Joshua Sofaer: "Apesar dos problemas, o Porto "tem uma vida cultural vibrante"
Daqui a um ano, no máximo, o Porto vai ter uma rua nova, e este é o homem que vai fazer disso (aliás já fez) uma festa. As práticas artísticas, acredita Joshua Sofaer, são a melhor maneira de fazer com que o poder pertença, efectivamente, ao homem da rua. (...)

Joshua Sofaer: "Apesar dos problemas, o Porto "tem uma vida cultural vibrante"
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.005
DATA: 2010-06-27 | Jornal Público
SUMÁRIO: Daqui a um ano, no máximo, o Porto vai ter uma rua nova, e este é o homem que vai fazer disso (aliás já fez) uma festa. As práticas artísticas, acredita Joshua Sofaer, são a melhor maneira de fazer com que o poder pertença, efectivamente, ao homem da rua.
TEXTO: Joshua Sofaer, o britânico que o FITEI – Festival Internacional de Teatro de Expressão Ibérica convidou para vir ao Porto convencer cidadãos anónimos a darem o nome a uma rua, já pôs os japoneses de Moriya a contemplar numa galeria as toneladas de livros e revistas que deitaram ao lixo em apenas 24 horas, os noruegueses das Lofoten a folhear o catálogo das colecções (de selos, de chávenas de café, de bonecas, de fl ores) de todos os habitantes do arquipélago e os ingleses de Londres a revirar a cidade em busca de animais esculpidos em cenouras. Parece uma brincadeira, mas não é: a arte, diz ele, é o único lugar onde cidadãos anónimos se permitem fazer coisas que nunca lhes passariam pela cabeça. Incluindo governar (das grandes às pequenas decisões, como a de escolher o nome de uma rua) a cidade onde vivem. PÚBLICO – Quando é que vão inaugurar a rua do Viver a Rua? JOSHUA SOFAER – Gostávamos de concluir o processo até daqui a um ano. Nesta fase, o nosso painel de juízes está a escolher o seu top pessoal de cinco nomes, por ordem de preferência. A seguir iremos verifi car o rigor das histórias por trás destes nomes e confirmar que os proponentes querem mesmo avançar com a proposta. No fim, levaremos uma lista definitiva à Comissão de Toponímia da cidade, e depois depende. Quando houver decisão queremos inaugurar a rua a sério, com uma festa. Como é que se lembrou de convidar a cidade a discutir que nome dar a uma rua?Antes de vir ao Porto, já tinha lançado dois projectos semelhantes no Reino Unido, Name in Lights e Rooted in the Earth. Em Birmingham, propus que se escrevesse o nome de uma pessoa num néon gigante em pleno centro da cidade; em Londres, propus que se fizesse mais ou menos a mesma coisa, mas desta vez escrevendo o nome de uma pessoa com flores, em canteiros públicos de praças e parques da cidade. Em Novembro, o Núcleo de Experimentação Coreográfica (NEC) convidou-me para vir ao Porto fazer um workshop sobre como promover a inclusão social e activar uma cidade através das práticas artísticas, e nessa altura ficou decidido que eu voltaria com um projecto para o FITEI. O NEC queria que fosse uma coisa muito visível, mas que custasse muito pouco dinheiro, e então resolvi que seria isto: envolver os cidadãos do Porto na discussão acerca do nome a dar a uma nova rua. O que é que tinha na cabeça no início do Viver a Rua? Participar na escolha do nome de uma rua da cidade onde vivemos é mais do que mandar palpites e sugerir que as pessoas de quem gostamos fiquem imortalizadas no espaço público. É uma discussão que nos obriga a pensar sobre que tipo de pessoas queremos como modelo e o que realmente significa ser cidadão. É sobretudo nisso que estou interessado. Se no fim do dia as pessoas concluírem que não há ninguém que mereça ter o nome numa rua, para mim o projecto é um sucesso na mesma. É o processo, e não o resultado, que vale. Aqui, o que é importante é que este nome, o nome que um cidadão anónimo como outro qualquer propôs, vai fazer parte do tecido da cidade, vai ficar no mapa. Acho que é a primeira vez que faço uma coisa que me vai sobreviver. Vai haver pessoas a viver e a morrer nessa rua, talvez alguns bebés venham a ser feitos nessa rua. Pensando bem, é incrível. Quantas propostas receberam?Estava um bocado inseguro sobre a adesão que iríamos ter. Quando fizemos o Name in Lights em Birmingham, houve milhares de propostas, mas basicamente apenas pedíamos às pessoas que nos enviassem um nome. Aqui fomos mais exigentes, as pessoas tinham de escrever um pequeno ensaio a explicar por que razão sugeriam aquele nome. . . Tivemos 253 propostas, mas, uma vez mais, não quero que isto seja sobre números e resultados. De qualquer modo, esperava que houvesse pelo menos cem propostas, portanto os resultados praticamente duplicaram as minhas expectativas. Que tipo de nomes apareceram? Todo o tipo de nomes. Desde figuras históricas até familiares dos proponentes, pessoas que obviamente não merecem uma rua mais do que qualquer outro cidadão, e até personagens de ficção. Apareceram muitas histórias tristes. Curiosamente, várias pessoas propuseram nomes de figuras históricas que na verdade já têm uma rua no Porto. O que mostra, por um lado, que as pessoas não conhecem bem a cidade, mas também que a Comissão de Toponímia está a fazer um bom trabalho. No Porto, muitas pessoas propuseram nomes de jogadores de futebol. . . Pelo contrário, os nomes vencedores dos seus anteriores projectos eram sobretudo de cidadãos anónimos dedicados à comunidade. . . No Porto essas pessoas não apareceram?No Porto, os cidadãos anónimos também foram maioritários. Mas claro que os nomes mais repetidos correspondem a jogadores de futebol. Em Londres, quando fizemos o Rooted in the Earth, a maioria dos votos foi para o “Baby Peter”, um menino que tinha sido assassinado pelo padrasto, num caso que sensibilizou imenso a opinião pública. Os juízes decidiram não escolher esse nome porque o espírito do projecto é celebrar figuras anónimas da comunidade, e não aquelas de que os jornais falam todos os dias. Vai ser interessante perceber como pensam os júris do Porto. Eu, pessoalmente, acho que esta é uma oportunidade para fazer uma coisa que de outra forma nunca seria feita: dar o nome de um cidadão vulgar a uma rua. Provavelmente, mais cedo ou mais tarde, esses jogadores de futebol acabarão por ter uma rua, com ou sem o Viver a Rua. Acho mágico passar numa rua e ver um néon enorme com o nome de uma pessoa que não faço ideia quem seja. É completamente a negação do star system que caracteriza a cultura contemporânea. Também por isso, gostava que a placa que vai ficar na rua não dissesse nada acerca da pessoa além do nome dela. Quero que as pessoas passem por ali e fiquem intrigadas. Se explicamos tudo, qual é a mística? Trabalha muito com nomes. O que é que o fascina tanto nos