Os amigos do TC
As pressões de Bruxelas são inadmissíveis, as de Luanda são entre bons amigos. Há aqui qualquer coisa que não está a bater certo1. Os angolanos, por razões provavelmente internas, dão-se ao luxo de tratar o Estado português como lixo. Que não somos um Estado de direito, que somos um bando de corruptos, que não querem uma parceria estratégica connosco para que aprendamos que o respeito é muito bonito. Estão naturalmente a ver-se ao espelho. Mas não se pode dizer que a intimidação não dê os seus frutos. Do Governo ao Presidente, estão todos dispostos a vergar ainda mais a espinha para preservar o nosso interesse no... (etc.)

Os amigos do TC
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2013-10-20 | Jornal Público
TEXTO: As pressões de Bruxelas são inadmissíveis, as de Luanda são entre bons amigos. Há aqui qualquer coisa que não está a bater certo1. Os angolanos, por razões provavelmente internas, dão-se ao luxo de tratar o Estado português como lixo. Que não somos um Estado de direito, que somos um bando de corruptos, que não querem uma parceria estratégica connosco para que aprendamos que o respeito é muito bonito. Estão naturalmente a ver-se ao espelho. Mas não se pode dizer que a intimidação não dê os seus frutos. Do Governo ao Presidente, estão todos dispostos a vergar ainda mais a espinha para preservar o nosso interesse no mercado e no investimento angolano. Cavaco Silva veio mesmo dizer que o Governo angolano está sustentado em eleições consideradas como livres e justas. (Jacques Chirac, num mau momento, também considerou que Putin era um grande democrata). Já quanto à Comissão, órgão central do sistema institucional da União, a sensível alma portuguesa está preparada para rechaçar, indignada, a sua ingerência nos assuntos internos do país e nada a incomoda tanto como as pressões inadmissíveis de Bruxelas sobre o Tribunal Constitucional. As pressões de Bruxelas são inadmissíveis, as de Luanda são entre bons amigos. Há aqui qualquer coisa que não está a bater certo. 2. Escrevi recentemente que um pouco de patriotismo não faria mal a ninguém. Referia-me à lamentável incapacidade das forças políticas que querem manter Portugal no euro e que assinaram o memorando, de se entenderem para negociar com a troika (e com as instituições que representa) soluções mais adaptadas à realidade, sobretudo tendo em vista o falhanço (que já quase ninguém nega) dos primeiros dois anos do programa. Deste patriotismo continuamos à míngua. Tem custos políticos que ninguém quer assumir. O PS prefere esperar que o Governo se desfaça por dentro ou por um segundo resgate para obter o seu momento de glória em eleições que seriam provavelmente antecipadas. Está a fazer mais ou menos o mesmo que Passos Coelho, quando o PSD forçou eleições antecipadas em 2011. É muito mais fácil alimentar tiradas patrióticas contra Bruxelas (ou Berlim). Não é que as palavras de Jorge Sampaio não façam sentido e não sejam sentidas. Ouvir o presidente da Comissão, num discurso em Portugal, dizer que se houver falta de responsabilidade de todos os órgãos de soberania teremos o caldo entornado, é demasiado ofensivo. Sampaio foi compreensivo quando Barroso, então primeiro-ministro, lhe foi dizer a Belém que tinha a oportunidade de presidir à Comissão, vendo nisso um ganho para o país. Ver agora o mesmo Barroso tratar o seu país desta forma é algo que lhe deve ser insuportável. Mas esse não é o verdadeiro problema. O problema é este assomo de "patriotismo" na defesa do Tribunal Constitucional, visto como o herói da pátria e do Estado de direito e o último baluarte contra as forças perversas de Bruxelas e dos seus representantes no Governo português. Num país normal, a fiscalização do TC poderia ser utilizada de maneira inteligente pelas forças políticas que assinaram o programa de ajustamento como uma forma de pressionar Bruxelas ou Berlim. Mas para isso era preciso que o Governo não tivesse enveredado pelo caminho das acusações ao TC, sem se dar sequer ao trabalho de justificar cabalmente as suas decisões com uma argumentação fundamentada (parece que desta vez já arrepiou caminho e fez o trabalho de casa). E era preciso também que o PS, em vez de prosseguir no caminho da radicalização, tivesse a mesma atitude. Como nada disto aconteceu, o TC foi transformado como o último reduto contra a troika, uma espécie de governo-sombra a que toda a gente se agarra para determinar as opções políticas do verdadeiro governo. O último episódio fala por si. 3. O relatório enviado pelo chefe da delegação da Comissão em Lisboa sobre o debate que se está a travar em Portugal não é muito diferente de outros, que já me passaram pelos olhos. É uma prática normal das delegações. Pode ser exercida com um espírito mais político ou pode cingir-se a um arrazoado de banalidades que não comprometem ninguém, conforme o perfil do funcionário que a chefia (muitas vezes escolhido por entendimentos políticos entre a Comissão e o governo nacional). Vale o que vale, ou seja, bastante pouco. Não sei se a actual delegação tem enviado também para Bruxelas relatórios sobre o enorme custo social do programa da troika. Se não fez, devia ter feito. Mas, apesar de tudo, tirando uma coisa ou outra com uma linguagem um pouco duvidosa, o que foi transmitido a Bruxelas é grosso modo o que se debate aqui. E aqui o tema central também é em torno do destino "constitucional" deste Orçamento. O risco de uma crise política caso o TC fizesse uma razia nas principais medidas destinadas a cortar os gastos públicos é a nossa discussão quotidiana. As críticas às decisões anteriores dos seus juízes são o pão nosso de cada dia. Tal como a percepção de que o TC (tribunal político, com 13 juízes eleitos por um entendimento entre os dois maiores partidos) tem de levar em consideração que somos um país do euro e que a lei europeia se sobrepõe à lei nacional. O que também é normal é que os nossos parceiros europeus se preocupem com isso. O que volta a não ser normal é que o mesmo PS que defende publicamente uma solução federal para a zona euro e que assinou o Tratado Orçamental, no qual o nível de "ingerência" nas contas públicas nacionais e das suas políticas económicas são muito maiores, alinhe com os que acusam Bruxelas de se comportar de forma inadmissível. Gostaríamos de perceber qual é então a visão socialista sobre o futuro da Europa. 4. O debate sobre as ordens constitucionais já é velho. Quando a Constituição europeia foi debatida no Parlamento português (teria vida curta por causa do chumbo francês e holandês), alguns eurocépticos e outros tantos constitucionalistas fizeram cavalo-de-batalha com o facto de no novo tratado explicitar que a lei constitucional nacional se submete ao tratado constitucional europeu, o que verdadeiramente já não era uma novidade. A integração europeia assenta numa partilha voluntária de soberania que os seus Estados-membros estão dispostos a aceitar. O euro é a forma mais avançada dessa soberania partilhada. A crise veio alterar as regras dessa partilha, tornando-a mais exigente. A filosofia de Berlim para lidar com esta crise é relativamente fácil de entender: primeiro, a garantia de que as políticas orçamentais dos Estados-membros têm de estar sujeitas a regras comuns muito estritas; segundo, que os choques assimétricos não se podem transformar em crises do euro. Terceiro, se tudo isto for adquirido, provavelmente a Alemanha acabará por negociar uma qualquer forma de aliviar o peso da dívida em alguns países e de dar aos mercados as garantias suficientes para eles olharem para a zona euro de novo com confiança. Como sempre, preferimos a via mais fácil de ser patriota. O problema é que, na zona euro, o que acontece a um tem repercussões para os outros, como temos aprendido à nossa custa nos últimos dois anos. Nesta Europa nova que estamos a tentar construir, os compromissos vão obedecer a regras muito mais duras. Com TC ou sem TC. As virgens ofendidas sabem tudo isto. Mas dá muito menos trabalho lançar meia dúzia de invectivas contra Bruxelas do que discutir as coisas a sério. A nossa Constituição, apesar das várias revisões, é um documento datado, que corresponde a um país e a uma Europa que já não existem. Temos de olhar para ela com os olhos da realidade actual. E podemos ter de alterá-la num sentido que reflicta melhor o nosso lugar na Europa e no euro. Mas estes é outro estúpido tabu em que ninguém quer tocar. Dá muito menos trabalho ser amigo do TC. Jornalista. Escreve ao domingo
REFERÊNCIAS:
Afweyne, o pirata com uma missão, foi preso a pensar que ia fazer um filme
Mohamed Abdi Hassan, líder do grupo de piratas somalis que fez alguns dos mais audaciosos sequestros de navios, foi preso em Bruxelas. Mas agora diz que queria acabar com a pirataria no seu paísUm dos maiores piratas da Somália, que terá ganho milhões de dólares com o resgate de superpetroleiros e um grande navio com armamento russo sequestrados ao largo deste Estado falhado, foi apanhado pela polícia belga há uma semana com um estratagema que parece filme: convenceram-no a abandonar a Somália e a ir até Bruxelas para ser consultor num documentário sobre a pirataria. Fazia todo o sentido para Mohamed Abdi Hassan,... (etc.)

Afweyne, o pirata com uma missão, foi preso a pensar que ia fazer um filme
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2013-10-20 | Jornal Público
TEXTO: Mohamed Abdi Hassan, líder do grupo de piratas somalis que fez alguns dos mais audaciosos sequestros de navios, foi preso em Bruxelas. Mas agora diz que queria acabar com a pirataria no seu paísUm dos maiores piratas da Somália, que terá ganho milhões de dólares com o resgate de superpetroleiros e um grande navio com armamento russo sequestrados ao largo deste Estado falhado, foi apanhado pela polícia belga há uma semana com um estratagema que parece filme: convenceram-no a abandonar a Somália e a ir até Bruxelas para ser consultor num documentário sobre a pirataria. Fazia todo o sentido para Mohamed Abdi Hassan, também conhecido como Afweyne - que quer dizer Boca Grande em somali -, um rico armador que anunciou a sua reforma em Janeiro, tem passaporte diplomático e cuja missão actual, garantia, era incentivar os jovens a abandonar a pirataria. Um relatório de 2012 do Grupo de Monitorização da Somália das Nações Unidas não hesitava em classificar Mohamed Abdi Hassan como "um dos mais célebres e influentes líderes da Rede de Pirataria Hobyo-Harardheere", que actua na zona central da costa da Somália. Mas Afweyne não era nenhum capitão Jack Sparrow, nem mesmo na sua versão moderna, com uma arma automática a tiracolo. É um empresário, tanto quanto se sabe conhecido pelos modos calmos. "Afweyne trouxe uma nova sofisticação a este negócio. Conseguiu capital de risco para as operações de pirataria, tal como se estivesse a lançar uma operação em Wall Street", escreveu Jay Bahadur, no livro The Pirates of Somalia - Inside Their Hidden World, lançado em 2011. A polícia belga queria prendê-lo porque, em 2009, uma dúzia de piratas atacaram o navio belga Pompei, a cerca de 700 milhas da costa da Somália, e sequestraram a tripulação durante mais de 70 dias, até ser pago um resgate. Dois dos piratas que participaram na operação foram capturados e julgados na Bélgica, condenados a dez e nove anos de prisão. Mas a justiça de Bruxelas estava interessada no mandante, e não apenas nos piratas - que podem ser apenas desempregados que enveredam pela pirataria para ganhar a vida. "Muitas vezes, estas pessoas estão para além do alcance da justiça", comentou o procurador Johan Delmulle. Não foram revelados pormenores concretos sobre a operação, nem como prosseguirá o caso de Mohamed Abdi Hassan, que terá um passaporte diplomático, emitido pelo governo de transição da Somália, com conhecimento do próprio Presidente Sheik Sharif Ahmed. É o que dizia o relatório de 2012 do Grupo de Monitorização da Somália: "O documento declarava que Afweyne estava envolvido em actividades antipirataria, em nome do governo de transição". Reformado aos 60 anosO próprio Mohamed Abdi Hassan anunciou, em Janeiro de 2013, que os seus dias de pirataria tinham terminado. "A partir de hoje deixo de estar envolvido em actividade de gangs. Tenho encorajado muitos dos meus colegas a renunciar à pirataria", afirmou, a partir da cidade de Adado, na Somália central, onde tem o seu centro de operações. Aliás, o governador da cidade, Mohamed Tiiceey Aden, é um parceiro próximo: negociou muitos resgates de navios e viajou com ele para a Bélgica, onde foi também preso. Terá sido através de Tiiceey que a polícia belga chegou a Afweyne, diz o jornal britânico The Telegraph. Aos 60 anos, estava pronto a enveredar por uma nova via, a dar o exemplo aos mais novos, declarou numa entrevista ao site de notícias sobre a região do Corno de África Sabahionline. com. "Quando tive a certeza de que podia tomar algumas medidas, o Governo deu-me permissão total para lutar contra pirataria", disse Boca Grande. Noutra passagem, nesta entrevista publicada a 8 de Outubro, menos de uma semana antes de ter sido preso no aeroporto de Bruxelas, contabilizava os seus sucessos. "Já persuadimos 1023 [jovens] a deixarem a pirataria. Alguns ficaram convencidos de que a pirataria não é uma coisa boa [e foram reintegrados nas suas comunidades] e outros [estão em processo de reabilitação] em campos. "O próprio Presidente Sheik Ahmed - cuja autoridade sobre o território não vai além de Mogadíscio, a capital - confirmou que a atribuição de passaporte diplomático a Afweyne fez parte dos esforços de desmantelamento dos grupos de pirataria que afligiram o tráfego de petroleiros e navios de carga pelo Golfo de Áden. Redução drásticaLevando em conta os resgates milionários exigidos pelos piratas para devolverem os navios que capturam e a subida dos prémios dos seguros pagos pelas empresas de navegação, as estimativas sobre quanto a pirataria somali terá custado à economia global oscilam entre 7000 milhões e 18. 000 milhões de dólares - e este último valor é uma estimativa do Banco Mundial. Só em resgates a piratas somalis terão sido pagos, desde 2005, cerca de 385 milhões de dólares, calculava o Banco Mundial, num relatório publicado em Abril. Mas a verdade é que a pirataria na Somália se reduziu drasticamente. O número de ataques atingiu o pico em 2011, para caírem 80% no ano seguinte. As operações navais dos Estados Unidos e da União Europeia na zona e o facto de se ter generalizado a prática nos navios que passam na zona de levarem guardas armados e outras medidas antiabordagem são avançadas como causas para esta queda acentuada no sucesso dos ataques dos piratas da Somália - este ano praticamente não há notícia de abordagens. Houve também uma controversa tentativa (que não chegou a bom porto) para criar uma polícia marítima privada na região autónoma de Puntland, no Norte da Somália, conhecida por ter bases de piratas, com financiamento dos Emirados Árabes Unidos e uso de empresas de segurança privada, sul-africanas e americanas. Os piratas somalis dividiam-se em quatro grandes grupos, organizados de forma geográfica e por uma lógica de clãs, segundo uma classificação do site Global Security. Muitos destes grupos estão interligados com a milícia islâmica Al-Shabab, que actua em terra. A Guarda Costeira Nacional de Voluntários, comandada por Garaad Mohamed, tem sede em Kismayu, na costa Sul, e especializou-se em interceptar navios pequenos e embarcações de pesca. O grupo Marka, comandado pelo sheik Yusuf Mohamed Siad, é composto por vários outros grupos, numa organização mais dispersa, e actua ao largo da cidade de Marka, que fica um pouco a sul de Mogadíscio. Uma terceira formação opera ao largo de Puntland, tem por origem pescadores e é denominada Grupo de Puntland. O grupo mais poderoso e melhor organizado era o dos Marines Somalis, de Afweyne, com uma estrutura de tipo militar que incluía um almirante, um vice-almirante e um responsável pelas operações financeiras, dizia um artigo no Global Security. Modelo de negócioNum país sem unidade política nem economia, a pirataria tornou-se uma actividade económica extremamente bem organizada e estratificada, explica Jay Bahadur no Livro The Pirates of Somalia. Cada célula de piratas tinha como que operários especializados em atacar os navios, intérpretes, contabilistas e cozinheiros, os seus próprios fornecedores de khat (uma planta que se masca e se torna viciante, cujas folhas são importadas do Quénia e da Etiópia). Os piratas propriamente ditos não ganham fortunas - os que estão no escalão mais baixo da hierarquia recebem apenas o suficiente para sobreviver. Afweyne notabilizou-se porque os seus homens capturaram navios como o superpetroleiro saudita Sirius Star, do tamanho de um porta-aviões, carregado com dois milhões de barris de crude, que foi abordado em 2008 a 450 milhas a sul do porto de Mombassa, no Quénia. O resgate, pago após dois meses, terá sido no valor de três milhões de dólares, e foi deixado cair de pára-quedas no convés do navio por um helicóptero. Outra conquista que tornou Afweyne e o seu modelo de negócio famosos foi a captura, pouco tempo depois, do navio ucraniano Faina, que transportava 33 tanques T72 do tempo da União Soviética que tinham sido renovados e outro armamento russo, com destino ao Quénia. O sequestro durou 134 dias, até ser pago um resgate também na ordem dos três milhões de dólares. O capitão do Faina morreu de ataque cardíaco. Empresário justiceiroAfweyne, no entanto, renega uma visão do seu passado que o encare simplesmente como um pirata. Dir-se-ia que prefere ver-se como um justiceiro que fez justiça pelas próprias mãos, quando os grandes navios pesqueiros estrangeiros começaram a chegar às águas do seu país e a roubar descaradamente o peixe, pelo que explicou ao site de notícias Sabahionline. com. "Eu era proprietário de uma grande empresa de pesca e tinha uma produção significativa. Mas quando os navios estrangeiros nos atacaram e já não pudemos ir para o mar ou ganhar a vida, decidimos tomar medidas para nos protegermos, o que era uma forma legítima de autodefesa", disse na entrevista de 8 de Outubro. "Lutámos contra os que estavam a destruir o mar e a impedir-nos de o usar. Por isso, eu não era um raptor, era um líder desde movimento legítimo de autodefesa. Organizámos a juventude da região com o objectivo de nos protegermos e não para fazer raptos". Qual o sucesso destes argumentos na justiça belga - e até com a dinamarquesa, que poderá também estar interessada em julgá-lo, devido ao sequestro do navio Danica White - é o que se verá nos próximos dias.
REFERÊNCIAS:
Étnia Árabes
O andorinhão-real é capaz de voar 200 dias sem uma única paragem
A migração de três andorinhões-reais foi registada com um pequeno aparelho colocado nas aves por uma equipa de investigadores suíços. Fica por descobrir como é que as aves dormem durante o vooChegando o final do Verão, as várias espécies de andorinhões abandonam os locais na faixa mediterrânica, de Portugal à Bulgária, onde fazem os seus os ninhos e voam em direcção à África Subsariana, à procura do seu alimento preferido - insectos -, que escasseia na Europa durante o Inverno. Há muito que se acredita que estes migradores de longa distância passam grande parte da sua vida em voo. O estudo de uma equipa suíça, pu... (etc.)

O andorinhão-real é capaz de voar 200 dias sem uma única paragem
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 0.409
DATA: 2013-10-21 | Jornal Público
TEXTO: A migração de três andorinhões-reais foi registada com um pequeno aparelho colocado nas aves por uma equipa de investigadores suíços. Fica por descobrir como é que as aves dormem durante o vooChegando o final do Verão, as várias espécies de andorinhões abandonam os locais na faixa mediterrânica, de Portugal à Bulgária, onde fazem os seus os ninhos e voam em direcção à África Subsariana, à procura do seu alimento preferido - insectos -, que escasseia na Europa durante o Inverno. Há muito que se acredita que estes migradores de longa distância passam grande parte da sua vida em voo. O estudo de uma equipa suíça, publicado na revista Nature Communications, vem provar que, pelo menos no caso dos andorinhões-reais, isso acontece realmente. Os andorinhões pertencem à família dos apodídeos, do grego ápodos, que significa "sem pé". "Claro que é um eufemismo, porque eles têm patas, mas são muito pequenas, por isso quase não as usam", explica ao PÚBLICO Gonçalo Elias, investigador num estudo sobre o andorinhão-pálido na serra da Arrábida. "Passam muito tempo no ar, só vêm a terra para nidificar. "O estudo agora publicado mostra como três aves, anilhadas e equipadas com um aparelho localizador quando abandonaram os locais de nidificação, na Suíça, terão estado permanentemente em voo durante 200 dias - quase sete meses! - até regressarem aos mesmos locais de nidificação. Ou, no máximo, terão pousado durante períodos muito breves, em locais à mesma altura do que a do seu plano de voo. "Têm de pousar num sítio alto, porque se pousam no chão não conseguem levantar voo, devido às suas asas muito grandes", acrescenta Helder Costa, um dos autores do livro Aves de Portugal, editado pela Assírio & Alvim. "São aves muito bem adaptadas ao meio aéreo, com elevadíssima mobilidade", reforça Gonçalo Elias. "Há estudos com andorinhões-pretos que mostram que percorrem todo o continente africano, fora da época de nidificação, para se alimentarem. Neste período, não têm nenhum território fixo. " Alimentam-se em voo, sem terem necessidade de pousar, utilizando o seu bico curto e largo e uma boca grande, capaz de apanhar uma grande quantidade de insectos, como se fosse uma rede de arrasto de um navio de pesca. Para perceber melhor os voos dos andorinhões-reais, foram colocados pequenos aparelhos em seis animais enquanto nidificavam na Suíça. Destes, conseguiram-se recuperar três, quando regressaram aos locais de nidificação no ano seguinte. "Só se conseguem capturar quando pousam nos locais de nidificação", refere Gonçalo Elias. "Não se conseguem apanhar nas redes [como as usadas normalmente para apanhar aves], porque voam muito alto. "Os dados recolhidos pelos aparelhos da equipa suíça parecem mostrar que os três animais se mantiveram em voo, fosse um voo batido ou planado, e que as aves estavam mais activas ao amanhecer e ao anoitecer, altura em que terão maior disponibilidade de alimento. Durante a noite, a actividade foi reduzida, mas desconhece-se se as aves descansaram ou dormiram e como o fizeram. "Durante muitos anos, dormir foi considerado essencial para recuperar pelo menos algumas das funções fisiológicas do cérebro", escrevem Felix Liechti, do Instituto Ornitológico Suíço (em Sempach) e colegas, na Nature Communications. "As necessidades de sono são diferentes consoante a espécie", especifica Gonçalo Elias. Embora os humanos precisem de dormir um certo número de horas todos os dias, há espécies que pouco descansam se têm de alimentar as crias, para aproveitar o alimento disponível, ou outras espécies que hibernam, dormindo quase metade do ano. Recordistas das migraçõesO corpo dos andorinhões, aerodinâmico e bastante leve, tem capacidade para chegar aos 110 quilómetros por hora em voo batido, e está completamente optimizado para uma maior eficiência energética, obtendo o máximo proveito no voo com um consumo mínimo de energia. Mas um voo de quase sete meses registado para estes andorinhões-reais desafia os limites das migrações. Este tipo de movimentações, durante períodos tão longos, só era conhecido para os animais marinhos, mas estes podem manter-se dentro da coluna de água com um esforço mínimo, permitindo-lhes descansar. Mesmo o recordista das migrações, a andorinha-do-mar-árctica (Sterna paradisaea), que viaja cerca de 70 mil quilómetros anualmente para ir e voltar da Gronelândia à Antárctida, não permanece em voo durante toda a viagem, pára para se alimentar. Acredita-se que os indivíduos das várias espécies de andorinhões que nidificam em Portugal regressem todos os anos, mantendo-se fiéis aos locais onde constroem os ninhos. Os andorinhões-reais (Apus melba) são raros em Portugal, embora apareçam por cá, sendo mais frequentes os andorinhões-pretos e os andorinhões-pálidos. Medem 21 centímetros de comprimento e têm 53 centímetros de envergadura de asas, tornando-os a maior espécie desta família. As penas são castanho-escuras, distinguindo-se pelas manchas brancas por baixo do bico e na barriga. Em voo, os andorinhões identificam-se por parecerem uma âncora, com as asas desproporcionadas em relação ao corpo. Apesar de algumas espécies até terem a cauda bifurcada, não são primos das andorinhas. Essas longas asas levam-nos em viagens incansáveis, como se viu agora.
REFERÊNCIAS:
As melhores fotografias de Natureza de 2013
O Museu de História Natural de Londres anunciou os vencedores do concurso Wildlife Photographer of the Year 2013, uma das mais importantes competições de fotografia de vida selvagem a nível mundial. O sul-africano Greg du Toit ficou em primeiro lugar, com uma imagem algo mística de elefantes africanos junto a um lago, numa reserva natural do Botswana. As 100 melhores fotografias ficam em exposição no Museu até 23 de Março de 2014.... (etc.)

As melhores fotografias de Natureza de 2013
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 1.0
DATA: 2013-10-22 | Jornal Público
TEXTO: O Museu de História Natural de Londres anunciou os vencedores do concurso Wildlife Photographer of the Year 2013, uma das mais importantes competições de fotografia de vida selvagem a nível mundial. O sul-africano Greg du Toit ficou em primeiro lugar, com uma imagem algo mística de elefantes africanos junto a um lago, numa reserva natural do Botswana. As 100 melhores fotografias ficam em exposição no Museu até 23 de Março de 2014.
REFERÊNCIAS:
Étnia Africano
Portugal, Europa... Cinco conclusões e uma pergunta
1. Votou-se nestas eleições para o mais inócuo dos órgãos da UE, mas elas permitem ver o que acham os europeus deste austeritarismo socialmente letal, imposto pela alta finança, o BCE e os seus muitos braços políticos (a Comissão Barroso, os governos da direita e da área socialista). Nos países sujeitos aos ditames da troika, é evidente a viragem à esquerda, e não à direita: vence na Grécia, e sobe em Portugal (CDU), em Espanha (Esquerda Unida, Podemos, independentistas bascos e catalães), e na Irlanda (Sinn Féin). Era bom que quem se tem concentrado tanto na reação racista, fascistóide e ultranacionalista que ga... (etc.)

Portugal, Europa... Cinco conclusões e uma pergunta
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2014-05-29 | Jornal Público
TEXTO: 1. Votou-se nestas eleições para o mais inócuo dos órgãos da UE, mas elas permitem ver o que acham os europeus deste austeritarismo socialmente letal, imposto pela alta finança, o BCE e os seus muitos braços políticos (a Comissão Barroso, os governos da direita e da área socialista). Nos países sujeitos aos ditames da troika, é evidente a viragem à esquerda, e não à direita: vence na Grécia, e sobe em Portugal (CDU), em Espanha (Esquerda Unida, Podemos, independentistas bascos e catalães), e na Irlanda (Sinn Féin). Era bom que quem se tem concentrado tanto na reação racista, fascistóide e ultranacionalista que ganhou força em França, na Grã-Bretanha, na Dinamarca, na Áustria, na Hungria, na Polónia, não deixasse de perceber esta outra reação. Os partidos de onde saíram os comissários europeus perderam milhões de votos, a CDU de Merkel, os conservadores de Cameron, o PS de Hollande, a direita portuguesa, esmagada até ao seu mínimo histórico. 2. Nunca numas eleições no Portugal democrático, quaisquer que elas tenham sido, os partidos do Governo sofreram uma derrota tão grande, nunca se lhes deu um apoio social tão reduzido! PSD e CDS têm hoje 27, 7% dos votos, perderam mais de 1/3 (520 mil) do que tinham há cinco anos. Na Madeira, por exemplo, repararam?, tem. . . 30, 9% dos votos, metade do que tinha! Dêem-se as voltas que se quiser, invoque-se a abstenção (como se ela não tivesse sido sempre elevadíssima em europeias anteriores), diga-se que “daqui a um ano é que se vai ver!”, mas não há volta a dar: em europeias, a direita tinha tido o seu pior resultado em 2004, em pleno arranque da austeridade, pela mão de Durão e Ferreira Leite, e obtivera 33, 3% dos votos; agora afundou-se. Até em 1975, em pleno fulgor revolucionário, superava 34% dos votos! Lembremo-nos que esta coligação de direita reuniu, em 2011, tanto apoio quanto Cavaco há 25 anos, bem mais do que as vitórias de Sá Carneiro. Está hoje reduzida a isto. O único castigo de dimensões comparáveis a algum partido de governo ocorreu nas legislativas de 1985, quando o PS, que liderara um governo de Bloco Central numa austeridade de efeitos tão devastadores como esta, mas aplicada por muito menos tempo, perdeu em dois anos mais de 40% da sua representação – mas o seu parceiro de governo, o PSD, é que não pagou o mesmo preço, o que, com a irrupção do PRD (17, 9% dos votos), propiciou nesse ano a mais baixa vitória de sempre em eleições (29, 8%). É verdade que ao fim de 24 horas o PS se deixou embarcar em mais uma daquelas operações em que só embarcam políticos profissionais fechados dentro da sua redoma, sem perceberem como são diferentes os tempos que estamos a viver: Seguro ou Costa?, quem é mais “ganhador”?, “qual dos dois nos safa de termos de fazer uma coligação e repartir lugares que gostaríamos só para nós?” De todo este lamentável folclore politiqueiro quase até parece que já nem há derrota irremissível de um governo que assumiu o maior ataque à sociedade portuguesa desde que Salazar nos lançou em 13 anos de guerra em África. Assentemos na segunda conclusão: nunca um governo teve tão pouco apoio em Portugal desde que há democracia! Nunca foi tão evidente que a Constituição deveria ser ativada para o demitir e permitir aos portugueses escolher outro governo!3. Semelhante derrota das candidaturas europeias de quem, no Governo português e no Parlamento Europeu, assente como um cão de porcelana ao Diktat de Berlim, não põe em causa a legitimidade do poder em Portugal? Tem-se insistido mais na elevadíssima abstenção para falar de uma crise do sistema democrático, mas, se assim é, deveria perceber-se que essa crise se mantém há 20 anos. Não votaram nestas europeias (65, 3%) tantos quanto em 1994 (64, 5%). Há 20 anos que mais de 60% dos portugueses não votam em europeias – o que, aliás, é bem menos do que em sete outros membros da UE; em 20 dos 28 países vota-se a menos de 50%. Mais revelador é que a abstenção, depois de 38 anos de rotação PS/direita, tenha passado de 10%-20% nas legislativas dos anos 70 para os 35%-42% deste século – mas, quando se trata de governar, quem ganha já não acha que a abstenção tira legitimidade à vitória. . . Além disso, esquece-se que em cinco anos terão emigrado 400-500 mil portugueses: é de espantar que se tenham abstido agora 240 mil eleitores mais. Colocadas estas eleições em contexto, o maior obstáculo à representatividade do poder não creio que esteja na abstenção – está, sim, nesta extraordinária, incomparável, derrota de quem governa!
REFERÊNCIAS:
Descoberto um oásis do Jurássico com mil trilhos de dinossauros
A valsa não nasceu no Jurássico, mas é fácil aludir a um salão de dança com 190 milhões de anos quando se vê tantas pegadas de dinossauros juntas. Nos Desfiladeiros de Vermillion, no Norte do Arizona, já perto da fronteira com o Utah, nos Estados Unidos, geólogos e geofísicos da Universidade de Utah descobriram muitos trilhos de dinossauros, alguns deles acompanhados de marcas de caudas. O estudo foi hoje publicado na revista "Palaios". “Terá que ter havido mais do que um tipo de dinossauro aqui”, disse Marjorie Chan, professora de geologia e geofísica na Universidade de Utah. “Era um local que atraia uma multidã... (etc.)

Descoberto um oásis do Jurássico com mil trilhos de dinossauros
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2008-10-21 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20081021130903/http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1346801
TEXTO: A valsa não nasceu no Jurássico, mas é fácil aludir a um salão de dança com 190 milhões de anos quando se vê tantas pegadas de dinossauros juntas. Nos Desfiladeiros de Vermillion, no Norte do Arizona, já perto da fronteira com o Utah, nos Estados Unidos, geólogos e geofísicos da Universidade de Utah descobriram muitos trilhos de dinossauros, alguns deles acompanhados de marcas de caudas. O estudo foi hoje publicado na revista "Palaios". “Terá que ter havido mais do que um tipo de dinossauro aqui”, disse Marjorie Chan, professora de geologia e geofísica na Universidade de Utah. “Era um local que atraia uma multidão, tal como as pistas de dança”, exemplifica a cientista. Os investigadores acreditam que a atracção daquele local era a água. Há 190 milhões de anos, a Terra só tinha um super-continente chamado Pangeia. O território actualmente definido pelos Estados de Utah, Wyoming, Colorado, Novo México, Arizona e Nevada, formava um deserto maior do que o Sahara. Devido ao tamanho do continente, os investigadores acreditam que existiam ventos muito fortes que formavam dunas maiores do que as do deserto africano. “As áreas entre estas dunas de areia podiam ter poças de água – um oásis”, explica o primeiro autor do estudo, Winston Seiler, que na altura da descoberta estava a tirar o mestrado. “Para sustentar grandes dinossauros, é provável que não houvesse só uma poça de água, mas muitas. Eles caminhavam numa rede de oásis para se alimentarem e beberem água”, diz o investigador. A área tem mais de 3000 mil metros quadrados. Já foram estimados mais de mil trilhos de dinossauros. Pensa-se que existam quatro espécies diferentes, com vários tamanhos. “Os trilhos de tamanhos diferentes [de 2, 5 centímetros a meio metro] podem querer dizer que estamos a ver mães a caminharem com os seus bebés”, refere Seiler. Não é produto da erosãoMarjorie Chan visitou pela primeira vez o local em 2005 e pensou que as marcas deixadas na rocha arenítica tinham sido formadas a partir da erosão do vento. Mas na altura a investigadora suspeitou de algo mais, “eu sabia que isto não era toda a história, havia uma alta concentração de marcas e não existiam em mais local nenhum na região”. Quando em 2006 Winston Seiler visitou o local, o investigador percebeu do que se tratava. “Depois de caminhar pelo local durante cinco minutos, percebi que eram pegadas de dinossauro”, disse. Vários argumentos deram força à teoria: o tamanho dos trilhos é o indicado para animais grandes e as pegadas estão limitadas a uma única camada rochosa; encontraram-se quatro tipos diferentes de trilhos que incluíam marcas de garras, dedos e calcanhares; as marcas tinham uma orientação, o que indica uma direcção na caminhada. Os trilhos de cauda que a dupla encontrou tornam o local ainda mais especial, porque não se conhecem muitas marcas destas no mundo. “Os dinossauros não costumavam andar a arrastar as caudas”, diz Seiler. As marcas têm cerca de seis centímetros de largura e prolongam-se até mais de sete metros. Segundo os investigadores, foram feitas por dinossauros do tipo dos saurópodes – os que se movem em quatro patas, são herbívoros e têm pescoços e caudas enormes. Os trilhos não deram informação suficiente para se conseguir identificar as espécies certas de dinossauros. Um do tipo de pegadas pertencia a um animal parecido com o carnívoro Tyrannosaurus rex, mas mais pequeno, com o comprimento entre 4, 8 e seis metros. Outro trilho seria de um dinossauro que não ultrapassava os 30 centímetros de altura e um terceiro trilho de outro dinossauro que não chegava aos quatro metros de comprimento. Depois de os dinossauros terem “dançado” naquela região, a superfície foi coberta pelas dunas que estavam em constante movimento. Posteriormente as rochas que se formaram foram sendo erodidas até que as pegadas ficaram visiveis. Eventualmente, a erosão também vai apagar as pegadas. Esta descoberta alterou a concepção que Marjorie Chan tinha deste local. Em vez do deserto "vasto, seco e inabitável” que a geóloga julgava existir, agora compreende que existiram "muitas variações, e houve períodos em que os dinossauros viveram aqui”.
REFERÊNCIAS:
Étnia Africano
“Os polícias disseram que nós, africanos, temos de morrer”
Desde quinta-feira que a Cova da Moura tem estado nas notícias. Seis jovens detidos pelos agentes da esquadra da PSP de Alfragide acusam a polícia de tortura e racismo. Pontapés, tiros, e violência verbal fazem parte da acusação. “Vocês têm sorte que a lei não permite, senão seriam todos executados”, dizem ter ouvido. Ou: “Deviam alistar-se no Estado Islâmico”. PSP e IGAI estão a investigar. (...)

“Os polícias disseram que nós, africanos, temos de morrer”
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 17 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-07-17 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20170717050633/https://www.publico.pt/1685599
SUMÁRIO: Desde quinta-feira que a Cova da Moura tem estado nas notícias. Seis jovens detidos pelos agentes da esquadra da PSP de Alfragide acusam a polícia de tortura e racismo. Pontapés, tiros, e violência verbal fazem parte da acusação. “Vocês têm sorte que a lei não permite, senão seriam todos executados”, dizem ter ouvido. Ou: “Deviam alistar-se no Estado Islâmico”. PSP e IGAI estão a investigar.
TEXTO: Os habitantes da Cova da Moura estão habituados a ver polícia neste bairro da Amadora. Volta e meia aparecem para fazer rusgas. Na quinta-feira, 5 de Fevereiro, “por volta do meio-dia”, Bruno Lopes estava na Rua do Moinho quando “pelo menos seis” agentes da polícia abordaram “duas pessoas”. Um dos polícias começa a rir para Bruno, que vira a cara. Bruno conversa com o primo e ri-se com ele. O polícia diz-lhe: ‘Estás-te a rir, olha que podes perder o sorriso”. O primo sugere que entrem no café, e em crioulo, Bruno diz que não tem de sair de onde está. O polícia quer saber do que falam, e encosta-o à parede. Vêm mais dois agentes que o agridem. Bruno não ofereceu resistência alguma. Isto é versão de Bruno Lopes, 24 anos. Da varanda de sua casa, Jailza Sousa, 29 anos, cabo-verdiana voluntária no Moinho da Juventude, vê-o “a levar chapadas”, e Bruno sem reagir, “nada que desse origem àquilo tudo”. Bruno ouviu uma voz feminina a gritar aos polícias: “Parem”. De nada serviu. – Começaram a bater até fazer sangue, lembra Jailza. Na rua em baixo, em casa, Celso Lopes ouve um, dois, três, quatro, cinco disparos. – O policial apontou para mim e disparou uma vez, tornou a carregar e a disparar, diz Jailza, com os cartuchos das balas de borracha na mão. O meu filho viu, está traumatizado. Bruno Lopes é algemado e levado para a esquadra de Alfragide, a cerca de um quilómetro dali. – Bateram-me com o cassetete, davam pontapés, conta. – Diziam-me para me candidatar ao Estado Islâmico. Chamavam pretos, macacos, que iam exterminar a nossa raça. Quatro dias depois, na segunda-feira, junto ao café ainda se vêem umas pingas de sangue. Jailza tem duas marcas das balas de borracha com que foi atingida: uma na nádega, outra no peito. Mostra-nos as sequelas, envergonhada, numa das salas de leitura da biblioteca do Moinho. Bruno seria libertado na sexta-feira. Foi acusado na altura de ter lançado uma pedra e partido um vidro da carrinha da polícia. Nega tudo. “Se estava a ser revistado, como é que podia ter lançado uma pedra?”O PÚBLICO deslocou-se à esquadra de Alfragide para confrontar os polícias com todas as acusações que aqui reproduzimos, mas o chefe desta unidade remeteu para as relações públicas da PSP. Têm uma versão contraditória dos factos. Por seu lado, a direcção nacional desta polícia garantiu-nos que o incidente foi “objecto do tratamento previsto para qualquer situação de acção/intervenção policial”. Abriu um inquérito interno. Aguarda os trâmites legais e não faz comentários, mesmo depois de confrontada com as acusações. A Inspecção-Geral da Administração Interna (IGAI) também abriu um inquérito à actuação da PSP. O Moinho da Juventude, projecto comunitário que existe há 30 anos na Cova da Moura, já recebeu diversos prémios como o de Direitos Humanos da Assembleia da República. Flávio Almada, conhecido como Lbc na sua pele de rapper, membro da direcção, é formado em tradução, está a preparar uma candidatura a um doutoramento, e participou em projectos como o ALICE, coordenado por Boaventura de Sousa Santos. Trabalha com crianças e jovens e muitas vezes Jailza ajuda-o. Cruzou-se com ela na quinta-feira e viu-a a chorar. Perguntou o que tinha acontecido. Decidiu ir à esquadra perceber o que se passara com Bruno. Celso Lopes, também da direcção do Moinho, investigador social, acompanhou-o. Juntaram-se mais amigos de Bruno. – Chegámos à porta da esquadra e estavam três agentes. Dissemos que éramos do Moinho e queríamos falar com o chefe. A abordagem deles foi logo agressiva: ‘Esperem na porta, não vão entrar’. Dois foram para dentro e gritaram: ‘Malta! Disseram: ‘basa daqui’. Flávio não consegue reproduzir com detalhe tudo o que se passou, pois tudo se passou muito rápido. Garante que não houve qualquer tipo de provocação, agressão, violência. – Não somos malucos. Sabemos a intervenção que eles fazem. Sabe que ouviu um primeiro tiro e depois outro e Celso atingido na perna. Celso diz que mais de uma dezena de agentes apareceram a seguir. E que no meio dos insultos foi pontapeado até que:– O polícia que me baleou duas vezes fez um disparo e fez ricochete e atinge-me na perna. Quando me viro para dizer ao Flávio, ele dá um segundo tiro na perna. Dentro da esquadra há um hall que tem uma secretária e mandaram-me contra um pneu. Mas depois o polícia disse: ‘Não, a merda tem que estar no chão. ’Flávio continua:– Eu perguntei: ‘o que fizemos? Não estamos a reagir, a faltar ao respeito com ninguém’. E começaram-me a bater, fiquei no chão, colocaram as algemas, depois perdi a noção porque eram pontapés e socos e já não sabia quantos eram. Disseram: ‘O lixo e cães é para o chão’. A tortura continuou: pontapés, socos, cara no chão, parti um dente – e mostra-o. Diziam-lhes: “Vocês têm sorte que a lei não permite, senão seriam todos executados”. E: “Deviam alistar-se no Estado Islâmico”. Entretanto, Rui Moniz tinha ido tratar de umas papeladas numa loja perto, e foi “apanhado” pelos polícias, também sem justificação, diz. O jovem, que sofreu um AVC e tem um mão imóvel, acusa igualmente os agentes de lhe baterem. – Começaram a encher-me de pontapés, arrastaram-me até à esquadra. Mandaram levantar a cara, e depois deram socos. Um deles vira-se e diz: 'esse aí é português. ’ E outro: ‘Não, ele é pretoguês’. Natural de Cabo Verde e a viver em Portugal há 12 anos, Flávio acusa a polícia de lhe ter ficado com a autorização de residência e de o ter impedido de fazer uma chamada para o advogado. – A única coisa que nos deu vantagem é que antes de ir à esquadra eu liguei para o Mamadou Ba, do SOS Racismo, e para o Jakilson (da biblioteca do Moinho da Juventude). Passou tanto tempo que as pessoas começaram a preocupar-se. A PSP, entretanto, nessa tarde, emitia um comunicado citado pela Lusa, acusando um “gang” da Cova da Moura de invadir a esquadra. Celso, Flávio, Paulo, Miguel e Rui seriam detidos. Foram levados para a super esquadra da Damaia e depois para o hospital Amadora-Sintra. O Ministério Público pediria a sua prisão preventiva por resistência e coacção a funcionário, mas no sábado o Tribunal de Sintra libertou-os determinando a medida de coacção menos gravosa, o Termo de Identidade e Residência. Eles, por seu lado, apresentaram uma queixa-crime por tortura no Ministério Público de Almada. Acusam a polícia de difamação e racismo institucional pelo que se passou segundo as suas versões. – Como é que se caiu no discurso que fomos invadir uma esquadra?, questiona Flávio. Sou membro da direcção do Moinho, trabalhei sempre com jovens na prevenção, fiz voluntariado na prisão para trabalhar a inclusão através da arte, e agora vou invadir uma esquadra?Flávio lembra:– Consegui ver a expressão de um dos polícias, quando disse com uma convicção que eu não consigo reproduzir: ‘Se eu mandasse vocês seriam todos exterminados. Não sabem o quanto eu odeio vocês, raça do caralho, pretos de merda’. Nunca tinha visto um ódio, em estado bruto, daquela forma. Nunca tinha visto e já vi muita coisa. A expressão dele era um ódio completamente cego e aquilo assustou-me: como é que uma sociedade anda a produzir indivíduos deste tipo?Recorda também de um deles dizer, sobre ele: “Apanha aquele filho da puta que tem a mania que é inteligente”. – Disseram-nos várias vezes que nós, os africanos, temos que morrer. Que se a legislação permitisse nos executariam, que devíamos estar pendurados pelos pés. Já depois de mais de duas horas de entrevista a explicar-nos o que aconteceu, Flávio desabafa, com Celso, que é necessário manter vivos os acontecimentos mas que não querem estar a toda a hora a lembrá-los. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. – Deixa sequelas, diz Flávio. A ficha vai caindo. Fico indignado. E alguém tem que ser responsabilizado. Tenho curso superior, sou activista, conheço muita gente e muita gente acredita em mim. Agora um jovem que tenha pelo menos um antecedente criminal: ninguém o iria apoiar. Os moradores da Cova da Moura, o SOS Racismo e outras organizações marcaram uma concentração de protesto em frente ao Parlamento, em Lisboa, para a próxima quinta-feira, dia 12, às 17h.
REFERÊNCIAS:
Entidades PSP
Deputada do PS questiona autarquia de Moura sobre medidas para travar racismo contra ciganos
Idália Serrão quer saber se a autarquia tem desenvolvido políticas de inclusão de todos os cidadãos na comunidade. (...)

Deputada do PS questiona autarquia de Moura sobre medidas para travar racismo contra ciganos
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 14 Ciganos Pontuação: 18 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-07-10 | Jornal Público
SUMÁRIO: Idália Serrão quer saber se a autarquia tem desenvolvido políticas de inclusão de todos os cidadãos na comunidade.
TEXTO: A deputada do Partido Socialista Idália Serrão questionou nesta quarta-feira a Câmara Municipal de Moura sobre as manifestações racistas e xenófobas de que tem sido alvo a comunidade cigana residente no concelho, em Santo Aleixo da Restauração. Num comunicado enviado à imprensa pelo grupo parlamentar do PS, afirma-se que Idália Serrão quer saber se a autarquia tem conhecimento do que se passa e quais as diligências que tomou para travar a situação. Sublinhando que é importante a câmara de Moura empenhar-se para “pôr cobro a estas manifestações xenófobas e racistas”, a deputada refere-se às “inscrições xenófobas" que nos últimos dias surgiram "nas paredes do edificado" de Santo Aleixo. Já anteriormente, lembra, houve queixas de "insultos a cidadãos de todas as idades, incluindo crianças e idosos, e ainda a destruição pelo fogo de habitações e viaturas e o envenenamento de animais” de famílias de etnia cigana. Idália Serrão, que tem um avô cigano, eleita por Santarém, vice-presidente do grupo parlamentar do PS e secretária da mesa da Assembleia da República, questionou ainda a autarquia sobre as políticas desenvolvidas "para a inclusão de todos os cidadãos na comunidade", e pediu informação detalhada sobre “as parcerias desenvolvidas, as medidas implementadas e os resultados alcançados, nomeadamente quanto ao trabalho desenvolvido com as comunidades ciganas”. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Depois de em Setembro ter sido alvo de ataques incendiários, que não pouparam casas, viaturas automóveis e até o edifício da igreja onde as famílias realizavam o seu culto religioso, a comunidade cigana de Santo Aleixo voltou recentemente a ser vítima de ameaças de morte. Uma das manifestações mais visíveis dos últimos dias foram as frases nas paredes de casas e muros da freguesia a exigir a sua expulsão ou a “morte aos ciganos”. São acompanhadas de cruzes e de caixões pintados a negro. Ao PÚBLICO, o presidente da Câmara Municipal de Moura, Santiago Macias, disse que os conflitos que envolvem a comunidade cigana de Santo Aleixo da Restauração revelam, essencialmente, “um problema de segurança pública”. Estes factos levaram a Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial, que funciona junto do Alto-Comissariado para as Migrações, a apresentar ao Ministério Público uma queixa crime de discriminação racial, previsto no artigo 240. º do Código Penal.
REFERÊNCIAS:
Partidos PS
Supremo americano impede execução no Texas por causa de testemunhos racistas
O Supremo Tribunal dos Estados Unidos suspendeu a pena de morte proferida contra um condenado por assassínio no Texas, considerando que a sentença foi aplicada com base em depoimentos racistas feitos durante o julgamento. A decisão foi tomada depois de ter sido negado um adiamento pelo governador do Texas e aspirante a candidato presidencial republicano Rick Perry. (...)

Supremo americano impede execução no Texas por causa de testemunhos racistas
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 12 | Sentimento 0.0
DATA: 2011-09-16 | Jornal Público
SUMÁRIO: O Supremo Tribunal dos Estados Unidos suspendeu a pena de morte proferida contra um condenado por assassínio no Texas, considerando que a sentença foi aplicada com base em depoimentos racistas feitos durante o julgamento. A decisão foi tomada depois de ter sido negado um adiamento pelo governador do Texas e aspirante a candidato presidencial republicano Rick Perry.
TEXTO: A apenas 90 minutos da hora marcada para a execução, os juízes deram aval aos argumentos apresentados pelos advogados de Duane Buck, um afro-americano de 48 anos, no sentido de que este tinha sido “injustamente” condenado à pena de morte por causa da avaliação feita por um psicólogo, sob juramento, testemunhando que os homens negros são mais propensos do que outras raças a reincidir no comportamento criminoso após serem libertados. Para a equipa de defesa de Buck, este depoimento, feito pelo psicólogo Walter Quijano, influenciou os jurados a proferirem a condenação do arguido por motivações racistas. Reconhecendo esta argumentação como legítima, o Supremo Tribunal decidiu suspender a execução – algo extremamente raro na justiça norte-americana – e, num comunicado de apenas um parágrafo, explica que esta suspensão se mantém até os tribunais darem resposta ao recurso. A advogada de Buck crê que tal acontecerá dentro de uma semana a um mês. O caso ganhou tanto mais atenção porque os advogados de Buck apelaram igualmente ao governador do Texas, Rick Perry – agora um dos favoritos na corrida pela nomeação dos republicanos à candidatura para as eleições presidenciais do próximo ano. Perry, um apoiante da pena de morte (presidiu a 235 execuções desde que foi eleito em 2000), recusou-se a fazer uso dos seus poderes e dar o adiamento de 30 dias pedido pela defesa de Buck, para dar tempo à investigação das alegações apresentadas ao Supremo. Esta decisão do Supremo foi comunicada já depois de Buck ter tomado o que julgava ser a sua última refeição: galinha frita com batatas fritas e salada de tomate, alface e pepino, molho picante e pimentos, maçãs, chá gelado e água. Tinha a execução, por injecção letal, marcada para as 18h (locais) de ontem, na prisão de Huntsville, no estado do Texas. “Valha-me Deus. Deus é grande. A misericórdia de Deus triunfa. Sinto-me bem”, afirmou o condenado após receber as notícias, de acordo com o Departamento de Justiça Criminal do Texas. Duane Buck foi condenado, em 1997, pelo duplo homicídio da ex-namorada, Debra Gardner, e um amigo desta, Kenneth Butler, ocorrido dois anos antes. Segundo os autos, Buck matou ambos a tiro com uma espingarda, uma semana após ter terminado a sua relação com Gardner, tendo forçado a sua entrada na casa da ex-namorada e morto ambos em frente dos filhos dela. A polícia testemunhou em tribunal que ao chegar ao local, Buck afirmou: “A puta teve o que merecia. ”
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave morte homens homicídio tribunal prisão morto
“Os filmes africanos não conseguem existir sem o interesse da Europa”
O Festival de Locarno seleccionou quatro projectos de cineastas africanos de língua portuguesa para apresentar no seu fórum de financiamento. Três observadores explicam porque é que, sem estes fóruns, talvez não possa existir um cinema africano. (...)

“Os filmes africanos não conseguem existir sem o interesse da Europa”
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 12 | Sentimento 0.0
DATA: 2014-05-20 | Jornal Público
SUMÁRIO: O Festival de Locarno seleccionou quatro projectos de cineastas africanos de língua portuguesa para apresentar no seu fórum de financiamento. Três observadores explicam porque é que, sem estes fóruns, talvez não possa existir um cinema africano.
TEXTO: Quatro filmes de cineastas africanos de língua portuguesa estão entre os doze projectos da África sub-saariana seleccionados para a edição 2014 do Open Doors, o fórum de financiamento do Festival de Locarno, que decorrerá em Agosto, em simultâneo com a 67ª edição do certame. Quatro longas-metragens que vão àquela cidade suíça ser apresentadas a potenciais parceiros de produção e financiamento, assinadas por nomes com créditos no cinema africano de língua portuguesa: as ficções Aleluia do angolano Zezé Gamboa, Heart and Fire do moçambicano Sol de Carvalho e Comboio de Sal e Açúcar do moçambicano Licínio de Azevedo, e o documentário do moçambicano Inadelso Cossa, Kula, uma Memória em Três Actos. E quatro filmes que, pela sua própria presença em Locarno, exemplificam a difícil sobrevivência das cinematografias de países exteriores aos circuitos tradicionais, e sobretudo de uma África onde as dificuldades do desenvolvimento social e político têm atirado a cultura para um papel secundário ou inexistente. Como diz Fernando Vendrell, realizador e produtor português cuja companhia David & Golias tem co-produzido regularmente cinema africano, “os países de onde estes cineastas vêm não têm políticas de cinema, o que faz que sofram de forma muito agressiva com a questão dos financiamentos. ” Fóruns como o Open Doors tornam-se, assim, na melhor – por vezes na única - oportunidade possível para conseguir montar projectos. Não é uma questão que afecte exclusivamente o cinema africano, mas afecta de modo particular as cinematografias “minoritárias” que são o foco central do Open Doors, como explica por telefone ao PÚBLICO a responsável da estrutura, Ananda Scepka. “Especializamo-nos nos países do sul e do leste, zonas que enfrentam desafios complicados mas que são interessantes precisamente por isso, por serem menos visíveis. ” O fórum, que tem como parceiro principal a Direcção para o Desenvolvimento e para a Cooperação do governo suíço, escolhe anualmente um máximo de doze projectos para apresentar a possíveis produtores e financiadores; um júri escolhe igualmente um projecto para receber 50 mil francos suíços (cerca de 40 mil euros). O foco na África sub-saariana em 2014 surge na sequência de um primeiro apoio em 2012 à África francófona – que coincidiu, aliás, com uma retracção da França, o país mais activo no financiamento estatal do cinema africano, com uma política de suporte e sustentação da francofonia de assinalável impacto. Foi das antigas colónias francesas, sustentadas por fundos entretanto descontinuados como o Fonds Sud Cinéma, que surgiu toda uma geração: do Senegal, Djibril Diop Mambéty e Ousmane Sembène; do Mali, Souleymane Cissé; do Burkina-Faso, Idrissa Ouédraougo – e mesmo cineastas dos PALOP, como o guineense Flora Gomes, beneficiaram com as estruturas francesas. Mas mesmo esta geração, que procurava fazer a ponte entre África e o “primeiro mundo” ocidental, não criou descendência. O mauritânio Abderrahmane Sissako pode continuar a filmar (Timbuktu está este ano na competição de Cannes, ver trailer), mas o único cineasta africano que tem mantido produção regular é o chadiano Mahamat Saleh Haroun – também ele graças a apoios franceses. Não há salas de cinemaKate Reidy, programadora e directora do festival suíço Black Movie, é peremptória: “Na maioria dos casos, os filmes africanos não conseguem ser feitos sem financiamento europeu. Precisam de interesse do Ocidente para existirem e serem divulgados. ” Atenta à produção do continente africano, a programadora australiana abre excepções para países que conseguiram criar estruturas quase industriais: a África do Sul, “que tem uma indústria e uma influência ocidental muito claras”, e a Nigéria, cuja produção “faça-você-mesmo” levou o país a ser conhecido como “Nollywood”, mas, feita exclusivamente a pensar no público local, é impossível de exportar. São as excepções num continente onde pensar em indústria de cinema ou política cultural pode ser utópico. Kate Reidy: “O que nos dizem os cineastas é que as condições de vida, de trabalho, de economia, são impossíveis. Não é que não queiram filmar; simplesmente não têm condições, não há apoios, e não há salas de cinema. ” O Black Movie, inicialmente dedicado exclusivamente ao cinema africano, abandonou essa abordagem já há vários anos para se tornar num festival de cinema independente global, porque “a produção [africana] deixou de ser suficiente e a qualidade foi declinando. Não havia filmes bons que chegassem”. Fernando Vendrell, que produziu O Herói de Zezé Gamboa (2004), um dos filmes africanos de língua portuguesa que fez melhor carreira internacional, aponta as contradições de um sistema de apoios que força os filmes a financiarem-se inteiramente no estrangeiro e, no processo, reforça o desinteresse dos países africanos. “Os fundos do Instituto do Cinema e Audiovisual [ICA] são muito importantes para o cinema africano de língua portuguesa, mas têm o efeito perverso de fazer com que os estados não se sintam responsáveis pelos filmes. Que ficam muitas vezes como património dos institutos de cinema locais, mas nem sempre tiveram o seu apoio. ”No caso português, o apoio ao cinema africano tem sido realizado ao abrigo de acordos de colaboração e co-produção com os países africanos de língua oficial portuguesa (PALOP), mas cuja visibilidade pública tem sido reduzida (actualmente, o ICA destina 500 mil euros às co-produções com “países de língua portuguesa”, abertas também ao Brasil). Muitas destas co-produções não chegaram às salas portuguesas - caso de O Grande Kilapy de Gamboa (David & Golias, 2012), de Por Aqui Tudo Bem da angolana Pocas Pascoal (LX Filmes, 2011, mostrado a concurso no IndieLisboa), ou do primeiro filme de Sol de Carvalho, O Jardim do Outro Homem (Fado Filmes, 2006). Quando chegam, o impacto tem sido inexistente – os casos mais recentes foram Virgem Margarida, de Licínio de Azevedo (Ukbar Filmes, 2012), ou A República di Mininus, de Flora Gomes (Filmes do Tejo, 2011), ambos estreados em 2013 perante a indiferença do público. Se é verdade que muitos destes são filmes de visível fragilidade artística, também é verdade que esbarram num mercado cuja formatação comercial não parece interessado em abrir-lhes espaço. Fernando Vendrell faz notar que muitas vezes o apoio ocidental a estes projectos se concentra no trabalho de pré-produção, desenvolvimento e rodagem, mas não abrange a difusão e distribuição. “Há muitas dificuldades de distribuição, filmes que não chegam a estrear nos seus próprios países. Mas alguns deles dão duas ou três vezes a volta ao mundo [no circuito de festivais], e acabam por ter um impacto internacional muito maior do que uma deslocação de uma comitiva a Washington. . . ”Vendrell evoca, de caminho, a incompreensão dos decisores ocidentais ao serem confrontados com estes filmes: uns exigem dos projectos africanos uma imagem turística vendável, de exotismo tribal, outros insistem em cadernos de encargos de cidadania e desenvolvimento que correm o risco de tornar os filmes em meros veículos de pedagogia social. Enquanto isso, as estruturas de produção que começam a surgir, por exemplo em Angola, acabam por se dirigir muito mais para uma dimensão televisiva que reproduz de modo mais ou menos linear os modelos ocidentais. Em Locarno, Ananda Scepka recusa quaisquer cadernos de encargos e define a escolha do comité de selecção Open Doors, que analisou este ano 190 projectos para reter apenas doze, como guiada pela “força artística” do projecto. Para além dos projectos dos PALOP, foram seleccionadas ainda obras da África do Sul, Etiópia, Gana, Uganda e Zâmbia. “Locarno apoia um certo tipo de cinema de autor, e o Open Doors insere-se inteiramente nessa visão, ” explica Scepka. “Contrariamente a outros fóruns, que exigem um mínimo de orçamento garantido, estamos abertos a projectos que ainda estejam em desenvolvimento. Alguns levam mais tempo do que outros, uns chegam a Locarno com o dinheiro quase fechado, para outros o financiamento começa aqui. Apoiamos obras que cremos serem capazes de encontrar exposição, mas quando as seleccionamos ainda está tudo por fazer. Não temos numerus clausus por países, nem escolhemos politicamente, mas como em todos os fóruns de co-produção temos que levar em conta se o projecto é realista e praticável. ”E apesar de todas as dificuldades, há uma razão para o foco do Open Doors estar este ano nesta parte do globo. “Sentimos que há uma nova geração muito dinâmica, que pega no touro pelos cornos, tem vontade de fazer coisas e procura os meios de as fazer. Já era o caso da África francófona, mas notámos uma grande actividade em muitos países, com pólos de atracção maior. ” Kate Reidy confirma: “Nos últimos quatro ou cinco anos tem havido filmes em regime de auto-produção, documentários feitos a uma escala extremamente pequena, mas que são por vezes de extraordinária qualidade. ” É por essa escala pequena que a programadora vê o futuro, mesmo admitindo que não é possível prevê-lo. “A economia mundial e a tecnologia estão a mudar tão depressa que isso tem uma influência muito grande no modo como o cinema se vai transformar e sobreviver. As fronteiras que existiam entre culturas nacionais estão a diluir-se, o modo como as pessoas contam histórias está a tornar-se cada vez mais difícil de definir. ”
REFERÊNCIAS: