Taiwan em risco de exclusão da assembleia da Organização Mundial de Saúde
O convite para a assembleia da agência da ONU, que decorre no final de Maio, ainda não chegou a Taipé. Está condicionado ao aval da China. (...)

Taiwan em risco de exclusão da assembleia da Organização Mundial de Saúde
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: O convite para a assembleia da agência da ONU, que decorre no final de Maio, ainda não chegou a Taipé. Está condicionado ao aval da China.
TEXTO: Taiwan corre o mais sério risco dos últimos anos de não participar na assembleia da Organização Mundial de Saúde (OMS), devido à pressão da China. Há mais de um mês que o governo de Taipé espera resposta ao apelo público dirigido aos responsáveis desta agência das Nações Unidas para que lhe envie o convite sem o qual não poderá participar “nesta assembleia que procura o bem de toda a humanidade”. A iniciativa, que visou também o apoio da comunidade internacional, não teve até agora resultados. “A ausência de Taiwan da OMS abriria uma séria fissura no sistema global de saúde e criaria riscos significativos”, adverte o Governo de Taiwan, em comunicado, como os de propagação de epidemias e de segurança alimentar, áreas em que o país tem programas activos. “A OMS precisa de Taiwan para construir um sistema de saúde global robusto, e Taiwan precisa da OMS também”, defende o governo. O próximo encontro magno da agência das Nações Unidas para a saúde está marcado para 22 a 31 de Maio em Genebra. Com estatuto de observador desde há nove anos, Taiwan apenas pode participar através de convite, o qual está condicionado ao aval da China, que não reconhece a independência do território de 23 milhões de pessoas. Taiwan lembra que desde o início da sua participação como observador, há nove anos, “a participação activa em encontros técnicos da OMS e da Assembleia melhorou o controlo de doenças em Taiwan e no mundo, face ao seu compromisso em prestar assistência a outros países que enfrentam desafios de saúde, indo ao encontro da visão da OMS”. Sobre o risco de propagação de epidemias, o país considera ter uma “posição crítica na rede global de transportes”. A Região de Informação de Vôo de Taipé, pela qual é responsável, administra um trânsito anual de 60 milhões de passageiros. E cerca de 1, 25 milhões de aves sobrevoam anualmente o território nas suas rotas migratórias desde a China, Japão e Coreia do Sul em direcção ao sudoeste asiático e às nações insulares do Pacífico. No que se refere à segurança alimentar, sublinha o seu lugar de destaque no comércio mundial. Foi, em 2015, o 17. º maior exportador e o 18. º importador mundial de mercadorias. “Será difícil gerir a segurança alimentar global, se Taiwan for excluído”, frisa. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Segundo a OMS, mais de dois milhões de pessoas morrem anualmente por contaminação de alimentos ou água para consumo. A ideia de que a OMS e Taiwan precisam uma da outra foi entretanto materializada numa exposição online de fotografia, promovida pelo governo do território: “Não deixar ninguém para trás: a segurança mundial de saúde precisa de Taiwan, Taiwan precisa da Organização Mundial de Saúde". Está disponível na Internet desde o final de Abril, e serve sobretudo como bandeira da campanha em favor da participação do país na próxima assembleia da OMS. Procura mostrar o que tem sido o contributo activo do país para a saúde mundial, e mais recentemente no apoio aos objectivos do desenvolvimento sustentável das Nações Unidas, através do envolvimento em vários programas. Esses programas incluem vários países asiáticos e também de língua oficial portuguesa, como São Tomé e Príncipe (país que no último ano cortou relações diplomáticas com Taiwan e as encetou com a China, após a forte aproximação desta). As dificuldades de participar na assembleia da OMS já se tinham manifestado abertamente em 2016, depois de Tsai Ing-Wen, líder do partido pró-independentista, ter ganho as eleições em Março. O convite chegou em cima das últimas horas, após diligências diplomáticas dos EUA em seu favor, mas condicionado ao reconhecimento, por parte de Taiwan, de “uma só China”, tal como tinha sido imposto pela China. A representação de Taiwan participou então sem fazer qualquer referência à intenção chinesa.
REFERÊNCIAS:
Entidades EUA OMS
O Curtas produz, mas sem pressas
Em 2018, o festival de Vila do Conde mostra três novas produções próprias - as primeiras a “saírem fora” do “caderno de encargos” que o Curtas tinha estabelecido. (...)

O Curtas produz, mas sem pressas
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DATA: 2018-07-16 | Jornal Público
SUMÁRIO: Em 2018, o festival de Vila do Conde mostra três novas produções próprias - as primeiras a “saírem fora” do “caderno de encargos” que o Curtas tinha estabelecido.
TEXTO: Ao longo dos seus 26 anos de existência, o Curtas Vila do Conde tem produzido regularmente, mas geralmente sempre no âmbito de efemérides (como as comemorações dos 20 anos do certame), respondendo a temáticas relacionadas com a região de Vila do Conde, ou ao abrigo de projectos de formação emparelhando jovens estudantes de cinema com realizadores de nome feito. Thom Andersen, Sergei Loznitsa, Graça Castanheira, Manuel Mozos, João Pedro Rodrigues, João Canijo ou Sandro Aguilar foram alguns dos nomes que responderam a esses convites. Mas as três produções do Curtas em estreia no programa 2018 – numa sessão especial este domingo, às 20h, com repetição no dia 21 às 17h – “saltam fora” dessas circunstâncias. Duas delas, A River Through the Mountains, de José Magro, e Circo do Amor, de Miguel Clara Vasconcelos, nem sequer respeitam literalmente o “caderno de encargos” que o trabalho de produção do festival tinha até agora seguido. Nuno Rodrigues, um dos directores do Curtas, reconhece que a situação é invulgar, mas explica que tem muito de puramente circunstancial. Até porque, para aquele que é um dos responsáveis do festival desde o início, a produção própria não é algo que o Curtas esteja interessado em assumir a tempo inteiro: “Ficámos de algum modo com o bichinho da produção, mas é algo que queremos desenvolver como actividade complementar, interligada com os nossos outros projectos. Temos a Agência da Curta-Metragem, a galeria Solar, o projecto Animar – actividades que não só são complementares umas às outras e ao Curtas, como ajudam e fortalecem todas as outras, e essa é também uma das formas de sobrevivermos e continuar a dar cartas fora de um grande centro urbano. ”O único filme que respeita a lógica de produção do certame é Náufragos, resultado de um workshop de formação com alunos “do final do ensino secundário e início do superior” no âmbito do serviço educativo do festival, Animar, que teve este ano como tema o documentário. Filme elegíaco e abstracto, espécie de mini-ensaio onde são as vozes dos entrevistados que transportam a narração, Náufragos nasce de um trabalho de pesquisa e criação orientado pelo cineasta Pedro Neves (Tarrafal, Hospedaria, Água Fria), documentarista que se tornou numa espécie de “historiador oficioso” do Porto e seus arredores, dando voz a sobreviventes e familiares da tripulação de um navio de pesca naufragado das Caxinas. “Convidar o Pedro para fazer uma espécie de residência artística surgiu a partir de uma ideia que tinha a ver com coisas que ele tem andado a fazer, ” explica Nuno Rodrigues. “Ele ficou desde logo muito interessado, deu uma base e muita liberdade aos alunos. ”Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Circo do Amor, o segundo dos três filmes, é uma ficção concebida por um realizador “muito lá de casa” – Miguel Clara Vasconcelos (Encontro Silencioso, Documento Boxe), que, natural de Lisboa, cresceu em Vila do Conde e realizou para o festival a média experimental Vila do Conde Espraiada, prolongada para uma instalação/exposição chamada Onde o Coração se Esconde. “Circo do Amor é uma co-produção com França e é por isso um filme feito com outros meios, completamente diferente das [nossas] outras [produções]", explica Rodrigues. “O Miguel tinha imaginado uma história de ficção na urbanização do Mindelo onde acabou por rodar, e há uma situação precisa que está na base da inspiração do argumento e da preparação. Mas a ligação ao local é ao mesmo tempo uma coisa muito livre – a história podia decorrer aqui como noutro sítio. ”Para o fim ficou o objecto mais “fora” do baralho. A River Through the Mountains, encantadora evocação do amor adolescente com forte inspiração da nova vaga asiática dos anos 1990, foi rodado na cidade chinesa de Hancheng por José Magro, realizador que participou no programa de formação Campus (foi director de fotografia de Mahjong, de João Pedro Rodrigues e João Rui Guerra da Mata). O projecto nasceu do desafio feito pelo festival chinês Hancheng Jinzheng a uma dúzia de certames irmãos por todo o mundo, entre os quais o Curtas: “cada festival escolheria uma equipa para fazer um filme em 72 horas na cidade, que seria uma ficção à volta do amor, ” explica Rodrigues. “Quisemos enviar uma equipa que tivesse a ver com o trabalho realizado aqui no Estaleiro e no Campus, daí termos convidado o José Magro, o Miguel da Santa e o Tiago Carvalho, que participaram enquanto estudantes em alguns dos trabalhos. ” O trabalho feito literalmente a três em Hancheng foi afinado a posteriori com mais tempo e é essa versão mais acabada que o Curtas vai estrear. Que não se pense, contudo, que o Curtas se vá tornar numa entidade produtora a tempo inteiro. “Claro que vão continuar a surgir histórias como estas, ” diz Nuno Rodrigues, que avança que há outros projectos em “estaleiro”. “Mas de uma forma calma, pausada, não como actividade que se sobreponha às outras de forma evidente. Não é esse o nosso objectivo. ”
REFERÊNCIAS:
Partidos LIVRE
“Para combater os plásticos é preciso uma revolução política à escala mundial”
Nos anos 90, Charles Moore descobriu a grande acumulação de lixo no Pacífico Norte. Desde então, tem viajado pelo mundo para nos alertar sobre os seus possíveis impactos. Veio a Portugal para avisar que estamos longe de estar preparados para vencer a batalha contra os plásticos. (...)

“Para combater os plásticos é preciso uma revolução política à escala mundial”
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: Nos anos 90, Charles Moore descobriu a grande acumulação de lixo no Pacífico Norte. Desde então, tem viajado pelo mundo para nos alertar sobre os seus possíveis impactos. Veio a Portugal para avisar que estamos longe de estar preparados para vencer a batalha contra os plásticos.