nomes?Os nomes são como guiões. Não os escolhemos, mas recebemo-los à nascença, e depois passamos a vida a desempenhá-los [performing]. Penso muitas vezes como é que seria a minha vida se tivesse outro nome, mesmo que tivesse exactamente a mesma cara e a mesma psicologia. Se tivesse um nome islâmico, por exemplo. Fascina-me o modo como os nomes operam. A primeira coisa que fazemos quando conhecemos um estranho é perguntar-lhe o nome – e é extremamente desconfortável falar com uma pessoa que não sabemos como se chama. Porquê? É só um nome. Acredito que, num certo sentido, os nomes são inescapáveis. O meu nome, por exemplo, significa escriba. E o que realmente faço na vida é escrever; neste caso, escrever os nomes das outras pessoas. E na rua, como é que correu o processo? Tivemos voluntários a ir para a rua para mobilizar as pessoas. E correu muito bem. Sobretudo porque houve desenvolvimentos inesperados, e coisas que são muito particulares do Porto. Por exemplo?Uma das coisas com que nos deparámos várias vezes foi a incredulidade das pessoas. As pessoas não acreditavam que isto era mesmo a sério. Diziam-nos: “Ah sim, é muito giro, mas claro que não vai acontecer. ” A segunda pergunta era: “E o que é que a câmara vai achar disso?” É bastante evidente que os portuenses se sentem excluídos do processo político de tomada de decisões acerca da vida da cidade, que se sentem sem poder, empurrados para fora da infra-estrutura política. Não lhes parece que possam ter uma palavra a dizer sobre o rumo da cidade. E isso, para mim, provou a absoluta necessidade de um projecto como o Viver a Rua. O que estamos aqui a fazer é a dizer às pessoas: “Esta cidade é vossa. Os burocratas que estão no poder actuam em vosso nome, mandatados por vocês, para fazerem aquilo que vocês acham melhor para a cidade. ” Ao permitirmos que escolham o nome de uma rua, estamos a encontrar uma maneira muito simples de dar aos cidadãos uma voz directa na coisa pública. Outra coisa curiosa: as pessoas queriam saber que tipo de rua estava em causa: “É que se for uma rua assim muito pequena não estou interessado. ” Fez-me pensar no tormento que é estar dentro de um aeroporto gigante, tipo Charles de Gaulle ou JFK, a correr para apanhar um avião, ou a desesperar porque as malas não aparecem. Os aeroportos são sítios desagradáveis e impessoais, e ainda assim a maior homenagem pública que se pode fazer a uma pessoa é dar o nome dela a um aeroporto. Depois da morte da princesa Diana houve uma enorme discussão em Londres para decidir se se devia dar o nome dela ao aeroporto de Heathrow. Por falar em discussão, o projecto incluiu uma série de workshops. Como correram? Organizámos workshops de escrita criativa, de história local e de reflexão sobre conceitos de cidadania e de família. A ideia não era garantirmos, através dos participantes nos workshops, um número mínimo de nomeações. Mas foi compensador que esses workshops nos tenham levado a trabalhar com escolas, e que vários grupos de alunos tenham feito propostas de nomes. O que é que aprendeu sobre o Porto?Aprendi que as pessoas do Porto adoram a cidade, apesar de passarem a vida a resmungar e queixar-se dela. Quase todas querem saber o que eu acho do Porto comparado com Lisboa, mas eu ainda não fui a Lisboa. No Reino Unido não existe uma divisão semelhante?No Reino Unido todas as pessoas que vivem fora de Londres odeiam Londres e todas as pessoas que vivem em Londres seriam incapazes de viver noutro lado. E como lhe pareceu a cidade em termos de participação cultural?Acho que o Porto está num ponto de viragem. Quando vim cá em Novembro, a cidade pareceu-me envelhecida; agora, nesta segunda visita, o tempo estava fabuloso e a cidade saiu completamente cá para fora. É incrível a quantidade de coisas que aconteceram na mesma semana numa cidade tão pequena: a Feira do Livro, o FITEI, o Serralves em Festa, o Clubbing. . . Quais são os pontos fortes e os pontos fracos da cidade, em termos de participação artística?Prefiro falar em bons e maus exemplos. Um exemplo brilhante é o Clubbing. Estive lá numa das últimas noites e vi um público completamente diversificado a responder com igual entusiasmo a programas complexos de música erudita e a sessões altamente experimentais de electrónica. Um mau exemplo, tenho de admitir, é o Serralves em Festa. Foi uma enorme desilusão. Achei que os projectos apresentados eram paternalistas, para não dizer mais. O mínimo denominador comum, absolutamente: novo circo, teatro de rua, balões, palhaços em andas. . . A arte contemporânea não é aquilo. É uma pena que consigam reunir tanta gente naquele espaço e que depois o Serralves em Festa não passe de um dia no parque. A câmara desinvestiu na cultura nos últimos anos. É um erro, nesta fase de euforia à volta das indústrias criativas? Acho que toda a participação financeira, pública e privada, nas práticas artísticas é saudável. Já se percebeu que, nesta área, os subsídios geram efectivamente emprego e riqueza. Nesta fase de severa crise económica, é óbvio que é politicamente mais aceitável cortar na cultura, mas a cultura é o que nos define como civilização. Logo a seguir à Segunda Guerra Mundial, quando a Inglaterra quis diminuir os gastos com a cultura, o Winston Churchill (não acredito que estou a citar o Winston Churchill) perguntou: então para que é que estivemos a lutar? Não pode haver Europa sem cultura. Ouvi falar do Rivoli mal cheguei ao Porto, falaram-me da ruptura que houve com a sua cedência a um produtor comercial. Mas o que me parece é que, quaisquer que sejam os problemas de bastidores, o Porto tem uma vida cultural vibrante. Mas é claro que é sempre possível fazer mais, e sem gastar muito mais dinheiro. Esta cidade tem imensos prédios e lojas ao abandono, a câmara podia e devia relaxar as regras de acesso e ocupação desses espaços, ceder licenças temporárias para a apresentação de espectáculos; não há razões para que os artistas tenham dificuldade em encontrar espaços. Acima de tudo, o papel do poder local é activar a noção de que as coisas são possíveis. E aqui, claramente, pelo menos no que depende da câmara, os artistas acham que as coisas são impossíveis.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave morte guerra cultura comunidade social princesa circo
O fabuloso destino de Alfredo Casimiro, um casapiano milionário aos 30 anos
Esta é a história nunca contada de um menino pobre que percebeu aos 30 anos que estava milionário. Um casapiano que acreditou no slogan da sua empresa: "We make it possible." (A Urbanos foi considerada a melhor PME para se trabalhar em 2010.) Como é que ele tornou isto possível? (...)

O fabuloso destino de Alfredo Casimiro, um casapiano milionário aos 30 anos
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.4
DATA: 2010-07-04 | Jornal Público
SUMÁRIO: Esta é a história nunca contada de um menino pobre que percebeu aos 30 anos que estava milionário. Um casapiano que acreditou no slogan da sua empresa: "We make it possible." (A Urbanos foi considerada a melhor PME para se trabalhar em 2010.) Como é que ele tornou isto possível?
TEXTO: Nasceu em 1966. Ontem. Viveu uma vida pobre, arrumada, limpa. Teve a noção do que eram cinco tostões, um tostão, dois tostões. "Os outros miúdos tinham jogos, brinquedos; as mães iam ao intervalo levar um bolo; a minha mãe, às vezes, conseguia comprar-me um bolo, mas de casa eu levava uma sandes. " Fez o seu primeiro negócio aos dez anos. Foi aluno da Casa Pia. Encontrou um preceptor que lhe disse que ele não tinha jeito para nada. (Estará ele a ler a entrevista - pergunta-se Alfredo Casimiro?) Casou e teve filhas cedo. Fundou uma empresa eleita em 2010 como a melhor PME para se trabalhar. Envolveu a família. Cresceu. Enriqueceu. Qual é o segredo de Alfredo Casimiro?A entrevista acontece em casa, no country club de Belas. É uma casa imensa, de linhas despojadas, que não revela de forma ostensiva o património que acumulou nos últimos 20 anos. Não é um exibicionista. Nas fotografias pede, sem pedir, algum recato. Não pretende confirmar o cliché do novo-rico que posa na casa com piscina, exuberante. Desfaz-se num sorriso quando a filha mais nova anuncia que chegou a casa: "Pai, pai, pai!" Tem mais duas filhas, do primeiro casamento. A vida delas nem por sombras se parece com aquela que o pai teve. Mas ele teve o prazer de vencer. A voz é tonitruante. Conta detalhadamente o que viveu. Não esquece pormenores como o de a carne vir da aldeia já arranjada. Ou o gesto do empregado que um dia não lhe deu uma bola de Berlim. Ou o olhar do pai numa conversa decisiva. Ou os anos em que não teve férias para fazer prosperar a empresa. (A Urbanos é hoje muito mais do que uma empresa de mudanças; Casimiro indica que apenas 20 por cento do volume de negócio resulta dessa área. ) A história desta entrevista começa há quase dois anos, quando pela primeira vez quis contar a vida de Alfredo Casimiro. Com polidez, recusou. Só este ano, depois da atribuição do prémio de melhor PME para se trabalhar em Portugal, e sobretudo depois da morte súbita do irmão, anuiu. Está mais sozinho. E dá a cara por um império que está a ser erguido. Tem quase 44 anos. Às vezes parece que foi há uma eternidade, e não ontem, que tudo começou. Quando é que teve a noção de que a sua vida podia ser uma coisa extraordinária?Não tive essa noção. Tive essa necessidade. Que quadro de vida era o seu? Como é que o vivia? Para perceber a necessidade que sentiu de o mudar. Os meus pais são migrantes de uma aldeia perto de Alenquer, Cabanas de Torres. O meu pai foi criado no campo, fez o serviço militar, fez a guerra, instalou-se em Lisboa. Nasci em Julho, eles terão casado em Março ou Abril de 1966. Alugaram o chamado "quarto com serventia de cozinha". A minha mãe empregou-se numa fábrica de pilhas, a Tudor. Eu ficava com uns tios-avós que moravam perto, que me mimavam muito. Os donos da casa onde os meus pais viviam não tinham filhos. O homem era contrabandista, daqueles que nos anos 60 iam a Badajoz buscar chocolates e rebuçados para revender em Lisboa. Um dia comi chocolates até quase morrer, literalmente. Aos 16 meses, tive uma colagem completa dos intestinos e estive três semanas internado no hospital Dona Estefânia, no vai não vai. Foi filho único até 1972. Quem eram os seus amigos?O bairro onde morávamos era em frente a um bairro de barracas. Essas pessoas, que moravam num ambiente degradado, eram os meus amigos. Jogávamos à bola, passávamos o tempo na rua. Quando fui para a escola primária, fui em condições distintas dessas pessoas. Como era muito irrequieto, os meus pais fizeram um esforço adicional e puseram-me num pseudojardim infantil aos quatro anos. Era a casa da Dona Celeste, uma professora reformada que dava explicações na salinha de jantar. Quando fui para a primária, já sabia ler e escrever correctamente. Estes meus companheiros de rua tinham normalmente problemas de aprendizagem, agravados pelo alcoolismo dos pais, pela desestruturação da família; era eu que os ajudava nos trabalhos de casa. Alguns tinham mais dois, três anos do que eu e andavam na primeira classe. Estamos a falar de um tempo anterior ao 25 de Abril, os castigos corporais eram frequentes na escola. Por causa disso, desde pequeno, fiquei com um grupo de guarda-costas privativo! [riso] O seu pai arranjou emprego na Carris. Fazia o quê?Começou por ser guarda-freio, depois passou a cobrador, depois passou a motorista; fez toda a sua vida profissional, até se reformar, como motorista da Carris. A minha mãe era doméstica e simultaneamente fazia costura para fora. Éramos o que se pode definir como família de classe média-baixa. O meu pai ganhava 900 escudos por mês e pagávamos 513 de renda. É um valor que retenho porque a partir dos dez, 11 anos, era eu que ia à Caixa Geral de Depósitos depositar esse dinheiro todos os meses. Era uma grande responsabilidade. Era mais de metade do que o seu pai ganhava. Tinha medo de o perder, de ser assaltado? Esses temores assaltavam-no?Não. Para colmatar as nossas necessidades, o meu pai alugou um pedaço de terreno perto de casa e fez uma pequena horta. Cultivámos feijão verde, tomate, cebola, alho; todos os produtos hortícolas normais, para não termos de gastar dinheiro na praça. Quando tínhamos excesso