Mais do que boa televisão, Girls foi uma boa dose de realidade
A série da HBO chega ao fim de domingo para segunda, às 3h, no TVSéries. (...)

Mais do que boa televisão, Girls foi uma boa dose de realidade
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 11 Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.633
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: A série da HBO chega ao fim de domingo para segunda, às 3h, no TVSéries.
TEXTO: “Acho que posso ser a voz da minha geração. Ou pelo menos a voz de uma geração”, declarava Lena Dunham na pele de Hannah, na estreia da aguardada série de televisão Girls, em Abril de 2012. Aquele que poderia ser apenas o grito de independência de uma personagem face às suas circunstâncias era também uma proposta ousada para romper com o olhar romantizado sobre o mundo feminino na televisão norte-americana e um convite para passar a vê-lo sem filtros em todas as suas dimensões. O último episódio de Girls, que tem estreia mundial de domingo para segunda, às 3h, no TVSéries (repete na quinta-feira às 23h), conclui seis temporadas da história de quatro amigas na casa dos 20 anos a tentar navegar o início da idade adulta em Nova Iorque. Tal como nota o New York Times, o ano de Girls foi também o ano de Veep, Scandal e The Mindy Project, três grandes séries encabeçadas por “mulheres complexas cujas problemáticas não eram criadas para fazê-las parecer adoráveis”. Só que nenhuma foi capaz de abrir caminho à discussão acesa, incómoda e controversa que viria a fazer de Girls um movimento — nunca chegou a afirmar-se como um êxito de audiências, mas conseguiu fidelizar uma geração que nela se via ao espelho. Os olhos estavam todos postos em Lena Dunham quando esta se propôs criar, escrever, produzir e protagonizar a série da HBO que, segundo a mesma, seria uma “espécie de Sexo e a Cidade mais próximo da realidade”. Jenni Konner, co-criadora e produtora da série, recordava em Fevereiro ao Guardian o momento em que Dunham se dirigiu aos responsáveis do canal para apontar a falta de diversidade na ficção norte-americana. “Não me vejo nem a mim nem às minhas amigas representadas na televisão”, terá dito a actriz. O seu desafio era mostrar que as batalhas de todas as mulheres deveriam ser igualmente validadas e celebradas, independentemente dos padrões de beleza popularizados pelos media. A estreia de Girls reuniu a opinião favorável da crítica, que elogiava o retrato arrojado e sincero de jovens mulheres com vulnerabilidades e imperfeições autênticas. Comparando-a ao brilho de Sexo e a Cidade, Tim Goodman notava no The Hollywood Reporter: “Girls é um caso muito mais lo-fi e enraízado no realismo e tira partido da honestidade das suas personagens para produzir uma comédia sólida e momentos dramáticos genuínos e emocionantes”. Já no Los Angeles Times, Mary McNamara classificou o visionamento da série como uma experiência mais intelectual do que emocional. “As personagens são imperfeitas e estão hiper-conscientes das suas imperfeições, as histórias prestam-se a todos os ângulos da sua auto-análise de tal forma que não há um papel real para o espectador”. No Vulture, Matt Zoller Seitz dizia que Girls era uma “sitcom rara sobre jovens mulheres que parecem pessoas reais (apesar de irritantes) em vez de caricaturas de sitcom”. A comparação com uma série tão icónica como Sexo e a Cidade é simultaneamente inevitável e indesejada. É verdade que a série de Lena Dunham também mostra quatro amigas em Nova Iorque (foi, aliás, a própria quem, inicialmente, indicou a história de Candace Bushnell como referência) mas a semelhança fica-se por aí. Girls dá voz a uma geração diferente, com relações, empregos e preocupações diferentes, e fá-lo através de um tom que se alinha mais com a comédia dramática que com a sitcom pura. “Gossip Girl falava de adolescentes que cresciam no Upper East Side e Sexo e a Cidade era sobre mulheres que se preocupavam com o trabalho e os amigos e que queriam construir uma família. Havia todo um espaço entre as duas [realidades] que ainda não tinha sido explorado”, atirou Dunham ao The Hollywood Reporter em 2012. A série mostra protótipos de millennials privilegiados, recém-formados e criados pela tecnologia — aparentemente preparados para tudo, menos para a ardilosa entrada na vida adulta. Afinal, a missão de Hannah (Lena Dunham), Marnie (Alison Williams), Jessa (Jemima Kirke) e Shoshanna (Zosia Mamet) ao longo das seis temporadas é tentar encontrar o rumo das suas carreiras e relações enquanto se encontram a si próprias. Girls serviu de plataforma ao tratamento de questões como a imagem, a auto-estima, o body shaming, o feminismo e a sexualidade. Mas o sexo foi retratado de forma muito particular — nunca foi politicamente correcto nem visualmente apelativo quando a narrativa exigia que fosse, em vez disso, embaraçoso, desconfortável e até, em alguns momentos, difícil de ver. O despudor com que Girls tratou a sexualidade da mulher é, de acordo com o New York Times, o seu grande legado. “A série não tornou o sexo fácil de ver porque não é fácil para as mulheres descobrirem-se como seres sexuais, terem autonomia e influência para determinar como querem exercer o seu feminismo e a sua sexualidade”. Em contraste com a imagem clean e sensual que Hollywood tanto prezava, em Girls havia barrigas às dobras, pernas com celulite, efeitos hormonais da menstruação e personagens caprichosas e privilegiadas. De acordo com o Washington Post, numa das últimas acções promocionais da série, elenco e produtores reafirmaram que nunca quiseram criar personagens que agradassem ao público, já que “a ideia de agradar a alguém é uma construção sexista antiga e frequentemente aplicada a personagens femininas, um fardo injusto na TV de hoje, que se alimenta de histórias sobre protagonistas complexas e moralmente desleais”. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Foi a série que falhou na frente da diversidade por predefinição ao focar a história de quatro raparigas brancas, uma realidade que foi criticada por não reflectir a demografia dos bairros de Brooklyn e de Nova Iorque. “Não faria outra série com quatro protagonistas brancas”, lamentou Lena Dunham à revista Nylon. Apesar disso, o debate ímpar que causou — sobretudo na Internet — transformou a dinâmica do panorama audiovisual. Com Girls a discussão passou a fazer-se de dentro para fora. “Passamos a perguntar-nos: o que é que isto diz sobre nós mesmos?”, nota o site Uproxx, que adjectiva a série como um “programa do século XXI que muita gente só viveu através de thinkpieces, ou seja, ensaios que partem de material de fundo para, com alguma opinião pessoal, fazer uma análise dos factos. (O próximo parágrafo que pode conter spoilers da sexta temporada. )O passar dos anos ensinou a Hannah, Marnie, Jessa e Shoshanna que, na verdade, nenhum adulto controla tanto a sua vida como parece controlar. No penúltimo episódio, vimos Hannah a deixar Nova Iorque para tomar as rédeas da sua vida enquanto futura mãe solteira e preparar-se para ser professora universitária. Seria ingénuo esperar um típico final feliz de uma série que sempre glorificou o caos. Afinal, a vulnerabilidade e a insegurança são uma verdade indissociável do crescimento.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave mulher sexo espécie mulheres sexualidade feminismo
A faz-tudo a quem só falta uma coisa: transformar Lisboa numa cidade comestível
Adriana Freire criou a Cozinha Popular da Mouraria, um projecto social, em 2012. Não é bem um restaurante nem um "projecto de caridade". “Queremos mudar a vida às pessoas, mas ensinando-as e puxando-as para aqui.” Apesar de “não ser fácil”, a associação não dá sinais de abrandar. Depois do quiosque, das hortas e das frutas, prepara-se para abrir uma escola e plantar uma cidade. (...)

A faz-tudo a quem só falta uma coisa: transformar Lisboa numa cidade comestível
MINORIA(S): Migrantes Pontuação: 6 Mulheres Pontuação: 2 Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-07-21 | Jornal Público
SUMÁRIO: Adriana Freire criou a Cozinha Popular da Mouraria, um projecto social, em 2012. Não é bem um restaurante nem um "projecto de caridade". “Queremos mudar a vida às pessoas, mas ensinando-as e puxando-as para aqui.” Apesar de “não ser fácil”, a associação não dá sinais de abrandar. Depois do quiosque, das hortas e das frutas, prepara-se para abrir uma escola e plantar uma cidade.
TEXTO: Completou 60 anos há duas semanas e celebrou-os como mais gosta: mesas fartas de petiscos e a casa recheada de amigos. A gastronomia é para Adriana Freire uma paixão de criança – e é nela que o percurso profissional tem tantas vezes desembocado. Na fotografia, na edição de livros, na criação da Cozinha Popular da Mouraria ou, mais recentemente, na luta por uma cidade que seja capaz de se alimentar a si própria. Diz ter começado a cozinhar aos oito anos: fazia “bolos em tachinhos para os baptizados das bonecas”. Mas é a comunhão intrépida à mesa, que invejava nas famílias grandes dos amigos de infância, que a atrai desde sempre no mundo da comida. O ambiente de festa, o barulho, a confusão. A partilha. Ainda que ultimamente mal tenha tempo para comer em casa ou preparar jantaradas, a despensa mantém-se recheada. “Dá-me um certo conforto, acho que me equilibra um bocadinho. ”É no terraço da Cozinha Popular da Mouraria que nos encontramos com Adriana, ao início de uma tarde a meio da semana. Lá dentro, Idália, figura já icónica da casa, vai dando arrumo ao fim dos almoços, enquanto numa das mesas se discute uma nova viagem no prato, um programa de jantares especiais dedicados às gastronomias do mundo. Entre refeições, a Cozinha Popular da Mouraria parece agora adormecida numa penumbra quente e silenciosa, mas foi aquele velho prazer de “ter muita gente à mesa” que esteve na origem do projecto social, em 2012. A gastronomia, acrescenta, está também “muito ligada às memórias e aos afectos”, pormenor “transversal a todas as culturas e línguas”. E Adriana queria ter uma casa cheia que ajudasse a dar rumo à diversidade do bairro que a acolheu há mais de 30 anos: os históricos da Mouraria e as novas comunidades emigrantes, os velhos e os novos, os pobres e os ricos. “Já tivemos situações incríveis em que as pessoas mais improváveis de se aproximarem acabaram a experimentar os pratos uns dos outros”, conta. “Há maior prazer do que provocar isso?”Ao fim de cinco anos e meio, o projecto continua a crescer. “Estou cá para manter a alma, mas temos de ser cada vez mais profissionais e evoluir na vertente de negócio. ” Reconhece que só assim conseguirão “agregar mais pessoas nesta família”. Gente do bairro que quer lançar-se no sector e precisa de uma mão. E gente de fora que, ao vir jantar, “contribui para que seja possível mudar a vida de outros”. A Cozinha Popular da Mouraria não é bem um restaurante nem um “projecto de caridade”. É mais do que isso. “Queremos mudar a vida às pessoas, mas ensinando-as e puxando-as para aqui. ” Apesar de “não ser fácil”, a associação não dá sinais de abrandar. Depois do quiosque, das hortas e das frutas, prepara-se para abrir uma escola e plantar uma cidade. Adriana é assim mesmo: nunca consegue parar quieta muito tempo. Há sempre mais uma ideia, um projecto, um desafio, uma arte a que atirar as mãos e experimentar. Nas Caldas da Rainha, onde nasceu, o Museu José Malhoa foi como uma segunda casa. Pintou, fez teatro de fantoches, barro. Lembra-se de jogar às escondidas com os guardas. “O óleo dos quadros ainda está entranhado nas minhas memórias de infância”, recorda. Quando a família se mudou para Torres Vedras, tinha Adriana 12 anos, a pintura e as artes manuais deram lugar ao cinema e à fotografia. Passou a estar sempre metida no cineclube, onde via os filmes de Fellini, Pasolini, Bergman, dos realizadores franceses da época. Talvez não tenha percebido “metade das coisas” na altura, admite, mas reconhece-lhes inspiração: “A minha grande escola visual foi o cinema. ” As fotografias eram enquadradas na mente como uma sequência em película, conta, desenhando um travelling com os dedos. Só os livros, dirá, ganham aos filmes: as palavras ainda deixam quase tudo por imaginar. Mas voltemos à adolescência, Adriana. Entretanto, contava, dá-se o 25 de Abril e as aulas tornam-se insignificantes perante a revolução que se está a viver no país. De repente, havia uma convulsão de novas possibilidades culturais para organizar na associação de estudantes. O grupo correu as embaixadas estrangeiras a pedir filmes para um ciclo de cinema de animação. Fizeram uma exposição de fotografia onde Adriana apresentou as primeiras imagens. Andava “danadinha” por vir para Lisboa. “Soube que havia um exame de admissão à [escola] António Arroio e foi assim que consegui vir mais depressa”, recorda. Ainda foi professora de Educação Visual em Alcobaça. Até o bichinho da capital voltar a atacar. Era o auge dos anos 1980. “Estava tudo a acontecer em Lisboa” e ela sentia-se “completamente fora do processo. ” Era novamente a fome da confusão, do arregaçar as mangas e fazer coisas novas, sempre diferentes. “Com a idade uma pessoa vai pensando um bocadinho naquilo que é e cheguei à conclusão que tenho um pavor imenso ao tédio e à normalidade”, diz às tantas. Sempre que chega a um sítio tem tendência a “interferir no ambiente”. Mexe na iluminação, traz flores, põe música, muda objectos de estante. E nada lhe dá mais “pica” do que “começar alguma coisa do zero”. Enche inúmeros “caderninhos” de ideias e sonhos que depois acaba quase sempre por perder, esquecida do lugar onde os guarda, diz a rir. Mas muitos planos ficam por ali a remoer, a pairar num futuro que nunca chega para tanta coisa. É assim que, aos 30, Adriana regressa a Lisboa para se reinventar como fotógrafa, recuperando a paixão da adolescência. Tinha “uns amigos que conheciam o Álvaro Rosendo”, da Galeria Monumental, e ela foi oferecer-se para ser assistente dele, recorda. Passou uns “bons tempos” a fazer provas de contacto até que começaram a “achar graça” às fotos dela. Lançava-se numa altura em que os fotógrafos ainda eram “reconhecidos e bem pagos”. Um trabalho levava a outro. Foi assim que chegou à revista Marie Claire, anos mais tarde, onde publicou as primeiras fotografias de gastronomia - e os primeiros textos, ainda com o pseudónimo Clara Castelo. “Tinha a mania que sabia um bocadinho [da área] porque tinha os livros da Maria de Lourdes Modesto e do Pantagruel, que eram as minhas bíblias”, ri-se. Mas tinha “vergonha” de assinar os textos porque quem gosta de ler, “sabe o que é escrever”. E aquilo que ela fazia, acreditava, não chegava ao patamar nobre do verbo. O percurso profissional chegava cada vez mais perto da mesa. Foi acompanhando o trabalho de vários chefs e restaurantes ao longo de décadas. Alguns tornaram-se amigos e têm dado um contributo importante na associação, liderando aulas e jantares especiais ou conseguindo equipamento para a cozinha. Entretanto, Adriana tinha ficado com vontade de fazer livros de cozinha. “Andei a chatear o Gonçalo Bulhosa, que estava a criar a Oficina do Livro, e o Hermínio Monteiro, da Assírio&Alvim. ” Quatro anos depois a insistência dava frutos: chegou o convite para fazer a fotografia e edição d’A Minha Cozinha, de Helena Sacadura Cabral. Depois os livros de receitas de João Carlos Silva, apresentador do programa de culinária Na Roça com os Tachos. Chegou a colher retalhos de roupa de Rui Reininho e digitalizar para compor a capa de um dos livros do vocalista dos GNR. “Cada livro era um desafio e divertia-me imenso. ” Foi por muito pouco que, anos mais tarde, não lançou uma editora especializada em gastronomia. O objecto-livro é algo de que sempre gostou muito. É-lhe difícil entrar num alfarrabista sem se perder. Chega a comprá-los só pelo papel, pelo grafismo, pela capa ou outro elemento que os torne “especiais”. Principalmente os antigos, porque as publicações modernas, confessa, tendem a desiludi-la. “A edição virou quase uma caixa de bombons”, lamenta. A capa tem de sobressair na estante e a impressão ser o mais barata possível. “Até os livros de cozinha já quase deixei de comprar. Já não aguento, toda a gente publicou um. ” A colecção que entretanto foi fazendo chega, no entanto, para preencher uma parede da sala e o próximo passo é com ela criar uma biblioteca especializada no novo espaço da Cozinha Popular da Mouraria, que há-de abrir aqui mesmo em frente. No rés-do-chão que já se adivinha entre as obras Adriana quer abrir uma escola ligada à gastronomia. Mais cedo ou mais tarde, era aí que o projecto teria de ir dar porque, acredita, “só a educação muda o mundo”. Quer disponibilizar cursos para graúdos, para continuar a dar oportunidade a quem quer seguir cozinha e não tem meios para isso, mas pensa cada vez mais nas crianças. É com elas que mais quer trabalhar. “Vejo-as no Jardim da Cerca da Graça a jogar à bola com laranjas ainda verdes. No dia em que elas plantarem uma laranjeira e virem o tempo que leva a crescer e a dar a primeira laranja, não vão olhar para a árvore da mesma maneira. ”Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. É lá fora, entre os frutos e as hortas da cidade, que se trilha ultimamente a motivação de Adriana. Há algum tempo que não fotografa. Não que lhe falte vontade ou ideias. Mas toda a energia está agora alocada na associação. “O meu trabalho é a minha vida”, diz, para justificar um percurso sem interruptores que intercalem o lado pessoal e o profissional. “Qualquer projecto que tenha em mãos é vivido intensamente. ” Está num outro processo onde a fotografia não cabe. “Acho que o meu papel agora é conquistar território”, ri-se. É essa a sua próxima luta: “transformar Lisboa numa cidade comestível”. A iniciativa Muita Fruta – que colhe e transforma os frutos das árvores da cidade – é o primeiro passo. Mas Adriana quer ir mais longe. Quer que se aposte na agricultura urbana e se repensem os espaços públicos. Porque é que os jardins hão-de ter canteiros e relvados que não se podem pisar? Porque não podem conviver flores e frutas e hortaliças e pessoas estendidas ao sol? No fundo, diz, quer transformar “as cidades em casas”. Em espaços que “façam parte da vida das pessoas”, de que elas se apropriem e “sintam como seus”. É isso que quer deixar como legado. “Tenho este problema de achar que tenho de deixar alguma coisa feita, por muito pouco que seja – e eu estou a fazer pouquíssimo. Mas acho que cada um de nós deve acrescentar alguma coisa para os outros usufruírem a seguir. ” Nem que seja uma mesa repleta de iguarias com alma e esperança num futuro diferente. Ou um jardim que se pode fruir e comerPorcarias [ri-se]. Torradas com manteiga são das melhores coisas que podem dar-me na vida. Não sei, não tenho nenhum prato preferido. Gosto de comer coisas que me fiquem na memória. Porque não é só o prato, é também o que o envolve. A açorda que comemos no Alentejo não sabe igual quando a recriamos em casa. É o comer algo local, no local, com os produtos locais, feito pelos locais. Uma Disneylândia. Com os turistas a virem cá ver as duas ou três pessoas que ficaram. Viajar é fundamental, devia ser obrigatório na escola, mas o turismo de massas estraga tudo. São os turistas que ficam na bicha do 28 à torreira do sol que matam a vida da cidade. Se calhar vão existir mais casas vazias, prédios sem ninguém e será cada vez mais um bairro fantasma. Mas a Mouraria sempre foi um bairro de excluídos. E essa cultura é importante, essas pessoas são importantes. E esse lado continuará a existir, pelo menos enquanto a Cozinha existir, porque há-de integrá-las sempre e tentar manter a família que é este bairro. Há um livro que descobri já depois dos 30 anos, Sinais de Fogo [de Jorge de Sena], que acho ser um retrato excelente da sociedade portuguesa, muito bem escrito. Esse livro bateu-me, não sei se por também ter vivido na província ou porque o li na altura certa. Depois, entre os livros de cozinha, tenho uma coisa fantástica do Vítor Sobral há anos, de uma colecçãozinha da Editorial Notícias. Chama-se Sabores, como combinar alimentos. É pequeno, mas muito prático e extremamente útil, tem a papinha feita. O Vítor Sobral foi pioneiro em pegar nos ingredientes portugueses e fazer alguma coisa deles. E cozinha, de facto, muito bem.
REFERÊNCIAS:
Uma história de exílio
Tendo como cenário a América do século XIX, Sebastian Barry continua a sua indagação sobre a identidade de uma família irlandesa. (...)

Uma história de exílio
MINORIA(S): Migrantes Pontuação: 6 Mulheres Pontuação: 2 Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-06-02 | Jornal Público
SUMÁRIO: Tendo como cenário a América do século XIX, Sebastian Barry continua a sua indagação sobre a identidade de uma família irlandesa.
TEXTO: Em Dias Sem Fim — vencedor do importante Costa Award — o escritor irlandês Sebastian Barry (n. 1955) continua a contar a história da família McNulty — familiares de outras gerações já surgiram em romances anteriores, nomeadamente em Escritos Secretos e em A História de Eneas (Bertrand, 2009 e 2010, respectivamente) — mas desta vez recua ao século XIX e à época da Grande Fome na Irlanda, e escolhe o cenário da guerra americana e do massacre dos índios, mas sempre com a vontade de indagar a identidade irlandesa. Thomas McNulty, a personagem principal e narrador deste romance, alistou-se no exército norte-americano em 1851, com dezassete anos de idade. Chegara da Irlanda havia quatro anos. Viajara sem familiares num barco de emigrantes (“os pobres, os destruídos e os famintos”), durante seis semanas, com destino ao Canadá. Filho de gente pobre de Sligo, vinha de uma família arruinada (o pai era exportador de manteiga para Inglaterra), que morrera nos anos da fome, e à qual apenas ele sobrevivera. “A fome é uma espécie de incêndio, uma fornalha. ” De certa forma escorraçado da sua terra natal, Thomas começa a sua deambulação em busca de uma redenção que talvez nunca chegue. Durante dois anos (antes de se alistar no exército) trabalha, com o seu inseparável amigo John Cole (bisneto de uma índia americana), como dançarino travestido num bar de mineiros; eles eram as únicas ‘raparigas’ no lugar de Daggsville. Mas o passado nunca deixa de ser um terreno minado, porque o passado afinal ainda não passou. O que se segue é uma longa história de exílio, dias de terríveis agruras, de horrores, de perigos, mas também de espanto e vida. Autoria:Sebastian Barry (Trad. de Patrícia Xavier) Bertrand Ler excertoSubscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Sebastian Barry, três vezes nomeado para o Booker Prize — primeiro com A Long Long Way (1995), depois com o belíssimo Escritos Secretos (2009), e a última, em 2011, com Do Lado de Canaã (Bertrand, 2012) — para além de romancista, é também um prolífico dramaturgo e poeta. O lirismo da sua prosa, o estilo elegíaco, e a exactidão poética, associados ao cuidado de atento ourives com que urde as tramas das suas histórias, fazem de Barry um dos mais talentosos autores de língua inglesa da sua geração. Esse virtuosismo é bem notório em Dias Sem Fim, um romance que apesar de ter a América como cenário, não deixa de se remeter para a Irlanda do atribulado Eneas McNulty (a personagem de A História de Eneas, que tinha lugar nos começos do século XX), o mesmo país deste Thomas que emigra, também ele nascido no lugar de Sligo, na Irlanda rural dos “velhos muros sombrios” e das “azinhagas assombradas”. A vida desta espécie de anti-heróis irlandeses, começa sempre de maneira conturbada, como se o destino quisesse que logo bastante novos eles vivam numa espécie de “lado errado” da História e das atribulações dos tempos, com o destino sempre a dificultar. Como num jogo de espelhos, Sebastian Barry serve-se, mais uma vez, de um anti-herói (em jeito de pícaro moderno) para nos mostrar como a história da Irlanda, de maneira maligna, se insinua e pode perturbar e alastrar como uma mancha na vida dos irlandeses quando estes menos esperam. “Reconhece-se um irlandês porque ele o tem escrito na cara. Fala de um modo diferente e não tem muito jeito para cortes de cabelo, e quando bebe, um irlandês não se parece com nenhum outro ser humano. Não me digam que o irlandês é um exemplo de humanidade civilizada. ”Em Dias Sem Fim há um mundo interior que não se mistura com o horror por que passam os protagonistas, esse mundo calmo e quase sagrado tão característico das personagens dos romances de Barry. Curiosamente, neste livro é esse mundo que salva os dois homens, pois numa época como a que viveram, conseguiram como que isolar-se dela e viver o espanto da vida no meio dos terríveis perigos que enfrentam; é assim que Barry nos apresenta o modo como viveram a homosexualidade e a ‘adopção’ de uma menina índia Sioux que tentam salvar a todo o custo. Mais uma vez, o que fascina em Barry é o minucioso trabalho de escrita, a capacidade de descrever tudo intensamente e de maneira bastante visual, ao mesmo tempo que a história vai montando a sua teia diante do leitor.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave homens guerra filho fome espécie homosexualidade
Já se pode espreitar o biopic de Morrissey
Um trailer de dois minutos abre o véu sobre o aguardado England Is Mine, centrado no início de carreira do carismático vocalista dos Smiths. (...)

Já se pode espreitar o biopic de Morrissey
MINORIA(S): Migrantes Pontuação: 6 Mulheres Pontuação: 2 Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-07-01 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20170701170612/http://publico.pt/1777545
SUMÁRIO: Um trailer de dois minutos abre o véu sobre o aguardado England Is Mine, centrado no início de carreira do carismático vocalista dos Smiths.
TEXTO: England Is Mine, o biopic de Mark Gill que acompanha a adolescência e juventude de Morrissey, o icónico vocalista dos Smiths, na Manchester dos anos 70, só chegará às salas de cinema inglesas a 4 de Agosto, mas já há um breve trailer do filme para abrir o apetite. Um dos produtores, Orian Williams, que já participara na produção de Control, biopic do malogrado líder dos Joy Division, Ian Curtis, revelou que England Is Mine termina quando Morrissey conhece Johnny Marr, um encontro que dará origem àquela que muitos consideram a melhor banda dos anos 80, The Smiths. Com argumento do próprio Mark Gill e de William Thacker, o filme, que se estreia este domingo, 2 de Julho, no Festival de Cinema de Edimburgo, é protagonizado por Jack Lowden, que encarna o jovem Morrissey. Conhecido pela sua participação na mini-série Guerra e Paz, da BBC, Lowden contracenará com Jessica Brown Findlay, a Sybil Crawley da série televisiva Downton Abbey, que interpreta a melhor amiga do músico, Linder Sterling, e Laurie Kynaston, escolhido para o papel de Johnny Marr. Inicialmente intitulado Steven – o nome de baptismo do ex-líder dos Smiths é Steven Patrick Morrissey –, o filme é a história do triunfo de um adolescente deprimido na Manchester dos anos 70 que se torna uma das mais talentosas e carismáticas estrelas da música pop. Quando o projecto ainda dava os primeiros passos, Mark Gill assumiu que England Is Mine, a sua primeira longa-metragem (foi nomeado para um Óscar pela curta The Voorman Problem, de 2011), seria “uma carta de amor” ao cantor e compositor, e prometeu um filme “tão dirigido ao público em geral como aos fãs incondicionais de Morrissey”. Um desígnio não muito fácil de alcançar, tratando-se de uma personalidade tão idiossincrática e tão pouco consensual. Do seu vegetarianismo militante à sua bissexualidade (ele prefere chamar-lhe “humanossexualidade”: “sou atraído por humanos, mas, claro, não por muitos”) –, das suas críticas à família real britânica às suas disputas legais com Mike Joyce, o baterista dos Smiths, a vida pessoal e as polémicas de Morrissey têm alimentado generosamente as páginas dos jornais. Mark Gill também sugeriu que o filme iria mostrar que o intérprete de Heaven Knows I’m Miserable Now é, na verdade, um homem divertido, apesar do seu historial de depressões e da sua reconhecida visão amarga da vida. Muitas páginas da autobiografia que Morrissey publicou em 2013 confirmam esse seu humor contido, a começar pela passagem em que descreve a sua vinda ao mundo: “Claro que o meu nascimento quase matou a minha mãe, uma vez que a minha cabeça é demasiado grande”. Filho de um casal de irlandeses que emigrara de Dublin para Manchester pouco antes de ele nascer, Morrissey passou a infância num bairro operário e tinha 17 anos quando começou a tomar anti-depressivos, por prescrição médica. Atraído desde muito novo para a música, mas também (a mãe era bibliotecária) para a literatura, Morrissey iria tornar-se não apenas um talentoso compositor e cantor, mas também um dos mais brilhantes letristas de sempre. England Is Mine apanha-o no momento em que se evade do seu quotidiano solitário e tristonho mergulhando na explosão de música punk que então eclodia em Manchester. Vocalista do grupo Nosebleeds no final dos anos 70, colaborou ainda efemeramente com os Slaughter & The Dogs. Foi neste meio que conheceu a artista plástica, cantora e performer Linda Sterling, fundadora da banda de punk-jazz Ludus, que se tornaria a sua amiga mais íntima. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Durante algum tempo, Morrissey ainda manteve uma carreira paralela de crítico de música e cinema, e chegou mesmo a publicar um pequeno livro sobre a banda punk americana The New York Dolls, uma das suas grandes influências, e outro dedicado ao actor James Dean. Em Agosto de 1978, então com 19 anos, foi apresentado a um rapaz de 14, Johnny Marr, durante um concerto de Patti Smith no Apollo Theatre de Manchester. Quatro anos depois, Marr apareceu-lhe em casa a perguntar-lhe se não estaria interessado em criar uma banda com ele. O trailer de England Is Mine termina precisamente com Morrissey a abrir a porta a Marr. A banda, já se sabe, veio a chamar-se The Smiths e lançou quatro álbuns que marcaram a música pop dos anos 80: The Smiths (1984), Meat Is Murder (1985), The Queen Is Dead (1986) – que a revista de música NME considerou, em 2013, o melhor álbum de todos os tempos – e Strangeways, Here We Come, de 1987. Nesse ano, os dois fundadores desentendem-se, os Smiths acabam e Morrissey estreia-se a solo com Viva Hate (1988), início de uma discografia pós-Smiths que já vai em dez álbuns. Mas essa a história que o filme de Mark Gill já não conta.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave guerra humanos filho homem adolescente cantora vegetarianismo
Os finlandeses querem que os filhos sejam professores
A Finlândia surge sistematicamente no topo dos estudos PISA, em que tri-anualmente a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) examina as capacidades dos alunos de 15 anos em Ciência, Matemática e Leitura. O investigador finlandês Jouni Välijärvi surgiu numa sala apinhada de professores portugueses, num encontro organizado pelo Ministério da Educação na quarta-feira, em Lisboa, no papel de mestre a quem pedem que ensine "como se faz". No fundo, queriam saber o que é a Finlândia tem de especial? Välijärvi, director do Instituto Finlandês para a Investigação em Educação, na Universidade de Jyväskylä, explica que muito está na base, no ensino primário, onde um professor motivado e bem preparado acompanha os alunos durante seis anos. (...)

Os finlandeses querem que os filhos sejam professores
MINORIA(S): Migrantes Pontuação: 6 Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2011-05-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: A Finlândia surge sistematicamente no topo dos estudos PISA, em que tri-anualmente a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) examina as capacidades dos alunos de 15 anos em Ciência, Matemática e Leitura. O investigador finlandês Jouni Välijärvi surgiu numa sala apinhada de professores portugueses, num encontro organizado pelo Ministério da Educação na quarta-feira, em Lisboa, no papel de mestre a quem pedem que ensine "como se faz". No fundo, queriam saber o que é a Finlândia tem de especial? Välijärvi, director do Instituto Finlandês para a Investigação em Educação, na Universidade de Jyväskylä, explica que muito está na base, no ensino primário, onde um professor motivado e bem preparado acompanha os alunos durante seis anos.
TEXTO: Defende que um dos segredos do sucesso finlandês é a qualidade do ensino primário. Por que é que os professores da primária têm tanta popularidade? Tem muito a ver com a nossa história. A Finlândia só é independente há 100 anos e os professores primários eram colocados por todo o país para espalhar a identidade nacional. É umas razões que explicam uma popularidade tão alta. Ser professor primário é tão prestigiado como ser médico ou advogado: os pais querem que os filhos sejam professores primários e, quando perguntam aos miúdos que acabaram o secundário que carreira querem seguir, a profissão surge nos dois primeiros lugares. E muitos dos que têm essa ambição não a conseguem alcançar, porque é muito difícil entrar para o curso. A popularidade estende-se aos professores do secundário? Depende das áreas. No secundário, muitas vezes ir para professor não é uma primeira escolha, é um recurso, e isso tem reflexos na motivação dos professores e na aprendizagem. Por que é que ser professor primário é tão apelativo? Uma das coisas mais importantes é a autonomia, em que cada professor organiza o trabalho como entende, por isso a questão da avaliação é muito sensível. As aulas estão muito fechadas sobre si mesmas, o que é uma força do sistema mas também uma fraqueza. Mas o facto é que os pais confiam nos professores e nas escolas. Na Finlândia, o ensino primário prolonga-se por seis anos, as crianças ficam durante este período com o mesmo professor. Isso é importante? Sim, é a base de tudo. Costuma ser um professor que trabalha com eles ao longo dos seis anos, mas há escolas que dividem os anos por dois professores e pode haver outros professores que ajudam nalgumas matérias, por exemplo, em Matemática ou Desporto. Fica ao critério da escola. Os poucos chumbos que existem são na primária. . . Analisando os alunos do 9. º ano, constata-se que só 2, 6 por cento chumbaram e a grande maioria foi na primária. É mais eficaz reter um aluno um ano no início do que este ter que repetir um ano mais tarde, porque é uma altura em que estão a ser dadas as bases. Os professores finlandeses têm expectativas muito altas em termos académicos, incluindo os primários, mais até do que noutros países nórdicos. Por exemplo, na Dinamarca o ensino está mais centrado no bem-estar e felicidade das crianças do que nos resultados académicos. O modelo finlandês mistura os dois factores, preocupa-se com a felicidade e com a parte cognitiva, o que se traduz na aquisição de certos níveis na Escrita, Leitura e Matemática, algo que também já é importante na pré-primária. O que faz com que um professor seja bom? Perguntámos isso a alunos e concluímos que é quando sentem que percebe do tema que ensina e também, e este aspecto é interessante, quando sentem que se interessa por eles e está disposto a ter conversas que lhes dizem algo e que não têm necessariamente a ver com a cadeira que lecciona. Questões como a sexualidade? Sim, mas também quando o professor os ajuda a escolher o caminho que vão seguir, que está disposto a discutir com eles o porquê das suas escolhas. As escolas finlandesas têm turmas pequenas. Este poderá ser outro factor de sucesso? São pequenas e os professores defendem que devem ser ainda mais pequenas. Eu sou céptico em relação à utilidade de reduzir as turmas. Actualmente, na primária, em média, temos 21 alunos por turma, no secundário 19. Eu acho que não é possível chegar a um número óptimo, que a dimensão das turmas deve depender dos alunos, do que se ensina. Até porque ter turmas mais pequenas significa ter mais professores e isso implica aumentar gastos. Penso que o dinheiro pode ser usado para criar mais apoios de acordo com o contexto de cada escola: há escolas em que 15 por cento são imigrantes.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave escola ajuda sexualidade
Ana Gomes dá a cara pelos "Monólogos da Vagina"
Nove deputadas europeias de várias nacionalidades, incluindo a socialista portuguesa Ana Gomes, representaram na noite desta terça-feira a peça "Monólogos da Vagina" no quadro de uma campanha mundial de alerta e mobilização contra a violência sobre as mulheres. (...)

Ana Gomes dá a cara pelos "Monólogos da Vagina"
MINORIA(S): Homossexuais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 9 | Sentimento 0.0
DATA: 2012-03-07 | Jornal Público
SUMÁRIO: Nove deputadas europeias de várias nacionalidades, incluindo a socialista portuguesa Ana Gomes, representaram na noite desta terça-feira a peça "Monólogos da Vagina" no quadro de uma campanha mundial de alerta e mobilização contra a violência sobre as mulheres.
TEXTO: Com muito humor mas sobretudo muita emoção, as nove deputadas - originárias de Portugal, França, Bélgica, Alemanha, Holanda, Áustria, Suécia, Finlândia e Roménia - partilharam entre si os textos da célebre peça da americana Eve Ensler, escrita a partir de entrevistas a mais de 200 mulheres sobre os diferentes aspectos da sua sexualidade. Desde a sua primeira representação em 1996, a peça já foi representada em mais de 40 países e traduzida para 35 línguas. A ideia de representar a peça no Parlamento Europeu partiu de duas deputadas - a conservadora finlandesa Sirpa Pietikäänen e a verde alemã Franziska Brantner - que há pouco mais de um mês desafiaram todas as eleitas do PE a associarem-se ao projecto. Sete deputadas responderam ao convite - três verdes, duas conservadoras, duas liberais, uma socialista e uma comunista. Eve Ensler, que acompanhou pessoalmente todo o processo de preparação da peça e os escassos ensaios, adaptou alguns textos à actualidade - nomeadamente para alertar para as violações em massa que continuam a acontecer no Congo. No final da representação perante uma sala à cunha e que ovacionou de pé as "actrizes", Ensler felicitou-as calorosamente enquanto "mulheres corajosas, brilhantes e visionárias". A representação destinou-se a lançar "um alerta para a violência feita contra as mulheres do mundo inteiro, da violação - incluindo enquanto arma de guerra - à mutilação genital feminina, passando pela violência doméstica", afirmou no final Ana Gomes aos jornalistas. A deputada admitiu que "gostava muito de a ver representada no parlamento português" - tal como já aconteceu nos parlamentos inglês e filipino, segundo disse - o que considerou aliás "muito apropriado, de modo a que o próximo 8 de Março não sirva só para as habituais declarações bem intencionadas ou hipócritas sobre a necessidade de combater a violência e a discriminação contra as mulheres". Ana Gomes disse ainda que a iniciativa de hoje gerou uma nova dinâmica entre as nove deputadas, que pretendem constituir um "núcleo para dar mais visibilidade às questões da violência contra as mulheres". A mobilização vai manter-se pelo menos até à celebração do "dia V" - V-Day - previsto por Eve Ensler para 14 de Fevereiro de 2013 em que é suposto mulheres e homens de todos o mundo descerem à rua para dançar exigindo o fim da violência contra as mulheres.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave homens guerra violência violação mulheres doméstica sexualidade feminina discriminação
Morreu David Bowie, um dos maiores ícones da cultura popular
Músico britânico tinha 69 anos. A sua influência está em todo o lado: na música, na cultura visual, na moda, nos estilos de vida. Morreu uma lenda. (...)

Morreu David Bowie, um dos maiores ícones da cultura popular
MINORIA(S): Homossexuais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 6 | Sentimento 0.8
DATA: 2016-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: Músico britânico tinha 69 anos. A sua influência está em todo o lado: na música, na cultura visual, na moda, nos estilos de vida. Morreu uma lenda.
TEXTO: O choque. A morte é-o sempre, mas nas circunstâncias actuais foi-o mais. Ninguém sabia publicamente que estava doente. E na última sexta-feira, dia do seu aniversário, tinha acabado de lançar um novo álbum que parecia um recomeço. É verdade que o mistério e a surpresa sempre fizeram parte dele. Esta era, porém, a notícia que ninguém desejava. O músico britânico David Bowie, uma das maiores celebridades da cultura popular, morreu na madrugada desta segunda-feira, aos 69 anos, em Nova Iorque, onde estava radicado há anos. A notícia foi divulgada na sua página oficial do Facebook e do Twitter. O seu publicista, Steve Martin, confirmou a morte ao canal Sky News. "10 de Janeiro de 2016: David Bowie morreu tranquilamente hoje, rodeado pela sua família, após uma corajosa batalha contra o cancro durante 18 meses", referia a nota publicada nas redes sociais, cerca das 6h30. "Muitos de vós partilham esta perda, mas pedimos que respeitem a privacidade da família durante o tempo do luto", completa a nota. Era músico, cantor, compositor ou letrista, mas acima de tudo era um artista total, alguém que foi capaz de compreender antes de todos que o rock era também a possibilidade de afirmar um novo universo cultural, um outro imaginário, renovadas formas de ser e de existir. E foi-o até ao fim. Blackstar, o álbum com que (sabemos agora) escolheu despedir-se, estava a ser bem acolhido. No PÚBLICO, descrevemo-lo como um disco ousado ou inspirado pelo jazz. É uma obra inquietante e negra, povoada por personagens bizarros e música intensa, onde por vezes parece reflectir sobre si próprio e outras sobre a angústia do presente, numa obra em aberto com muitas possibilidades de decifração. No vídeoclipe para a canção Lazarus (nome do musical co-escrito por Bowie e pelo dramaturgo irlandês Enda Walsh que se encontra em cena na Broadway), realizado por Johan Renck, surge magro e envelhecido, deitado numa cama de hospital, começando por cantar: "Look up here, I'm in heaven/ I've got scars, that can't be seen/ I've got drama, can't be stolen/ Everybody knows me now. " Naturalmente, agora, mais do que uma canção ou um vídeo premonitório, pode ter-se a leitura de que a totalidade do álbum era quase um testamento, uma espécie de carta de despedida. Já esta segunda-feira, o produtor Tony Visconti, seu colaborador desde os anos 1960, publicou no Facebook uma nota que atribui sentido a essa leitura, dando a entender que sabia da morte iminente. "Fez sempre o que quis", escreveu. "Queria fazer as coisas à sua maneira e da melhor forma. A morte foi como a sua vida – uma obra de arte. Fez Blackstar para nós como prenda de despedida. Há um ano que eu sabia que ia ser assim. No entanto, não estava preparado. Era um homem extraordinário, cheio de amor e vida. Estará sempre connosco. Por enquanto, o que há a fazer é chorar. "Desde que a morte foi anunciada, as redes sociais foram inundadas. No Twitter registaram-se três milhões de mensagens até às 12h30. Os Rolling Stones lamentaram o desaparecimento de “um artista extraordinário”; Bruce Springsteen classificou-o como "um artista visionário"; Iggy Pop recordou a amizade com Bowie como “a luz” da vida dele; Madonna disse ter ficado “devastada”, enquanto Kanye West e os Pixies admitiram reverenciá-lo. . Da Alemanha chegou um agradecimento por ter ajudado a derrubar o Muro de Berlim, como escreveu o ministro dos Negócios Estrangeiros no Twitter, apelidando-o de “herói” – recorde-se que foi na Alemanha dividida, onde viveu uma temporada na década de 1970, que gravou três álbuns. A morte do criador de Space oddity e Life on Mars também foi lamentada no espaço, com uma mensagem do astronauta Tim Peake a partir da Estação Espacial Internacional. Mas é naturalmente em Inglaterra que as reacções têm sido mais expressivas, com o primeiro-ministro britânico, o conservador David Cameron, a escrever no Twitter que "era um mestre da reinvenção, que sempre a fez bem", enquanto o líder trabalhista, Jeremy Corbyn, considerou que "foi um grande músico e um grande artista". Também em França, o primeiro-ministro, Manuel Valls, afirmou que era "um artista fora de série" e "um herói do rock. "GlobalEra um artista total. Tinha uma maneira emancipada de pensar a sua actividade. Partia da música para, com liberdade e inquietação, transcender linguagens – algures entre a música, a arte, a moda, a literatura, a filosofia, o cinema, o teatro, o design gráfico ou a performance –, mostrando que a cultura popular podia ser reveladora. Era assim que se pensava a si próprio, era assim que pensava a realidade à sua volta. Foi talvez o primeiro músico moderno – ou será melhor chamar-lhe pós-moderno? – a perceber que música, imagens, conceitos e comportamentos eram elementos que se tocavam, integrando o mesmo corpo artístico. Na actualidade, de Madonna a Björk, dos Daft Punk a Lady Gaga, dos LCD Soundsystem aos Arcade Fire, na cultura de massas ou nas franjas minoritárias, todos o fazem. Vídeo: O caleidoscópio de David BowieMas ele foi o primeiro. Como todos os grandes artistas, foi muito além do seu centro de acção. Pensava o seu trabalho artístico como um todo. O seu corpo também era matéria plástica, não espantando que tivesse tido também uma carreira como actor, tanto no cinema como no teatro. A crítica reparou nele em Absolutamente Principiantes (Julien Temple, 1986), mas participou em muitos outros filmes, como Fome de Viver (John Blaylock, 1983), Feliz Natal, Mr. Lawrence (Nagisa Oshima, 1983), A Última Tentação de Cristo (Martin Scorsese, 1988), Twin Peaks (David Lynch, 1992), Basquiat (Julian Schnabel, 1996), Christiane F (Ulrich Edel, 1981), ou O Terceiro Passo (Christopher Nolan, 2006). No limite, até a sua vida foi uma obra de arte. A forma como administrou os últimos anos prova-o, como se quisesse mostrar que surpreender ainda é possível. Na era da Internet, da sobreexposição, da comunicação incessante, das fugas de informação e das redes sociais, uma celebridade conseguiu apanhar toda a gente desprevenida, lançando dois álbuns sem aviso prévio, e até a sua doença foi ocultada. Dir-se-á que por compreensíveis razões de intimidade. Mas também existe quem argumente que foi a forma de criar mais uma personagem enigmática. Em 2013, surpreendeu o mundo com o seu regresso ao activo. Havia dez anos que não lançava qualquer álbum novo e desde 2006 que não dava concertos. As aparições públicas também rareavam. Até o seu último biógrafo, o jornalista inglês Paul Trynka, que um ano antes escrevera o livro Starman – The Definitive Biography, ficou boquiaberto quando a 8 de Janeiro de 2013 festejou 66 anos mostrando ao mundo uma nova canção, Where are we now?; dois meses depois, saiu o álbum The Next Day. Na altura, Trynka dizia ao PÚBLICO que o impacto de The Next Day, "gravado em segredo total", era totalmente justificado. “Porque [Bowie] teve uma influência tão grande sobre o som e a imagem da música actual que o seu desaparecimento havia deixado um grande vazio. ”Fans are sharing a beautiful image of David Bowie through the ages https://t. co/i30YyAaenW pic. twitter. com/37oxKOf19LDurante dois anos gravou esse disco sem que ninguém soubesse, depois de muitas especulações sobre a sua saúde. É verdade que durante esse tempo não esteve ausente por completo (surgiu em palco ao lado dos Arcade Fire, de David Gilmour e de Alicia Keys e colaborou pontualmente com TV On The Radio, Scarlett Johansson ou Kashmir), mas parecia ter-se remetido à condição de pai de família, levando uma vida tranquila em Nova Iorque, ao lado da mulher, a ex-modelo Iman, e da filha de 15 anos de ambos, Alexandria Zahara – para além dela, tem um outro filho, o realizador Duncan Jones, fruto de um primeiro casamento com Angela Bowie, que terminou em 1980. 2013 seria o ano do seu grande regresso a todos os níveis: além do álbum, houve também uma grande exposição no Museu Victoria & Albert de Londres, David Bowie Is, que dava a ver a sua carreira nas mais diversas dimensões, explorando as suas múltiplas identidades e demonstrando a sua incomparável influência na música, nas ideias, na cultura visual e nos comportamentos, desde os anos 1960 ao presente, através de roupas, fotos, excertos de filmes e manuscritos inéditos. David Bowie condensado: 72 canções para ouvir sem pararNeste tempo de cultura fragmentária, em que os artistas comunicam cada vez mais para audiências estilhaçadas, David Bowie acaba por ser uma das últimas celebridades de alcance global. “E nesse sentido", sublinhava Paul Trynka em 2013, "acaba por reflectir uma certa nostalgia pelo tempo em que isso era possível. Por outro lado, é uma celebridade atípica, alguém suficientemente ambíguo que se expôs muito, mas manteve sempre uma certa distância, um mistério, uma mística, que leva as pessoas a desejarem querer saber mais, ouvir mais, estar mais próximas. ”Não é comum o conhecimento que tinha das dinâmicas culturais, das mais massificadas às marginais. Fascinava-o o conceito de celebridade, como algumas canções (Starman, Andy Warhol, Star, The prettiest day) ou as palavras de Heroes (“We can be heroes/ just for one day”) manifestaram. No álbum de 2013 havia também Stars (are out tonight), outra auto-reflexão sobre o culto das celebridades, com Bowie a olhar-se ao espelho. “Ele é um descendente directo de Andy Warhol”, dizia ao PÚBLICO o curador da retrospectiva do Museu Victoria & Albert, o inglês Geoffrey Marsh, em 2013, citando uma frase do poeta William Blake que, na sua opinião, o explicaria: “Alguém que não teve um predecessor, que não vive a par dos seus contemporâneos e não pode ser substituído por qualquer sucessor. ” Ou seja, uma personagem única. Desde o lançamento do álbum de 2013 que parecia em reavaliação. A compilação Nothing Has Changed de 2014 dava-o a entender. Não era uma simples antologia. Notava-se um olhar cuidado. Havia uma leitura sobre a sua obra, ordenada cronologicamente dos temas mais recentes aos mais antigos, como se quisesse mostrar que se mantinha actual. E na verdade os últimos discos mostravam um músico capaz de assimilar ideias aventureiras num vocabulário pop, mais uma vez reinventando-se, sem deixar de ser ele próprio, ou incarnando ideias colectivas para as transformar em canções suas. MudançasNão é fácil dizer se era Bowie que se adaptava aos acontecimentos culturais mais relevantes, ou se contribuía de forma determinante para a sua emergência. Provavelmente aconteciam ambas as coisas. Algo é certo – não deixava nada ao acaso. A cada novo disco mudava, absorvendo e lançando tendências, num misto de música, arte conceptual e estética, com o som, a roupa, a maquilhagem, as capas dos discos, a performance a participarem no mesmo acontecimento. Desde os anos 1960 foi Major Tom, Ziggy Stardust, Aladdin Sane, Halloween Jack ou Thin White Duke. Foi mod, hippie ou glam-rocker. Augurou o punk, inspirou-se na electrónica alemã nos anos 1970, beneficiou da euforia provocava pela MTV nos anos 1980, juntou-se à vaga dançante nos anos 1990 e renasceu desde os 2000. Directa, ou indirectamente, acabou por marcar a maior parte dos acontecimentos mais relevantes da cultura popular dos últimos 40 anos. Em 2004 foi submetido a uma angioplastia de urgência, o que levou ao cancelamento da Reality Tour, a poucos dias da passagem pelo Porto – naquela que seria a sua terceira presença em Portugal, depois da estreia no estádio de Alvalade em 1990 durante a digressão Sound + Vision e de um concerto em 1996, no festival Super Bock Super Rock, em Lisboa. Era o mestre da reinvenção. Tornou-se um cliché dizer-se que era um camaleão, alguém que mudava de pele em cada novo álbum. Mas a verdade é que David Robert Jones, seu verdadeiro nome, surpreendeu inúmeras vezes, sugerindo novos conceitos, personagens e roupagens, influenciando a cultura musical das últimas décadas, mas também o imaginário visual e os estilos de vida de inúmeras gerações. Nasceu a 8 de Janeiro de 1947, em Londres, numa família modesta do bairro de Brixton. Os pais chamaram-lhe David Jones, nome que o músico viria a mudar 19 anos mais tarde, em 1966, devido ao êxito alcançado por um outro David Jones – o dos Monkees. A discografia viria a ser longa: 26 álbuns de estúdio (dois dos quais com os Tin Machine), nove álbuns ao vivo e três bandas sonoras. E mais uma mão-cheia de EP e mais de uma centena de singles. Estima-se que ao longo dos anos tenha vendido no total cerca de 140 milhões de discos em todo o mundo. Na alvorada dos anos 1960 integrou várias formações, antes de lançar o primeiro álbum homónimo em 1967. Space Oddity (1969) e The Man Who Sold the World (1970) prepararam o caminho para o sucesso que foi Hunky Dory (1971), o seu primeiro álbum de platina no Reino Unido, ou para The Rise and Fall of Ziggy Stardust and the Spiders from Mars (1972) e Aladdin Sane (1973) . É nessa fase que se inspira no teatro kabuki ou que explora questões de género e sexualidade (também aí chegou primeiro) para criar personagens como Ziggy Stardust, a andrógina e bissexual estrela rock de outro planeta . Foram tempos de grande efervescência, em que não só gravou álbuns em nome próprio, como também produziu Transformer, de Lou Reed, ou Raw Power, dos Stooges de Iggy Pop, antes de lançar Diamond Dogs (1974), onde prenunciava a revolução punk que estava à porta, e do qual sairia o êxito Rebel rebel. Em 1975 editaria Young Americans, culminando a sua obsessão pela música soul, e originando o seu número um nos EUA com Fame. Uma outra pele, a do Thin White Duke, acabou por surgir no seu período de Los Angeles, com Station to Station (1976). Em 1977 dá início à trilogia de Berlim, que muitos consideram a sua fase mais criativa, com Low (1977), Heroes (1977) e Lodger (1979), gravados na capital alemã com Brian Eno ao leme, numa mistura de electrónicas, pop e técnicas vanguardistas, antecipando muito do que se viria a ouvir no período new wave e pós-punk. Nos anos 1980 deu-se a conhecer através de Scary Monsters (1980) e depois com Let's Dance (1983), o seu maior êxito de vendas, em grande parte por causa do tema-título e de China girl, com assinatura na produção de Nile Rodgers dos Chic. O próprio Bowie pareceu não saber lidar com esse sucesso, lançando no ano seguinte uma espécie de réplica, o álbum Tonight, do qual foi extraído o êxito Blue jean, mas que não alcançou o impacto comercial do seu antecessor. Under Pressure, o single que gravou em 1981 com os Queen, ou o dueto que fez em 1985 com Mick Jagger para o Live Aid, Dancing in the street, ajudaram a cimentá-lo como celebridade em todo o planeta, mas álbuns como Never Let Me Down (1987) e os dois que registou com os Tin Machine estão entre os seus momentos menos conseguidos. Nos anos 1990 com Black Tie White Noise (1993), ao lado de Nile Rodgers, ou com The Buddha of Suburbia (1994), tentou relançar a carreira. Foi provavelmente a sua fase mais difícil. Em 1995 voltou a juntar-se a Brian Eno para Outside, andando em digressão com os Nine Inch Nails, e em 1997 lançou Earthling, muito marcado pelas linguagens electrónicas da altura, tentando chegar a audiências mais novas, mas com resultados desiguais. A primeira metade da década de 2000 foi mais entusiasmante. David Bowie voltou a conquistar os admiradores de sempre, ao mesmo tempo que as novas gerações começaram a olhá-lo com fervor, graças a álbuns como Heathen (2002) ou Reality (2003), e principalmente devido ao distanciamento provocado pelo tempo. De repente, todos tomávamos consciência de que aquele homem havia sido determinante na forma como olhamos para o mundo. Não apenas o da música, mas também o da arte, do cinema, da moda, dos comportamentos ou da sexualidade. Depois da prolongada paragem, que se seguiu à digressão de 2004, só voltaria em 2013 com The Next Day, documento de grande vitalidade que o mostrava em forma, capaz de criar momentos de introspecção ou de electricidade rock, a que se seguiria Blackstar, editado na sexta-feira passada, um álbum magnífico onde cabe toda a sua vida. E, sabemo-lo agora, também a sua morte. A sua obra encerra com I can’t give everything away, um momento de reflexão na canção mais clássica do disco, aromatizada com o charme da eternidade. Completa-se com ele a despedir-se de nós. Até sempre. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Escolha o melhor álbum de David BowieO caleidoscópio de David Bowie
REFERÊNCIAS:
Partidos BE
Ensaio: o melhor do ano
Escolhas de António Araújo e António Guerreiro. (...)

Ensaio: o melhor do ano
MINORIA(S): Homossexuais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 6 | Sentimento 1.0
DATA: 2018-12-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: Escolhas de António Araújo e António Guerreiro.
TEXTO: Jonathan CraryAntígonaJonathan Crary, mais conhecido pelos seus ensaios sobre arte e estética, descreve e analisa este fenómeno: o mundo contemporâneo permanece em funcionamento vinte e quatro horas durante os sete dias da semana, para que a produção e o consumo não tenham interrupções. Para conquistar o tempo inútil do sono, impôs à noite luzes cada vez mais fortes. A extinção da noite é um fenómeno das grandes metrópoles, como Nova Iorque, difundido como uma tendência universal. A. G. Georges Vigarello (org. )Orfeu negroAo longo de várias décadas, Georges Vigarello tem-se destacado pelas suas inúmeras obras de história cultural centradas em tópicos como o corpo, a higiene, o desporto, a beleza, a sexualidade e as emoções. Em conjunto com Alain Corbin e Jean-Jacques Courtine produziu uma trilogia de grande alcance sobre a história do corpo e outra sobre o ideal viril desde a Antiguidade aos nossos dias. Este é o primeiro volume de uma obra que, num esforço algo "enciclopédico", procura compreender a evolução da masculinidade ocidental e das práticas e representações construídas em seu redor, à luz de uma paráfrase do célebre dito de Beauvoir: um homem não nasce homem, torna-se homem. A. A. Anna M. KlobuckaDocumentaProfessora no Departamento de Português da Universidade de Massachusetts Darmouth, Anna Klobucka dá à estampa um longo e informado ensaio sobre o mundo gay de António Botto, expressão que poderemos considerar anacrónica quando aplicada ao tempo do autor de Canções mas que ganha pleno sentido nesta redescoberta do universo homoerótico de um poeta por vezes considerado menor ou vulgar, mas que de modo algum é – ou foi – um marginal e um maldito. A. A. Bernardo Pinto de AlmeidaRelógio D'ÁguaEste livro reúne os textos das conferências que Bernardo Pinto de Almeida proferiu em Serralves, entre Novembro de 2017 e Março de 2018. É, no fundamental, um livro de estética, onde se faz uma análise do regime contemporâneo das imagens (algo já iniciado num livro de 1996, O Plano da Imagem) de maneira a elaborar, simultaneamente, uma “arqueologia da modernidade”, segundo o ambicioso programa formulado pelo autor. A. G. William TaubmanDesassossegoAutor de uma esmagadora biografia de Krutchev galardoada com o Prémio Pulitzer, William Taubman é um académico especialista na Rússia soviética que dedicou vários anos de investigação à figura de Mikhail Gorbachev. Pese a sua indisfarçável simpatia para com o seu biografado, Taubman traz-nos um retrato isento e completíssimo, porventura inultrapassável, da trajectória política e pessoal do líder da glasnost e da perestroika, a quem a História ainda não fez justiça. Mal-amado na sua terra, como todos os profetas, a lucidez e a coragem de Gorbachev são aqui reveladas com extremo rigor, num livro de leitura obrigatória em tempos de Putin e Trump. A. A. Peter SloterdijkRelógio d’ÁguaCom este título que imita de maneira provocatória os livro de auto-ajuda, o filósofo alemão Peter Sloterdijk acrescentou à sua obra grandiosa mais uma peça fundamental. A “virtude” em torno da qual gira todo o livro é a ascese, as práticas e “exercícios espirituais” que conduzem o ser humano para além das suas possibilidades. Criticando o mito do regresso da religião, Sloterdijk desenvolve aqui o seu conceito de antropotécnica, isto é, as práticas através das quais o ser humano se torna uma auto-produção. A. G. Camille PagliaQuetzal EditoresTão popular quanto controversa, Camille Paglia reúne neste livro diversas intervenções que em comum têm o que designa por "o meu feminismo dissidente", lugar pessoalíssimo e altamente instável. Sem o fulgor de outras obras da sua autoria, com destaque para Personas Sexuais, este Mulheres Livres, Homens Livres percorre temas aparentemente díspares mas obviamente afins: o aborto, o sexo e o género nas universidades americanas, as denúncias de assédio, o ideal de beleza feminina, a educação sexual e o futuro do feminismo. Termina, não por acaso, com um breve texto sobre uma fotografia de Patti Smith tirada por Robert Mapplethorpe. Num estilo incendiário, por vezes panfletário, uma corajosa defesa da liberdade igual para mulheres e homens. A. A. Roberto EspositoEdições 70É no horizonte da “crise” europeia que o filósofo italiano Roberto Esposito propõe uma filosofia para a Europa. O que está aqui implícito é que a Europa se constituiu como “ideia”; e o que está bem explícito é que o instrumento de análise para uma interpretação da situação europeia é aquele fornecido pela filosofia. Eis a tese de Esposito: é preciso que a Europa não fique imobilizada no pensamento do seu interior, já que essa forma de se concentrar sobre si própria, fechando-se ao seu “fora”, foi o que a colocou numa órbita fatal, ao longo do século XX. A. G. Ian KershawPublicações Dom QuixoteSegundo volume de um díptico de grande fôlego que cobre o período de 1914 a 2017, este livro confirma o prestígio de Ian Kershaw como um dos maiores e mais prolíficos historiadores contemporâneos, a quem já devíamos uma biografia monumental de Adolf Hitler. Pelo imenso caudal de informação que consegue mobilizar numa escrita segura e luminosa, Continente Dividido é um digno sucessor de Pós-Guerra, de Tony Judt, com a vantagem de ir até aos tempos da crise de 2008 e suas sequelas e aos nossos dias sombrios, feitos de populismos e fake news. Essencial. A. A. José GilSubscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Relógio d’ÁguaTalvez possamos apresentar este livro formulando a sua dimensão paradoxal, capaz de provocar enormes resistências: trata-se de um discurso filosófico sobre o que escapa ao logos, à razão discursiva; ou ainda: é um discurso dos conceitos (e eles vão sendo construídos ao longo de todo o livro) sobre o que não é da ordem do conceptual. Caos e ritmo são algo como uma infra-linguagem, uma "matéria não-verbal" que, no entanto, agem sobre a ordem da racionalidade. Estão do lado das forças e não das formas, mas determinam a criação artística. José Gil “desce” assim a um nível do arcaico, do inconsciente, mas fazendo um uso heterodoxo e alargado do inconsciente da psicanálise, que o leva a criar conceitos como “inconsciente da linguagem” e “inconsciente do corpo”. O corpo, nas suas manifestações menos estudadas e menos codificadas, é de facto uma matéria fundamental deste livro. E quando se chega a uma secção sobre “o corpo na arte” torna-se evidente que estamos também perante uma investigação estética e toda a questão do caos e do ritmo é o que está em acção no processo criativo. Entre a psicanálise, a antropologia, a estética e a análise da linguagem e das representações e formações imaginárias, este livro move-se em territórios estranhos e difíceis de habitar, aqueles que dão origem ao mito, à magia, ao pensamento por imagens (por oposição ao “pensamento puro”), à “lógica do delírio” (da escrita de Artaud). Este quadro teórico-conceptual desemboca numa matéria mais facilmente reconhecível, numa zona que é a “sombra” da racionalidade política: o discurso populista, o populismo e a estupidez. A. G.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave aborto homens guerra educação ajuda homem consumo sexo género sexual mulheres corpo extinção sexualidade gay feminina assédio feminismo
Senado francês defende fim de concursos de beleza para crianças
Eventos "mini-miss" podem passar a ser punidos com pena de prisão e multa. Última decisão cabe a deputados da Assembleia Nacional. (...)

Senado francês defende fim de concursos de beleza para crianças
MINORIA(S): Homossexuais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2013-09-19 | Jornal Público
SUMÁRIO: Eventos "mini-miss" podem passar a ser punidos com pena de prisão e multa. Última decisão cabe a deputados da Assembleia Nacional.
TEXTO: O Senado francês pronunciou-se a favor da interdição dos concursos de beleza para raparigas com menos de 16 anos, os chamados “mini-miss”. A decisão favorável à proposta apresentada pela antiga ministra do Desporto e senadora Chantal Jouanno terá agora que ser aprovada pelos deputados na Assembleia Nacional. Em 2010, Thylane Lena-Rose Blondeau fez a capa da edição de Dezembro da Vogue Crianças francesa. A menina, que já fazia trabalhos como modelo desde os quatro anos, viu-se subitamente no centro de uma polémica quando surgiu na revista com roupas de alta-costura, sapatos de salto alto, jóias e muita maquilhagem. Na altura foi considerado que a criança tinha sido apresentada em poses demasiado sensuais para alguém com apenas dez anos. A revista defendeu a sua edição, bem como a mãe de Thylane. Pelo lado da crítica estiveram várias organização e Chantal Jouanno, uma senadora que pegou no caso para levantar a questão da “hipersexualização” das crianças. Cerca de dois anos depois do caso de Thylane, a antiga ministra do Desporto apresentou um relatório a denunciar o que considera ser um “fenómeno cada vez mais presente”, ainda que admita que “não tenha afectado massivamente as crianças”. No documento, Jouanno alertou que, no “extremo, a intrusão precoce da sexualidade representa danos psicológicos irreversíveis em 80% dos casos”. Já este ano, a senadora apresentou um projecto de lei a defender o fim de concursos destinados a crianças com menos de 16 anos. Na noite desta terça-feira, o Senado aprovou a proposta com 196 votos a favor e 146 contra. Caso seja também aceite pelos deputados da Assembleia Nacional, a nova lei prevê uma pena de prisão de dois anos e o pagamento de uma multa de 30 mil euros a quem organizar concursos que sejam destinados a meninas. “Não deixemos as nossas filhas acreditarem desde pequenas que não valem mais do que a sua aparência. Não deixemos o interesse comercial prevalecer sobre o interesse social”, escreveu Chantal Jouanno na sua proposta agora aprovada. As sanções a aplicar à organização dos “mini-miss” foram consideradas “excessivas” pela senadora socialista Virginie Klès, bem como a ministra dos Direitos das Mulheres, Najat Vallaud-Belkacem. A ministra tinha proposto, pela sua parte, que os organizadores destes concursos ficariam obrigados a pedir uma licença oficial, que depois de analisada permitira ou não a realização do evento. A proposta foi rejeitada.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave direitos lei prisão social criança mulheres sexualidade
A avó foi virgem para o casamento, a neta gostava de experimentar swing
Tinha 17 anos quando se casou no final dos anos 50. Chama-se Antónia, vive nas Terras de Basto. Pediram-lhe para recordar a noite de núpcias. E ela contou: “Na noite do casamento, quando me deitei ele disse-me: ‘Então porque não te vens deitar? Não te faço mal… Sabes como é… se me casei foi para ter relações contigo’… E eu: ‘Não, que eu não quero!’ E ele: ‘Não é assim, tu não queres… tem de ser. ’ Depois aconteceu. ” Antónia sobreviveu. “Não morri, graças a Deus. ”Berta, filha de Antónia, tem 42 anos, casou-se nos anos 80. Era virgem e sentia vergonha do sexo. “Ele disse-me: ‘Não faz mal, depois eu explico-te. Tu... (etc.)

A avó foi virgem para o casamento, a neta gostava de experimentar swing
MINORIA(S): Homossexuais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 6 | Sentimento 0.6
DATA: 2009-09-25 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20090925020500/http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1402280
TEXTO: Tinha 17 anos quando se casou no final dos anos 50. Chama-se Antónia, vive nas Terras de Basto. Pediram-lhe para recordar a noite de núpcias. E ela contou: “Na noite do casamento, quando me deitei ele disse-me: ‘Então porque não te vens deitar? Não te faço mal… Sabes como é… se me casei foi para ter relações contigo’… E eu: ‘Não, que eu não quero!’ E ele: ‘Não é assim, tu não queres… tem de ser. ’ Depois aconteceu. ” Antónia sobreviveu. “Não morri, graças a Deus. ”Berta, filha de Antónia, tem 42 anos, casou-se nos anos 80. Era virgem e sentia vergonha do sexo. “Ele disse-me: ‘Não faz mal, depois eu explico-te. Tu não tenhas medo. Porque vai correr tudo bem. Tens de te pôr apta, porque tu sabes como é, eu não te faço mal. ’”Carla, neta de Antónia, filha de Berta, tem 25 anos. Teve a primeira relação sexual aos 18, antes de casar-se. “Qualquer pessoa tem direito a sentir prazer e a ter a sua própria sexualidade, acho que uma pessoa que tem namorado não tem de estar virgem. ” Agora que é casada gostava de experimentar o swing (troca de casais). “Era uma coisa de que eu gostava. ”As três mulheres da mesma família fazem parte das 60 pessoas entrevistadas por investigadores do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa num projecto inédito em Portugal, explica a socióloga Sofia Aboim. O estudo tem o financiamento da Fundação para a Ciência e Tecnologia e da Comissão para a Igualdade e Cidadania. E é apresentado hoje num seminário, em Lisboa. Abarca três gerações de 20 famílias. “Tentámos perceber o que é que mudou em Portugal através das narrativas de vida de homens e mulheres, avós, pais e netos. ” E comparando com estudos semelhantes feitos nos EUA ou em Inglaterra, diz, a distância geracional “é enorme”. Na área da sexualidade, a investigadora fala mesmo de uma “mudança radical”. Regresse-se à noite de núpcias: “O discurso da avó e da mãe sobre a sexualidade é o discurso da vergonha. Mesmo quando esconde uma verdade que não era relatada [Belmira, por exemplo, acabou por contar que, na verdade, estava grávida quando se casou], revela algo que é real: que existia uma opressão muito grande da sexualidade feminina. ”E entre os homens? De novo uma família entrevistada: Tiago nasceu em 1922, teve a sua primeira relação sexual com uma prostituta. O filho, Raúl, nasceu em 1949. Aos 17 anos foi com os amigos a uma casa de prostituição e começou a sua vida sexual da mesma forma que o pai. Já o seu filho, Victor, nasceu em 1983. Começou a namorar aos 15 anos e foi com a namorada que perdeu a virgindade. Ao contrário do pai e do avô, Victor defende que homens e mulheres devem dormir com quem acharem por bem, “desde que não façam mal a ninguém”. Depois, contradiz-se: “não é possível olhar com amor” para as raparigas que dormem com vários rapazes. O que mostram relatos como este? Que o recurso à prostituição era institucionalizado e hoje quase não existe. Mas também que, havendo um discurso de paridade sexual, “é sistemática a diferenciação que os rapazes fazem entre as raparigas fáceis e as não fáceis”, diz Aboim. “É um discurso que só emerge se aprofundamos as entrevistas, que é herdado dos avós, mas muito mais matizado. ”Em suma, ao contrário do que se passou a outros níveis, “no campo da sexualidade, a mudança foi mais ambígua”, remata. “Há imensa sensibilização para a igualdade de género, mas depois há questões mais profundas que não têm a ver com o conseguirmos levar mais os homens para a cozinha. Há, de facto, concepções de diferenciação e de poder: uma rapariga simplesmente não pode ter o mesmo comportamento que um rapaz. ”
REFERÊNCIAS:
Entidades EUA