TEXTO: Charles Moore é o pai da investigação sobre a grande mancha de lixo (dominada por plástico) do Pacífico Norte e tem assumido bem esse papel. Depois de a ter descoberto nos anos 90, não tem parado de a estudar e de viajar pelo mundo para nos sensibilizar sobre o problema do plástico. Esteve esta semana na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e, na semana passada, deixou o seu testemunho na Faculdade de Ciências e Tecnologia (FCT) da Universidade Nova de Lisboa para assinalar o Dia Nacional do Mar. E veio vestido a rigor: calças pretas, camisa avermelhada e um laço preto de plástico a condizer. Na mão, segurava uma coroa colorida também feita de plástico. “É de plástico reciclado e reutilizado. Veio da Holanda”, diz de forma energética. Com a mesma energia, subiu ao palco do Grande Auditório da FCT. “Olá! Ei”, dirigiu-se para a plateia – quase preenchida –, que reagiu com um aplauso. O norte-americano de 71 anos anunciou que durante os próximos minutos iríamos estar no meio do oceano. Naveguemos então até ao Pacífico Norte e recuemos até 1997. Nesse ano, a bordo do seu catamarã Alguita, o capitão Charles Moore regressava de uma regata. “Apenas queria testar o meu catamarã”, conta. Em 1994, já tinha criado a Fundação de Investigação Marinha Algalita (um nome inventado a partir do espanhol porque, além de química, estudou literatura espanhola) – que tinha o objectivo recuperar as zonas com algas para que as águas costeiras voltassem a ser prístinas – e decidiu adquirir o tal catamarã. “A toda a hora estava a ver fragmentos. Não era nenhuma grande ilha de plástico: eram pequenas peças a flutuar”, lembra. “Comecei a detectar que este tranquilo ‘oceano pintado’ parecia ser – como é que o devo dizer da melhor forma? – manchado. Aqui e ali, partículas peculiares e lascas manchavam a superfície do oceano. Acredito que a maioria é feita de plástico”, escreve no seu livro Plastic Ocean, de 2011 (não editado em Portugal). Já em terra firme, conta que pegou no bloco de notas da viagem e fez alguns cálculos das partículas que tinha observado. “Vi detritos de plástico durante sete dias consecutivos e ao longo de mil milhas náuticas. Penso que esta sopa deverá cobrir uma área maior do que um círculo com mil milhas de diâmetro”, refere no livro. “Nesse ano, só tive a sensação de que algo estava errado”, acrescenta agora. “Dois anos mais tarde – já com equipamento científico –, analisei a área com redes de arrasto e vi que havia níveis muito elevados de plástico. Foi aqui que tive a percepção de que estávamos a transformar o oceano muito mais do que aquilo que eu imaginava. ”Desde então, Charles Moore mudou o foco da sua fundação e não parou de analisar a situação desta grande acumulação de lixo. Entre as descobertas mais “surpreendentes” está a verificação de que numa área havia seis vezes mais plástico do que zooplâncton. “Quando analisámos as amostras que recolhemos, vimos que havia seis quilos de plástico por cada quilo de zooplâncton”, salienta. “Temos visto que o problema está a aumentar e que estamos a mudar e a destruir coisas [na ecologia] que nem fazemos ideia do que são. Estamos fora de controlo: há como que um ataque de plástico. ”Actualmente, Charles Moore constata que esta mancha de lixo piorou. “Quando a descobri, não era uma coisa contínua. Agora há áreas que estão fortemente cobertas de plástico”, aponta. Segundo um estudo publicado este ano na revista científica Scientific Reports, estima-se que os plásticos flutuantes desta mancha cubram uma área de 1, 6 milhões de quilómetros quadrados, o que equivale a mais de 17 vezes o tamanho de Portugal continental, dos Açores e Madeira. E como a descreve Charles Moore? “Como um aterro no mar. ”Grande parte dos contributos para esta acumulação vem de países asiáticos que têm uma fraca gestão de resíduos, economias emergentes e um elevado número de habitantes. Mas Charles Moore sublinha: “Toda a gente no planeta está a contribuir. Há pequenas fontes que vêm todas desaguar nesta mancha de lixo. ”Esta não é a única mancha de lixo flutuante no oceano (embora ser a maior). Os oceanos têm acumulações na sua zona central, os giros: há duas no Pacífico, duas no Atlântico e uma no Índico. Além da mancha do Pacífico Norte, Charles Moore tem estudado a do Pacífico Sul. “Numa viagem que fizemos em 2016 e 2017, encontrámo-la igualmente contaminada. ” Em termos gerais, as amostras recolhidas no Pacífico Sul são mais recentes do que as do Pacífico Norte, que estão mais fragmentadas. “A sociedade no Pacífico Sul tornou-se consumista [e a utilizar plástico descartável] mais tarde. ”O norte-americano conta ainda que, ao longo dos anos, tem tentado transmitir que aquilo que encontrou não é uma verdadeira ilha ou uma mancha contínua de plástico. Contudo, há pouco tempo, na grande acumulação do Pacífico Norte encontrou aquilo que se aproxima mais de uma ilha: um conjunto de bóias, materiais de pesca e fragmentos de plástico com cerca de 24 metros de comprimento. Na apresentação na FCT , Charles Moore mostrou um vídeo onde conseguiu ficar de pé na chamada “Ilha Hi-Zex”, que terá vindo do grande tsunami do Japão em 2011. “[Finalmente] encontrei uma ilha artificial de plástico no meio do oceano”, ironiza. O que preocupa mais Charles Moore relativamente aos plásticos no oceano? “O maior problema são os animais embaraçados no plástico, como tartarugas, focas e baleias. Este é o maior problema visível. ” Quanto aos problemas invisíveis, refere, por exemplo, a ingestão de partículas de plástico. “Já há medusas que têm plásticos incorporados nos seus tecidos. Estamos a fazer medusas de plástico. ”Além disso, destaca que o plástico mais antigo está a degradar-se em nanoplásticos e que estes estão a penetrar na barreira hematoencefálica de peixes, o que pode causar distúrbios comportamentais. Charles Moore já questiona se o mesmo acontece nos humanos. “O plástico não é um condutor de electricidade e o cérebro precisa de circulação eléctrica. Colocar um não condutor no cérebro, poderá trazer desafios à nossa capacidade de pensar”, especula. “Nos peixes, quando o plástico entra no cérebro, eles deixam de procurar comida muito longe. ”O plástico foi inventado no final do século XIX. Mas a sua produção em massa só começou depois da Segunda Guerra Mundial. Na década de 50 produziam-se cerca de dois milhões de toneladas de plástico por ano, em 2015 já eram cerca de 400 milhões, segundo um artigo na Science Advances de 2017. Ao todo, até 2015, já se terão produzido 8300 milhões de toneladas de plástico. Charles Moore confessa que sente que está a perder a luta contra o plástico. “Esta batalha nunca esteve perto de ser vencida. E vamos precisar de muitos anos até chegarmos a um ponto em que poderá ser vencida. ”Como podemos lutar? “Para combater as alterações climáticas e os plásticos é preciso uma revolução política à escala mundial. E ainda não a temos. Estamos apenas na fase da consciencialização e das pequenas medidas. ” E acrescenta: “As soluções, até agora, foram tímidas. Não temos tido soluções à escala do problema. Temos de mudar a forma como produzimos e consumimos plástico. Temos de exigir mudanças no sistema económico. ”Charles Moore elogia tanto a Estratégia Europeia para os Plásticos numa Economia Circular (de 2017), que prevê proibir a venda de produtos de plástico de uso único, como os governos que estão a bani-los. Mas diz que é preciso mais: “Temos de mudar a nossa visão do sistema de produção e consumo para um modelo circular. ” E avisa que se deve ter uma economia circular de “coisas boas”. “É diferente que haja uma economia circular que continue a ter uma parte de materiais perigosos. Ora, os plásticos na distribuição alimentar são perigosos. ” Para cada um de nós, aconselha que reduzamos a pegada de plástico e influenciemos os outros a fazê-lo. Relativamente a iniciativas como a da Fundação The Ocean Cleanup, que lançou o sistema em forma de serpente para recolher plástico da grande mancha de lixo do Pacífico, classifica-a como uma “fraude”. “Há uma praga de plástico e querem limpá-la. Mas não há uma cura. ” Além disso, podem trazer organismos agarrados e continuará a depositar-se plástico no oceano, refere. Sobre se ainda tem esperança no futuro dos oceanos, Charles Moore responde que “a esperança é um aliado muito fraco”: “Quando Pandora trouxe os problemas ao mundo depois de a caixa ser aberta, a última coisa a sair foi a esperança. É uma forma de compensação dos deuses por todos os problemas trazidos pela abertura da caixa. Agora já não podemos meter o plástico dentro da caixa, ele já saiu. Já perdemos a batalha de um mundo livre de poluição de plástico. O nosso futuro será certamente poluído por ele. ”Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Ao mesmo tempo, frisa que a ideia não é vivermos num mundo sem plástico. Afinal, ele está nos carros, nos telemóveis ou até na indústria aeroespacial. “O plástico está omnipresente. Devemos temê-lo pela profunda poluição que provoca e respeitá-lo pelo quão importante é. ”Charles Moore garante que vai continuar a sensibilizar as pessoas e a estudar a grande acumulação de lixo no Pacífico Norte. Ainda em Julho esteve nesta área para recolher mictofídeos (peixes), que estão a alimentar-se de plástico, para perceber os níveis de stress a que estão sujeitos. Afinal, o oceano é a sua vida: cresceu perto dele, já navegava com cinco anos e considera-se “um mamífero marinho”. A luta contra os plásticos do oceano acaba por ser a sua batalha e quer que mais pessoas se juntem a ela.
REFERÊNCIAS:
Lisboa meets Ásia no novo Mercado Oriental
Da Taberna de Macau aos katsu sando, passando pelos baos, os sócios da Taberna da Rua das Flores abriram três novos espaços no novo Mercado Oriental, no Martim Moniz, e mostram uma comida de rua que nasceu com as viagens dos portugueses pelo mundo. (...)

Lisboa meets Ásia no novo Mercado Oriental
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.136
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: Da Taberna de Macau aos katsu sando, passando pelos baos, os sócios da Taberna da Rua das Flores abriram três novos espaços no novo Mercado Oriental, no Martim Moniz, e mostram uma comida de rua que nasceu com as viagens dos portugueses pelo mundo.
