remata André. Na maioria dos casos parecem estar à vontade nas lides matemáticas. Durante 90 minutos non stop passaram do cálculo decimal para as frequências, destas para as propriedades da multiplicação e depois fracções e mais tarde ângulos. João está sempre de braço no ar. Quer responder a tudo, impacienta-se, a professora tem que lhe dizer repetidamente para deixar os outros responder. Afonso, um dos seus colegas, resume-o assim: “O João é o melhor aluno a Matemática, mas também é o mais nervoso. "João está sentado ao lado de Ana, um dos sete alunos de etnia cigana da turma. Estão atentos, mas a sua produção é muito inferior à dos colegas. E também faltam mais. “Fora da escola não estudam, não têm apoios”, justifica Ana Gaspar, que diariamente tenta encontrar um equilíbrio para não deixar para trás os alunos com mais dificuldades e não desiludir aqueles que já estão mais à frente. “Não nivelo nem por baixo, nem por cima. Fico-me pelo meio”, relata. Professora há 27 anos, diz que o que mais gosta de fazer é precisamente “dar aulas”. E isso percebe-se na interacção que vai tendo com os alunos, no modo como tenta puxar por eles e até fazer incursões por matérias de anos mais avançados, como é o caso da raiz quadrada. “Já tinha feito com o meu pai”, diz uma das crianças. Quase todos as outras demoram pouco a percorrer o caminho entre as potências e a raiz quadrada. Ficam contentes. “Mas vai sair na prova?”, pergunta um. Ana Gaspar responde pela negativa, diz-lhes que esta é matéria que do 7. º ano de escolaridade. Margarida tem outra dúvida, mas desta vez não teve resposta: “Quem inventou a raiz quadrada?”A propósito do cálculo do percurso de vários animais distintos, segue-se um desvio pelas Ciências Naturais para saber quais as características dos bichos. É assim que será a prova de aferição. Ana Gaspar concorda com esta forma de fazer, diz que os cruzamentos entre as duas disciplinas são vários e que os alunos não estranharão a mistura. Na sala de aula eles mostram que assim é. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Numa carteira mais atrás, Giovana permanece calada, mesmo quando é interpelada pela professora. Chegou à escola, vinda do Brasil, apenas no final do 2. º período. Tudo ainda é novo para ela: a cidade, a escola, os colegas, os professores, as matérias. Mas nesta quinta-feira estará a fazer a prova de avaliação. Segundo o Ministério da Educação, ao identificarem o que os alunos sabem ou não sabem, as provas de aferição funcionam como uma “radiografia do sistema educativo”. São provas nacionais, elaboradas pelo Instituto de Avaliação Educativa com as mesmas questões para todos os alunos do mesmo ano de escolaridade de todo o país. Os resultados da avaliação são qualitativos (não há uma nota, mas sim uma descrição do desempenho do aluno). Tanto os pais como as escolas recebem um relatório pormenorizado sobre como se saíram as crianças. As provas de aferição realizam-se actualmente no 2. º, 5. º e 8. º ano de escolaridade (os alunos do 8. º também fazem nesta quinta-feira prova de Ciências Naturais e Físico-Química). Exames a contar para a nota final só a partir do 9. º ano, antes disso não. Esta foi uma das mudanças introduzidas pelo actual Ministério da Educação. Ana Gaspar discorda. Defende que no final de cada ciclo de escolaridade os alunos deveriam ter provas finais que contassem para a sua avaliação final. E justifica: “Estamos a preparar futuros adultos que vão ser avaliados a vida toda. "
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave escola educação
Inscrição de Auschwitz "Arbeit macht frei" roubada
A célebre inscrição “Arbeit macht frei” (“o trabalho liberta”), afixada à entrada do campo de concentração nazi de Auschwitz, no sul da Polónia, foi roubada durante a noite por indivíduos desconhecidos, foi esta manhã revelado por responsáveis do museu histórico que ali funciona. (...)

Inscrição de Auschwitz "Arbeit macht frei" roubada
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Ciganos Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2009-12-18 | Jornal Público
SUMÁRIO: A célebre inscrição “Arbeit macht frei” (“o trabalho liberta”), afixada à entrada do campo de concentração nazi de Auschwitz, no sul da Polónia, foi roubada durante a noite por indivíduos desconhecidos, foi esta manhã revelado por responsáveis do museu histórico que ali funciona.
TEXTO: "Foi levado pelas 6h00 [locais, menos uma hora em Portugal]. Um cão polícia foi posto em busca do rasto dos ladrões”, precisou porta-voz da polícia de Auschwitz, Malgorzata Jurecka, em declarações à rádio pública Trojka. Estão agora a ser examinadas as câmaras de segurança instaladas no local, que fica encerrado durante a noite. “É uma profanação do local onde mais de um milhão de pessoas foram assassinadas. É vergonhoso”, lamentou o porta-voz do museu de Auschwitz, Jaroslaw Mensfeld, precisando que se trata do “primeiro caso de um roubo desta gravidade neste local”. As autoridades do museu - que ocupa pouco mais de um terço do espaço de cerca de dois quilómetros quadrados do campo - já instalaram uma réplica do sinal no portão, a qual fora usada já antes quando o original esteve a ser reparado, informa a edição online do diário polaco Gazeta Wyborcza. O sinal, feito em ferro forjado por prisioneiros judeus, erguia-se às portas de Auschwitz desde o início da década de 1940, por ordem de Rudolf Höss, comandante do campo, o qual – segundo o historiador britânico Laurence Rees – acreditava que o trabalho manual o ajudara a ele próprio na experiência de prisioneiro de guerra, durante o período da república de Weimar, que precedeu a ascensão dos nazis ao poder na Alemanha. O slogan nazi “Arbeit macht frei” foi colocado nos portões de vários campos de concentração sob ordem directa do general das SS Theodor Eicke, inspector dos campos e primeiro comandante em Dachau. A inscrição à portas de Auschwitz1 – o maior dos campos de concentração e extermínio de judeus durante a II Guerra Mundial – tem a particularidade de a letra “B” de “Arbeit” ser maior do que as restantes, dando-lhe a aparência de uma letra invertida. Historiadores calculam que 1, 1 milhão de pessoas, 90 por cento das quais judeus, morreram em Auschwitz entre 1940 e 1945. As demais vítimas foram sobretudo polacos não judeus, ciganos e prisioneiros de guerra soviéticos. Notícia actualizada às 8h55
REFERÊNCIAS:
Altas temperaturas provocaram desmaios em crianças e idosos na comunidade cigana de Beja
Sem água potável nem a sombra de uma árvore, cerca de uma centena de pessoas enfrentam desafios acrescidos perante o calor extremo dos últimos dias. (...)

Altas temperaturas provocaram desmaios em crianças e idosos na comunidade cigana de Beja
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Ciganos Pontuação: 13 | Sentimento 0.16
DATA: 2018-08-08 | Jornal Público
SUMÁRIO: Sem água potável nem a sombra de uma árvore, cerca de uma centena de pessoas enfrentam desafios acrescidos perante o calor extremo dos últimos dias.
TEXTO: Mais de uma centena de pessoas, que habitam barracas e tendas e que não têm acesso a água potável, vivem assustadas de que um dia o fogo se propague no mato que os rodeia. Já se conhecia a dureza do dia-a-dia da comunidade cigana que vive no bairro das Pedreiras, em Beja, onde nos invernos rigorosos o frio afecta sobretudo as crianças e a chuva e o vento destrói as tendas e barracas cobertas com lonas, plásticos e chapas metálicas. Quando a secretária de Estado da Habitação Ana Pinho, acompanhada de Rosa Monteiro, secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade, do alto-comissário para as Migrações, Pedro Calado e do presidente da Câmara de Beja, Paulo Arsénio, se deslocaram ao bairro no final de Janeiro, o panorama era desolador: as crianças estavam mal agasalhadas, eram acossadas por tosses persistentes e os pais reclamavam por uma habitação que os libertasse de vidas inteiras a viver debaixo de toldos. Faltava conhecer o quotidiano da comunidade durante o período estival. Com a chegada do calor extremo, a realidade que se observa no referido bairro “é de penar”. Quando o PÚBLICO se deslocou ao local pelas 11h deste domingo, com a indicação de que crianças e pessoas mais velhas desmaiavam por não terem acesso à água, a temperatura ambiente era mais uma vez “insuportável”. No espaço onde vivem mais de cem pessoas, na sua maioria crianças e idosos, em tendas e barracas rodeadas de montes de entulhos deixados pelos serviços municipais, que tem nas proximidades o seu parque de materiais, não há uma única árvore. O mato seco e denso rodeia e intercala o espaço entre as barracas e as tendas. O ponto de água que abastecia estas famílias encontra-se a quase dois quilómetros de distância, na fonte de Suratesta, mas tem uma placa a dizer que estava imprópria para consumo humano. Entretanto, dizem os que dela se serviam, “foi secando e ficando verde e deixamos de lá ir”. Na última reunião do executivo municipal de Beja, realizada na passada quarta-feira, o PÚBLICO alertou o presidente da câmara, Paulo Arsénio, da ausência de acesso a água potável, que patenteava um evidente risco de saúde pública. Estava por cumprir a promessa feita pelo vereador Luís Miranda, quando no início de Junho se comprometeu perante dezenas de famílias ciganas que se tinham deslocado aos Paços do Concelho, reclamando o direito a habitação e, no imediato, o acesso à rede eléctrica e a um ponto de água. Decorridos dois meses, Luís Miranda adiantou ao PÚBLICO que estava a ser “muito difícil” levar a água à zona das barracas, escusando-se a entrar em mais pormenores, acrescentando apenas que a promessa que fez não era em nome da câmara mas “em nome pessoal”. Paulo Arsénio escusou-se a fazer comentários à situação relatada. Na manhã de hoje, a falta de água não era compensada com a colocação na passada sexta-feira de uma torneira a cerca de uma centena de metros do aglomerado de barracas. A “fonte” revelou-se inadequada e insuficiente para satisfazer as necessidades das pessoas. Por estar colocada junto à zona onde a Câmara de Beja construiu em 2006, um bairro com 50 habitações para alojar cerca de 250 pessoas de origem cigana e que hoje acolhe o dobro, o novo ponto de água é disputado para todo o tipo de necessidades. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Ofélia Barão ainda conseguiu lavar a roupa da família, e encher a pequena banheira insuflável para “meter os dois filhos lá dentro” para os refrescar. A disputa do novo ponto de água passou a servir para "matar o calor”. Adultos, crianças e jovens passaram a tomar banho vestidos e calçados. “É a única maneira da gente fugir por um bocadinho ao calor”, explicaram ao PÚBLICO. A família de Júlio Martins conta como a falta de água e as temperaturas muito elevadas acabaram por matar à sede as galinhas que tinham. "Até o cavalo lhe secou a boca”. E para o animal não morrer à sede, dois jovens da família foram buscar água numa pequena banheira para bebés. “O bicho despachou-a num instante”, observou uma das netas de Júlio Martins. Contudo, o problema maior está na frequência de desmaios em crianças e idosos. "Veio-lhe o desmaio e depois vimos que não tinha água na garrafa”, disse uma filha de Júlio Martins, apontando para uma idosa que se arrastava à procura de sombra, afectada por um problema de diabetes. Mal conseguia falar. “Os bebés ficam escaldando”, acrescentam os relatos. “Nem para a assear a casa temos água”, acrescenta uma jovem mãe. Ofélia Barão diz que o mais a assusta são as cobras, mas sobretudo o medo de um incêndio. Em redor das barracas, e até entre elas, o mato denso e seco apresentam um risco eminente de incêndio que a comunidade cigana tenta acautelar. “Se uma chama chega às nossas casas, morremos todos assados” receia Ofélia Barão.
REFERÊNCIAS:
Comunidade cigana denuncia discriminação e ameaça fazer uma concentração nacional
A Câmara de Beja construiu um muro à volta do bairro, que ficou transformado num gueto. Uma ONG europeia fala em segregação e critica as condições "deploráveis" daquele espaço. (...)

Comunidade cigana denuncia discriminação e ameaça fazer uma concentração nacional
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Ciganos Pontuação: 13 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-07-15 | Jornal Público
SUMÁRIO: A Câmara de Beja construiu um muro à volta do bairro, que ficou transformado num gueto. Uma ONG europeia fala em segregação e critica as condições "deploráveis" daquele espaço.
TEXTO: As condições "deploráveis" em que moram as famílias ciganas que, desde 2006, vivem no Bairro das Pedreiras, em Beja, deram origem a uma queixa contra Portugal. A denúncia foi apresentada em Abril, pelo European Roma Rights Centre (ERRC) junto do Comité Europeu dos Direitos Sociais (CEDS). A União Romani Portuguesa, que representa as comunidades ciganas, ameaça com uma concentração nacional às portas de Beja, caso a autarquia não resolva vários problemas, a começar por um muro construído pela câmara e que acaba por isolar o bairro do resto. As autoridades nacionais são acusadas de casos de segregação, da baixa qualidade das habitações e da falta de acesso a serviços básicos de saúde e educação. Mais grave ainda é a construção de um muro de 2, 5 metros de altura que, num dos lados, esconde este bairro marcado pela polémica desde que, em 2005, foi apresentado como projecto. O muro, afirma o ERRC - uma organização não-governamental que combate a discriminação de comunidades ciganas na Europa - é um claro exemplo de "exclusão e discriminação social". A queixa feita em Abril pode chegar ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. "Diga lá se isto não parece uma cadeia", denuncia um dos residentes à reportagem do PÚBLICO. "Tantos anos a lutar contra o muro de Berlim e temos um muro em Beja", acentua o presidente da União Romani, Vítor Marques, criticando a forma como se tenta "isolar uma população" como se "sofresse de lepra ou de outra doença contagiosa". O projecto de "reinserção social" dinamizado pela Câmara de Beja, para instalar 53 famílias ciganas que residiam no bairro de lata nos arredores daquela cidade, não cumpriu o objectivo de "integrar aquelas famílias sem ofender a sua cultura", observa Vítor Marques. "Estamos perante um caso evidente em que soluções remediadas degeneraram em situações xenófobas. " "Queremos evitar a todo o custo o conflito social, quando sabemos que são outros a promovê-lo". Mas "se as coisas não arrepiarem caminho faremos uma concentração nacional em Beja da comunidade cigana", adverte. As famílias que ali vivem foram instaladas nas traseiras do parque de materiais da Câmara de Beja e junto ao canil/gatil municipal. O amor e os ratos"As reclamações são mais que muitas, mas a câmara não lhe dá sequência" queixa-se Armando Marques, pai de nove filhos e que tem ainda a seu cargo a sogra com 90 anos. Outro problema grave é que "os ratos são tantos que davam para encher um camião", insurge-se, agastada, Nazaré Reis, enquanto o PÚBLICO visita a sua habitação, exígua para uma família com cinco crianças. No único quarto que a casa dispõe, amontoam-se as "camas" - um eufemismo para os cobertores que, à noite, são estendidos no chão. As 53 habitações do bairro onde vivem cerca de 400 pessoas têm todas a mesma configuração e o mesmo número de divisões: um quarto, uma casa de banho e uma sala. É neste espaço com cerca de 50 metros quadrados de área que se amontoam agregados familiares com oito, nove e até 12 elementos. Em Maio, a câmara ordenou o desmantelamento, com apoio das forças policiais, de pequenos anexos e barracas construídos pelos moradores para alojar pessoas e animais. Armando Marques já foi obrigado a facultar o quarto a um dos filhos que casou recentemente, e colocou a sogra a dormir numa tenda que ergueu junto à residência, contrariando desta forma a orientação do município que proíbe este tipo de soluções, "Não tenho outra solução. Jogamos os moços fora?", pergunta, antes de um último desabafo: "As condições a que nos obrigam a viver não nos deixam ter intimidade. Para fazer amor com a mulher tenho de ir para o campo. "
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave direitos cultura exclusão campo concentração tribunal educação mulher homem comunidade social doença discriminação canil
Afinal, a pintura mais antiga do mundo não está na Europa
Identificadas pinturas com pelo menos 40 mil anos em grutas na Ilha de Celebes, na Indonésia. O estudo na revista Nature defende que a produção artística no Sudeste asiático é contemporânea da europeia, se não mais antiga. (...)

Afinal, a pintura mais antiga do mundo não está na Europa
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Asiáticos Pontuação: 9 | Sentimento 0.0
DATA: 2015-05-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: Identificadas pinturas com pelo menos 40 mil anos em grutas na Ilha de Celebes, na Indonésia. O estudo na revista Nature defende que a produção artística no Sudeste asiático é contemporânea da europeia, se não mais antiga.
TEXTO: Têm pelo menos 40 mil anos e adornam as paredes de várias grutas calcárias na ilha indonésia de Celebes, entre o Bornéu e as Molucas. Fazem lembrar as brincadeiras das crianças com tintas mas são, na realidade, produto das primeiras manifestações artísticas do homem. As pinturas rupestres das grutas calcárias nos arredores da cidade de Maros já se conheciam há 50 anos, mas só agora foram datadas por peritos australianos e indonésios das universidades de Griffith e Wollogong, que acabam de publicar as suas conclusões na revista científica Nature. Os dados que reuniram mostram, defendem, que o homem moderno do Sudeste asiático começou a pintar pelo menos ao mesmo do que o europeu. “Presume-se com frequência que a Europa foi o centro das mais antigas explosões da criatividade humana, em particular da arte das cavernas, há cerca de 40 mil anos”, diz a perita em datação Maxime Aubert, de Griffith, que co-dirigiu o estudo agora publicado. “Mas as datas da nossa arte rupestre de Celebes mostram que, por volta da mesma altura, do outro lado do mundo, as pessoas desenhavam animais tão extraordinários como os das grutas da Idade do Gelo de França e Espanha”, continua, num comunicado divulgado por esta universidade australiana. As pinturas mostram mãos – 12 stencils (impressões em negativo), feitos espalhando tinta numa rocha contra a qual se colocou a mão – e dois animais, um deles um babirusa, espécie de porco autóctone do arquipélago indonésio. Uma das mãos, garante a equipa, é agora o mais antigo exemplar desta forma de arte rupestre, ao passo que um dos desenhos dos mamíferos – um babirusa fêmea com pelo menos 35. 400 anos – estará certamente entre as representações figurativas mais precoces. A ideia generalizada de que a arte terá nascido na Europa baseia-se nas pinturas rupestres, algumas de grande espectacularidade, descobertas pelo continente. Destas destacam-se a mais antiga – um disco vermelho indefinido em El Castillo, Espanha, com 41 mil anos – e os maravilhosos cavalos e rinocerontes de Chauvet, França, representações já muito complexas, de grande movimento, com pelo menos 30 mil. Ainda um mistérioAs pinturas de Celebes eram conhecidas há mais de 50 anos, mas não tinha havido ainda qualquer tentativa para as datar. Defendia-se, sem certezas, que não teriam mais de dez mil anos porque se supunha que não pudessem resistir mais tempo do que isso num clima tropical, escreve Wil Roebroeks, especialista em evolução humana da Universidade de Leiden, na Holanda, num artigo que acompanha o estudo na Nature e a que deu o título de Art on the move. Para determinar quando teriam sido feitas, os cientistas tiveram de apurar o rácio de urânio e de isótopos (formas) de tório existentes em pequenas formações semelhantes a estalactites (conhecidas como “pipocas das cavernas”) que cresceram sobre as imagens. Este método, aplicado a 14 pinturas distribuídas por sete grutas, mostra que foram executadas entre 39. 900 e 17. 400 anos, precisa ainda o comunicado, advertindo para o facto de estas serem as datações mínimas, o que significa que, na realidade, as pinturas podem ser muito mais antigas. Defende agora a equipa que as pinturas do Paleolítico europeu que têm vindo a surpreender gerações nas grutas de Chauvet e Lascaux podem ter raízes mais profundas. “Na realidade, as pinturas nas grutas e outras formas de expressão artística com elas relacionadas faziam muito provavelmente parte das tradições culturais dos primeiros homens modernos que saíram de África para a Ásia e a Austrália, muito antes de chegarem à Europa”, explica Adam Brumm, outro dos especialistas da Universidade de Griffith que coordenou o estudo com Aubert e os indonésios Muhammad Ramli e Budianto Hakim, que identificaram já 90 sítios com pinturas na ilha, além de centenas de figuras e stencils isolados. “O que significavam estes stencils de mãos para os artistas pré-históricos de Celebes continua a ser um mistério, assim como a razão por que os criaram em tão grande número”, disse Brumm ao diário britânico The Guardian. Por que é que esta arte é tão importante? Thomas Sutikna, outro dos autores do estudo, responde num comunicado da Universidade de Wollogong: porque é um dos dos primeiros indicadores da existência de pensamento abstracto, que “é o que faz de nós humanos tal como nos conhecemos”.
REFERÊNCIAS:
Ritual de Leuven da Bélgica e teatro de sombras chinês já são Património Imaterial
O ritual de Leuven da Bélgica e o teatro de sombras da China foram já este sábado inscritos como Património Imaterial da Humanidade durante o VI Comité Intergovernamental da UNESCO, que em quase cinco horas só discutiu três propostas. (...)

Ritual de Leuven da Bélgica e teatro de sombras chinês já são Património Imaterial
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Asiáticos Pontuação: 9 | Sentimento 0.0
DATA: 2011-11-26 | Jornal Público
SUMÁRIO: O ritual de Leuven da Bélgica e o teatro de sombras da China foram já este sábado inscritos como Património Imaterial da Humanidade durante o VI Comité Intergovernamental da UNESCO, que em quase cinco horas só discutiu três propostas.
TEXTO: “Foi um dia muito difícil porque as regras de procedimento não são claras e então a única solução é votar. Estamos agora a falar de uma proposta chinesa do abaco e não temos consenso na sala”, afirmou Ion de La Riva, relator do comité e embaixador espanhol. Segundo Ion de Lan Riva, o comité vai continuar a trabalhar em privado hoje durante a noite para ver se consegue chegar a um consenso. “Temos de pagar aos tradutores que custam muito dinheiro, estamos em tempo de austeridade e temos de encontrar uma solução”, salientou. O diplomata disse também que o fado deverá ser analisado no domingo. O comité é presidido pelo embaixador da Indonésia junto da UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Ciência, Educação e Cultura), Aman Wirakartakusumah, e é constituído por 24 países, entre eles, Espanha, Quénia, Japão e Venezuela. No domingo, os 24 delegados vão analisar mais de 30 candidaturas para inscrição na lista do Património Imaterial da Humanidade, entre as quais o Fado. A candidatura portuguesa é uma das sete melhor recomendadas pelo Comité de Peritos da UNESCO, ao lado da do conhecimento dos jaguares, pelos xamãs da tribo ameríndia colombiana Yurupari, da música Mariachi, do México, das danças Nijemo Kolo da Dalmácia (Croácia), da música e dança tsiattista do Chipre, e a cavalgada de reis da Morávia (República Checa). Há uma candidatura transnacional partilhada pelo Mali, Burkina-Faso e Costa do Marfim que é a das práticas e expressões culturais ligadas ao “balafon” das comunidades Sénoufo do Mali, Burquina-Faso e Costa do Marfim.
REFERÊNCIAS:
Entidades UNESCO
A alimentação substitui o petróleo nas compras chinesas
Depois de uma década e mais de 200 mil milhões de dólares gastos em minas e campos de petróleo da Austrália à Argentina, a atenção da China vira-se agora para a alimentação. O país mais populoso do mundo está a deparar-se com uma dura realidade: por cada tonelada adicional de trigo ou carne que o mundo produz, a China precisará de praticamente metade para conseguir alimentar os seus cidadãos. Reconhecendo que não consegue produzir internamente carne e trigo suficientes, empresas da China continental e de Hong Kong gastaram no ano passado 12, 3 mil milhões de dólares (9 mil milhões de euros) em aquisições e invest... (etc.)

A alimentação substitui o petróleo nas compras chinesas
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Asiáticos Pontuação: 9 | Sentimento 0.0
DATA: 2014-06-04 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20140604170208/http://www.publico.pt/1638551
TEXTO: Depois de uma década e mais de 200 mil milhões de dólares gastos em minas e campos de petróleo da Austrália à Argentina, a atenção da China vira-se agora para a alimentação. O país mais populoso do mundo está a deparar-se com uma dura realidade: por cada tonelada adicional de trigo ou carne que o mundo produz, a China precisará de praticamente metade para conseguir alimentar os seus cidadãos. Reconhecendo que não consegue produzir internamente carne e trigo suficientes, empresas da China continental e de Hong Kong gastaram no ano passado 12, 3 mil milhões de dólares (9 mil milhões de euros) em aquisições e investimentos em alimentos, bebidas ou agricultura no estrangeiro, segundo indicam os dados compilados pela Bloomberg. Essas compras incluem a maior aquisição de uma empresa americana por parte da China, quando a Shuanghui International Holdings comprou a Smithfield Foods por 7 mil milhões de dólares, incluindo a sua dívida. É provável que venha a ser seguida de investimentos em carne de vaca, borrego ou cereais, de acordo com o National Australia Bank. “Estes negócios estavam destinados a acontecer e até estou surpreendido por não terem acontecido mais cedo”, diz Paul Conway, vice-presidente da Cargill, uma das quatro empresas que dominam o comércio mundial de alimentos. “A China estará mais integrada no sistema global de produtos agrícolas do que alguma vez esteve. ”Ao longo do crescimento económico explosivo da China nas últimas décadas, tem sido hábito do Governo utilizar as empresas do Estado para liderar as aquisições de indústrias estratégicas. Foi isto que aconteceu com a segurança energética quando a PetroChina se lançou para uma década de compras em todo o mundo, gastando 40 mil milhões de dólares na área petrolífera. O campeão chinês da segurança alimentar é o Cofco, que controla 90% das importações de trigo e que este ano fez duas aquisições. No espaço de dois meses comprou acções que lhe permitem controlar a holandesa Nidera Holdings e a empresa de agronegócio Noble, pagando 2, 8 mil milhões. Com o agronegócio da Noble, a Cofco conquistou silos de cereais na Argentina e fábricas de açúcar no Brasil, além de fábricas de processamento de sementes na China, Ucrânia e África do Sul. A compra da Nidera deu à Cofco uma plataforma forte para a produção de cereais no Brasil, Argentina e Europa Central, afirmou a empresa em Fevereiro. A Cofco será “um investidor poderoso na agricultura, capaz de produzir directamente em várias partes do mundo”, adianta um relatório da agência de notação Fitch de 3 de Abril. Os números mostram porquê. A China tem 21% da população mundial, mas só 9% do seu território é zona arável, e tem uma percentagem ainda menor de água doce, segundo o Jefferies Group. O aumento dos rendimentos levou a um aumento da procura de alimentos ricos em proteínas, mas a oferta interna está próxima do limite, diz Abhijit Attavar, analista do Jefferies Group em Singapura, num relatório de 15 de Abril. Não faltarão rivais à CofcoAs americanas Archer-Daniels-Midland, Bunge e Cargill, e a francesa Louis Dreyfus – conhecidas em conjunto como as A-B-C-Ds – controlam mais de 70% do comércio mundial de cereais, de acordo com a Continental Rice, sedeada em Tóquio. A Japonesa Mitsui também vê uma grande oportunidade no mercado alimentar. Em 2007, a empresa de comércio construiu uma quinta e uma rede comercial de raiz, e conquistou activos nos cinco continentes. As empresas de comércio japonesas aventuraram-se em activos tão diversos como as plantações de soja no Brasil, os viveiros de camarão na Tailândia ou os silos de milho nos Estados Unidos. O maior comerciante petrolífero do mundo, o Vitol, decidiu expandir-se no ano passado para o comércio de cereais, criando uma sucursal em Singapura. “O que temos vindo a assistir é que, impulsionadas por empresas estatais, as empresas privadas e as empresas de comércio de outros países estão todas à procura de uma forma de criar linhas de abastecimento que vão da Austrália à China, e também das Américas para a China”, comenta Patrick Vizzone, director regional da alimentação e agronegócio do National Australia Bank. Vizzone, que também tem assento na direcção da unidade China Agri-Industries da Cofco, diz que vê potencial para as aquisições chinesas nas indústrias de cereais, oleaginosas e nas carnes de carneiro e vaca.
REFERÊNCIAS:
Quem não tem mãe caça olhos
Se David Lynch e Takashi Miike rodassem a meias um gótico americano rural ao som de Amália, o resultado não andaria longe de Os Olhos de Minha Mãe. A primeira longa do americano Nicolas Pesce, com a portuguesa Kika Magalhães, criou sensação em Sundance e chega agora às salas portuguesas. (...)

Quem não tem mãe caça olhos
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-02-22 | Jornal Público
SUMÁRIO: Se David Lynch e Takashi Miike rodassem a meias um gótico americano rural ao som de Amália, o resultado não andaria longe de Os Olhos de Minha Mãe. A primeira longa do americano Nicolas Pesce, com a portuguesa Kika Magalhães, criou sensação em Sundance e chega agora às salas portuguesas.
TEXTO: Portugal não é país do qual o cinema americano se lembre muito. Logo na primeira vez que um filme americano recente tem uma personagem de ascendência portuguesa no centro da acção, é uma órfã psicótica que mora isolada do mundo numa casinha escondida na província, que aprendeu com a mãe a dissecar olhos de vaca ao som de Amália Rodrigues. Por Skype de Nova Iorque, Nicolas Pesce, argumentista e realizador em estreia na longa-metragem com Os Olhos de Minha Mãe, ri-se e explica que a ideia era usar uma língua da Europa ocidental mediterrânica que tivesse algo ao mesmo tempo de ancestral e exótico para os ouvidos americanos. “Queria que o filme falasse de uma família que vinha de outro sítio, e que não encaixava no sítio onde vivia por uma série de motivos, ” explica Pesce, cujos pais são sicilianos. “Queria que o filme tivesse uma qualidade bilingue, e, pelo menos na América, o português de Portugal é muito menos conhecido que o português do Brasil, é completamente diferente, e tem uma sonoridade belíssima. ” E, claro, há o pormenor, nada dispiciendo, da actriz principal ser portuguesa – Kika Magalhães, que Pesce já conhecia de telediscos que tinha dirigido. “Ela existia antes do guião, eu sabia que ia escrever o guião a pensar nela e que ela era a actriz certa para o papel. Ser portuguesa era uma questão secundária, mas tornou-se muito interessante integrar essa herança portuguesa da Kika no filme. Foi ela quem me apresentou a música de Amália, que eu nunca tinha ouvido antes. . . ”Os Olhos da Minha Mãe é uma homenagem, cheia de pose, à aristocracia cinematográfica do gótico e do macabro - cheia de pose, e cheia de mais coisa nenhuma. Agora que já picámos o apetite, larguemos a bomba: Os Olhos de Minha Mãe, revelado em Sundance 2016 acompanhado por uma série de críticas embasbacadas e que chega às salas com lançamento quase simultâneo nos video-clubes, em DVD e nos serviços de streaming, é o mais singular filme de terror que vimos em muito tempo. É uma conjugação incatalogável de slasher movie, cinema de autor, surrealismo Lynchiano e extreme horror asiático, rodado em écrã panorâmico a preto e branco ao som de Amália e blip-hop, e produzido por António Campos (After School), Sean Durkin (Martha Marcy May Marlene) e Josh Mond (James White), o trio da Borderline Films nova-iorquina – Pesce (n. 1990) foi assistente de Mond na rodagem de James White e a amizade que daí nasceu levou o trio a apadrinhar Os Olhos de Minha Mãe, “tal como eles próprios foram apadrinhados por outros”. Ao longo desta conversa, Nicolas Pesce invoca os nomes de Takashi Miike, Park Chan-wook, William Castle ou David Lynch como influências, e explica que a atmosfera é a chave da concepção desta primeira longa-metragem. É o tipo de filme que nos velhos tempos apareceria com o proverbial aviso “este filme contém cenas que podem chocar os espectadores mais sensíveis” – e o mais perturbante é que o filme se inspira, em parte, na própria mãe de Pesce, que era cirurgiã oftalmologista. Ninguém diria, face ao entusiasmo muito juvenil com que o realizador fala com o Ipsilon. A personagem principal tem uma obsessão por olhos e dissecações. E o olho é uma presença regular no cinema e na arte surrealista. Como é que tudo isto se conjuga?A resposta é muito simples! A minha mãe era oftalmologista, e a dissecação do olho da vaca que se vê no princípio do filme vem da minha própria vida. Ela fê-lo comigo quando eu era miúdo, para me explicar coisas sobre a cirurgia, a anatomia… Talvez por isso eu tenha crescido com uma postura muito clínica perante o sangue e as vísceras no cinema de género. As pessoas não se dão conta que as operações são algo de muito sanguinolento. Quis jogar com a sobreposição de alguém que tem essa postura muito natural perante o sangue mas que é extremamente violenta enquanto pessoa, e com a tensão que isso cria. E o olho foi uma escoha natural. É uma parte muito sensível do nosso corpo, e, para um cineasta, perder os olhos é um dos maiores medos que existe. Tirar os olhos a alguém é um acto extremamente brutal. Quanto ao surrealismo, é engraçado que faça essa referência, porque tenho um cartaz na parede de Abraham Lincoln pintado por Dali, e tenho no braço uma tatuagem da Audrey Horne do Twin Peaks… David Lynch é um dos meus realizadores preferidos de sempre e tem a capacidade de tornar o banal e o vulgar absoutamente assustadores. A lição dele que quis pôr em prática em Os Olhos de Minha Mãe tem a ver com isso. Muitas histórias sobre assassinos em série mostram as cenas violentas, que podem ser assustadoras ou perturbantes. Mas se soubermos aquilo de que alguém é capaz, observar essa pessoa a ver televisão, a fazer o jantar ou lavar a louça torna-se ainda mais aterrorizante. Aprendi isso com Lynch. Os Olhos de Minha Mãe não é bem um filme de terror. Não. Mas ao mesmo tempo é de facto um filme de terror. Completamente, e foi sempre pensado assim. Os filmes de terror de que gosto são filmes de autor, como Audition (Anjo ou Demónio, 99) de Takashi Miike, que foi uma influência enorme, e muito do seu trabalho e de outros cineastas japoneses está precisamente nessa terra de ninguém entre géneros. Como os filmes do Park Chan-wook, que são thrillers, dramas, romances, filmes de terror, não sabemos nunca muito bem o que são… Mas também cresci a ver o cinema de terror gótico dos anos 1950 e 1960, William Castle, Alfred Hitchcock, aqueles filmes com a Bette Davis ou o Vincent Price. Claro que gosto do Massacre no Texas e afins, mas existe uma elegância no modo como Hitchcock fazia um filme de terror que tentei emular. Sou um cinéfilo antes de ser cineasta, e isso vê-se, não escondo as minhas influências. Como Jacques Tourneur e a maneira como ele usava o preto e branco?Exacto. Fiz a escola de cinema, sei os truques que eles usavam para filmar, adoro essas coisas, e parte do gozo de rodar Os Olhos de Minha Mãe a preto e branco vem daí. Pegue nas cenas de exteriores. As cenas que decorrem de dia foram rodadas à noite com muita iluminação para fingir que é dia, e as cenas de noite foram rodadas de dia com um filtro vermelho e iluminação muito específica. É algo que só podíamos fazer rodando a preto e branco, e dá aos exteriores uma qualidade surreal, alienígena, que joga bem com a estética do filme. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Os filmes fazem-nos sentir coisas que nunca sentimos antes, e quero que seja o espectador a juntar as peças, a encontrar a atmosfera, o tom do filme, ao mergulhar neste mundoO filme tem um tom extremamente pacato, uma quietude que tanto está presente na performance da Kika Magalhães como no próprio desenrolar da acção. Isso tem tudo a ver com a atmosfera, porque é importante que não seja só a história a afectar o espectador mas também a atmosfera, e de um modo que não se consegue verdadeiramente explicar. É outra coisa que aprendi com o David Lynch. Há muitas cenas nas quais, se formos a olhar para elas com olhos de ver, não encontramos verdadeiramente uma razão para nos sentirmos inquietos, mas sentimo-nos assim na mesma e não há nenhuma razão especial para isso. Isso é uma das coisas mais fantásticas do cinema: poder criar estas experiências emocionais que as pessoas não compreendem bem. Os filmes fazem-nos sentir coisas que nunca sentimos antes, e quero que seja o espectador a juntar as peças, a encontrar a atmosfera, o tom do filme, ao mergulhar neste mundo. E como é um filme curto, só tem 1h15, posso ir devagarinho que as pessoas não se chateiam!Ou seja, a lógica onírica do filme, do pesadelo que não se percebe por inteiro onde nem tudo bate certo, é deliberada?Não tem piada nenhuma explicar tudo! Muitas vezes, saber para onde o filme vai deixa o espectador sossegado, e eu não quero nada disso. Gosto da ideia de um filme como um quebra-cabeças, e como cineasta quero deixar “buracos” para o espectador preencher. A cena que ele imaginar será provavelmente melhor do que a que eu escreveria!
REFERÊNCIAS:
Étnia Asiático
Em Sines o rock é made in Mongólia, Coreia do Sul e Colômbia
Meridian Brothers, Ajinai e Jambinai reinventaram o rock no Festival Músicas do Mundo. E fizeram companhia a Mulatu Astatke e Ibrahim Maalouf nos muitos pontos altos de dois dias que culminaram com um concerto de sitar saudado por uma multidão às quatro da manhã. (...)

Em Sines o rock é made in Mongólia, Coreia do Sul e Colômbia
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2015-05-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: Meridian Brothers, Ajinai e Jambinai reinventaram o rock no Festival Músicas do Mundo. E fizeram companhia a Mulatu Astatke e Ibrahim Maalouf nos muitos pontos altos de dois dias que culminaram com um concerto de sitar saudado por uma multidão às quatro da manhã.
TEXTO: O mais certo é que Jimi Hendrix nunca tenha ouvido a palavra "champeta" ao longo dos 27 anos que precederam a sua morte pouco gloriosa, engasgado no próprio vómito. Enquanto fenómeno musical popular colombiano, com guitarras e teclados a preço de saldo a ordenarem aos frequentadores dos bailes que se rocem desavergonhadamente nos seus parceiros, a champeta só ganhou relevo nos anos 80, já Hendrix se tinha finado. Mas para que não permanecessem em mútua ignorância, os Meridian Brothers resolveram juntá-los numa delirante versão de Purple haze para lá das três da manhã no palco da Avenida da Praia, em Sines. O concerto dos colombianos foi a descarga certa após uma noite de quinta-feira ziguezagueante no Castelo, iniciada por um óptimo concerto da trupe etíope comandada por Mulatu Astatke. Mas lá iremos. Purple haze acabara de deixar o público esbugalhado perante a brilhante desfaçatez com que os Meridian Brothers exumam o espírito aventureiro de Hendrix, transformando esse acto num atordoado baile às portas da Amazónia ou dos Andes colombianos. Pouco depois, essa febre tropical que parece acompanhar cada canção saída do génio de Eblis Álvarez escancara-se, quando, no final do instrumental El gran pájaro de los Andes, os cinco músicos em palco desatam a macaquear animais (macacos inclusive) com as vozes a treparem por cima umas das outras. Por esta altura, tudo era já normal nesta soberba demonstração de alegre demência artística e de como as músicas locais e universais, depois de se cheirarem e reconhecerem, continuam a juntar-se em sínteses de completo deslumbramento. Aqui, ao longe, faz sentido e agradecemos que o rock (carregado de psicadelismo e sons do vallenato, da cumbia e da salsa) na Colômbia soe como nenhum outro. A sensação não era estranha. Já na véspera, Aijinai e Jambinai tinham apresentado teses magníficas dedicadas à temática “Como fazer do rock uma experiência intuitivamente asiática”. Do lado dos mongóis Ajinai, aquilo a que assistimos é uma notável investida dentro de alguma convencionalidade do rock, mas adulterada pela execução enérgica do morin khuur – imagine-se um pequeno violoncelo cujo topo ostenta uma cabeça de cavalo, tradução, de resto, para o nome do instrumento. Não larguemos esta imagem por mais uns segundos: a música dos Ajinai, grupo fundado por um dissidente dos Hanggai, soa a constantes cavalgadas pelas estepes do país. Neste rock, a guitarra eléctrica entrega a primazia ao morin khuur, a bateria fustiga ritmos tradicionais e as vozes assumem a técnica khoomei – uma forma gutural de produzir um som hipnótico que parece uma descoberta da necessidade de comunicar em extensas paisagens áridas e desabitadas. O caso dos Jambinai é um pouco mais extremo. Próximos de uma linguagem pós-rock associável aos Mogwai, atravessada por elementos noise e punk, vivem numa alternância entre momentos etéreos que nunca desligam a tensão até desabarem em pesadas descargas obsessivas. É seguir os movimentos de Lee Ilwoo, cujo penteado à Justin Bieber não faz adivinhar este jogo de sonho inquieto/pesadelo: quando utiliza o instrumento de sopro piri, pode recuperar-se o fôlego, mas quando se lança à guitarra é de esperar que as estruturas que seguram o céu lá em cima possam ceder de vez. No haegum, espécie de violino que parece só admitir as frequências agudas, Kim Bomi garante que ninguém relaxa durante a actuação dos Jambinai. Uma incrível vergastada sonora – sexta-feira, 25, repetem a dose no Milhões de Festa – a provar que nem só de gangnam style vive a Coreia do Sul. Aqui também há jazzPassava das quatro da manhã quando Niladri Kumar terminou o primeiro tema da sua actuação na Avenida da Praia. O virtuosismo estarrecedor do músico indiano no sitar rendeu uma generosa ovação. E o músico, sabendo que há horas mais fáceis para conquistar uma multidão com recurso a uma música tocada por gente sentada (sitar+tablas) e sem as confortáveis camas rítmicas electrónicas, valeu-se da História e parafraseou Ravi Shankar no Concerto para o Bangladesh de 1971: “Se gostaram assim tanto do soundcheck, espero que também gostem do concerto. ” (No original, Shankar falava em afinação. ) Inteligentemente, citaria Deep Purple ou Carlos Paredes, trazendo referências populares para uma mescla de ragas indianos que poderia revelar-se um problema, mas que apenas reforçou o constante questionamento do que pode ser e oferecer o FMM.
REFERÊNCIAS: