Roménia vota para que Constituição proíba casamentos homossexuais
Apesar de as uniões entre pessoas do mesmo sexo não serem legais na Roménia, foi convocado um referendo para tornar essa possibilidade ainda mais difícil. (...)

Roménia vota para que Constituição proíba casamentos homossexuais
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Homossexuais Pontuação: 21 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-10-06 | Jornal Público
SUMÁRIO: Apesar de as uniões entre pessoas do mesmo sexo não serem legais na Roménia, foi convocado um referendo para tornar essa possibilidade ainda mais difícil.
TEXTO: Os romenos começaram a votar este sábado num referendo de dois dias que pode fechar ainda mais a porta à legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo. Os críticos dizem que a consulta é apenas uma manobra do Governo para distrair a opinião pública de escândalos de corrupção. A Roménia já é um dos poucos Estados-membro da União Europeia que proíbe tanto o casamento como as uniões civis entre pessoas do mesmo sexo, mas o referendo propõe uma redefinição do conceito de casamento na Constituição para que declare textualmente que só uma união entre um homem e uma mulher é legal. Os grandes apoiantes da alteração estão congregados na Coligação pela Família, uma organização conservadora, e contam com o apoio da Igreja Ortodoxa. Cartazes a favor do “sim” alertam para o perigo de casais gay roubarem crianças ou para a possibilidade de se permitir no futuro que um homem possa casar com uma árvore, descreve a Reuters. Num país onde a promoção dos direitos da comunidade LGBT não rende muitos votos, praticamente todos os partidos têm estado a favor do “sim”. “Muitos receiam que aquilo que aconteceu noutros países, como a legalização do casamento entre um homem e um animal, possa acontecer aqui”, disse esta semana o líder do Partido Social Democrata (PSD, no poder), Liviu Dragnea, ao canal Romania TV. “Os partidos agarraram a iniciativa oportunisticamente para obterem benefícios eleitorais a partir de uma coisa que é uma questão praticamente inexistente”, disse ao Guardian a investigadora do Instituto de Estudos Humanos de Viena, Veronica Anghel. Os grupos de defesa dos direitos humanos encaram o referendo como uma estratégia do Governo para esconder o escândalo de corrupção em que Dragnea está envolvido – o líder partidário foi condenado a três anos e meio de prisão por abuso de poder e a sentença do recurso que apresentou é conhecida na segunda-feira. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Um recuo dos direitos dos casais homossexuais deverá aprofundar ainda mais o clima de desconfiança entre a União Europeia e o Governo romeno, visto em Bruxelas como cada vez mais autoritário. “O plano é óbvio: criar um sentimento anti-europeu na Roménia que Liviu Dragnea possa utilizar quando os dirigentes europeus lhe exigirem que não destrua o sistema judicial, o Estado de Direito e a luta anti-corrupção”, disse à Reuters o antigo primeiro-ministro Dacian Ciolos. Os activistas LGBT têm apelado ao boicote à consulta, na esperança de que a participação não atinja o limiar necessário para tornar o seu resultado vinculativo. Porém, o Governo parece estar a fazer os possíveis para que a consulta permita alterar a Constituição. Para além de ter autorizado que o voto se prolongasse durante dois dias, foi aprovada uma nova lei que baixa de 50% para 30% o limite mínimo de participação para que o resultado seja válido.
REFERÊNCIAS:
Partidos PSD
Estará Heféstion, companheiro de Alexandre, o Grande, sepultado em Anfípolis?
Pensava-se que o grande templo funerário escavado em Anfípolis guardava os restos mortais de Olímpia ou Roxana, respectivamente mãe e mulher de Alexandre. Esta quarta-feira apontou-se noutra direcção: os arqueólogos crêem ter sido erguido em homenagem a Heféstion. (...)

Estará Heféstion, companheiro de Alexandre, o Grande, sepultado em Anfípolis?
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.8
DATA: 2015-10-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: Pensava-se que o grande templo funerário escavado em Anfípolis guardava os restos mortais de Olímpia ou Roxana, respectivamente mãe e mulher de Alexandre. Esta quarta-feira apontou-se noutra direcção: os arqueólogos crêem ter sido erguido em homenagem a Heféstion.
TEXTO: Foi escavado em 2012 e aberto no último Verão, 13 séculos depois de a cidade em que foi instalado ter sido abandonada. Anfípolis era uma cidade grega, a 100 quilómetros de Tessalónica, e foi nela que Alexandre, o Grande erigiu aquele que é o maior templo funerário descoberto em território grego. Especulava-se que teria sido construído em honra da sua mãe, Olímpia, ou da sua mulher, Roxana. Esta quinta-feira, porém, Katerina Peristeri, arqueóloga chefe das escavações, apontou noutra direcção. “Supomos que se trata de um templo funerário dedicado a Heféstion”, companheiro inseparável de Alexandre, declarou em conferência de imprensa. No interior foram encontrados os restos mortais de uma mulher idosa, as ossadas de dois homens, de um recém-nascido ou de um cavalo. Nenhum deles corresponde, naturalmente, a Heféstion, e Peristeri afirmou não estar certa que o mesmo esteja ali enterrado, mas a descoberta no interior de três inscrições com a palavra “parelavon” (recebido) e o monograma de Heféstion, conduziram à suposição de que o gigantesco complexo, com 500 metros de diâmetro e escavado numa colina de 30 metros, seria dedicado ao fiel companheiro do mítico rei macedónio. Apesar da contestação de alguns arqueólogos, que defendem que a tumba foi construída já durante o período romano, Katerina Peristeri afirma que aquela foi erigida algures entre 325 e 300 a. C. , num período em que Anfípolis era uma cidade de relevo no reino macedónio que Alexandre estendeu do Egipto à Índia. O túmulo em Anfípolis será, então, um dos muitos que Alexandre ordenou que o seu arquitecto, Dinócrates, projectasse por todo o império quando da morte de Heféstion em Ecbatana, no Irão, segundo descrito por Plutarco, o grande historiador da Antiguidade. No interior do complexo foram descobertas várias divisões ricamente decoradas com esculturas de esfinges e cariátides, bem como diversos mosaicos e moedas com o rosto de Alexandre. Heféstion foi o amigo mais próximo de Alexandre. Filho da aristocracia macedónia, cresceu próximo do futuro imperador e tornar-se-ia, não só um dos seus generais, guarda-costas e diplomatas mais distintos, mas também o seu confidente, numa relação que se prolongou até ao final da sua vida e que foi comparada à de Aquiles e de Pátroclo, personagens centrais da Ilíada de Homero. A natureza amorosa da relação entre Alexandre e Heféstion é parte integrante da mitologia envolvendo o grande Imperador. Em 2004, Oliver Stone tornou-a central no seu filme Alexandre, O Grande, apresentando os dois como amantes. Na altura, numa reportagem do Ípsilon dedicada ao filme, o historiador Nuno Simões Rodrigues, afirmou que “Heféstion é o grande amor [de Alexandre], Roxana uma aliança política, Bagoas [o eunuco do imperador persa Dario, que Alexandre resgatou para si após derrotar aquele] o objecto sexual”. Esclareceu ainda que “na Grécia a sexualidade não se definia como hetero-homo-bi, mas numa relação entre dominador – o amante ou ‘erastes’ – e um dominado – o amado ou ‘eromenos’ –, fosse ele do mesmo sexo ou não”. Nos próximos tempos, pode ser confirmado que é em Anfípolis que está sepultado Heféstion. Quanto aos restos mortais de Alexandre, continuarão, de forma intrigante, em parte incerta. Morreu na Babilónia em 323 a. C. , aos 32 anos e diz-se que o seu corpo terá sido levado por Ptolomeu até Alexandria, a cidade que fundara no Egipto e em que terá sido sepultado. Onde exactamente? O mistério permanece até hoje.
REFERÊNCIAS:
Homenagem a Ruy de Carvalho nos 90 anos de vida e 75 de carreira
Festa realiza-se esta quarta-feira no Casino Estoril. A 22 de Março, o actor vai receber um Prémio Sophia de carreira, atribuído pela Academia Portuguesa de Cinema. (...)

Homenagem a Ruy de Carvalho nos 90 anos de vida e 75 de carreira
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-03-02 | Jornal Público
SUMÁRIO: Festa realiza-se esta quarta-feira no Casino Estoril. A 22 de Março, o actor vai receber um Prémio Sophia de carreira, atribuído pela Academia Portuguesa de Cinema.
TEXTO: O actor Ruy de Carvalho vai ser homenageado esta quarta-feira no Casino Estoril, quando completa 90 anos e comemora 75 de carreira, com um espectáculo em que participam, entre outros, Rui Veloso e Dulce Pontes. A festa de homenagem realiza-se no Salão Preto e Prata, com intervenções previstas de Rui Veloso, Luís Represas, Dulce Pontes e Toy, além dos actores João e Henrique de Carvalho, respectivamente filho e neto de Ruy de Carvalho, entre outros artistas. A Academia Portuguesa de Cinema também vai distinguir o actor Ruy de Carvalho, com o Prémio Mérito e Excelência, na entrega dos Prémios Sophia do cinema português, no dia 22 de Março. Ruy de Carvalho nasceu em Lisboa a 1 de Março de 1927, estreou-se em 1942, numa peça encenada por Francisco Ribeiro (Ribeirinho), e anunciou a reforma em 1998, quando interpretava Rei Lear, de Shakespeare, para o Teatro Nacional D. Maria II, mas prosseguiu a carreira durante mais duas décadas, pelos palcos, pelo cinema, pela televisão. O actor tem o nome associado à primeira peça exibida na televisão portuguesa, Monólogo do Vaqueiro, de Gil Vicente, quando da criação da RTP, em 1957, e também à primeira telenovela, Vila Faia, em 1982, realizada por Nuno Teixeira. Formado pelo Conservatório Nacional, actuou pela primeira vez no Teatro D. Maria II em 1947, integrado no elenco da companhia Rey-Colaço/Robles Monteiro. Seguiram-se o Teatro Avenida, a companhia Rafael Oliveira e o Teatro Monumental, o Teatro do Povo e o Teatro Moderno de Lisboa, com sede no Cine-Teatro Império. Em 1963, assumiu a direcção artística do Teatro Experimental do Porto, onde realizou a sua única experiência como encenador, com Terra Firme, de Miguel Torga. Regressou ao Teatro D. Maria II, quando este reabriu, em 1978. Fez parte do elenco dos musicais Passa por Mim no Rossio (1992) e Maldita Cocaína (1994), de Filipe la Feria. Em Espanha, trabalhou no Teatro Monumental de Madrid, a convite do encenador Simon Suarez, e protagonizou Fígaro, de José Ramon Encinar, no Teatro Lírico La Zarzuela, também na capital espanhola. Estreou-se no cinema no filme Eram 200 Irmãos (1951), de Armando Vieira Pinto, seguindo-se Pássaros de Asas Cortadas (1963), de Artur Ramos, Domingo à Tarde (1965) e A Bicha de Sete Cabeças (1978), ambos de António Macedo, O Cerco (1969), de António da Cunha Telles, Cântico Final (1974), de Manuel Guimarães. Em 1990, entrou em O Processo do Rei, de João Mário Grilo, e Non ou a Vã Glória de Mandar, de Manoel de Oliveira, com quem trabalhou ainda em A Caixa (1994) e em O Quinto Império - Ontem Como Hoje (2004). Ainda no cinema, nos últimos anos entrou em A Morte de Carlos Gardel (2011), de Solveig Nordlund, Refrigerantes e Canções de Amor, de Luís Galvão Teles, e A Canção de Lisboa, de Pedro Varela, ambos de 2016. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Ruy de Carvalho recebeu o Prémios de Imprensa para o Teatro e para o Cinema por sete ocasiões, e ainda os Prémios da Crítica, cinco vezes. Foi ainda distinguido com a Comenda e o Grande Colar da Ordem Militar de Sant'Iago da Espada, respectivamente, em 1998 e em 2010, o grau de comendador da Ordem do Infante, em 1993, e a Medalha de Mérito Cultural, atribuída pela Secretaria de Estado da Cultura, em 1990. Em 2012, quando completou 70 anos de carreira, recebeu a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique, que dedicou aos portugueses, por estarem a viver o "muito difícil" momento da crise económica.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave morte cultura filho bicha
O ritual e a peregrinação segundo Miguel Moreira
Possível peça final para o ciclo iniciado com The Old King, Pântano evoca os lugares sombrios ou misteriosos que cada um prefere habitualmente deixar trancados longe da luz do dia. Uma questão de romantismo noir, acredita Miguel Moreira. (...)

O ritual e a peregrinação segundo Miguel Moreira
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2015-05-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: Possível peça final para o ciclo iniciado com The Old King, Pântano evoca os lugares sombrios ou misteriosos que cada um prefere habitualmente deixar trancados longe da luz do dia. Uma questão de romantismo noir, acredita Miguel Moreira.
TEXTO: Na obra de Miguel Moreira para o Útero, a beleza convive com a ruína desde há muito. Não são forças contrárias, não se anulam, cresceram juntas como irmãs enquanto a companhia habitava no Espaço Ginjal, com o rio a servir de fosso que a mantinha na periferia. Esse antigo armazém convertido em sala de espectáculos e partilhado com outras estruturas foi-se deteriorando com os anos e sendo cada vez mais ruína. “E quanto mais chovia lá dentro, mais parecia que ficava melhor”, comenta Miguel Moreira. “Melhor para nós e para o público. ” A humidade e a temperatura de gelar quaisquer 206 ossos, a dificuldade em suportar a aspereza do espaço, tudo isso foi contribuindo para que as obras surgissem, afinal, “de uma forma progressivamente mais urgente”. Até que o Espaço Ginjal fechou, em 2010, e pouco depois Moreira criava com o bailarino Romeu Runa The Old King, peça para um homem abandonado por Deus e em combate com os seus pensamentos numa tentativa de encontrar maneira de se relacionar com a sociedade. Com The Old King, Miguel Moreira e o Útero davam o salto para as grandes salas. “Mas acho que nunca deixámos de estar no Ginjal, naquele ambiente e naquele sítio de procura utópica de um sítio que sabemos que não vamos conseguir alcançar mas que achamos que é nosso”, defende. Porque se havia uma condição geográfica no Ginjal, de periferia e de marginalidade em relação ao centro, havia também uma inquietação e uma busca sôfrega por uma arte guiada, em primeiro lugar, pela parca identificação com aquilo que o centro propunha. “Aos 16 ou 17 anos fui então à procura dos artistas e da arte com que me pudesse identificar”, recorda. “Ao estar no subúrbio, sem dúvida que sempre senti essa ausência de alguma coisa, esse lado marginal nos grupos que existiam. E nunca me irei afastar disso porque sei que esse sítio de marginalidade e do culto é um sítio onde quero estar, um sítio onde me sinto bem. ” Pense-se novamente no Ginjal, nesse espaço desafiador, de condições duras, mas virado para uma paisagem belíssima. Ruína e beleza. “Espaços-limite, neutros, onde as normas e os preceitos se diluem na fronteira entre a vida civilizada e o mundo selvagem…”, cita Miguel Moreira do prefácio de Ernesto Sampaio para Cais Oeste, texto do dramaturgo francês Bernard-Marie Koltès. Cais Oeste vive precisamente dessa cisão entre dois mundos, um oásis longínquo de civilização e um pequeno universo selvagem e sujo, separados por um rio; vive do querer chegar ao outro lado mas estar irremediavelmente preso neste. Para Moreira, que enquanto actor fez Na Solidão dos Campos de Algodão dirigido por Rogério de Carvalho, “Koltès tem uma constante preocupação existencial com o submundo – quer viver nos sítios onde normalmente os outros dizem que não querem viver e escreve sobre isso”, uma ideia de submundo com a qual confessa ter “uma identificação imensa”. O empurrão de SadePântano, peça que Miguel Moreira estreia hoje na Culturgest, em Lisboa (e que segue depois para Porto, Castelo Branco, Coimbra e Paris), anuncia-se como possível capítulo final para um ciclo iniciado em 2011 com The Old King. Romeu Runa volta ao Útero e, ao lado de Francisco Camacho e Catarina Félix, contribui para mais uma imersão num cenário de desconforto. De início, quase uma imobilidade dos três, depois uma procura lasciva e sacrificial entre os corpos, aludindo a uma imagem de ritualização e de peregrinação que Moreira quis trabalhar. Há olhos cerrados, seres despojados pelo chão, vislumbres recolhidos nas artes plásticas, mas também movimentos animalescos ou uma sexualidade a latejar pedidos de empréstimo a Sade – “podia passar a vida toda a falar de Sade, Pasolini ou Beckett”, confessa Miguel Moreira. Mas foi “a exposição ao mesmo tempo provocatória, chocante e bela” sobre Sade no parisiense Musée d’Orsay que se assumiu como peça fundamental para pôr os bailarinos em palco a “vomitar lugares ou sensações que queremos esconder”. Não se trata de uma regurgitação literal, mas antes de “uma certa evocação de lugares sombrios ou misteriosos que existem dentro de nós”. Ecos de um romantismo noir, como o define Miguel Moreira, ele que se diz espantado por o público continuar a falar-lhe em dureza nas suas peças. Quer apenas destapar e aceder a esses sítios obscuros, e não cair na provocação. “Não sinto que os bailarinos estejam a sofrer”, responde. “Acho é que hoje não estamos muito habituados a viver rituais. Só os mais comuns, ir à igreja, a um casamento, um baptizado ou funeral, mas é uma sociedade muito mais ligada ao prazer imediato e isso é contrário a este lugar onde as coisas têm de ter um caminho para chegarem a algum lado. ” A evocação da peregrinação, refere, vem daí, desse trajecto solitário com vista a um destino final. E se o público acusa o desconforto desta tentativa de “dar respostas ao mundo, de uma forma livre e abstracta”, Miguel Moreira confessa que frequentemente fica tão surpreendido quanto qualquer espectador. “Acontece acabar um espectáculo e estar tão atingido emocionalmente e tão desconfortável como eles”, admite. Até por isso, suspeita que Pântano possa encerrar o ciclo iniciado em The Old King com a leitura de Ideia da Paisagem, obra de Ana Francisca Azevedo. “Primeiro há uma fase de espanto com o material que estamos a produzir em conjunto e depois, não sei porquê, começa a haver uma necessidade de mapear ou ter alguma organização emocional interna daquilo que estamos a fazer. Nesse aspecto, não o digo com certeza absoluta, mas sinto isto como chegar a um porto. ”Este ciclo é em grande parte estimulado pela exploração mais aprofundada de questões técnicas como a utilização da luz e da música (banda sonora de Carlos Zíngaro e projecto Shhh), ou a duração do espectáculo, numa lógica de partilha grupal que Miguel Moreira compara a ter uma banda de rock. O importante, na reivindicação de um espaço que sabe ser habitado por outros artistas, é saber que esta é uma linguagem construída em conjunto e para estarem juntos. Mesmo sabendo que a outra margem, que se vê lá adiante, será sempre inalcançável. Não há, na verdade, tentativa nem esforço de chegar até lá.
REFERÊNCIAS:
Partidos LIVRE
Café Monte Carlo, Lisboa: Cafés, cinemas e bifes
Havia cafés onde se vivia. Entrava-se de manhã e saía-se de madrugada, com o estômago aconchegado por um bom bife. No Monte Carlo era assim. Cinéfilos e outras tribos tinham ali a sua casa. (...)

Café Monte Carlo, Lisboa: Cafés, cinemas e bifes
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Havia cafés onde se vivia. Entrava-se de manhã e saía-se de madrugada, com o estômago aconchegado por um bom bife. No Monte Carlo era assim. Cinéfilos e outras tribos tinham ali a sua casa.
TEXTO: Que me desculpem os leitores se hoje não os levo a algum sítio lá fora, mas está um daqueles dias de temporal em que o vento assobia à volta da casa, as árvores perdem os ramos, que se lançam num voo descontrolado, e a chuva tenta entrar por todas as frinchas das janelas. É dia de fazer um café e enfiar a cabeça num livro. Por isso, troquei os planos para ir à exposição de orquídeas na Estufa Fria pelo livro, a que não me canso de voltar, Os Cinemas de Lisboa, de Margarida Acciaiouli, e, mais exactamente pelo capítulo sobre os antigos cafés da capital. Cafés havia muitos. Para além dos clássicos, na Baixa e no Chiado, a abertura de novas avenidas na cidade foi acompanhada pelo nascimento de novos cafés, alguns deles ligados, por cumplicidades várias, aos novos cinemas que iam também surgindo. Acciaiouli descreve como esses cafés “representam as referências a partir das quais se redefine a cidade e se estabelecem as fronteiras das incursões que se passam a fazer depois dos filmes”. Era o que acontecia com o Café Império, por exemplo, que surgiu em 1955 junto ao Cinema Império. E, na Avenida Fontes Pereira de Melo, com o Café Monumental e o Café Monte Carlo, “em polaridades que permaneceriam quase imutáveis pelos anos fora”. Ambos desapareceram e no local do Monte Carlo existe hoje uma loja da Zara. Conta-me quem os conheceu que, se o Monumental se distinguia pela luminosidade do espaço e pelo brilho das estrelas (sobretudo figuras do teatro) que o frequentavam, o Monte Carlo — que nasceu, também em 55, como café, no local onde antes existia a Pastelaria Fradique — era território de artistas alternativos, surrealistas e outros, que se identificavam mais com o seu ambiente austero, de madeiras escuras — e, consta, excelentes croissants que tinham o seu contraponto nos mais vistosos (e efeminados) bolos do café vizinho. Nesse tempo vivia-se nos cafés. Não se entrava apenas para comer um dos célebres bifes ou beber uma bica. Eram locais para passar grande parte do dia — e da noite, por entre uma ida ao cinema. Neles habitavam escritores, poetas, cineastas, críticos, jornalistas, estudantes, pensadores e aspirantes a qualquer uma destas coisas. Falava-se de política, criticava-se o regime, discutiam-se as notícias que chegavam do que se via, ouvia e lia “lá fora”. O café era de tal forma uma segunda (ou, em alguns casos, primeira) casa que era habitual os clientes receberem telefonemas lá. O telefone tocava, um empregado atendia e perguntava para a sala: “O sr. X está? Chamam-no ao telefone. ” O embaixador Francisco Seixas da Costa recorda num texto o dia em que no Monte Carlo alguém brincou e, ligando da cabine telefónica do próprio café, pediu para falar com o general Humberto Delgado. O empregado que atendeu era jovem e não sabia de quem se tratava, pelo que perguntou se o general estava na sala, recebendo de volta um coro de gargalhadas. Mas os telefonemas podiam também ser usados quando alguém queria tornar-se notado e pedia para lhe telefonarem para o café, garantindo que o seu nome seria gritado em alto e bom som. Um texto do crítico de cinema Eurico de Barros, citado por Margarida Acciaiuoli, descreve a vida no Monte Carlo: “Chegava-se de manhã, comprava-se a imprensa, tomava-se o pequeno-almoço, lia-se um livro, via-se quem estava ou passava. ” E, entre um almoço no restaurante, mais leituras à tarde, “cavaqueira com quem tivesse chegado entretanto”, jantar, cinema e “serão no café até às duas da matina, hora de fecho”, passava-se o dia. A tabacaria ficava logo à entrada, convenientemente localizada para quem quisesse abastecer-se de jornais a qualquer hora. No interior, bastante amplo, havia uma sala de jogos, com bilhar, xadrez e damas, e ao fundo existia ainda, mais discreta, uma barbearia. A parte de restaurante estava separada do resto por uma grade e era aí que se podia comer o afamado bife. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Este hábito de comer bifes vem, diz-se, de influência inglesa e, inevitavelmente, do aumento do poder de compra. Antigamente, a carne de vaca não era coisa comum, mas na Lisboa dos anos 60 e 70, estabelecimento que se prezasse tinha o seu “bife à café”, geralmente com um molho generoso que podia levar natas e café, um ovo estrelado e batatas fritas (e o que mais se lembrassem de lhe juntar). E assim, entre discussões políticas de café, intensas análises do último filme em estreia e bifes mergulhados em calóricos molhos sem culpas, os dias passavam numa Lisboa que era ainda uma cidade pequena, levemente entediada. Com a chuva a cair lá fora, este parece-me, hoje, um bom programa de domingo.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave carne vaca
Como esquecer sem matar e como lembrar sem morrer
É um caminhante que faz perguntas e procura respostas na literatura. No seu último livro, a primeira pergunta foi: como lembrar sem morrer de dor? Nele, faz o luto da morte do filho, vítima da guerra entre Israel e o Líbano, em 2006. (...)

Como esquecer sem matar e como lembrar sem morrer
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: É um caminhante que faz perguntas e procura respostas na literatura. No seu último livro, a primeira pergunta foi: como lembrar sem morrer de dor? Nele, faz o luto da morte do filho, vítima da guerra entre Israel e o Líbano, em 2006.
TEXTO: Uma conversa com o escritor David Grossman raramente começa pela literatura, talvez porque a sua escrita ande sempre muito colada à realidade. Israelita, natural de Jerusalém, onde nasceu em Janeiro de 1954, tem associado o seu nome à luta pelo fim do conflito que se eterniza entre o seu país e a Palestina. Nos seus romances, a tragédia de viver, pensar e amar num território em guerra assumem uma densidade invulgar que o tornam um dos mais respeitados autores em todo o mundo. Há nove anos, a guerra — desta vez com o Líbano — matou o seu filho Uri, de 21 anos, quando escrevia um livro sobre o medo de perder um filho para a guerra. Até ao Fim da Terra, publicado em Portugal em 2012, foi a “casa” onde se refugiou quando não sabia como viver. Terminou-o numa altura em que ainda lhe era difícil falar da morte. O luto seria feito com um livro “estranho”, chama-lhe “criatura”. Foi o seu modo de aprender a viver com a memória. Falling Out of Time saiu em 2014 e será editado em Portugal em 2016. Foi esse livro que permitiu esta conversa, em Cascais, onde o escritor esteve como convidado para o festival internacional de cultura no passado domingo. Começou com literatura e terminou com gargalhada. Sim, acho que é um bom modo de se estar nesta vida. A vida é ofensivamente pequena e muitos de nós esforçam-se demasiado em não ser eles mesmos, não ouvindo o que deveriam ser. Muita da nossa realidade é-nos imposta por expectativas de outras pessoas, pelos ditames de outras pessoas e vemos muita gente a viver em paralelo em relação às vidas que deveriam viver. Porque fizeram a escolha profissional errada, escolheram o casamento errado, muitas vezes com o género que negam. Escrever é uma maneira muito eficaz de não negar a nossa própria vida, não nos evadirmos da nossa vida, de confrontar tudo o que a nossa alma ou corpo nos sugere que confrontemos. Quando perdemos o Uri, eu estava a escrever Até ao Fim do Mundo, que era sobre o sentimento de perder um filho na guerra. Olhando em retrospectiva, parece estranho, mas é algo que muitos pais que vivem em Israel sentem, a ansiedade de perder os seus filhos. Depois dos sete dias de lamento — no judaísmo temos sete dias de luto, o shivá, que devo dizer que é uma das grandes invenções do judaísmo…Todas as pessoas que fazem e fizeram parte da nossa vida vêm até nós para estar connosco e com os nossos e fazem-nos esquecer a dureza do nosso sofrimento nos primeiros sete dias. Eles não nos deixam sós, não estamos sós, eles abraçam-nos, acodem-nos, mesmo fisicamente. E, nesse momento, toda a nossa vida passa à nossa frente. Os nossos amigos do jardim-de-infância vêm, os do liceu, da tropa, da universidade, de todos os trabalhos que tivemos, todos vêm e ao estar connosco expressam algo que é muito mais forte do que palavras. Mas, claro, todos sabemos que é apenas por uma semana e que depois somos outra vez confrontados com a nossa ferida. Quando no dia a seguir ao shivá, voltei ao pequeno espaço onde trabalho, comecei a reescrever a história que naqueles dias era a única coisa sólida na minha vida. Era o único lugar que se assemelhava a uma casa. Todas as outras casas estavam destruídas pela catástrofe. Nada estava assegurado, garantido. Nada [pausa]. Senti uma espécie de instinto, de responsabilidade pelas personagens, pela história em que estava a trabalhar havia tanto tempo. Sim. Trabalhei como um carpinteiro, acho. Ou como um sapateiro. Não muito com a minha cabeça, mas com um instinto da fisicalidade das coisas e apenas para continuar esta casa que era a história, intocada, sólida. Mas mais tarde comecei a notar que não era apenas o tempo que impedia as paredes de cair, mas que estava a incutir aspectos nas minhas personagens, características, dei-lhes notas muito específicas, dei-lhes calor e vitalidade e sexualidade e humor e sensibilidade. Comecei a sentir que essas coisas continuavam em mim. De certa forma, sim. Estava surpreendido por ainda ter estas coisas em mim. Quando aquilo aconteceu, Amos Oz e A. B. Yehoshua, amigos muito próximos, vieram imediatamente, no mesmo dia, e ambos sabiam o que eu estava a escrever, porque costumamos conversar entre nós sobre o que cada um escreve e mostramos versões uns aos outros. Eles sabiam isso e sabiam o que me estava a acontecer. Lembro-me de lhes dizer que não sabia se era capaz de salvar o livro. E Amos Oz respondeu-me: “É o livro que te vai salvar a ti. ”De uma certa maneira, sim. Chamo-lhe “criatura”. Tem a sua própria vida (risos). Depois da morte de Uri, levei mais um ano a terminar Até ao Fim da Terra. Quis permanecer leal, fiel a essa história, ao que ela era antes de a realidade me mudar. Eu queria que o livro permanecesse como era antes. O livro não era sobre a perda, mas sobre o medo da perda. Há uma grande diferença. Era sobre essa ilusão de que podemos combater o medo da perda, de que podemos prevenir a perda. É o que Ora faz. [Ora é a protagonista, uma mulher que deixa a sua casa em Jerusalém e caminha para a Galileia, tentando fugir de possíveis mensageiros que a queiram informar sobre a possível morte do filho, em Hebron. ] Com o seu pensamento mágico, ela luta contra a ameaça de morte que está sempre presente, que é uma constante, sobre o seu filho Ofer. Ela conta a sua história, os pequenos momentos de devoção, culpa e frustração, sentimento de falhanço, de amor e cuidado que depositamos num filho. Ela sente que ao fazê-lo ela combate a ameaça, a selvajaria, a dureza do mundo e que ele enfrenta e ela com ele. Mas o novo livro, Falling Out of Time, foi depois da perda. O que significa continuar a viver depois de ter experimentado uma coisa assim? E como lembrar? Como separar a memória da dor? Toda a memória era tão dolorosa que é preciso parar de lembrar, tinha de parar de lembrar. Era como tocar em electricidade com mãos molhadas. Acho que foi algo que descobri nesses anos, que quando se perde alguém não se perde só a pessoa e o futuro que ela poderia ter, mas perde-se também o seu passado e, com isso, o nosso próprio passado por causa do medo de lhe tocar. Há espaços da nossa vida onde não queremos mais entrar porque são intoleráveis. Foi então que senti que queria lembrar. Não queria que grande parte da minha vida fosse confiscada pelo luto. Eu teria de viver a dor para lá chegar. Como é que se faz isso? Como se separa a dor da memória e como esquecer sem morrer disso? [Pausa] É muito, muito complicado. Como esquecer sem matar e como lembrar sem morrer? Era de tudo isso que andava à procura com esse livro. Ajudou. Era inevitável. Não posso perceber como fui capaz de…Sim, evitar escrever sobre isso. Sim. Há fases na vida. Muitas vezes me perguntavam sobre isso e eu não era capaz de falar. Claro que falava com a minha família e amigos, mas levou-me tempo até ser capaz de dizer o que estou a dizer aqui. Acho que escrever esse livro tornou isto possível. Escrevi tantas nuances de luto e depois entendi este lugar que quis atingir, onde quis chegar, um ponto de encontro muito evasivo, sempre a tentar escapar, que é o que está entre a vida e a morte, um lugar onde podemos continuar a arranhar o exterior desta dimensão hermética e monolítica da morte. Eu sou um não crente, sou uma pessoa secular. Não posso retirar conforto da ideia de uma vida além da morte ou de paraíso ou de deus. Sim. Há muita solidão, mas prefiro a solidão a qualquer tipo de ilusão que vem do acto de acreditar numa história picaresca de deus e diabo e paraíso. Quem me dera conseguir acreditar, mas não consigo. Para mim, isso não é verdade. Se quem acredita retira disso algum conforto, alguma ajuda, fico feliz por eles, mas eu não conseguiria retirar algum conforto disso. Sinto que o único lugar onde posso sentir no mesmo segundo vida e morte é no espaço da arte, da criação, da literatura, da prosa, da poesia, no cinema, no teatro, na música. Para mim, é nesses sítios que a vida de facto acontece e é neles que estamos totalmente cientes da morte. Esse lugar da arte não é um lugar assustador, nem sequer um lugar triste, é um lugar profundo…Exactamente. Um lugar de um entendimento profundo. Eu comecei a pensar em todos os livros que li, todos os filmes que vi, as músicas que ouvi, e eles foram tão significantes, criaram-me, fizeram-me crescer e trouxeram-me a um maior entendimento do que sou, desde criança. Tudo aconteceu sempre neste ponto, todos estavam nesse ponto entre vida e morte. Acho que toda a peça de arte séria deve ter lugar aí, nesse intenso espaço. Sim, está sempre a lembrar-me da morte. Sim. Muitas vezes me zanguei, senti raiva daquele lugar, e frustrado, muitas vezes desesperado, mas é o único lugar que entendo. Vamos assumir que a partir de hoje vou viver aqui em Cascais. Acha que alguma vez eu seria capaz de entender o lugar, o comportamento das pessoas, as suas memórias, as histórias de embalar que os seus pais lhe leram, as cantigas de criança? Nunca iria conseguir. Só em Israel sou capaz. E como a vida é tão tremendamente curta, quero viver a minha vida num lugar relevante, num lugar onde tudo o que acontece é relevante para mim, mesmo quando me repugna ou me faz perder a cabeça. Sim. É verdade. Quando ele afirmou que iria interferir, eu imediatamente retirei a minha candidatura. Tinha lido nos jornais que era o principal nomeado. Achei que o que ele fez foi ultrajante. Mas ele fez isso e eu sei de onde vem essa atitude. Sei interpretar a sua maneira de pensar, porque é que enquanto primeiro-ministro interfere na escolha de um prémio literário num Estado democrático. Vê, tudo isto é relevante, é irritante. Israel é uma casa, no sentido em que entendo o país. Infelizmente não é a casa que eu desejaria, onde qualquer cidadão se possa sentir seguro, possa sentir a doçura da pertença. Esse lugar ainda não é assim, porque a mensagem que passa é que enquanto os palestinianos tiverem ali a sua casa nós não teremos a nossa. É uma tragédia, porque para mim a definição mais profunda de um judeu é a de alguém que nunca se sente em casa em nenhum lugar do mundo, mesmo nos sítios mais amistosos. Vivemos sempre no perigo de ser atacados ou perseguidos ou expulsos. Era suposto que Israel fosse a nossa casa porque este é o lugar de onde somos originalmente, enquanto povo e religião e cultura e língua, e tem potencial para ser uma casa, e desejamos que o seja. Como lhe disse, quero estar lá, quero que os meus filhos estejam lá, quero que seja um país atractivo para os mais jovens, mas enquanto não houver paz não será uma casa. Quando se perde alguém, não se perde só a pessoa e o futuro que ela poderia ter, mas perde-se também o seu passado e, com isso, o nosso próprio passado por causa do medo de lhe tocarNão consigo separar a arte do real. A arte é um meio de estar no mundo real e é outro modo de descodificar a vida além da religião, da psicologia. As religiões são modos diferentes de olhar a vida, de acomodar o crente. A psicologia faz o mesmo e a arte também. Todas nos sugerem um modo de entender mais neste pequeno período de tempo que é uma vida. A arte é isso, uma maneira mais precisa de estar na vida. Ela ajuda, em especial porque a vida está a ser formulada pelos meios de comunicação social, e eles são uma alternativa muito frágil para essa descrição. Pensamos muitas vezes nos mass media como um meio de chegar às massas, mas eles são um meio de fazer com que os seres humanos pensem em si enquanto parte de uma massa, transforma-os em massa… É um processo terrível. O ser humano está a tornar-se uma multidão. A sua vida interior e a de biliões de pessoas estão a ser formuladas pelo que a televisão e todos os meios de comunicação lhes dão, lhes mostra, convencendo-os de que devem pensar e sentir de uma certa maneira. É uma mistura de kitsch, de posição farisaicas, de agressão, de qualquer coisa violenta contra o modo como somos. Nesse mundo de anonimato, a literatura pode ajudar-nos a reconquistar a nossa face mais autêntica. Na literatura vemos as coisas através de matizes, somos capazes de sentir o que é ser outro ser humano. Claro que quando lemos os suplementos de jornais de sábado ou de domingo nos deixamos levar por uma história comovente e íntima, mas há nisso qualquer coisa de falso. Não sentimos que realmente somos capazes de entender a pessoa de que o jornal nos fala. Sentimos outra coisa que pode ser muito perversa. Se nos permitirmos levar, tornamo-nos parte de um imenso colectivo kitsch. Há algo de muito caloroso e doce nisso. Sabemos o como precisamos desses doces para a alma. Mas alguém nos está a manipular. Há um milhão de pessoas a ler o mesmo jornal numa sexta-feira à noite e aquele jornal fá-los pensar e parecer iguais; mas quando mil pessoas estão a ler o mesmo livro, se for um bom livro, é lido por cada uma delas de um modo diferente. Um bom livro permite o acesso a diferentes partículas da alma. Muitos leitores escrevem-me cartas e em cada um desses textos leio uma reacção diferente que não fui capaz de antecipar ou imaginar. Acho que li em cerca de 40 línguas a expressão: “A Ora sou eu. ”É exactamente o que sinto quando leio um bom livro de uma cultura diferente, de um tempo diferente. Sim, eu podia ter sido este Raskolnikov [personagem de O Crime e Castigo de Dostoievski] e que sorte tive por poder sentir isso e ler esse livro. É por isso que não posso confundir este sentimento com o outro, o que me quer confundir com a multidão, com o modo como os mass media funcionam e que é quase sempre preconceituoso, que julga e culpa, com o poder de arrancar uma gargalhada durante cinco minutos. A literatura permite-nos estar com uma pessoa, com o pobre Raskolnikov. Pense só, se uma pessoa escreve um longo artigo, de sete páginas, sobre Ralskolnikov num jornal, hoje, nunca estará perto do que Dostoievski escreveu. É essa a diferença. Em todos os meus livros há muito movimento físico porque quando escrevo, caminho. Vou contar: nos últimos nove anos todas as manhãs, a um quarto para as seis, a minha mulher, eu e um casal de amigos andamos cinco quilómetros. Vemos gazelas — tenho aqui [mostra o telemóvel] uma fotografia de uma gazela prenha que a minha mulher enviou da caminhada que fez hoje de manhã. É como começamos o nosso dia. É fantástico, muito bom. Mas mesmo antes disso, já caminhava. No meu primeiro livro, que não está traduzido, há uma pessoa que corre. Em todos os livros há esse movimento. Eu preciso de me movimentar. Quando escrevo, não consigo estar sentado. Sento-me à secretária e se tenho uma boa ideia tenho de fazer qualquer coisa com aquela energia. Não sei. E ando, há muitos dias em que ando 15 quilómetros numa sala. Ando durante seis horas. Não é uma piada [risos]. A minha mulher brinca, diz que eu deixo marcas nas carpetes, que sulco o chão como um prisioneiro. Aluguei a sala onde trabalho e do que gosto mais ali é do corredor entre as salas. Tem cerca de 30 metros. Percorro aqueles 30 metros durante cinco ou seis horas. Sei que pode parecer estranho. Quando se caminha, quando se está em movimento, não se está fossilizado, não se está congelado. Fico horrorizado com pessoas que congelam, não gosto da ideia de congelar. Vejo tantas pessoas à minha volta que a partir de uma certa idade, muito jovem, caem e são apenas eles mesmos, muitas vezes nem isso, sem qualquer movimento fértil ou qualquer flexibilidade. Caminhar é fazer perguntas. A cada momento estamos num lugar diferente. É por isso que gosto tanto de viajar. Viajo muito com os meus livros. Conheço pessoas, ouço histórias. As pessoas adoram contar histórias a um escritor. Não sei. Mas acho que sou um bom ouvinte. Conheço a minha própria história por isso não sinto qualquer necessidade de a impor, a não ser nos livros. Mas contam-me histórias muito interessantes. Não faço qualquer uso de muitas delas, porque são irrelevantes para o que eu escrevo, mas tiro tanto prazer da maneira como as pessoas contam as histórias. Há pouco [fora desta conversa] falávamos do que se diz sobre o fim do romance [enquanto género] e acho que fica claro o que penso sobre isso. Tem tudo a ver com o modo como ouvimos e contamos histórias. Isso define-nos. As histórias são a nossa base. Sim, por isso são tão populares. Tenho muitos livros para crianças entre os três e os quatro anos e eles perguntam-me se aquilo aconteceu mesmo. Pergunto-lhes se queriam que tivesse acontecido e quando me dizem que sim, digo-lhes que essa é a resposta. Acho que é o mesmo com os textos sagrados — muitas pessoas, grande parte da humanidade, quer que eles sejam verdade e essa é a origem do seu poder. Sim. Sim, é verdade. Se se conhecer os caminhos, é fácil. Há caminhos para a recrear e inventar e as pessoas imediatamente entendem. É difícil. Como posso dar um exemplo em hebraico… Há a palavra nightwalker ou moonwalker, alguém que caminha pela noite. Mas se eu quero descrever uma criança que caminha atrás de uma borboleta eu digo he moonwalked after… Em hebraico corresponde a uma palavra totalmente nova e imediatamente toda a gente entendeu. Intuitivamente fazemos essa arrumação. Na língua há sequências desde há três, quatro mil anos, e isso significa que se Abraão, o patriarca, estivesse sentado connosco à mesa, ele poderia entender pelo menos metade da nossa conversa. Acho isso notável. Há dois mil anos era uma língua do belo, ninguém falava hebraico. Era uma língua sagrada, apenas para rituais, para dias santos. [Risos] Claro. Agora lembrou-me uma velha história. Acho que há uns 40 anos a minha mulher e eu viajámos por Portugal. Eu estava a conduzir e fomos parar a uma pequena vila, não me lembro exactamente do nome. Pode ser Nazaré?Era à beira-mar. Chegámos a um sítio e era preciso ligar para casa, já não me lembro porquê, e não era possível fazer uma chamada directa por telefone, tinha de passar por uma operadora. Disse-lhe em inglês: “Pode por favor ligar-me a Jerusalém?” E ela começou a rir. Perguntei-lhe porque se estava a rir e ela respondeu: “Jerusalém é no céu. ” Isso foi verdade. Cresci com o hebraico. Sei que pode parecer algo mágico, não sei… Penso em imagens e quando quero entendê-las penso em hebraico e falo comigo em hebraico. Invento-a de imediato. É intuitivo. E é o meu trabalho. Sei o que fazer para encontrar uma palavra. É verdade. Quando a língua era sagrada, se limitava à beleza, não se faziam negócios em hebraico, um soldado não dava comandos em hebraico, os casais não faziam amor em hebraico e as crianças não brincavam em hebraico. Muita coisa mudou e muita coisa teve de ser inventada. Houve um homem incrivelmente inteligente, Eliezer Ben-Yehuda [1858-1922, um dos responsáveis pelo criadores do hebraico moderno], que começou a ler hebraico às crianças. Foi buscar muitas palavras à Bíblia, à Tora, mas no tempo da Bíblia não havia gelado, ou helicóptero ou tomate. Ele inventou ou reinventou baseado nessas regras antigas e as pessoas percebiam o que ele queria dizer. Agora toda a nossa vida se formula em hebraico. Sinto-me muito privilegiado por escritores como Amos Oz e A. B. Yehoshua, que me aceitaram apesar de eu ser mais novo, como o seu irmão mais novo. É uma boa família. Sim, terminei um romance há nove meses, que está a ser traduzido e está a ser publicado já em alguns países da Europa. Chama-se Walks a Horse Into a Bar. É um livro totalmente diferente do anterior e é uma sessão de stand-up comedy em Netanya, uma cidade de Israel. É uma mistura de horror e gargalhada. Há muitas anedotas lá e o título é o início de uma anedota muito famosa em Israel. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Há centenas de anedotas de um cavalo a entrar num bar. Vou contar uma: um cavalo entra num bar e pede um vodka ao empregado. Ele serve-lhe o vodka, pergunta quanto é. São 25 paus. Ele abre a carteira, paga e quando se dirige à saída, o empregado corre para ele: “Desculpe-me senhor Cavalo, espere um momento. Isto é fantástico, nunca vi um cavalo que fala. ” O cavalo olha para ele e diz-lhe: “Com os seus preços, não voltará a ver. ”Quero viver a minha vida num lugar onde tudo o que acontece é relevante para mim, mesmo quando me repugna ou me faz perder ?a cabeça
REFERÊNCIAS:
Resistir ao vazio
Um romance inteligente que confunde o real e o imaginário de maneira a interrogar ambos. (...)

Resistir ao vazio
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-10-26 | Jornal Público
SUMÁRIO: Um romance inteligente que confunde o real e o imaginário de maneira a interrogar ambos.
TEXTO: A escritora e ensaísta Dubravka Ugresic (n. 1949), nascida numa vila da antiga Jugoslávia (numa região que actualmente pertence à Croácia), é uma das vozes mais originais e eruditas da literatura da Europa Central — nomeada em 2009 para o International Man Booker Prize e em 2016 recebeu o Neustadt de Literatura (para alguns uma espécie de ante-câmara do Nobel) — deixou a Croácia em 1993 (depois de anos a ensinar literatura russa e as suas vanguardas na Universidade de Zagreb), e isto porque foi acusada pelo poder, no Parlamento e na imprensa, de “bruxa, puta e traidora”; tudo isto devido às críticas assertivas e irónicas que fez, entre outros, ao regime autoritário e nacionalista de Tudjman e às causas da Guerra dos Balcãs. A mestria técnica de Ugresic é uma das suas características mais notadas, ao conseguir juntar, por exemplo, subtis intertextualidades (conhece bem as tradições literárias e filosóficas europeias) com diálogos assertivos que iluminam sátiras corrosivas; ou como consegue fazer uso do seu sentido de observação para os detalhes sócio-culturais. A complexidade do seu pensamento é expressa com uma simplicidade tocante. A estrutura dos romances é quase sempre episódica, resultando numa acumulação de partes narrativas e de polifonia de registos, num patchwork em construção. Raposa não difere deste modo narrativo. Autoria: Dubravka Ugresic (Trad. de Guilherme Pires) Cavalo de Ferro Ler excertoAntes da desagregação da antiga Jugoslávia, Dubravka Ugresic — que estudou e ensinou literatura russa e as suas vanguardas — escreveu, numa espécie de exercícios de ironia paródica, romances cómicos e arremedos pós-modernistas de histórias românticas com um final feliz. Mas veio a Guerra dos Balcãs e os tempos mudaram: foi obrigada a deixar o ensino em Zagreb, e depois de ter passado por várias “residências artísticas”, e se ter fixado em Amesterdão, tornou-se numa autora mais “séria”, passando a escrever (alternando entre a ficção e o ensaio) sobre o exílio, a vida de escritor, os nacionalismos, ou a imposição arbitrária de fronteiras e de identidades. Em português tinha até agora dois livros traduzidos: Museu da Rendição Incondicional (Cavalo de Ferro, 2011) — brilhante e ambicioso exercício reflexivo sobre a poética do exílio, tendo sempre a memória como metáfora da possibilidade de reconstrução da vida e do passado — e Baba Yaga Pôs Um Ovo (Teorema, 2010) — um romance originalíssimo baseado na figura mítica de uma bruxa do folclore eslavo, e que Ugresic transpôs para o nosso tempo, servindo-lhe de lente para um olhar sobre a feminilidade e o envelhecimento, a sexualidade, o amor e os seus segredos. Curiosamente, neste Raposa também recorre ao folclore e ao simbolismo dos seus arquétipos. É sabido que o campo simbólico da raposa (apesar das diferenças de substracto cultural) pressupõe a astúcia, a perfídia, a artimanha, a mentira, a hipocrisia, a duplicidade, o egoísmo, a luxúria, a reclusão. E Dubravka Ugresic interroga-se ao longo de toda as partes do romance: “A raposa é o totem do escritor?” Talvez por isto afirme: “A vida literária só é interessante quando estamos à nossa secretária, entre quatro paredes. Tudo o resto evoca um sentimento de derrota, tanto humana como profissional. ”Na primeira parte do romance — que é dividido em seis — titulada Uma História Sobre Como as Histórias Se Tornam Matéria Escrita, é aquela onde mais se define a afinidade entre o escritor e a “raposa aldrabona”: a autora parte de um conto do escritor russo Boris Pilniak (1894-1938) — e conta histórias adjacentes, aparentemente reais, à história narrada nesse conto (também se acredita que verídica). Algumas das histórias chegam misturadas com elementos autobiográficos — a autora estudou, nos anos 1980, em Moscovo, tentando escrever uma tese de mestrado sobre Pilniak — tornando a ficção em auto-ficção, recorrendo a alguns truques do pós-modernismo. Enquanto narra parte da história escrita por Pilniak em 1926 (baseada, em parte, numa suposta autobiografia da personagem), Ugresic fala da Moscovo dos anos 1980, um tempo em que “as pessoas não alimentavam expectativas nem tinham quaisquer esperanças”. E depois interroga-se: “Estarei a contar uma história sobre o conto de Pilniak ou uma história sobre mim mesma?”Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Erudita e inteligente, Dubravka Ugresic confunde o real e o imaginário de maneira a interrogar ambos. Assim, nas partes seguintes, a viúva de um escritor recria o seu legado, criando na realidade as ilusões que o marido criara na sua obra. Chegando-se a uma possível existência de um último romance desse escritor, mas que na verdade parece existir apenas na memória de outros escritores que com ele privaram. Pelo meio surgem referências, por exemplo, a Bulgakov e a Nabokov e a episódios das suas biografias. Desta maneira a História da Literatura começa a fazer parte da própria literatura, a confundir-se com a ficção. Os temas habituais de Ugresic surgem mais uma vez: o exílio, os nacionalismos, a reabilitação da História, o modo de vida do escritor, e o mercado cultural da arte. Sobre este último: “Os festivais literários que hoje temos não são assim tão diferentes das feiras rurais medievais, nas quais os visitantes caminhavam de tenda em tenda, passando do espectáculo dos engolidores de fogo para o dos malabaristas. Actualmente, os escritores já não aborrecem o seu público com uma leitura; hoje em dia, actuam. ”Em Raposa, a autora croata parece querer reivindicar uma maior veracidade para a magia da literatura, a que nos ajuda a resistir ao vazio.
REFERÊNCIAS:
A Espanha folclórica e andrógina atravessa o corpo de François Chaignaud
O coreógrafo e bailarino François Chaignaud e o músico Nino Laisné andaram por várias regiões espanholas à procura de tradições seculares ligadas à música e ao movimento. Daí resultou Romances inciertos, un autre Orlando, uma ópera-ballet que desestabiliza o lugar do feminino e do masculino. Em estreia nacional no Palácio da Bolsa, no Porto, sexta e sábado. (...)

A Espanha folclórica e andrógina atravessa o corpo de François Chaignaud
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Ciganos Pontuação: 6 Homossexuais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-10-26 | Jornal Público
SUMÁRIO: O coreógrafo e bailarino François Chaignaud e o músico Nino Laisné andaram por várias regiões espanholas à procura de tradições seculares ligadas à música e ao movimento. Daí resultou Romances inciertos, un autre Orlando, uma ópera-ballet que desestabiliza o lugar do feminino e do masculino. Em estreia nacional no Palácio da Bolsa, no Porto, sexta e sábado.
TEXTO: Mesmo com quatros músicos em palco, mesmo com um deles a dar tudo, e bem, no bandoneón, é difícil não centrar o olhar em François Chaignaud. Entra em cena muito suavemente, mas também muito dramaticamente, com um figurino medieval feito à medida, uma face impecavelmente maquilhada, um corpo que tanto poderia ser de homem como de mulher. O bailarino e coreógrafo francês, adepto do transformismo e que tantas vezes põe em confronto, no seu próprio corpo, as suas pesquisas enquanto historiador, é mesmo assim: nunca se sabe como vai aparecer diante de nós, mas é sempre coisa para parar o trânsito. Em 2016, no Rivoli e com o solo Dumy Moyi, vimo-lo de rabo à mostra a equilibrar pássaros na cabeça, entre outras coisas, enquanto cantava árias ucranianas do século XIX e canções medievais sefarditas, inspirado pelas cerimónias theyyam do Sul da Índia. Esta sexta e sábado no Salão Árabe do Palácio da Bolsa, no âmbito da programação do Teatro Municipal do Porto, vamos vê-lo a encarnar três personagens da mitologia espanhola em Romances inciertos, un autre Orlando, uma ópera-ballet criada juntamente com o músico e artista transdisciplinar Nino Laisné. Este espectáculo resultou de um processo de investigação e criação de quatro anos, focado nas tradições orais, musicais e coreográficas espanholas desde o século XVI. Tudo começou com uma residência em Huesca, onde François Chaignaud e Daniel Zapico, um dos músicos que viria a integrar Romances inciertos, apresentaram um performance. A partir daí, Chaignaud e Laisné viajaram por aldeias de várias regiões de Espanha “à procura de melodias e tradições seculares”. “Também trabalhámos com muitos maestros de flamenco, fandango, jota [dança folclórica espanhola]. Todos estes materiais levaram-nos a fazer Romances inciertos”, contextualiza Nino Laisné. “Esta peça nasceu também da vontade em criar um corpo completo, em que as canções e as danças estão muito próximas. Um corpo que pudesse viajar no tempo e na geografia. ”A solo ou acompanhado – muitas vezes com a coreógrafa Cecilia Bengolea, com quem tem a companhia Vlovajob Pru –, François Chaignaud sempre procurou não só fazer convergir referências e repertórios históricos heterogéneos, dos tempos medievais às danças de rua, como ensaiar diálogos íntimos entre o movimento e o canto – e em Romances inciertos subiu definitivamente a parada. Podemos dizer que está mais cantor do que nunca, e também é seguro dizer que isso lhe sai da pele. “Há uma exigência neste espectáculo que nós não queremos esconder”, afirma o coreógrafo. “Na maior parte do tempo, canto num contexto ‘hostil’, em que o corpo está inquieto e desequilibrado. ”Chaignaud é uma figura saturnina, uma presença magnética e exuberante, mas ao mesmo tempo muito real, muito próxima de nós: há uma vulnerabilidade naquele corpo em autoconstrução, entre a disciplina e a libertação, entre o equilíbrio e o desequilíbrio. Ele gosta de complicar, de implicar os figurinos na própria coreografia, como se fossem um segundo corpo. “Este espectáculo é um belíssimo recreio para pesquisar sobre canto e dança, simultaneamente. Adoro as dificuldades que nele existem, as oportunidades formais e, claro, o poder ficcional. ”Romances inciertos, un autre Orlando desenrola-se em três actos, cada um correspondente a uma personagem. A primeira é Donzela Guerreira, uma jovem mulher que corta os cabelos, disfarça o peito e veste-se com roupas de homem para poder lutar na guerra. Depois é a vez do arcanjo São Miguel, “cujas representações pictóricas apresentam sempre uma certa ambiguidade”, descreve Nino Laisné – nos poemas de García Lorca, esta figura é imbuída de “erotismo e androginia”. Por fim, vemos Chaignaud enquanto Tarara, uma cigana andaluza de coração partido. “Ela aparece na música sefardita antes de se ter tornado numa figura-chave do flamenco. Alguns versos fazem referência à sua provável intersexualidade. ”Há uma androginia e uma desconstrução das normas de género em comum entre estas três personagens, que de alguma forma desestabilizam o lugar do masculino e do feminino, pondo em causa a concepção de género enquanto marcador cultural e social estático. Numa altura em que se começa a falar mais sistematicamente sobre estes assuntos, Nino Laisné considera que olhar para estas figuras “das culturas tradicionais” é uma maneira de nos “lembrar” que as questões de género já andam por cá há séculos. François Chaignaud concorda. “Sinto que a perspectiva histórica do espectáculo permite reenquadrar estas questões de uma forma muito mais ampla. A fluidez de género não é uma coisa recente”, observa, referindo que procura reflectir nos seus trabalhos o seu próprio “processo de identidade”. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Para o coreógrafo, “é muito inspirador” conectar-se com “estas manas dos séculos passados”. “A nível artístico, elas são como fantasmas que visitam os nossos corpos; politicamente, legitimam as negociações de género enquanto processo secular. Impressiona-me o facto de estas figuras serem movidas pela sensualidade e pela intensidade dos seus desejos, que as colocam numa situação de vida precária, mas que ainda assim mostram o caminho para uma acção e agência inspiradoras. ” Outra dessas “manas” é Orlando, a personagem marcante de Virginia Woolf, que apesar de não estar na peça, é evocada no título por causa de algumas “semelhanças” entre o romance de Woolf e a forma como o espectáculo está construído. “Os sonos de Orlando, durante os quais muda de identidade de género, poderiam ser aqui os momentos em que eu saio do palco por alguns minutos, que são como décadas e que me permitem reaparecer com uma identidade diferente”, aponta Chaignaud. Apesar de as questões de género estarem habitualmente presentes nas suas performances, o coreógrafo e bailarino francês diz estar muito mais interessado “na prática de danças e de músicas específicas”. Neste caso, foi beber ao ballet, ao flamenco e ao jota, às danças de corte e às danças com andas. Outro eixo central da coreografia é “os pés, os sapatos, o chão”. Dos saltos altos às andas, aquilo que usa nos pés “determina muitas das (im)possibilidades” do movimento. E isso tem também a ver com as personagens. “Ao colocarem-me constantemente num equilíbrio impossível, estes objectos espelham a procura das personagens, o sentido de risco delas. ”Mesmo que não consigamos tirar os olhos de François Chaignaud – e ele parece que nasceu para isto, para encarnar estas personagens – a verdade é que nem esta Donzela Guerreira, nem este arcanjo São Miguel nem esta Tarara existiriam sem os músicos em palco. “Isto não é um solo com quatro músicos. Os nossos cinco corpos convergem para fazer com que cada figura apareça. ”
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave guerra mulher homem social género corpo donzela
O cinema é um milagre
Com Na Via Láctea Emir Kusturica, qual Fénix, renasce das cinzas, ou das misérias em que havia caído o seu cinema, com uma prodigiosa obra-prima que é o seu filme mais arriscado e também uma súmula, convocando inúmeras memórias dos anteriores e incitando à sua revisão e reconsideração. (...)

O cinema é um milagre
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Ciganos Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2016-12-31 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20161231180500/http://publico.pt/1756225
SUMÁRIO: Com Na Via Láctea Emir Kusturica, qual Fénix, renasce das cinzas, ou das misérias em que havia caído o seu cinema, com uma prodigiosa obra-prima que é o seu filme mais arriscado e também uma súmula, convocando inúmeras memórias dos anteriores e incitando à sua revisão e reconsideração.
TEXTO: Emir Kusturica (n. 1954) é um realizador controverso que, como poucos, suscita as mais extremadas opiniões. E é assim controverso por duas ordens de razões. Por um lado as propriamente cinematográficas, pela adesão ou rejeição imediata, epidérmica mesmo, que suscitam a desmesura e imaginário figurativo dos seus filmes. E, por outro, pela sua trajectória política durante a guerra na ex-Jugoslávia e suas sequelas, bem como pelas suas idiossincracias megalómanas – e note-se que estas últimas são matérias de facto e não da subjectividade de apreciações. Kusturica destacou-se logo com Recordas-te de Dolly Bell?, Leão de Ouro para a melhor primeira obra em Veneza em 1981 e foi consagrado com O Papá Está em Viagem de Negócios, Palma de Ouro em Cannes em 1985, muito claramente duas obras de “jovem cineasta”, duas revisitações sob prisma íntimo da História da Jugoslávia comunista de Tito, os anos 60 na perspectiva de um adolescente, no primeiro filme, a de 1950 narrada por um miúdo, no segundo. O seu cinema evoluiu entretanto num sentido desmesurado que, podendo até nalguns casos estar inscrito em matérias do real e da História ou, na mesma ordem de razões, da cultura e sentir de uma comunidade específica, no caso os ciganos, é feito de excesso e “para além” do real, num “sobre-real” mesmo, quando não até taxativamente “surrealismo”. E assim se sucederam O Tempo dos Ciganos (1989), a viagem americana de Arizona Dream (1993) e dois absolutos delírios, a apoteose de Underground (nova Palma de Ouro em Cannes, 1995) e o regresso aos ciganos com Gato Preto, Gato Branco (1998). Só que…Só que ocorreu com Kusturica o horizonte negativo dos cineastas, dos artistas, que operam nesse estreito fio de risco que são a desmesura e o excesso. A Vida é um Milagre (2004) era (é) uma catástrofe também ela absoluta, e Promise me this (2007, nunca estreado em Portugal e um fracasso internacional) um “monumento” de auto-indulgência e auto-citação insuportavelmente repetitivo. Seria Kusturica “um caso arrumado”? Deve haver uma prevenção genérica com este tipo de catalogação e ter a disponibilidade suficiente para ainda se deixar ser surpreendido – já me ocorreu mais que um caso em que considerei um realizador já “assunto encerrado” e depois haver um filme que me levava a reconsiderar. Além disso´, e no caso concreto, com Na Via Láctea Kusturica, qual Fénix, renasce das cinzas, ou das misérias em que havia caído o seu cinema, com uma prodigiosa obra-prima, absolutamente espantosa, que é o seu filme mais arriscado e também uma súmula, convocando inúmeras memórias dos anteriores e incitando à sua revisão e reconsideração. Este é, por demais claramente, um caso de “pegar ou largar”. Compreendo que haja rejeições veementes do filme mas por mim estou “pegado”, e não sou eu que “pego” o filme, é ele que se “pega” a mim, logo desde o assombroso primeiro plano do falcão na montanha – fica-se “colado” ao ecrã. Este é um daqueles raríssimos casos em que temos de repor a questão de base, perdida na sucessão de visões de filmes, ou até na voracidade do consumo: o que é o Cinema?O aparato e a arte cinematográfica têm uma capacidade ímpar de indagar, captar e registar os indícios do Real e da História, constituindo-se como uma experiência do mundo tanto mais relevante quanto é rápida e alargada a sua possibilidade de difusão. Mas a arte cinematográfica é também espectral e fantasmática, propiciadora de espantos e assombrações. São de algum modo, ainda que transfigurados, os dois polos existentes desde os primórdios, Lumière ou o real, Méliès ou a ilusão. E porque se repõe a questão com Na Via Láctea? Porque o filme anuncia-se, num cartão logo ao princípio, ser baseado em histórias reais, e aborda uma ineludível tragédia real, a das guerras na ex-Jugoslávia (inclusive de modo muito mais frontal que Underground, que tinha supostamente como quadro a II Guerra Mundial, embora não deixe de ser óbvia que era uma metáfora das turbulências do desmembramento do antigo país, que se torna explicito no final, com o bocado de terra que se separa e a derradeira frase, “era uma vez um país”), e todavia transcende em absoluto qualquer realismo, de modo inaudito e até “miraculoso”. Eis também o que nos conduz a uma “digressão” pela obra de Kusturica. Ele estudou na FAMU, a famosa escola de Praga, e nessa sua obra cedo se dá a ver a decisiva influência dos filmes checos de Milos Forman (antes da invasão soviética e do seu exílio), o “realismo íntimo” mas também de implicações geracionais e sociológicas dos maravilhosos O Ás de Espadas (1964) e Os Amores de uma Loira (1965), depois a dança incendiária e carnavalesca de O Baile dos Bombeiros (1972). Lembras-te de Dolly Bell? evoca irresistivelmente O Ás de Espadas e de modo mais lateral Os Amores de uma Loira, e não foi nada fortuito que a inesperada Palma de Ouro a O Papá Está em Viagem de Negócios tenha sido atribuída por um júri presidido por Forman. Só que com as personagens principais de um e outro já havia práticas ou ocorrências que, ainda que não saindo do quadro do real, eram de âmbito digamos que “para-normal”: o Dino de Dolly Bell praticava “hipnose, auto-sugestão”, inclusive com o seu coelho (começo logo no “anunciador” primeiro filme do inacreditável bestiário que Kusturica foi reunindo), o Malik de O Papá tornava-se sonâmbulo. Mas havia ainda outra recorrência. O primeiro plano do primeiro filme era um homem, o “controleiro”, o pregador do partido, com grossos óculos escuros e o encarregado que se ocupava dos miúdos era chamado de “Quatro Olhos” pelos seus espessos óculos; isso tinha também Mirza, o irmão mais velho de O Papá…. Ou seja, desde os primeiros filmes Kusturica punha em cena uma condição “reforçada” de visão, mas também distorcida, o que voltava a acontecer com o rapaz que é personagem principal do filme seguinte, O Tempo dos Ciganos, que também usa óculos muito graduados, com a particularidade acrescida de a lente esquerda estar tapada - e o Kosta interpretado pelo próprio Kusturica de Na Via Láctea reforça a visão com um monóculo!E, claro, desde os primeiros filmes havia a música, as cançonetas e os bailes, em roda-viva, que nos dois filmes de guerra, Underground e este agora, se tornam delirante dança macabra. Crucial na filmografia foi a opus seguinte, O Tempo dos Ciganos: não só o cinema de Kusturica, já para além do real, “entrava em levitação” (estado que a partir daí nunca faltaria), coma a estrutura precisamente do tempo deixava de estar comprimida e uniforme, antes havendo cenas e sequências longuíssimas que, nos seus melhores momentos, neste filme e nos posteriores, têm o caracter de alucinações hipnóticas. E começava a ser patente a proximidade com o universo de Fellini – mas disso já falaremos. Alucinações, hipnoses, sonhos (Arizona Dream se chama o belíssimo filme americano – mesmo que o realizador tenha antes achado a experiência um pesadelo), fantasmagorias – o real e o “sobre-real”, quando não ocorre ser taxativamente “surrealismo”, afirmam-se como o universo distintivo do autor. É um cinema de “visões”: se há muitas personagens com questões de vista (neste agora há um olho de vidro), os ângulos de visão multiplicam-se até ao uso recorrente da grande angular (mas como é possível filmar intensamente em exteriores com essa lente?, o que sucede em Na Via Láctea, e é um dos mais destacados prodígios ou “milagres” do filme), e há com frequência “visões”. E, em paralelo, há o continuado bestiário: o coelho, a pomba e os cães em Dolly Bell, os pombos e os cães de O Papá…, o peru e o gato do Tempo dos Ciganos, as tartarugas e o porco de Arizona Dream, o macaco, o papagaio, os gansos, etc. . , etc…em Underground, os gatos, cães, peru, patos… de Gato Preto…Seria Kusturica “um caso arrumado”? Deve haver uma prevenção genérica com este tipo de catalogação e ter a disponibilidade suficiente para ainda se deixar ser surpreendidoOcorre haver animais em filmes, muitos cães, cavalos, pombos e gatos sobretudo, mas nada que se assemelhe ao circo zoológico de Kusturica. Cabe sim mencionar que há dois animais que “são” personagens principais de filmes e até lhe dão título, evidentemente o burro de Au Hasard Balthazar (1966) de Robert Bresson e o falcão de Kes (1970) de Ken Loach. Um burro e um falcão, que coincidência, vem a calhar…Por muitos animais que haja em filmes de Kusturica, não há precedente para o estatuto que ele dá em Na Via Láctea ao falcão, ao burro, ao urso e à serpente, inclusive creditando-os como intérpretes no genérico final. A serpente é um caso particular. A história que a envolve (mais que uma vez aliás) é dramaturgicamente da maior importância e o realizador refere-a sempre como um dos acontecimentos reais em que se baseou, o de um soldado russo que no Afeganistão foi enrolado por uma serpente que de facto o salvou de um tiroteio. Mas a serpente não é propriamente “ensaiável” e controlável, e nessas cenas há efeitos especiais de tratamento digital. Mas os outros, com quem obviamente Kosta/ Kusturica tem uma “relação pessoal”, são mesmo animais dele, parte do “circo privado” que mantém e com o qual até se desloca. Pode-se suspeitar aliás que essa foi uma razão determinante para uma das maiores dificuldades do filme, o facto de Kusturica ser também protagonista. Mas como conseguiu ele estar atrás da câmara, com movimentos extremamente complexos e incríveis “orquestrações” de figuras e eventos, e estar ao mesmo tempo frente a ela, como actor principal?! É da ordem do prodígio, mas se é de um virtuosismo imenso não é reduzível a isso, é o espantoso “investimento pessoal” do autor neste filme. Fica-se boquiaberto e rendido – eu por mim fico. Como conseguiu ele estar atrás da câmara, com incríveis “orquestrações” de figuras e eventos, e estar ao mesmo tempo frente a ela, como actor principal?!A peculiaridade do “circo privado” leva-nos às idiossincracias de Kusturica e à sua megalomania. O narcisismo vedetista da pose de rock star com que ele andou à frente da No Smoking Band (até fez um documentário sobre ele e o grupo) é coisa menor comparado com a construção de uma cidade para a rodagem de A Vida É um Milagre, a qual, chamando-se Andricgrad, em homenagem ao Prémio Nobel da Literatura Ivo Andric, autor de A Ponte sobre o Drina (a “cidade” fica junto aos locais referidos no romance), é uma “kusturicalândia”, uma Disneylândia nos Balcãs. E que interessa isso para a consideração do seu cinema? Importa porque coloca a interrogação desse cinema não ser mais que exibicionista (o que muitas e respeitáveis pessoas acham), suscitando a tal questão da característica felliniana, inegável em Kusturica. Ora “felliniano” é coisa que não sou de todo, o que não me impede de achar que há filmes, e esses são obras-primas (Amarcord, E la Nave Va… ou a tocante homenagem ao circo que é I Clown) em que ele se “transcendeu”. “Transcendência” é um conceito que ocorre a propósito de Na Via Láctea, sobretudo depois dos dois imensos desastres anteriores. Citei dois polos do cinema, Lumière e Méliès. Cabe referir, a título de paradigmas, um outro, Dreyer e Buñuel, o ascético e crente e o surrealista e herético. O título Na Via Láctea deriva de ser pelo leite que a misteriosa mulher ordenha das vacas e entrega a Kosta que se estabelece a proximidade entre os dois, mas remete também para a desmesura cosmológica do filme, no modo como intenta criar um universo. O tão surrealizante Kusturica não podia contudo desconhecer que Na Via Láctea se chama o mais herético dos filmes daquele que é “o” cineasta surrealista, Buñuel. Não podia desconhecer, note-se, mas pelo contrário o epílogo até é com a conversão de Kosta em monge ortodoxo. Não é por esse religioso final que se invoca um paradigma com Dreyer, mas porque um prodígio maior do filme é fazer-nos “acreditar” nele, questão de “crença” portanto. Não é de modo nenhum preciso ser crente para acreditar no milagre em A Palavra de Dreyer. De outro modo de todo diferente e sem estar a fazer comparações, Na Vida Láctea é um filme que nos faz “acreditar” nele, em que o cinema pode ser “um milagre”. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Mais importante é a possível objeção ética ao filme como não só legitimação da posição pró-sérvia do autor (e, de resto, até da sua conversão ao cristianismo ortodoxo) como, mais grave, de branqueamento de crimes de guerra. Não é nada inocente, antes pelo contrário é motivo de perplexidade, que Kusturica tenha situado o filme na Krajina, “república sérvia” em território croata, em que houve gravíssimos crimes, ou proceda ao seu “ajuste de contas” com a intervenção ocidental nas guerras da Jugoslávia, apresentando como “a má da fita” uma brigada da SFOR (Stabilisation FORce), os destacamentos enviados pelo Nato, embora ao abrigo de uma resolução do Conselho de Segurança. Compreendo a objeção e respeito-a, mas ainda assim acho que o cerne é outro. “Esta guerra não é connosco” diz a velha aldeã, e o par da “Noiva” e Kosta não estão envolvidos na guerra, são sim cercados por ela. Não sendo nada fortuito que este seja o filme em que Kusturica enfrenta directamente as feridas das guerras na Jugoslávia, é divergente o fio da narrativa: “é possível o amor em plena guerra?”.
REFERÊNCIAS:
Tapeçaria de Katty Xiomara em leilão solidário para a Acreditar
O leilão solidário começa a licitação nos 3000 euros e reverte a favor da Associação Acreditar (...)

Tapeçaria de Katty Xiomara em leilão solidário para a Acreditar
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Ciganos Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-06-02 | Jornal Público
SUMÁRIO: O leilão solidário começa a licitação nos 3000 euros e reverte a favor da Associação Acreditar
TEXTO: A primeira tapeçaria de Katty Xiomara, criadora de moda portuguesa, vai ser leiloada online a partir do primeiro minuto de quarta-feira, 22 de Março. A licitação começa nos 3000 euros e o total do montante conseguido vai ser doado à Acreditar – Associação de Pais e Amigos de Crianças com Cancro que abriu há um mês uma casa no Porto. Considerando o valor comercial da tapeçaria, a organização do leilão espera atingir pelo menos os 6000 euros. Os interessados têm até ao fim do dia da próxima segunda-feira, 27 de Março, para licitar no tapete em tons de azul que tem quatro metros de comprimento por dois de largura e pesa quase 50 quilos. A tapeçaria única de oito metros quadrados foi fabricada com lã neozelandesa e fio de viscosa, com “técnicas de tufagem que combinam a tradição manual com a mais moderna tecnologia de produção industrial existente em Portugal”, lê-se no comunicado da Desistart. A peça chama-se “Enamorado” e é uma representação da música “El toroenamorado de la luna”, interpretada pelos Gipsy Kings, um grupo de música cigana que toca rumba flamenca. Os tufos de diferentes alturas (entre oito e 65 milímetros) realçam as formas dos animais e da lua, num contraste entre tons azuis frios e castanhos e vermelhos escuros. A peça foi produzida pela Desistart, uma empresa portuguesa especializada no fabrico de tapeçarias de luxo e pode ser vista ao vivo no desfile de apresentação da colecção Outono/Inverno da estilista integrado nesta edição do Portugal Fashion, que se realiza na antiga Cadeia da Relação do Porto na sexta-feira, 24 de Março. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Katty Xiomara ficou contente com o resultado final da tapeçaria “pela qual toda a gente de bom gosto se irá enamorar”, diz em comunicado. A empresa e a estilista já tinham trabalhado juntas numa peça para o desfile que a organização do Portugal Fashion realizou em Nova Iorque, no mês passado. Para licitar no leilão solidário, os interessados têm de se registar previamente no site oficial da Desistart. Texto editado por Ana Fernandes
REFERÊNCIAS:
Tempo Março