TEXTO: Quando Joana, a gerente do Amanhecer Supermercado Oriental do Martim Moniz, em Lisboa, falou a André Magalhães sobre a vontade de criar um espaço de comidas por cima do supermercado, o fundador da Taberna da Rua das Flores e da Taberna Fina (ambas no Chiado) pensou logo que teria graça fazer não um food court mas um hawker center, um desses locais onde, nas grandes cidades asiáticas, se juntam os vendedores de comida de rua, cada um com a sua especialidade. André tinha, há já algum tempo, vontade de fazer alguma coisa em torno da comida de Macau e viu aqui uma oportunidade. Falou com os sócios da Taberna, Bárbara Matos e Tiago Alves, e decidiram avançar. Assim, no novo Mercado Oriental, que abriu mesmo antes do Natal, há três espaços que lhes pertencem – a Taberna Macau, o Bao Bar e o Kamakura – ao lado de outros restaurantes de especialidades de diferentes países da Ásia. “O que eu disse à Bárbara e ao Tiago foi ‘vamos fazer uma taberna com petiscos macaenses’”, conta André. “Sempre me interessou o rasto que a comida portuguesa deixa pelo mundo. Parte do meu trabalho de investigação, e das minhas viagens, passa por aí. ” E Macau é especial neste contexto porque “foi o primeiro sítio do mundo em que houve realmente uma fusão cosmopolita de comidas, motivada e instigada pelos portugueses”. André explica que “a instalação de uma administração portuguesa em Macau implicou a ida de funcionários públicos de outras possessões portuguesas, de Moçambique, Goa, Timor”. Por outro lado, “havia um vai e vem de jesuítas que iam ao Japão e voltavam, [por isso] Macau era um ponto de confluência de tudo o que os portugueses andavam a fazer naquela zona do mundo”. Os pratos da Taberna Macau (todos entre os 7€ e os 9€) são inspirados nessa cozinha de fusão. Há a Sopa de Lacassá, “um clássico, o caldo verde da cozinha macaense”; o Tchai de Bonzo, “um prato vegetariano bastante popular”; o Minchi, que é “o bitoque dos macaenses”, com ovo estrelado e batata frita e com a diferença de a carne ser picada e os temperos serem orientais; o Bao Zai Fan, “um arroz feito no pote de barro, muito parecido com os arrozes de enchidos e de forno portugueses”; o Chatchini de bacalhau, “muito representativo dessa fusão de sabores porque tem o bacalhau mas também curcuma e leite de coco”; e a Cabidela de pato, “um prato antiquíssimo da cozinha portuguesa, a que eles chamam ‘adem’, palavra do português antigo para pato. ”Para além disso, há as sobremesas: a Bebinca de leite, que é “completamente diferente da indiana, porque não tem camadas”. André explica que, embora este seja um doce que toda a gente associa a Goa, ele existe por todo o Sudeste asiático, das Filipinas à Malásia, sendo que “esta versão macaense leva leite de vaca e coco”. Outra hipótese é provar a Batatada, que aqui é feita com batata roxa. “É uma receita portuguesa, da qual agora existem também versões com batata-doce. ” E, por último, a Laranja dos Bonzos, “que é um pouco a ‘laranja dos fidalgos’ de cá, temperada com azeite e, neste caso, com especiarias orientais”. Com Macau a “crescer a olhos vistos” e com uma percentagem cada vez maior da população a vir de fora, “a tradição da cozinha macaense está a diminuir”. Por isso, André acha que “é uma responsabilidade tentar manter isso”, até porque “era uma vergonha que em Lisboa não houvesse nada relacionado com a comida macaense”. Agora já há. Olhando para o espaço onde iria nascer o Mercado Oriental, André e os sócios pensaram que seria interessante ocupar um dos cantos, o que tornaria mais fácil criar um ambiente de convívio nas mesas. Por isso, quando Joana, a gerente do supermercado, lhes perguntou como é que faziam os baos na Taberna da Rua das Flores porque estava interessada em ter um espaço de baos, tiveram uma ideia. “Pensámos que podíamos ser nós a fazer uma coisa com baos, já que a Taberna foi o primeiro sítio em Lisboa a servi-los e eu sou absolutamente fanático dos baos tradicionais de Taiwan, que não têm nada a ver com os que estão agora na moda”, diz André. Os de Taiwan “são grandes, servidos num saco de plástico, cheios de molho que escorre para dentro do saco”. Foi essa a inspiração para os que agora são apresentados no Bao Bar, mas com algumas adaptações. “Na última viagem que fiz, fui ter com o homem que é o Papa dos baos, estive a falar com ele e a aprender como é que se fazia e decidimos fazer mesmo a receita original. ”A lista do Bao Bar incluiu versões mais clássicas e algumas mais criativas (todas a 8€). Há o Pok! Bang! com barriga de porco; o Pángxiè Bao, com caranguejo de casca mole; o Bao à Pequim, com pato lacado; o Bao Mi, de inspiração vietnamita, mais fresco e leve; e até um Vegetarian Dog, com salsicha vegetariana. Nos baos doces (a 4€), a opção é entre um mais asiático, com doce de feijão e sésamo (o Dou Sha Bao) e o Bao de Priscos, com, sim, é isso mesmo, com Pudim Abade de Priscos e fios de carne de porco seca – decididamente poderoso. O Bao Bar funciona também como bar, com uma selecção de cervejas orientais e refrigerantes também orientais, e alguns cocktails feitos com bebidas asiáticas, como o Pirolito japonês ou a Shangria. André Magalhães acredita que, depois da explosão dos baos, a próxima moda vai ser o katsu sando, a sanduíche japonesa que, afinal, também tem a ver com os portugueses. “Fomos nós que introduzimos a fritura no Japão”, recorda. “E katsu é uma abreviatura de katsuretsu, ou seja, costeleta [sando é sanduíche]. É o nosso panado de costeleta, que deixámos no Japão e também em Macau, onde a bifana é uma costeleta panada, com osso e tudo, servida no pão. O katsu sando é uma sandes de panado, uma coisa que tem uma raiz nossa. Porque é que não havemos de puxar por esse fio?”. Foi assim que nasceu o terceiro “irmão” deste trio no Mercado Oriental, o Kamakura, nome inspirado numa cidade nos arredores de Tóquio que André descreve como “uma espécie de Costa da Caparica de Tóquio, onde toda a gente vai para a praia e onde existe imensa comida de rua”. O que os restaurantes mais sofisticados começaram a fazer mais recentemente foram sandes deste tipo mas com wagyu, a carne de vaca de grande qualidade mas caríssima. “Nós pensámos que isso não fazia sentido e decidimos fazer a clássica, com carne de porco. ”Rua da Palma nº 41 Lisboa Horário: todos os dias das 12h às 23h (fecha dia 1 de Janeiro)Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Quem quiser provar essa terá que pedir a Kurashiku, “que é como os japoneses dizem clássico”; depois há também a Tori Katsu, com peito de frango; a Gyu Katsu, com bife de vaca; e a Ebi Katsu, com camarão. Para os vegetarianos, foi criada a Kinoko Katsu, com um cogumelo Portobello panado. Todos os katsu sando custam entre 5€ e 9€. Como alternativa, pode-se pedir as mesmas proteínas mas servidas sobre arroz numa taça, o donburi, com uma sopa de miso (entre os 7 e os 10€). Para sobremesa, aqui as propostas são o monburan, ou bolo de creme de castanhas, ou um kohi zeri, gelatina de café. Para além dos três espaços dos proprietários da Taberna da Rua das Flores, o Mercado Oriental inclui ainda o japonês Sushi House, com variedades de sushi e sashimi, o vietnamita Mint House, que apostou na sopa pho, o coreano K-Bob, que apresenta alguns dos pratos mais típicos da cozinha da Coreia, como o bibimbap (arroz com carne, vegetais e ovo), e ainda, uma oferta de cozinha portuguesa no Cantinho do Chef.
REFERÊNCIAS:
Nova crise financeira e os “animal spirits”
A perspectiva dominante da actualidade é que estaremos na iminência de uma nova crise financeira internacional. Mas talvez não seja para tão breve. (...)

Nova crise financeira e os “animal spirits”
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.068
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: A perspectiva dominante da actualidade é que estaremos na iminência de uma nova crise financeira internacional. Mas talvez não seja para tão breve.
TEXTO: Parecia que a perspectiva de crise financeira tinha sido ultrapassada. Após uma “correcção” de um dos principais índices bolsistas em mais de 10%, no início do ano, a bolsa dos EUA voltou a subir atingindo um novo recorde em Agosto. Contudo, desde então, as quedas regressaram e avolumam-se os sinais de uma nova crise financeira. O “preço” da bitcoin [uma “criptomoeda” que se pretendia desenvolver como nova moeda digital em substituição e em concorrência com as moedas públicas como o euro e o dólar], sinónimo recente da maior bolha especulativa de sempre, caiu de um máximo de quase 20 mil dólares, no final de 2017, para 3, 8 mil dólares na última sexta-feira. Contudo, a actividade económica dos EUA apresenta alguns indicadores muito positivos que há muito não se registavam. O emprego total aumentou em 600 mil postos de trabalho em Outubro, com a taxa de desemprego a situar-se em mínimos dos últimos 49 anos, 3, 7%. A taxa de crescimento real do PIB tem estado a acelerar desde 2016, tendo o PIB crescido 3% em termos homólogos no 3T2018. No mesmo período, a taxa de crescimento do salário médio, +3, 1% em termos homólogos, atingiu o nível mais elevado desde 2009. Nestas condições, a queda do índice bolsista dos EUA em pouco mais de 10% desde o pico absoluto atingido em Agosto, após longos anos de subida contínua sem qualquer variação negativa significativa, não deveria ser factor de preocupação, sobretudo quando o desempenho da economia real dos EUA parece melhorar. Mas é. Embora os resultados da literatura académica não sejam conclusivos sobre a relação de causalidade entre os mercados financeiros e a actividade económica, parece dominante a perspectiva que as crises financeiras tendem a causar crises da actividade económica real, embora nem todas as crises financeiras causem crises económicas, i. e. , resultem em recessões económicas com quedas do PIB e do emprego. No entanto, crises financeiras profundas parecem resultar quase sempre em recessões ou mesmo depressões económicas. Foi isso que se observou na Grande Depressão dos anos 30, com a actividade económica (nomeadamente, PIB, nível de emprego e taxa de desemprego) a demorar muitos anos a voltar a atingir o pico antes da crise. Algo similar também se verifica na crise financeira internacional de 2007-2009. E, em particular, nas frequentes crises dos mercados emergentes documentadas no livro de Reinhart e Rogoff, “Desta vez é diferente”. Nesse livro, com um título muito pertinente e irónico, Reinhart e Rogoff notam que em todas as expansões (“booms”) que precedem as crises financeiras, decisores e agentes económicos argumentam que a expansão é diferente das anteriores e que “desta vez” não irá resultar numa nova crise financeira mas, posteriormente, são surpreendidos por nova crise financeira. Keynes em 1936 enfatizou o papel dos espíritos animais, “animal spirits”, (i. e. , emoções humanas) nos mercados financeiros (Keynes era também um especulador) e nas decisões dos agentes económicos do sector privado. Contudo, afigura-se que, a próxima crise financeira será diferente, ao contrário do que defendem Reinhart e Rogoff, porque desta vez já quase não há humanos nos mercados financeiros. A maior parte das transacções são, actualmente, realizadas por algoritmos automatizados e algoritmos inteligentes. Com efeito, será difícil pensar em “animal spirits” e emoção humana quando, de acordo com algumas estimativas, mais de dois terços das transacções em bolsa são realizadas por máquinas e somente 10% das transacções serão baseadas em escolhas discricionárias por investidores humanos. Claro que Keynes, ao falar de “animal spirits” se referia ao efeito dos lucros e das perdas sofridas em bolsa no resto da actividade económica, nomeadamente, em consequência dos seus efeitos sobre as expectativas dos empresários. Mas parece provável que o drama e a emoção dos mercados financeiros tenha sido atenuado pela presença crescente das máquinas. Será que, tal como num electrocardiograma, as oscilações diárias, semanais e anuais dos mercados tenderão a ser substituídas por uma linha contínua de uns e zeros, com transições digitais abruptas, à medida que definha e se extingue a “humanidade” dos mercados financeiros?É importante notar o papel da Reserva Federal (FED) nas crises financeiras. Embora macroeconomistas, como Ricardo Reis, destaquem o papel da política monetária moderna como factor fundamental para evitar uma nova Grande Depressão na sequência da crise financeira internacional de 2007-2009, outros há que argumentam que a política monetária inspirou ou, pelo menos, não contrariou bolhas especulativas nos mercados financeiros que resultaram na crise bolsista das dot. com (empresas da era da internet) em 2001 e na crise bancária e do mercado imobiliário em 2007-2009, crises essas que se transformaram em recessões globais. Já antes, entre 1979 e 1983, a política monetária do FED sob a liderança de Paul Vocker, tornou-se muito restritiva, para combater a elevada taxa de inflação observada nos EUA (9%) resultando numa queda acumulada da actividade económica nos EUA estimada em 20% do PIB, à data, “o maior declínio cumulativo do ciclo económico do emprego e produto desde a Segunda Guerra Mundial”, bem como numa crise de balança de pagamentos em economias emergentes, nomeadamente na crise da América Latina. Mas essa política monetária é hoje considerada como um sucesso. A taxa de inflação nos EUA caiu para 4% em 1983. E, em 1987, o índice bolsista Dow Jones caiu 22% numa segunda feira “negra” de Outubro. O FED tinha vindo a adoptar uma política monetária mais restritiva em 1987, aumentando a taxa de juro de referência. Mas, no dia a seguir ao crash, o FED anuncia que está disposto a ceder liquidez para suportar os mercados financeiros e reduz a taxa de juro de referência. Esse crash bolsista não causa crise económica: a economia americana cresce mais de 4% em 1988. E poderíamos ainda considerar o papel da política monetária dos EUA no despoletar de outras crises como a crise do sudeste asiático de 1997. O dólar é moeda de reserva internacional e, por isso, a política monetária dos EUA tem impacto na estabilidade financeira e em crises económicas noutros países, particularmente, quando os desequilíbrios económicos e externos desses países são acentuados. Não será por acaso que ocorrem, em 2018, estas oscilações no mercado bolsista dos EUA e crises de balança de pagamentos na Argentina, Brasil e Turquia. Note-se que, sobretudo desde o final de 2017, o FED tem vindo a aumentar a taxa de juro de referência bem como a retirar liquidez do sistema financeiro. Existe, por isso, o receio de que esta “normalização” da política monetária dos EUA possa causar uma nova crise financeira. A perspectiva dominante da actualidade é que estaremos na iminência de uma nova crise financeira internacional. Mas talvez não seja para tão breve. É certo que vivemos, nos últimos anos, uma bolha especulativa que, segundo alguns parâmetros – o rácio e a rapidez da subida do preço de alguns activos financeiros como a bitcoin, o preço dos activos sobre lucros observados, ou ainda o rácio de endividamento face a resultados antes de impostos – atingirá níveis historicamente elevados. Por outro lado, a inovação nos mercados financeiros significa que existem tecnologias e novos instrumentos financeiros que não foram testados em tempos adversos. Por conseguinte, uma eventual crise financeira poderá ter contornos distintos das anteriores. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Contudo, a economia real só agora verdadeiramente começa a sair da crise financeira internacional de 2007-2009, particularmente nos países do sul da Zona Euro, e a política monetária a nível global continua a ser muito acomodatícia. A política orçamental dos EUA também continua a ser expansionista. Acresce ainda que os mercados financeiros estão sob um colete-de-forças muito mais forte do que no passado, com a presença directa e indirecta de Bancos Centrais, de Fundos de Riqueza Soberana, de plutocratas à escala global e de grande bancos e intermediários financeiros que na realidade manipulam e controlam o preço de todos os activos financeiros. Portanto, arrisco “prognosticar” que desta vez será (algo) diferente…
REFERÊNCIAS:
Entidades EUA
Nova edição de Akira, a icónica BD de Katsuhiro Otomo, sai em Portugal
Banda desenhada de Katsuhiro Otomo é reeditada esta semana pela mão da JBC Portugal. (...)

Nova edição de Akira, a icónica BD de Katsuhiro Otomo, sai em Portugal
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.295
DATA: 2018-12-12 | Jornal Público
SUMÁRIO: Banda desenhada de Katsuhiro Otomo é reeditada esta semana pela mão da JBC Portugal.
TEXTO: A banda desenhada japonesa futurista Akira, de Katsuhiro Otomo, é reeditada esta semana em Portugal, numa edição restaurada e revista pelo autor, 36 anos depois da primeira publicação, revelou a editora JBC Portugal. Akira, publicado pela primeira vez em 1982 e editado em Portugal nos anos 1990, é uma das mais conhecidas obras de BD de ficção científica do Japão, com a acção centrada numa cidade — Neo Tokyo — devastada pelos efeitos de uma terceira guerra mundial. Segundo a JBC Portugal, a nova edição de Akira foi também desenvolvida por Katsuhiro Otomo, com os materiais originais a serem restaurados e digitalizados. Cada um dos seis volumes desta reedição terá em média 350 páginas a preto e branco, com a leitura a proceder-se da direita para a esquerda, de forma a aproximar a edição portuguesa do original japonês. "Tudo isso foi feito para aproximar ao máximo a experiência de leitura japonesa: o manga português, com excepção da língua, é exactamente igual ao publicado no Japão", referiu o editor Júlio Moreno. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Katsuhiro Otomo, 64 anos, é considerado uma das referências da manga, e Akira ajudou a popularizar a BD japonesa no Ocidente. Otomo, que também fez o filme Akira, é autor de outras obras como Gun Report (1973), Fireball (1979), Domu (1980) e Mother Sarah (1990-2004), ilustrado por Takumi Nagayasu. Em 2015, foi o primeiro autor asiático a vencer o Grande Prémio do Festival de BD de Angoulême, em França. A editora JBC Portugal começou a publicar manga em Portugal no Verão passado, iniciando o catálogo com The Ghost in the Shell, de Shirow Masamune. Editou também Ataque dos Titãs, de Hajyme Isayama, e O Cão que Guarda as Estrelas, de Takashi Murakami. O primeiro volume de Akira será apresentado no sábado, 15 de Dezembro, pelo editor Júlio Moreno, na livraria Kingpin, em Lisboa.
REFERÊNCIAS:
Com mais dois graus, que Terra nos espera em 2100?
Mais seca, chuva mais concentrada. Menos gelo, o nível médio do mar mais alto. Em 2100 haverá mais pessoas deslocadas e as espécies exóticas poderão colonizar novas regiões. Há muitas perguntas sobre o futuro das alterações climáticas, em discussão em Paris. Mas os seus efeitos já se sentem hoje. (...)

Com mais dois graus, que Terra nos espera em 2100?
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.5
DATA: 2018-12-19 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20181219190957/https://www.publico.pt/n1716166
SUMÁRIO: Mais seca, chuva mais concentrada. Menos gelo, o nível médio do mar mais alto. Em 2100 haverá mais pessoas deslocadas e as espécies exóticas poderão colonizar novas regiões. Há muitas perguntas sobre o futuro das alterações climáticas, em discussão em Paris. Mas os seus efeitos já se sentem hoje.
TEXTO: Se o fim do século vai ser mais quente por causa das alterações climáticas, então 2015 está a marcar o tom do futuro. A temperatura média à superfície da Terra arrisca-se a atingir um grau Celsius acima da média pré-industrial, divulgou a Organização Meteorológica Mundial em Novembro. Se isso acontecer, este ano bate-se o recorde de temperaturas, e de uma forma simbólica. Um grau é metade do limite de dois graus que a Terra pode aquecer até 2100, definido por cientistas do clima e por políticos. A partir deste valor, os cenários climáticos prevêem um futuro mais assustador. Isto não quer dizer que 2016 ou 2017 irão ser tão quentes como 2015. Há uma variabilidade natural de ano para ano. Mas o potencial recorde de temperaturas faz parte de uma tendência ligada às emissões humanas de gases com efeito de estufa, como o dióxido de carbono (CO2), o metano e o dióxido de azoto. Como é que estes gases influenciam o termómetro global? A resposta começa nos raios solares que aquecem a superfície da Terra. Parte deste calor volta para a atmosfera em raios infravermelhos. Os gases com efeito de estufa retêm este calor e aquecem o ar. Quanto maior for a sua concentração, mais calor é retido. O CO2, por ser injectado em grandes quantidades com a queima dos combustíveis fósseis, acaba por ser o gás mais importante nesta equação. Desde a revolução industrial, a sua concentração na atmosfera passou de 280 partes por milhão (ppm) para 400 ppm. E a temperatura tem subido. Um dos efeitos mais significativos é no ciclo da água. Com mais calor, a evaporação dos oceanos torna-se mais rápida, a acumulação na atmosfera é maior e a precipitação mais concentrada. No Norte da Europa, espera-se por isso mais chuva até ao final do século, mas o Mediterrâneo vai tornar-se mais quente e seco. As secas vividas na Península Ibérica em 2005 e 2012 já só podem ser explicados neste contexto. “Só conseguimos obter nos modelos climáticos esta frequência de grandes secas quando inserimos os gases com efeito de estufa”, diz ao PÚBLICO o investigador Ricardo Trigo, climatologista do Instituto Dom Luiz, da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL). “Se só pusermos a variabilidade natural, não conseguimos reproduzir esta frequência. ”Por volta de 2100, se tivermos em conta apenas um aumento de dois graus Celsius, um ano típico em Portugal terá a chuva mais concentrada no Inverno e uma Primavera e um Outono mais secos. Este padrão é uma incubadora de ondas de calor mais fortes. “É uma situação atmosférica favorável para que ondas de calor que antes duravam uma semana, com uma temperatura de 37 graus, passem a durar duas semanas e atinjam os 40 graus”, avisa Ricardo Trigo. Se a chuva acabar mais cedo na Primavera, em Maio e Junho os solos já estão completamente secos. Quando chega uma onda de calor, “a energia solar não é usada para evaporar a humidade do solo, por isso o solo aquece e começa a aquecer a atmosfera”. Décadas decisivasO Mediterrâneo é uma pequena peça no complexo puzzle das alterações climáticas, que têm implicações no aquecimento e acidificação dos oceanos, no degelo dos pólos, na subida do nível médio do mar, no derretimento do permafrost, na alteração da vegetação, na migração e extinção de espécies e no agravamento das condições de vida de muitas populações humanas. Todos estes fenómenos serão mais ou menos graves dependendo da evolução das emissões de gases. Em 1996, com base na informação divulgada pelo Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC, sigla em inglês), das Nações Unidas, o conselho de ministros do Ambiente da União Europeia pôs os dois graus na agenda política. “O conselho acredita que a temperatura média global não deve exceder os dois graus acima do nível pré-industrial”, lê-se nas conclusões daquela reunião. “As concentrações de todos os gases com efeito de estufa devem ser estabilizadas”, acrescenta-se. “Os dois graus Celsius talvez permitissem evitar os pontos de não retorno. Acima deste patamar, a irreversibilidade [de vários fenómenos] torna-se mais plausível”, explica Tiago Capela Lourenço, investigador da FCUL. Alguns exemplos de pontos de não retorno são a perturbação das monções, o derretimento dos glaciares e à morte da floresta amazónica. Mas pouco ou nada aconteceu para inverter a situação. Em 2000, o mundo tinha lançado 24. 720 milhões de toneladas de CO2 para o ar. Em 2013 o número passou para 35. 670 milhões. No quinto relatório do IPCC, de 2013 e 2014, estimou-se que, no máximo, só se podia lançar mais um bilião de toneladas de CO2, face às emissões acumuladas até 2011, antes de se ultrapassarem os dois graus em 2100. Esta quantidade é equivalente a emitir 33. 333 milhões de toneladas por ano em 30 anos, menos do que o valor de 2013. Por isso, as próximas décadas serão decisivas. Na conferência do clima de Paris, que decorre desde 30 de Novembro, os países vão apresentar os seus compromissos de redução das emissões de gases com efeito de estufa. A Climate Interactive, uma organização sem fins lucrativos de Washington (EUA), compilou os valores das reduções a que os países já se comprometeram. A partir dessa informação, estimou que o CO2 atingirá as 675 ppm na atmosfera em 2100 e a temperatura aumentará 3, 5 graus. Sem esses compromissos, o cenário é pior – o CO2 subirá até às 910 ppm e a temperatura 4, 5 graus. Ainda assim, o horizonte dos dois graus será ultrapassado se não for feito mais. Risco na AntárctidaAlém desta incerteza sobre o futuro, mesmo tendo em conta o limite de dois graus, há impactos que poderão não ter regresso. “Nas regiões polares, muito provavelmente já se passaram pontos de não retorno”, diz Ricardo Trigo. Uma dessas situações é na Antárctida. Alguns trabalhos recentes mostram que as águas marinhas junto à Antárctida Ocidental – com cerca de um décimo do gelo de todo o continente – estão a aquecer e a “comer” a parte de baixo dos glaciares da região. Segundo alguns modelos, a água irá acabar por penetrar debaixo daquela enorme massa de gelo, derretendo-a nos próximos séculos a milénios, e fazendo subir o mar em três metros. Mas há dados mais concretos para outros fenómenos. No melhor dos cenários do último relatório do IPCC, em que é provável que a temperatura não ultrapasse os dois graus em 2100, os glaciares dos continentes vão derreter entre 15 e 55%, e o nível médio do mar subirá entre 26 e 55 centímetros. Esta subida pode pôr em causa a existência de atóis dos oceanos Índico e Pacífico, como as ilhas de Tuvalu, um país no Pacífico. Tiago Capela Lourenço acrescenta que esta subida é especialmente perigosa durante as tempestades, quando “há uma diminuição da pressão atmosférica que faz uma sobreelevação do nível médio do mar”, aumentando ainda mais o alcance das cheias. Um relatório de 2012 do Banco Asiático de Desenvolvimento prevê que em 2050 haverá 37, 2 milhões de pessoas em risco na Índia por causa do aumento do nível médio do mar, 27 milhões no Bangladesh e 22, 3 milhões na China. Em Portugal, o litoral irá mudar. “A linha costeira portuguesa como a conhecemos não será igual em 2100. Talvez as arribas no Sudoeste alentejano se mantenham”, prevê Tiago Capelo Lourenço. As praias do Algarve, da Costa da Caparica ou de Aveiro estão, por isso, em perigo. Outra dúvida é o efeito do aquecimento no permafrost – o solo e subsolo gelados, que existem principalmente no Norte da Rússia e do Canadá. Esta região congelada pode atingir profundidades de centenas de metros. O IPCC estima que, no melhor dos cenários, 37% da área do “permafrost” irá derreter até uma profundidade de 3, 5 metros. Este derretimento torna o solo instável e terá efeitos nas alterações climáticas. Quando este solo descongelar, a matéria orgânica congelada há milénios irá degradar-se, libertando CO2 e metano, e acelerando as alterações climáticas. “O ‘permafrost’ é das coisas que assustam mais os climatologistas”, confessa Ricardo Trigo. “Há uma componente natural que pode disparar e está fora do nosso controlo. ”Resposta ao calorAo mesmo tempo, os ecossistemas do planeta vão estar sob um stress acrescido com o aumento de temperatura e as alterações do padrão de chuva nos continentes, e com o aquecimento e a acidificação nos oceanos – parte do CO2 a mais na atmosfera é absorvido pelos oceanos, tornando-os mais ácidos. “Projecta-se o decréscimo da produção primária em oceano aberto”, lê-se no relatório do IPCC, diminuindo os stocks de pesca em 2100. Em terra, a sobrevivência dos animais dependerá de vários factores. No caso de um aumento de temperatura, “se a espécie viver numa planície, isso exige uma migração de centenas de quilómetros”, explica Henrique Miguel Pereira, especialista em conservação da biodiversidade da Universidade de Halle-Wittenberg, na Alemanha. “Numa zona de serra, pode ser que tenha só de se deslocar um pouco para o lado”, considera o biólogo. Mas há situações sem solução. “As comunidades adaptadas aos topos de montanha não têm para onde ir. ”Os cientistas têm estudado a resposta fisiológica de grupos de animais, como os répteis. Um trabalho publicado em 2010 na revista Science analisou a sobrevivência de 28 espécies de lagartos mexicanos em 200 locais diferentes do México desde 1975. Segundo o trabalho, 12% das populações locais extinguiram-se até 2009. E 39% das populações dos répteis em todo o mundo deverão extinguir-se até 2080. “Os répteis estão especialmente activos no início e no final do dia. Durante metade do dia ficam no abrigo”, explica Henrique Miguel Pereira. Com as alterações climáticas e com o aquecimento global, os répteis têm menos tempo para estarem activos, segundo o artigo da Science. Um estudo mais recente, na revista Ecology Letters, indica, antes, que a mortalidade pode ser explicada por haver menos sombra natural, fornecido pelas plantas. No caso das árvores, o aumento da concentração de CO2 pode ser bom para a fotossíntese, mas a seca e o calor serão factores de stress. “No Alentejo, o aumento de CO2 é provavelmente compensado muito negativamente com a diminuição da água”, diz Henrique Miguel Pereira. Espécies emblemáticas como o sobreiro e a azinheira, e paisagens como o montado, estão em risco no Sul de Portugal e poderão migrar para norte. No entanto, “o processo de expansão é mais lento do que o da degradação”. Pobres com menos escolhasO homem terá também de responder às novas pressões e o mesmo fenómeno pode ter implicações diferentes consoante os países, como o desaparecimento dos glaciares. “A região dos Himalaias é muito susceptível. Há muitas regiões dependentes do abastecimento de água vindo dos glaciares”, diz Tiago Capela Lourenço. Mas nos Alpes, o problema é a “instabilidade das vertentes” que pode afectar as ferrovias. Os impactos também vão depender de factores económicos. “As populações mais desfavorecidas terão sempre mais problemas. Porque para a adaptação às alterações climáticas é necessário ter recursos. Sem recursos não há escolhas. Isso é verdade entre países e dentro de países”, sustenta o investigador. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Um exemplo desta situação é a fome de 2010 no Sudão, causada pela seca. Menos óbvia é a ligação entre as alterações climáticas e a guerra na Síria. Um artigo de 2010 do jornal New York Times – publicado meses antes da Primavera Árabe – dava conta da situação dos agricultores sírios, após quatro anos de seca profunda, com centenas de milhares de pessoas a fugir para as cidades. Um ano depois, um estudo de cientistas da Administração Nacional do Oceano e da Atmosfera (NOAA) dos EUA indicava que o aumento de calor e secas nas últimas décadas no Mediterrâneo já era explicado pelas alterações climáticas. Em 2015, outro artigo publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences fez a triangulação dos factos, defendendo que a duração da seca na Síria era provocada pelas alterações climáticas no Mediterrâneo, e que ajudou a fomentar o descontentamento civil nas cidades contra o regime ditatorial de Bashar al-Assad, com repercussões que continuamos a viver hoje. Nas próximas décadas, as alterações climáticas serão um factor cada vez mais importante a ter em conta. E Ricardo Trigo lembra ainda que vamos continuar a sentir os seus efeitos nos próximos séculos: “Os dois graus é um valor artificial e 2100 é completamente artificial. ”
REFERÊNCIAS:
Partidos PPM
O chef recolector à procura de si próprio
Leonardo Pereira gosta de andar pelos campos e levar esses passeios para o prato. A culpa não foi só do Noma, onde trabalhou vários anos. Sempre foi assim. Essa é a verdade da sua cozinha, integrando as imperfeições que surgirem pelo caminho. O mundo das estrelas Michelin não lhe interessa nada. (...)

O chef recolector à procura de si próprio
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-06-21 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20180621174349/https://www.publico.pt/1750552
SUMÁRIO: Leonardo Pereira gosta de andar pelos campos e levar esses passeios para o prato. A culpa não foi só do Noma, onde trabalhou vários anos. Sempre foi assim. Essa é a verdade da sua cozinha, integrando as imperfeições que surgirem pelo caminho. O mundo das estrelas Michelin não lhe interessa nada.
TEXTO: Não há como evitar falar do Noma quando se fala de Leonardo Pereira. Esteve no restaurante de René Redzepi de corpo e alma entre o início de 2010 e finais de 2014. Foi um período vibrante também para o Noma, que durante esses anos (e apenas com a excepção de 2013) foi considerado pela revista Restaurant o melhor restaurante do mundo, reconhecido pela sua reinterpretação ousada da cozinha nórdica (incluindo levar formigas para a mesa dos seus clientes). Leonardo Pereira começou a trabalhar num restaurante italiano numa aldeia piscatória onde viveu em criança. Depois seguiu para Aveiro e esteve na Irlanda. Foi aí que deu o salto para uma cozinha mais complexa. Estagiou com Redzepi, depois no El Poblet, de Quique Dacosta, e no Mugaritz, de Andoni Aduriz. Voltou ao Noma porque era lá que se sentia no seu ambiente natural. Chegou a sous-chef. Não admira que quando Leonardo Pereira regressou a Portugal, para trabalhar no restaurante do Hotel Areias do Seixo (em Santa Cruz, onde esteve um ano), tivesse mil olhos postos nele. Trazia de Copenhaga o mesmo impulso recolector, e era vê-lo andar pelas dunas à procura de plantas silvestres que pudesse colocar no prato. Agora, aos 31 anos, está sempre a pôr as facas na mala e a partir para algum lugar, para cozinhar em festivais, congressos, eventos espalhados pelo mundo. Durante o mês de Agosto parou: filmou 44 episódios do novo programa televisivo Chef de Raiz. Enquanto não abre o seu próprio restaurante — “provavelmente no Porto” —, é no canal por cabo 24 Kitchen que o poderemos ver todas as segundas-feiras, às 21h, ensinando-nos a cozinhar de forma saudável e sem grandes complicações. Entre uma coisa e outra, tem a quinta onde cresceu em Santa Maria da Feira e onde agora vive e cultiva mais de 40 tipos diferentes de tomate. Às vezes compra sementes pela Internet, de variedades antigas, capazes de surpreender o palato mais exigente. No seu mundo ideal, seria daqui que sairiam todos os produtos do seu futuro restaurante. Conversámos no Príncipe Real, em Lisboa. A relação com a terra vem da infância?Por acaso é engraçado: eu não tinha uma grande afinidade com a terra, porque era um trabalho duro e por vezes tinha de ajudar os meus pais no campo, e não era algo que gostasse de fazer. Isso em Santa Maria da Feira?Sim, nos arredores. Eu odiava ter terra nas mãos. Também não gostava de ter areia nas mãos. E até gostava mais de estar na cozinha. Com que idade começou a cozinhar?Acho que comecei a cozinhar para mim relativamente jovem, 11, 12 anos. O que fazia? Omeletes?Sim, ovos e arroz, esse tipo de coisas. Comecei desde muito cedo a fazer grelhados no carvão, peixe. Houve uma altura da minha infância que vivi numa vila piscatória perto de Ovar, no Furadouro. Fiz lá a minha terceira e quarta classe. Naquela altura ainda havia a grande tradição de ir ao mar, aqueles barcos antigos empurrados por bois. A minha infância foi entre o campo e o mar, o que também foi giro, porque, apesar de Portugal ser um país pequeno, normalmente estás muito circunscrito àquilo que se passa à tua volta e deixas que sejam essas coisas, essas pessoas, a realidade dos cinco quilómetros à tua volta, que te definam enquanto pessoa. Ter passado por estas experiências enquanto criança abriu-me os horizontes. Adorei porque ia para a escola com os filhos dos pescadores, ia jantar a casa deles, brincávamos nas dunas, comíamos camarinhas [uma baga branca], íamos à procura de cogumelos na mata. Quando os barcos vinham da pesc, a estávamos todos ali à espera de que desembarcassem, que trouxessem a rede cheia de peixe. Brincávamos com anémonas e alforrecas. Fazíamos muitos grelhados. Peixe grelhado no carvão ainda é das minhas coisas preferidas, pela simplicidade e porque é um verdadeiro luxo. Essas lembranças, de sentir os aromas quando se está a caminhar e estão pessoas a grelhar no meio da rua, ou a assar castanhas, ficaram muito vincadas. E no fundo são estimulantes. Quando é que a cozinha se tornou uma evidência?A comida sempre foi importante na minha vida. A cozinha nunca foi uma coisa linear como “Agora quero ser cozinheiro”. Foi uma obra do acaso. Primeiro escolhi a área errada no liceu: desporto. Na altura gostava muito de natação e andava obcecado com a ideia, queria ser nadador olímpico, o que não aconteceu. Acabei por desistir passado um ano. Não tinha muitas opções e acabei por encontrar um folheto sobre a Escola de Hotelaria de Santa Maria da Feira. Ia começar o curso em três semanas e estava na data-limite. Acabei por ser aceite. Era em cozinha que pensava?Sim e não só. A minha família tem ligação a hotéis, mas noutras áreas: dos quartos, conciérge, essas coisas. Na cozinha não havia ninguém, mas a comida sempre foi uma coisa transversal à minha infância e à minha adolescência. Quais são os pratos que lhe lembram a infância?O meu prato favorito desde sempre é o arroz de cabidela. Obviamente, tínhamos os nossos próprios animais em casa, matávamos os animais e fazíamos o arroz. Chanfana de cabrito, também típica daquela zona, era uma coisa de que eu gostava muito, ainda gosto. Naturalmente que era uma dieta muito focada na carne. No Norte do país encontra-se muito esse foco na carne. Havia a ideia de que o peixe não puxa carroça. Isto apesar de estarmos a 20 ou 30 quilómetros da costa. Também passei uma fase da minha vida em Paris, imediatamente antes de ir para o Furadouro, com uns cinco, seis anos. Regressei várias vezes porque tinha a família lá a trabalhar. Para um miúdo que primeiro estava numa vilazeca no meio do nada em Portugal, com aquela idade, ir para uma cidade enorme como Paris, dinâmica e vibrante. . . Adorei, claro. E a comida foi sempre o meu ponto de equilíbrio e a minha forma de ficar a conhecer a cidade. Andava pelas ruas e sentia cheiros e aromas. “O que é que eles estão a comer, o que estão a cozinhar?” Isso despertava-me interesse, mas não era uma coisa premeditada, de eu a tentar encontrar algo que me fascinasse. Não. Era puro fascínio que tomava conta de mim. Já agora, nesse tempo, o meu livro de rabiscos era o Cozinha Tradicional Portuguesa, da Maria de Lurdes Modesto. Desenhava, rabiscava, mas também gostava de o ler, de “molhar o apetite” e imaginar que estava a comer uma daquelas coisas. Como estava na quinta e talvez fosse um pouco monótono, pegar no livro era uma forma de me entreter. O que quer passar com a sua cozinha?Há várias vertentes. Não me cinjo particularmente a uma única forma de cozinhar. Acho que situações diferentes provocam formas diferentes de cozinhar e de sentir o que está à nossa volta. Tenho 16 anos de trabalho em cozinhas, mas só há dois anos é que comecei a explorar a minha própria identidade. Ainda estou a cavalgar essa onda, que primeiro me deixou curioso e quase em êxtase, para encontrar a minha própria forma de cozinhar. O que me leva a ser um pouco egoísta. Egoísta como?Porque cozinho aquilo que quero e que gosto de comer. Não é o que ambicionam todos os chefs?Sim, podes seguir esse caminho até ao resto da tua vida, mas não tens de te limitar apenas a isso. E o que quer e gosta de comer?Cada local ou cada situação provoca sentimentos diferentes e vontades diferentes. Se eu estiver em Portugal, a minha vontade maior é comer peixe grelhado ou arroz de cabidela, mas se estiver na minha quinta nem sequer é nada disso: é ir apanhar um tomate, cortá-lo e comer sobre o pão. Essa passa a ser a minha forma de comer favorita. Podes ser multifacetado na forma de te aproximar da comida. Eu tendo a transpor isso para a minha forma de cozinhar profissionalmente. Apesar de neste momento me focar essencialmente naquilo que gosto de fazer e explorar isso até ao máximo, sinto já uma certa vontade para sair desse registo egocêntrico. É óptimo porque estás a explorar várias vertentes da tua forma de cozinhar e podes até explorar o território português — e sinto que ainda posso fazer muito mais nesse aspecto —, mas também há outras vertentes: cultural, talvez tradicional, que certamente virá numa fase mais adiantada da minha vida. E não será para tirar completamente o tradicional do contexto, do rústico de onde ele veio, e metê-lo num sítio todo bonito e branquinho e moderno, porque acho que isso é completamente descabido. Terá de ser uma coisa ponderada e muito bem feita. E como se faz isso?Não sei. Quando chegar o tempo, logo veremos. Se pudesse, tinha um restaurante como. . . Num livro do José Quitério, ele descrevia restaurantes na zona de Colares [Sintra] que durante os anos 60 tinham aqueles balcões antigos, móveis lindísimos de madeira, enormes, mas o chão não existia, era palha, ou bocados de madeira. Se eu pudesse ter um restaurante assim, ficava contentíssimo da vida. Repare: não cresci a comer numa hamburgueria moderna, ou em restaurantes Michelin, ou em hotéis. Cresci a comer em restaurantes em que se via o piso de baixo através das frinchas de madeira do chão, e onde havia um sentimento de família e de pertencer a um determinado local muito forte — o que tem que ver com o facto de serem vilas pequenas, locais onde toda a gente se conhece. Essa é uma coisa que não se pode apagar da memória, e quer se queira quer não, acaba por nos moldar. Também já trabalhei vários anos em restaurantes hipermodernos onde se vai buscar a tradição clássica. O que significa para si esse restaurante de chão de palha?Primeiro, é extremamente reconfortante, apesar de eu saber que é muito difícil reproduzir um cenário desses, pelo menos de uma forma legal. É nostálgico. Se calhar seria [um artifício]: é giro, mas fica-se por aí. O que estou a tentar dizer é que independentemente do país onde vives é importante encontrar uma autenticidade que não depende só de modas ou daquilo que achas que é bonito. É importante encontrares algo que vá mais além, mesmo que seja incompreendido, mesmo que as pessoas não recebam de uma forma favorável. Depois de encontrares isso, se não tiveres sucesso, então tens de reconsiderar, mas pelo menos já deste um passo na direcção certa. Lá está: a profissão de cozinheiro, apesar de estar muito em voga, está sempre a ser escrutinada. Toda a gente tem uma opinião sobre aquilo que gosta de comer. No meio disto tudo tens de conseguir fascinar ou, no outro lado do espectro, de trazer a sensação de que as pessoas estão a comer em casa da avó. O que prefere: fascinar ou a sensação de que se está em casa da avó?Sem dúvida fascinar. E o que é mais difícil?A avó, porque a avó cozinha melhor do que eu. Cozinha a mesma coisa há 40 anos, como é que eu sou capaz de algum dia conseguir ultrapassar isso? É muito difícil. Há coisas que para mim são quase. . . sagradas (uso o termo de uma forma um bocado leviana), mas que são elementos a que toda a gente tem uma ligação muito forte, pelo menos em Portugal. Para mim, usar esses elementos, sobretudo no que tenho feito até agora, que é uma coisa mais disruptiva, mais fora da caixa. . . Fico sempre. . . Como é que posso fazer melhor do que um bacalhau à Gomes de Sá ou um bacalhau à Brás? Aquela tendência que há desde há uns anos, “vou pegar nisto e vou desconstruir”, esquece. Para mim, é o primeiro passo para falhar. O que se deve fazer com o bacalhau?Bacalhau à Gomes de Sá. Contentíssimo da vida. Isto para mim é ainda um obstáculo que não consegui ultrapassar. Já fiz esforços internos e usei muitas pessoas como cobaias, mas não consigo dizer “descodifiquei o bacalhau, consigo fazer melhor do que a tradição”. Não, ainda não consegui fazer isso e não sei se é possível. Cozinhar tem de ser uma coisa bastante orgânica. Não justifica fazer o melhor bacalhau do mundo se por detrás disso tiveres 40 pessoas a trabalhar exclusivamente para aquele prato, ou estiveres a trabalhar na cozinha durante 20 e tal horas por dia, ou usares processos e geringonças. Será que vale a pena? Vale para um determinado carácter, a mim não me fascina. Se não puder fazer isso com os elementos da cozinha, qual é o sentido? Estou a fazer comida que é impossível? Comida que gasta mais em termos de recursos, energia, disponibilidade humana, do que consegue trazer para a mesa em termos de felicidade, de satisfação, de número de pessoas que se consegue atingir? São coisas com que me debato. De certa forma, tenho vindo a afastar-me lentamente daquilo que é o fine dining, a alta-cozinha. Há facetas da alta-cozinha que para mim são intoleráveis. Há um excesso de recursos?Sem dúvida. Portugal é um país com boa qualidade de produtos?Sim. Mas se me dissesses: “Agora só vais cozinhar com aquilo que fores capaz de encontrar no mercado, só produzido em Portugal”, não, não consegues. Consegues, mas não me chega. Se pensarmos no clima: mais de 90% dos dias do ano com temperaturas superiores a 15 graus, para um agricultor, é uma maravilha. E eu tenho uma quinta e fazemos as nossas provas em relação a isso. A quantidade de coisas que consegues cultivar num clima como este é incrível. Temos pouca variedade?Temos. Fomos o povo que levou os piripíris da América do Sul para a Ásia e que de regresso trouxe não sei quantas plantas para África e América do Sul. Se somos responsáveis por esta dinâmica, por esta troca de alimentos entre continentes tão distantes uns dos outros, porque é que não fomos capazes de recriar isso no nosso próprio país? As condições existem. Não devemos ser puristas e pensar “isto não é autóctone”?Para mim, não. Não, não. Comes feijoada? Isso é uma coisa portuguesa, tradicional, não é? Mas o feijão não é português, foi trazido para Portugal da América do Sul e nem sequer foram os portugueses a trazê-lo. Os holandeses tiveram muita responsabilidade nisso, e os espanhóis. O bacalhau, voltamos a ele: se há algum sítio no mundo onde é considerado realmente tradicional em todo o seu direito é em Portugal. E veio da Islândia e da Noruega, foram os bascos e os franceses a irem primeiro buscá-lo para alimentar os pobres, porque era uma coisa de longa conservação. Os portugueses acabaram por seguir o caminho. Ser purista — vou só cozinhar com as coisas que tenho à minha volta e fechar-me ao resto do mundo — não. É o mesmo que negar a minha nacionalidade. Ainda vai à procura de bagas, cogumelos?Gosto de fazer isso como passatempo. Tanto isso como estar no campo a cultivar. Funciona quase como terapia. A vida de um cozinheiro é extremamente stressante, e a maior parte do tempo está-se confinado a um pequeno cubículo, como se fosse uma panela de pressão. Depois cada um encontra o seu próprio equilíbrio. Que coisas gosta de apanhar?Depende de onde estou. No ano passado estava na costa, em Santa Cruz [no Hotel Areias do Seixo], e gostava de apanhar ervas costeiras. Existem muitas ervas costeiras comestíveis e deliciosas. Isso foi uma descoberta. Se estiver em Santa Maria da Feira: nas imediações do castelo posso apanhar cogumelos, flor de sabugueiro, violetas, muitas outras coisas. Uma vez estava à procura de uma coisa e fui à serra de Montesinho. Quando olhei para o chão, encontrei uma espécie de tomilho: “Olha que giro!” Era um tomilho mais fino, a folha era mais delgada, mais linhosa, e tinha um cheiro pungente, balsâmico, canforado. Nunca tinha encontrado um tomilho com aquele aroma. Fartei-me de pesquisar, nada, nada. Encontrei finalmente um documento numa universidade do México que falava de tomilho-canforado. Como é que é possível? Aparentemente, é uma coisa extremamente rara no mundo, e estava lá. Há uma erva que cresce em todo o lado cá, que já encontrei em São Tomé e Príncipe, onde lhe chamam mastruço, e é das ervas mais importantes da culinária mexicana. Chama-se epazote. Aqui, às vezes, caminhamos por cima dela. Tem um cheiro intenso, quase químico, mas ao mesmo tempo interessante e versátil. É uma erva selvagem mesmo no México. Podemos aprender como outras culturas exploraram os alimentos à sua volta, e como podemos incorporar essas coisas à nossa forma. Uso essa diversidade do território como uma base para trabalhar. Ali em Monsanto encontramos uma coisa que se chama salsaparrilha, que veio das Caraíbas há centenas de anos. É uma trepadeira, não é tão infestante quanto isso porque não está muito disseminada, mas tem um sabor a espargos. Está ali, a envolver os pinheiros, e ninguém quer saber. Cozinha-se muito levemente, a vapor, e passa-se no azeite. Tens abrunhos selvagens, com um sabor a amêndoa amarga incrível. Usámos as folhas cruas, em vinagre; as bagas, que frescas são extremamente adstringentes, secam a boca, mas se as deixarmos no próprio ramo a secar, quando começarem a cair as primeiras geadas perdem a adstringência e ficam extremamente doces, parece que se está a comer uma compota. E nem sequer tens de procurar muito, aquilo está em todo o lado. Podemos lá ir ver?Podemos. Interrompemos aqui a conversa para dar um salto ao parque de Monsanto. Afinal, fica só a dez minutos do centro da cidade. Assim que damos os primeiros passos, encontramos salsa-de-cavalo. “É uma planta que era muito consumida até ao século XIX, e foi suplantada pelo aipo. Tem um sabor ligeiramente diferente. É parecido com a angélica (que há muito no Norte da Europa). Chama-se salsa-de-cavalo porque os cavalos adoram comê-la. Encontra-se em todo o lado em Portugal. ” Precisa de frio e humidade para perder o amargo, diz Leonardo Pereira. Também já calhou encontrar por aqui camomila, salsaparrilha, borragem na Primavera. Segue com passos firmes, de quem sabe exactamente por onde seguir. “Vou mapeando as coisas na cabeça. ”Encontramos funcho silvestre — “É muito anisado, usamos em conserva, em vinagres, óleos aromatizados. ”Encontramos abrunheiros sem folhas nem bagas. “Estamos naquela fase intermédia entre o que aconteceu e o que vai acontecer. ” Continuamos a contornar árvores, a descer ladeiras, com azedas no caminho — “Comecei logo a usá-las quando vim para Portugal. ” Nem todos na cozinha partilhavam a sua memória de infância de ir chupar o caule das azedas a caminho da escola. Encontramos Aloe vera. Leonardo Pereira parte uma ponta. “Gosto muito desta parte gelatinosa, aromatizada. Larga muita goma. No ano passado fiz uma sobremesa com Aloe vera, bergamota [um citrino asiático] e erva-príncipe. Uma coisa que também encontramos muito é o chorão, que é invasivo. Na Austrália usam-no para cozinhar; também usámos. Ao longo da época, a polpa da flor vai tendo uma variedade enorme de sabores. ”Os portugueses não têm o hábito de olhar para a natureza como uma possível despensa, porque, “em Portugal, há sempre alguma coisa que nos é oferecida. No Norte da Europa são mais obrigados a transformar para ter o que comer no Inverno”. Nos seus passeios recolectores já calhou comer coisas tóxicas. “Fica-se um bocadinho doente. ” Há sinais: o sabor amargo normalmente diz-nos para ficar longe. “O amargo é a defesa da planta. ”Perguntamos-lhe se já tinha o hábito de fazer estas deambulações antes de ir trabalhar para o Noma. “Escolhi ir para o Noma pelo que representava, sabia que podia aprender mais sobre o que gostava de fazer. Na altura, nem sequer era o melhor restaurante do mundo. ”Voltamos a entrar no carro. Irrita-o que lhe perguntem sempre pelo Noma?Não me irrita. O Noma é fenomenal, antes de mais. Sem dúvida foi uma etapa muito importante na minha carreira, não só pelo tempo que passei lá mas pela aprendizagem. O que aprendeu?Mais do que a cozinhar, foi a pensar. Entender o que me define. Porque essa era a pergunta que fazíamos a nós próprios: o que nos define enquanto restaurante? Do que estamos à procura? Onde queremos ir a seguir? Era tudo muito abstracto, nada linear. Depois estamos a falar num restaurante que tinha um staff de 80 e tal pessoas, todos os dias servíamos 120, 130 pessoas, havia ali uma grande operação na gestão de recursos humanos, de stocks, essas coisas inerentes ao trabalho de um cozinheiro. Aí também foi uma aprendizagem enorme. Quando falamos de identidade, falamos de quê?Tem que ver também com aquilo que te preocupa. Não gosto de usar a palavra filosofia, mas é por aí. Por exemplo, esta busca de diversidade do país, do clima, de que tenho andado a falar, fazem parte do que considero a minha identidade gastronómica. Aquele tomilho-canforado faz parte da minha identidade gastronómica. O gosto, naturalmente, que é importante; é uma peça fulcral, mas não é a única que define um cozinheiro. Podes limitar-te ao gosto e desenvolver pratos que se cingem a isso: sabe bem, as pessoas vão adorar e funciona. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Mas desde que saí do Noma fiz algo que considero importante: não olhei para trás. Não queria ser mais um a copiar. Para isso tinha ficado em Copenhaga a trabalhar e tinha-me socorrido da ajuda do Noma. Fazíamos isso muitas vezes: se alguém que conhecíamos abria um restaurante, ajudávamos. Não era o que eu queria fazer. Precisava de limões, precisava de azeite. E precisava de descobrir algo novo. Foi isso que me trouxe de volta a Portugal. Temos de conseguir perpetuar esse sentimento de êxtase, de descoberta, pelo menos numa fase inicial da carreira: queres velejar e explorar o mundo que tens dentro de ti ou o mundo que tens à tua volta. Só fazia sentido tentar ser cozinheiro em nome próprio se conseguisse distanciar-me na totalidade (ainda não consegui) daquilo que tinha feito. Era preciso cortar o cordão umbilical?Sim, tive de o cortar. Os dois primeiros meses no Hotel Areias do Seixo foram uma batalha. Eu fazia coisas e sentia que havia ali o René [Redzepi, chef do Noma] a sussurrar-me ao ouvido. Ficava zangado comigo próprio. Não sentia que aquilo era eu, que reflectisse aquilo que sou ou o sítio onde estava. Só dois ou três meses depois é que comecei a fazer pratos que não tinham ponto de referência, apesar de muita gente os identificar como nórdicos — para mim, não tinham nada de nórdico. Obviamente que há formas de cozinhar, elementos, técnicas que se emprestam daqui e de acolá. Muito raramente consegues fazer uma coisa completamente nova. Mesmo que penses que é nova, há outra pessoa noutro lado que já a faz. Isso aconteceu-me várias vezes. Eu pensava: “Fiz uma coisa que nunca ninguém fez”, e passados três meses via alguém a pôr uma coisa no Instagram que era quase o mesmo [@leodspereira] . Há um prato que fiz no ano passado: limão grelhado com gelado de trigo-sarraceno e mel queimado. Estava a tentar fazer uma limonada, ou uma base, com limão e esqueci-me do limão no grelhador e ele ficou completamente queimado por fora. Seco. Quando o abrimos, tinha uma polpa totalmente caramelizada, ligeiramente fumada, com toques doces, amargos. “Uau, isto é bom!” Passados seis meses vejo uma tangerina, e não era trigo-sarraceno, era outra coisa qualquer, exactamente como eu tinha feito, com um prato com carvão, etc. Mas não obstante isso, é importante sentires algum orgulho no que conseguiste fazer, e fazer algo que as pessoas consigam apreciar: isso também é importante. É um jogo entre o desafiarmo-nos e conseguirmos dar às pessoas algo que elas consigam identificar.
REFERÊNCIAS:
Maya Gabeira, ligada a Portugal pelo mar da Nazaré
Depois de quase perder a vida em águas portugueses e de ser a mulher que surfou a maior onda de sempre, na Praia do Norte, a brasileira faz de Portugal a sua casa e alerta para o perigo da Nazaré perder a sua alma. (...)

Maya Gabeira, ligada a Portugal pelo mar da Nazaré
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: Depois de quase perder a vida em águas portugueses e de ser a mulher que surfou a maior onda de sempre, na Praia do Norte, a brasileira faz de Portugal a sua casa e alerta para o perigo da Nazaré perder a sua alma.
TEXTO: A maior parte dos surfistas de ondas gigantes esteve nos últimos dias no Havai, para a Triple Crown (um conjunto de três provas disputadas entre o fim de Novembro e o início de Dezembro), mas Maya Gabeira permanece na Nazaré durante o Inverno, quando pode aproveitar a companhia do mar, indiferente à água gelada. “Todo o surfista prefere surfar sem muitas pessoas ao lado. E eu sempre gostei de um estilo de vida mais pacato. A Nazaré se encaixa bem com o meu espírito”, revela. A brasileira prefere este cenário bucólico ao enxame de turistas e mostra preocupação com o destino da população residente da vila piscatória portuguesa, que pode ter o seu futuro ameaçado pelo aumento do preço das rendas no centro da localidade. Após uma volta de carro pela vila com a surfista, foi possível contar mais de uma dezena de anúncios de venda afixados nas janelas das habitações. “Eu espero que nunca percam [a sua vila], porque tem charme e muita cultura. A pesca é muito forte aqui e eu quero que os nazarenos sempre ocupem este espaço central na cidade e no seu estilo de vida”, confessa Maya. Aos 31 anos, a brasileira teve reconhecido pelo Guinness, em Outubro, o recorde de maior onda já surfada por uma mulher, de 20, 72 metros, em Janeiro, na Praia do Norte. Em 2013, ela sofreu um acidente grave quando tentava surfar uma onda gigante na Nazaré. Maya ficou inconsciente, fracturou o perónio, foi resgatada por uma equipa de apoio e transportada ao Hospital de Santo André, em Leiria. Os dois factos ligam para sempre a brasileira com a Nazaré. “Eu morei no Havai e em Los Angeles muitos anos, mas agora Portugal é a minha casa”, afirmou a surfista. Ela não gosta de confusão na “sua casa”. Depois de recolher um pedaço de papel do chão do Forte São Miguel Arcanjo e guardá-lo no bolso das calças de ganga até encontrar um recipiente de lixo, Maya caminha tranquilamente pelo monumento. Seria impossível para ela andar por ali na época alta sem ser abordada a todo o momento para selfies e autógrafos. A surfista conversa com todas as funcionárias do local, onde uma de suas pranchas está exposta na “Surfer Wall”, a galeria com os equipamentos, fotos e histórias de ícones do surf de ondas gigantes. O forte é o termómetro do aumento do turismo na Nazaré, que tem cerca de 15 mil habitantes. Este ano, o monumento bateu em Setembro o recorde de visitantes, com mais de 174 mil entradas. Apenas nos seis primeiros meses de 2018, foram 30 mil visitantes a mais do que no período homólogo. “Era uma cidade mais vazia e o turismo fica aquecido quase o ano todo por causa do surf. Mas não traz prejuízo à cidade. Não é algo, ainda, que atrapalhe meu estilo de vida no Inverno, ainda consigo estacionar meu carro em todo canto”, confessa a surfista. No Verão há mais turismo e Maya prefere passar a estação na Ericeira, onde comprou uma casa e vive com a cadela Naza. Quando está na Nazaré, arrenda um apartamento. Filha do jornalista e ex-deputado federal brasileiro Fernando Gabeira, Maya, a surfista confessa que o seu pai não partilha o mesmo amor pelo mar. “Ele visitou a Nazaré, deu uma olhada e disse: ‘Sim, muito bonito. E agora, vamos fazer o quê?’”, brincou Maya. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Ao caminhar na Praia do Norte ainda vestida com um fato vermelho de surf, um grupo de turistas asiáticos aparece surpreendentemente na areia vazia. Maya é simpática, sorri e diz ao grupo umas palavras em inglês, o mesmo idioma utilizado para cumprimentar um surfista estrangeiro que saía da água. “This morning was fun”, disse, para comentar a manhã de surf clássico. Maya surfa na Nazaré desde 2013 e irá, enfim, viver o Inverno inteiro na cidade pela primeira vez. Após a homologação do recorde pelo Guinness, a sua rotina de compromissos na cidade tem sido intensa. Antes, de Janeiro a Setembro, enfrentou um desafio quase tão grande quanto a onda de mais de 22 metros, ao passar meses tentando convencer o Guinness. “Surfar a onda foi muito mais difícil, porque foram anos de treino e obstáculos. Mas garantir que ela fosse homologada foi uma grande burocracia”, contou Maya, pentacampeã do Big Wave Awards. Para os próximos anos, Maya, que começou a surfar com 14 anos, evita fazer um planeamento detalhado. Quer apenas seguir em cima da prancha tentando aumentar a fasquia do recorde. Mas já sabe o que irá fazer quando chegar a hora da reforma. “Eu nunca sei muito do futuro, espero surfar por alguns anos em alta performance, em ondas gigantes. Mas depois quero muito velejar, conhecer o mundo desta forma, trabalhar com isso”, resume.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave filha cultura mulher
Gelado, azeite e biscoitos de algas
Já estão em teste os primeiros produtos alimentares com a microalga Clorella. (...)

Gelado, azeite e biscoitos de algas
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-06-22 | Jornal Público
SUMÁRIO: Já estão em teste os primeiros produtos alimentares com a microalga Clorella.
TEXTO: A geladaria Santini entusiasmou-se com a ideia de usar microalgas e criou um gelado de Chlorella, naquela que foi a primeira parceria para o desenvolvimento de produtos da Allmicroalgae a concretizar-se. No mercado, os produtos da empresa ligada à Secil aparecem com a marca Allma. E, para além do gelado, estão já a ser testados, “em fase de protótipo mas com grande potencial de comercialização”, azeite com Chlorella, com o Oliveira da Serra, da Sovena; bubble tea com a Frulact; e queijo fresco com a Queijaria Simões. “No caso do azeite, as algas dão um ténue aroma a mar que fica muito bem com saladas ou com peixe”, garante Sofia Hoffmann de Mendonça, responsável pelo desenvolvimento de negócio da empresa. Foram também testados uns crocantes de Chlorella que estão neste momento a ser “redesenhados”. Também o chef Vítor Sobral, da Tasca da Esquina, tem colaborado com a Allmicroalgae e começou a experimentar a Chlorella em vários pratos – alguns dos quais foram apresentados no final da cerimónia de inauguração da Unidade de Produção de Microalgas de Pataias, na terça-feira. Das duas espécies que a empresa utiliza, a mais indicada para consumo humano é a Chlorella vulgaris, que é, aliás, “o organismo vivo com maior concentração de clorofila”. É uma microalga com “mais de 50 % de proteína completa, o que significa que tem todos os aminoácidos essenciais e pode substituir a proteína de origem animal, o que a torna muito interessante para vegetarianos”, explica a responsável. Por enquanto, foi desenvolvida a Chlorella em pó (que já está a ser exportada), em comprimidos e em cápsulas (para ser tomada como suplemento alimentar) e ainda em extracto aquoso e oleoso. A outra espécie, a Nannochloropsis oceanica, “tem ómega-3, que o nosso organismo não sintetiza”. Mas, “por não ter ainda histórico de consumo humano significativo”, está a ser utilizada para rações para peixes de aquacultura, outra das áreas de negócio que a Allmicroalgae está a desenvolver. É um produto que já está a ser exportado para vários países europeus, sendo a Alemanha e a França os maiores mercados e também os mais exigentes. “Valorizam muito a qualidade e a frescura e preferem a produção europeia relativamente aos produtos asiáticos, que representam 90% do que encontramos na Europa nesta área”, refere Sofia Mendonça. A Allmicroalgae vê na alimentação de peixes um mercado com enorme potencial de crescimento porque, dizem os responsáveis da empresa, a tendência é para o aumento da utilização de ingredientes vegetais na aquacultura – e esta irá, inevitavelmente, crescer à medida que os stocks de peixe no mar se vão reduzindo. Quando as grandes indústrias poluidoras começaram a estudar alternativas para a fixação de CO2 e se interessaram pelas microalgas, a ideia era virem a produzir biocombustíveis a partir daquelas, explica Sofia Mendonça. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Mas há um obstáculo. “Para a produção de bio-óleos de microalgas, destinados a fazer biocombustíveis, é preciso ter volumes muito grandes, na ordem dos milhares de toneladas. ” Houve então, no caso da Secil, uma adaptação de estratégia. “Percebemos que, no início de uma actividade como esta, temos que trabalhar com volumes de produção mais pequenos e vamos ganhando escala até podermos chegar aos biocombustíveis. ”A investigação em laboratório tem também grande importância porque permitirá identificar as espécies de algas mais adequadas – para bio-óleos o ideal será usar microalgas mais ricas em lípidos. Para além dos biocombustíveis, há outras áreas interessantes como os bioplásticos e os bioquímicos. No final da apresentação que fez na inauguração da Unidade de Produção de Microalgas de Pataias, Sofia Mendonça usou um slide para mostrar o que, de acordo com a visão da empresa, pode ser o futuro. Na imagem vê-se uma casa, com um carro estacionado à porta, em que uma série de produtos – dos pneus do carro ao tapete, passando pelo champô, a manteiga e óleo de cozinha, a gasolina, a pintura das paredes ou o detergente – têm um componente comum: as microalgas.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave concentração consumo espécie animal