de legumes, que não consumíamos inteiramente, vendíamos as sobras. Eu tinha seis, sete anos, e ia vender aos vizinhos. Achavam-me graça e eu tinha habilidade para falar com as pessoas. O dinheiro era muito esticado para que não chegássemos ao final do mês sem dinheiro. Eram conversas que tinham consigo, que ouvia? Responsabilizavam-no?Fui envolvido desde a mais tenra infância. Falávamos sobre o valor das coisas, o valor do trabalho, as contas da casa. Faziam-se malabarismos. Antes de o último tomar banho, desligava-se o gás para se gastar a água quente que estava ainda nos canos. Sempre me habituei a tomar duche muito rápido. O meu pai dizia que era por uma questão de robustez física que tomava banho de água fria (até morrer, nunca tomou banho de água quente); mas não acredito, acho que fazia isso para não gastar gás. E poupávamos imenso. Quando fui para a primeira classe, no primeiro dia, a minha mãe foi ter comigo ao recreio e levou-me um pacote de batatas fritas. Um luxo absoluto! Esse gesto da sua mãe revela um cuidado consigo. Com o que é que acha que eles sonhavam?Sonhavam dar-me a mim e aos meus irmãos uma vida melhor do que aquela que tinham. Cada um deles só estudou até à quarta classe. Esforçavam-me muito. O meu pai folgava um dia por semana, fazia muitas horas extraordinárias. Na minha primeira infância, passava os Verões em Cabanas com os meus avós. O meu avô paterno, António, tinha a alcunha de gajão; quando era novo, era bonito, imponente. O meu pai era o mais velho de seis irmãos. Os meus tios iam à guerra e os meus avós vestiam de preto - como se tivesse morrido alguém. Os meus avós estiveram de luto desde que o meu pai foi à tropa, em 1961, até ao 25 de Abril. A antecipar a morte de um filho, que felizmente nunca aconteceu. O Verão na aldeia: tranquilo, com os meus avós, em casa, com o gado. Era uma vida muito pobre - digo: a pobreza do tempo de Salazar. Com pouco cash, mas razoável abundância de tudo. Os meus pais tinham falta de roupa e de sapatos, mas para comer havia sempre pão, carne. Nunca passei fome, nunca andei roto, nunca andei miserável. Apesar de tudo, o quadro que descreve não é desesperado. O que é que o faz dar o salto, sentir a necessidade de que a sua vida fosse outra?[Pausa] Não o consigo identificar. Há um fenómeno que é importante referir. Em 1969, morre uma irmã da minha mãe, que era muito próxima. A minha mãe ficou muito abalada. A forma de se recompor passou pelo encontro com as Testemunhas de Jeová. O meu pai continuou católico até ao fim da vida e sempre com mágoa por a minha mãe praticar uma religião diferente. Mas as meninas são dos pais e os meninos são das mães. Não tenho memórias de práticas religiosas que não sejam as das Testemunhas de Jeová. O que é que aprendeu?Coisas fabulosas. O código ético é muito apertado. É muito difícil convencê-la a ser Testemunha de Jeová, é preciso uma grande capacidade de convencimento, e para isso somos treinados desde que lá chegamos. O objectivo é que me torne um reprodutor dessa mensagem, um pregador dessa palavra e um angariador de mais Testemunhas de Jeová. Isto molda profundamente o meu carácter, e venho a aproveitá-lo em toda a minha vida. Por que é que saiu? Hormonas. Estive até aos 14 anos. Havia uma total proibição de relacionamento entre sexos. Mas, durante os anos em que estive, aprendi muito. Que o não é o princípio do sim. Que é preciso insistir e conseguir. A sua relação com a sua mãe era a célula fundamental da sua vida. A passagem pelas Testemunhas de Jeová é expressão disso. Como era em casa?Ajudo a minha mãe em casa, na costura, a passar a ferro, a tirar linhas. Era uma casa cheia. Todos os irmãos do meu pai passaram por nossa casa depois de regressarem da guerra. Ficaram seis meses, um ano, dois anos, até casarem. Posso dizer-lhe que nunca tive um quarto. Quando é que teve o seu primeiro quarto?Quando me casei. Até lá, dormia sempre na sala ou no divã. Nunca tive essa privacidade. Estava lá, por exemplo, o meu tio-padrinho, que hoje é meu sócio e por quem tenho um profundo carinho. O meu pai tentou metê-los a todos na Carris. Ele sentia essa preocupação em relação aos irmãos? Era o patriarca. Que é, no fundo, hoje o seu papel na família. Os amigos podemos escolher, a família é nossa. Se Deus me deu este dom e esta capacidade de me autodesenvolver, de construir alguma coisa, tenho esta responsabilidade perante a família. Qual foi o primeiro dinheiro que ganhou? Vou falar do primeiro negócio que fiz. Sempre gostei muito de ler e não tinha dinheiro para comprar livros. Só tinha livros emprestados. Os livros da escola primária que tinha eram livros de alguém que já tinha andado na escola primária. Usados, rabiscados, sujos. Em Odivelas, junto à paragem das camionetas, havia uma barraca-armário e um velhote que trocava livros. Deixávamos um livro, trazíamos outro. Um livro custava 25 tostões, pagávamos 10 tostões e trazíamos outro que ainda não tivéssemos lido. Na minha zona não havia nada igual. Então, aos dez anos, tinha uma valise de carton - do género Linda de Suza - com livros. Investia todo o dinheiro que me davam e que ganhava em livros. Passava duas horas por dia, entre as 17h e as 19h, na paragem do autocarro, a vender e a trocar livros. Foi esta a minha fonte de rendimento até ir para a Casa Pia. Sempre sozinho. Contava consigo e partilhava o que vivia com a sua mãe?Exactamente. O salto: em 1972, o meu pai conseguiu comprar um carro velho, uma Renault 4L castanha. Ainda me lembro da matrícula: DG/46 /26. Gostava de saber onde está esse carro. . . Gostava de o ter?Adorava! O meu pai vendeu-o quando tinha 16 anos, com grande pena minha. Queria tê-lo por ter sido o primeiro carro da família, um símbolo de uma certa ascensão?Seguramente. Dava-nos uma sensação de quase riqueza. Estávamos desenraizados. A nossa referência não era o sítio onde vivíamos. Era a aldeia; e na aldeia, estávamos claramente acima da média (porque os meus pais tinham comprado um apartamento próprio, um carro). Em relação ao bairro de barracas, passa-se a mesma coisa. O meu pai comprou o carro e no fim-de-semana fomos a Cabanas de Torres, trouxemos uma quantidade enorme de comida (couves, alfaces, coelhos, galinhas, carne já arranjada). A minha mãe pediu-me que levasse umas coisas ao meu tio, que morava na outra ponta de Odivelas. O meu tio dava-me sempre um dinheirito e naquele dia deu-me 25 tostões. Vim todo contente com a moeda branca no bolso, e na Rua da Memória vi uma pastelaria com uma montra cheia de bolos. Eu sabia que uma bola de Berlim, na padaria, custava 15 tostões. Tenho a cena como se fosse hoje, felliniana. . . Chego-me ao balcão com o meu metro e dez de altura, peço ao empregado: "Quero uma bola de Berlim, se faz favor. " Um empregado vestido de branco, de lacinho. Vai ao armário, tira a bola de Berlim, mete em cima de um guardanapo, em cima de um prato, em cima do balcão. Estico-me e entrego os meus 25 tostões. Ele diz: "São três e quinhentos. " "Obrigado, não tenho. " Retirei a moeda, ele retirou o bolo, venho por aí fora. Penso muito, muito nessa bola de Berlim. Aliás, gosto pouco de bolos. Acho que tem a ver com isso. Determinou que ia ser diferente? Talvez o salto seja este. Sinto que tenho de ganhar dinheiro. Não vou passar a vida inteira a perguntar primeiro quanto é que as coisas custam, para saber se as posso comprar. Esta é a história da minha vida até aos 12, 13 anos. Antes de avançarmos até à adolescência e à Casa Pia, conte-me de um brinquedo que tenha tido na infância. No Natal, a Carris dava brinquedos aos filhos dos funcionários. Nesses brinquedos vinha um saco com balões. Eu gostava tanto de balões. Imaginei que se iriam romper e estragar, e por isso guardei um em cima do reposteiro. "Daqui a uns meses, quando não tiver mais brinquedos, brinco contigo. " Mas, dali a uns meses, o balão estava completamente comido, provavelmente pelos bichos. Fez-me compreender que as coisas têm de ser vividas no dia-a-dia. Este exercício que estamos a fazer, de olhar para o passado e perceber que marcas há dele na pessoa que é hoje, é uma coisa que faz amiúde?Não o faço de forma tão sistematizada. Faço quando olho para as minhas filhas, e as vejo, como este fim-de-semana, a encher balões de água e a rebentá-los na piscina. Fiquei a pensar que tristeza seria se o visse na minha infância. Encher balões e rebentá-los de propósito era inconcebível. Ainda demorou muito na sua vida até assistir a cenas dessas, na piscina? E a dar-se com ricos? Muito tempo. Na minha infância só via ricos na televisão. Sempre estive integrado em grupos de pessoas do meu meio. Entretanto, a minha mãe ficou grávida da minha irmã, quando eu tinha 12 anos. Os meus pais tinham conseguido juntar algum dinheiro e começaram a construir uma casa na aldeia. Planeávamos inaugurá-la nas festas de Cabanas, no dia 3 de Setembro. No dia 2, a minha mãe, no fim do tempo, pôs-se em cima de um banco para limpar umas coisas; um banco de madeira, que se desmanchou todo. Caiu, destruiu o pé e o tornozelo, foi operada ainda antes de a minha irmã nascer. Esteve no hospital uns seis, sete meses. O meu irmão e eu ficámos sozinhos em casa, a minha irmã foi viver com uma tia. Estávamos em 1979, com uma inflação galopante. Por via desta falta da minha mãe em casa, da sua orientação, entrámos numa situação financeira crítica. O meu pai trabalhava incessantemente, 20 horas por dia, em grande desespero. Eu cozinhava, aguentava a casa, tomava conta do meu irmão. Chumbei o sétimo ano. Um dia disse ao meu pai: "Não vou estudar mais. " O meu pai olhou-me profundamente; não me lembro onde foi a conversa, mas lembro-me do olhar dele. "Nem penses nisso, está fora de questão. " Foi o olhar da determinação e da autoridade?Não foi um olhar autoritário. Foi o olhar de quem dizia que aquela seria a última opção. "Tens de te salvar pelo estudo"?Sim. "Tens de ser melhor. " A solução encontrada foi a Casa Pia?Foi. O meu pai transportava todos os dias uma senhora que trabalhava na secretaria da Casa Pia. Inscreveu-me, em Outubro de 1980 entrei como externo. Acordava todos os dias às cinco da manhã e chegava a casa às oito, nove da noite. Ia de autocarro de Odivelas até Belém. Associado a isto, tenho uma história com este homem que moldou a minha vida. O seu avô materno, cuja fotografia trouxe para perto de si durante a entrevista. O meu avô Alfredo. Por causa dele, mudei de nome aos 14 anos. O meu nome é António Alfredo. Toda a gente me chamava António, Toninho, Tonho, Tó. Nessa altura em que vou para a Casa Pia, o meu avô chama-me à parte e dá-me 500 escudos para comprar os livros. O homem que está nesta fotografia não sabia ler nem escrever. Na aldeia, pobre, foi o primeiro a ter uma vaca para produzir e vender leite. Foi o primeiro a comprar sementes de couves e a semeá-las. A alcunha dele era o Moca das Couves. Até então, as pessoas comiam cardos. Criou oito filhos e trabalhou noite e dia a sua terra. Quando cheguei à Casa Pia, "como é que te chamas?". Fiquei Alfredo, nome com o qual me identificava. É um tributo ao meu avô, que mudou a minha vida. Sempre vestido de preto, punha o barrete ao domingo, escondia os cigarros Porto dentro. Ainda lhe fiz a barba algumas vezes antes de morrer - dava-me um prazer enorme. Já tinha sucesso quando ele morreu? Em que fase da vida estava quando fez a barba ao seu avô?O meu avô morreu no final de 1992. Já ganhava muito dinheiro. Como foi a entrada na Casa Pia?A Casa Pia é uma escola fantástica a quem devo uma grande parte do que sou hoje. Se tenho continuado no ensino normal, teria desistido no ano seguinte - não acabaria o 9. º ano. Ter-me-ia desestruturado. Não sei se estaria cá hoje. Não sei se me teria acontecido o que aconteceu a mais de metade dos meus amigos, que morreram por problemas relacionados com a toxicodependência; outros estão presos. Aquilo era francamente duro. Heroína, crack. Nunca foi por aí?Nunca. Fumei o meu primeiro charro aos 14 anos, na Casa Pia. Recusei as drogas duras porque representam a alienação do mundo real. E é no mundo real que quero estar. É no mundo real que tenho de lutar. Na Casa Pia encontrei um ambiente hostil. Trinta por cento dos que lá estavam eram brancos; os outros eram negros, mulatos, timorenses (estávamos no fim do processo de descolonização). Miúdos com muito ressentimento, raiva, dor. A hierarquia era vincada, dos mais velhos sobre os mais novos. Tinha 14 anos, consegui socializar bem. Até porque trazia esta esperteza de rua, este street smart, que aprendi com os meus amigos das barracas. Queria licenciar-se, tirar um curso técnico para poder começar a trabalhar rapidamente? Qual é a opção?Vou para os cursos técnico-profissionais. Serralharia, marcenaria, electricidade, electrónica. Fiz uma série de testes psicotécnicos e um preceptor, que estava a licenciar-se em Psicologia, o Silva, viu os meus exames e disse-me: "Tu não tens jeito para nada. " Foi uma farpa que me espetaram. "Filho da puta, vou provar-te que estás enganado. " Nunca mais vi o Silva. Deve ser, com certeza, um funcionário público medíocre. Era um autoritário estúpido, que batia nos miúdos por prazer. Dedico-lhe grande parte das minhas vitórias. De cada vez que tem uma vitória continua a ouvir o Silva a dizer que não tem jeito para nada?Não. Continuo a ouvir o Silva em cada momento de ameaça. Sempre que me sinto acossado, encostado ao canto. Nas vitórias, ouço os meus amigos e a minha família. Na luta, vou buscar a força ao que o Silva me disse. Como não tinha jeito para nada, durante o primeiro ano passei de oficina em oficina. O que eu queria era electrónica. Por alguma razão especial?Era o mais limpo. Era o mais intelectual. Era onde estavam os melhores. E era aquilo para que tinha mais jeito. Encontrei aí alguns dos meus mestres. Na mesma altura, comecei a trabalhar nas férias e aos fins-de-semana. Ajudava a montar equipamento de som em bailes dos Alunos de Apolo, na Feira Popular, nos Bombeiros Lisbonenses. Ganhava algum dinheiro para os cigarros. Um dos bailes era frequentado mais do que tudo por prostitutas e empregadas domésticas - as denominadas "sopeiras". Entre os meus 14 e 18 anos, só tive namoradas sopeiras. Porque eram aquelas a que tinha acesso?Não. Porque cozinhavam muito bem e estavam normalmente sozinhas em casa durante o dia. Como andava com o grupo de baile, encontrava muitas. Especializei-me. . . Quantos anos esteve na Casa Pia?Quatro. Não foi só o estar na Casa Pia, foi o sair da Casa Pia. Saí na primeira fornada de cursos técnico-profissionais e com oferta de três empregos. A RDP, a RTP e a Control Data. Um grande amigo, já falecido, o João Soares Louro, fez-me a oferta para trabalhar na RTP. Um ex-casapiano, também. Não há ex-casapianos. Um casapiano é um casapiano para sempre. Durante este processo Chernobil da Casa Pia, repugnante, todos foram apelidados de ex-casapianos. . . É-se aluno da Casa Pia quando se está lá. É-se um casapiano o resto da vida. É uma coisa que fica, como se nos acrescentassem um apelido. Serei um casapiano até morrer. Como assistiu a todo o processo Casa Pia?Uma instituição com mais de dois séculos, que deu a este país homens únicos, tem estado debaixo de fogo. O crime é hediondo. Durante os anos em que estive lá, apercebi-me de que existia prostituição juvenil. Que é uma coisa completamente diferente de pedofilia. Havia alguns rapazes, internos e externos, que apareciam bem vestidos, alguns compravam motos. Todos nós sabíamos de onde vinha esse dinheiro. "Iam aos paneleiros" - dizíamos. Prostituição. Como havia na tropa. Enquanto estive na Casa Pia, nunca me dei conta de nenhuma situação de pedofilia, com crianças. Nem depois, quando saí. (Fui responsável e presidente do Casa Pia [Atlético Clube]. Mantive uma relação próxima com os órgãos [sociais] da Casa Pia. ) Teria sido o primeiro a revoltar-me. Estava a contar que quando saiu da Casa Pia teve várias ofertas de trabalho. Um outro casapiano, Jaime Ribeiro, convidou-me para a Control Data, em Palmela. Eu e os meus cinco colegas fomos todos. Sentimos que era ali que estava o futuro. Estamos a falar de uma fábrica de discos; um disco de 40 megabytes era maior do que uma máquina de lavar roupa de hoje em dia. A fábrica era subsidiada pela CIA (soube-o mais tarde), para travar a força dos vermelhos no concelho. Estive seis meses na fábrica de Palmela, ganhei muito, muito dinheiro. Foi a primeira vez que teve um emprego que não era precário e onde ganhava bem?Foi. Com 17 anos, a dias de completar 18, fiz um contrato para ganhar de base 75 contos por mês (375 euros). O meu pai ganhava 20 na Carris. No final de Junho, quando me pagaram o ordenado e o subsídio de férias, comprei uma moto. A partir do primeiro mês, tinha dinheiro a rodos. Na fábrica, éramos 70 homens e 700 mulheres; e tive na família em casa de quem aluguei um quarto, em Setúbal, uma segunda mãe e uma segunda família. Nem aí sentiu que podia descarrilar? Era a primeira folga, a primeira possibilidade de respirar fundo. Senti um bocadinho. Aqueles meses foram o meu Woodstock. Ao fim de meio ano, fui convidado para vir para Lisboa. Uma proposta difícil de aceitar, mas que me motivou bastante. Era um estágio de um ano ao cabo do qual passaria a contrato. Ordenado: 25 contos(125 euros)por mês. Era especializado em discos e podia especializar-me em informática de uma forma geral. Aceito vir para Lisboa, volto para casa dos meus pais, fiquei a contrato. A vida corria-me muito bem. Como é que fundou a Urbanos?Senti, por via dos meus skills naturais, e daqueles que aprendi enquanto Testemunha de Jeová, que tinha skills comerciais e que estava a desperdiçá-los na Control Data. Queria crescer. No departamento comercial só podiam entrar licenciados. Estava liquidado. Estávamos em 1988/89, tinha acabado de me casar. Casei com 21 anos acabados de fazer, quando saí da tropa. Na tropa fui para um batalhão de transportes. Larguei os cento e tal contos que já ganhava por 1200 escudos por mês, para fazer o serviço militar obrigatório. Fui com uma raiva muito grande. É a primeira vez que fala de raiva. Em todo este processo, e apesar das coisas por que passou, não disse nenhuma vez: "Fiquei enraivecido. " Para a tropa, fui realmente enraivecido. Porque era um revés? Porque contrariava anos de ascensão?Porque não fazia sentido. Dois terços dos mancebos eram dispensados de forma aleatória. Fui obrigado, não houve nada que pudesse fazer. Chorei dias seguidos. Mas quando saí da tropa trazia um know how precioso: como é que funciona uma frota de camiões, quais são os custos, onde é que se tira vantagem, como é que se faz uma mudança. Transportes e logística. As bases para a empresa que veio a montar. Por isso a montou?Em Portugal, não havia nenhuma empresa de logística especializada em transporte de tecnologia. Na Control Data, os meus colegas e eu estávamos qualificados para transportar os equipamentos, para abrir as caixas de madeira, passar cabos por baixo do chão. Era um trabalho que qualquer pessoa podia fazer desde que não estivesse bêbeda, mal apresentada, não cheirasse mal e tivesse a barba feita. Como é que partiu para a constituição da empresa, com que dinheiro?Comecei a estudar Gestão, fiz uma série de cursos e candidatei-me a um programa de apoio a jovens empresários. Uma verba de 20 mil contos a fundo perdido. As taxas de juro estavam quase a 20 por cento! Fui apresentar o meu projecto ao Palácio das Laranjeiras, num dia quente, em Julho de 1990. No fim, o meu interlocutor perguntou-me, en passant, se eu era filiado no PSD. . . Desisti dessa possibilidade. Falei com a minha mulher, mãe das minhas filhas mais velhas, e apostámos na Urbanos. Com os dois mil contos que tínhamos, comprámos uma carrinha. Envolvi a família: fiz um acordo com o meu pai e com o meu padrinho (o meu pai já estava reformado e o meu padrinho trabalhava por turnos). Dava 20 por cento a cada um se trabalhassem de borla durante um ano. Foi assim que começámos. A Paula em casa a tratar dos papéis, eu na Control Data, simultaneamente, e a conduzir à noite. Correu bem desde sempre?Não tínhamos custos além do gasóleo, e ao fim de um ano tínhamos cinco carros, sete ou oito empregados. Tínhamos uma série de serviços relacionados com a tecnologia, com a importação de bens perecíveis e o transporte de materiais francos que vinham do aeroporto ou do porto de Lisboa, tabaco e uísque para abastecer os navios que estavam a reparar na Setenave. Montar a empresa de raiz, nessas circunstâncias, é um processo ousado. O que é que o fez confiar tanto em si? O passado. O lado dinâmico, empreendedor e de vendedor vem da minha infância. Em Fevereiro de 1992, despedi-me. Deixei os 500 contos e o carro e vim ganhar 167 contos para a Urbanos. Era o necessário para pagar a prestação da casa, para vivermos com alguma qualidade. Arrisquei tudo e não estou nada arrependido. Passei seis anos consecutivos sem férias. Por que é que quis arriscar tudo quando já estava numa situação confortável, com 500 contos e carro? Para quem vem de uma situação de carência como a sua, aquilo já era extraordinário. Mas não lhe bastava. O problema era que aquilo era a prazo e não tinha perspectivas de crescimento. Já sabia que queria ser alguém. Queria que as minhas filhas tivessem uma vida diferente da minha. Queria viajar pelo mundo inteiro, ter acesso às coisas boas. Queria ter uma vida diferente daquela que tive até aos 14 anos. Quando é que o dinheiro deixou de ser uma preocupação? Quando é que deixou de olhar para o lado direito do menu?Quando me divorciei, pesava 118 quilos, trabalhava e fazia uma vida desregrada. Só nessa altura é que percebi que estava milionário. Entre 1991 e 1998, não tive a noção do património que estava a acumular. Estava preocupado em fazer mais, em fazer crescer a empresa, em contratar as melhores pessoas. Mas ainda não estava a desfrutar?Não, de forma nenhuma. Ofereço a mim próprio o meu primeiro presente no dia em que fiz 33 anos. Comprei um Mercedes descapotável, que ainda hoje tenho e que quero guardar como relíquia. O primeiro brinquedo foi a moto. Sim, mas este teve uma carga especial. Porque era inimaginável?Era a consumação de um facto, a consagração, o abrir da garrafa de champanhe. É a fase em que começo a desfrutar. Comecei a ir para a Quinta do Lago e para Vale de Lobos. Nesse ano conheci a Eugénia, com quem vivo e tenho uma filha. Nunca teve complexos de nenhuma espécie? Nem quando o Silva lhe disse que não tinha jeito para nada. Nem quando nas Laranjeiras lhe perguntam se tinha cartão do partido e vê as portas fecharem-se. Não tenho complexos de inferioridade. Parto de uma base muito baixa para um patamar simpático, onde estou, tanto profissional como económico e social. Em cada sítio onde chego, aprendo, adapto-me, não me sinto complexado. Uma vez ou outra senti-me rejeitado. Dói-me bastante, quando acho que o fazem, não por causa do meu valor, mas quando outros valores se levantam. Nunca teve raiva de ricos?Pelo contrário. Há duas atitudes possíveis. Ou estamos na paragem do autocarro a olhar para o tipo que passa no Mercedes e dizemos: "Um dia hei-de ser como tu"; ou olhamos para o tipo que passa no Mercedes e dizemos: "Filho da puta, um dia hás-de andar de autocarro como eu. " Sempre usei a primeira fórmula. Esta é uma característica que o nosso povo tem. Apetece-me esganar os nove milhões e 800 mil que às vezes sentem isto. Nunca tive raiva aos ricos. Sempre disse que um dia seria como eles. Mas nunca teve a subserviência que muitas vezes os pobres têm em relação aos ricos. Não. Começou a viajar quando? - era outro dos seus anseios. A primeira vez que fui ao estrangeiro foi quando me casei, em lua-de-mel. Fui de carro a Paris no Renault 5 que tinha. Fiquei em casa de uns familiares, e depois em casa da madrinha da minha mulher, na Suíça. Fizemos um pequeno tour, dez ou 12 dias a ver o mundo e a ficar de boca aberta. A comer McDonalds, aquele sabor único que fica do primeiro que se come. Estive a fazer as contas: já visitei 64 países diferentes. Durante muito tempo, só se deu com pessoas do seu meio. Quando é que os ricos passaram a ser pessoas com quem se cruza na rua, ao almoço?Começo a relacionar-me com pessoas de um poder económico e de um mundo diferente do meu em 1996, a jogar golfe. Percebeu que os negócios passavam pelo golfe?Claramente. Tive sempre muitas ajudas. O meu grande segredo foi nunca desiludir as pessoas que apostaram em mim. Não são os "Silva" desta vida que me fizeram chegar onde cheguei; são aqueles que disseram que eu era capaz, que ia ser bem sucedido, aqueles que me deram oportunidade de fazer um negócio com responsabilidade. Os "Soares Louro" desta vida, os "Manuel Mateus" desta vida. Não podemos desiludir as pessoas que estão connosco, os nossos colaboradores. E nas bases é o mesmo processo: é fazer pequenos "Alfredos Casimiros". Pegar em ajudantes de mudanças e transformá-los em directores de unidades de negócio. Este ano, a Urbanos foi considerada a melhor empresa para se trabalhar em Portugal. O segredo é dar a cada pessoa a noção de que pode progredir?Para além das instalações, do salário, da água, da fruta, é a formação e a possibilidade de crescer dentro da organização. Oitenta por cento da nossa equipa comercial é constituída por pessoas que vieram de baixo. A empresa, culturalmente, está desenhada para motivar, apoiar e acarinhar os melhores membros dentro de cada área, sejam ajudantes ou motoristas. Um caso que ilustre isso que diz. O Bernardino Neves é um study case dentro da Urbanos. Foi para lá com 16 anos e o 2. º ano do ciclo, hoje tem o 12. º ano, está a fazer Gestão, é director de uma unidade de negócio, está a um passo de ser administrador do grupo. Encontro pessoas com um valor extraordinário, que vestem a camisola, que precisam da formação certa. E as pessoas sentem esperança. Isso é uma necessidade de retribuição?That"s business. Também tem a ver com retribuição, mas é um modelo de negócio. O meu negócio não é logística ou transportes, são as pessoas. Trata assim as pessoas porque acha que é assim que profissionalmente a sua empresa pode crescer?Exactamente, com o crescimento dessas mesmas pessoas. É isto que faz com que as pessoas dêem a sua last mile, aquela milha extra quando se corre a maratona, quando é preciso suar e ir buscar energias onde elas já não existem. Estão com esta motivação, este drive, porque têm os exemplos dos outros. E os exemplos são tudo, não podemos escrever por decreto e depois não dar o exemplo. Consegui fazer isto na Urbanos e noutros negócios em que tenho estado envolvido, numa série de empresas que comprei e vendi (foi também isso que me deu mais alguma folga económica). É aquela velha máxima de Sun Tzu: "Não existem maus soldados, existem maus generais. " Tem várias edições na estante de A Arte da Guerra, de Sun Tzu. Também tem pelo menos duas edições de O Príncipe, de Maquiavel. Infelizmente não li a edição inglesa. O meu inglês não é suficientemente bom. Mas o das minhas filhas já é. O golpe mais rude da sua vida foi a morte do seu irmão?Foi. O meu irmão era um grande back up. A existência dele dava-me a possibilidade de estar fora o tempo que fosse necessário, sabendo que em termos profissionais e familiares estávamos à distância de um telefonema. Demorei muito tempo a processar a morte do meu irmão. Chorei nos primeiros cinco minutos, depois parei. Entrei num estado de semitranse em que a única preocupação era fazer controlo de danos na família, nos filhos dele, na minha mãe, fazer umas exéquias fúnebres dignas. Só ao fim de 12 dias é que consegui chorar. Fui a nova Iorque em trabalho, e no terceiro dia não saí do quarto; estive convulsivamente a chorar entre as sete da manhã e as seis da tarde. Tinha-me custado muito a morte do meu pai, mas era mais natural, embora tivesse apenas 61 anos. A morte de um irmão mais novo, um companheiro, um compincha. . . Foi como se fosse uma parte de si?Sim. Tinha 37 anos, foi um ataque cardíaco fulminante, um aneurisma. Fez-me pensar, e faz-me repensar, muito a vida. É evidentemente uma dor imensa. Mas o que é que muda em si, em que é que muda a sua atitude?O meu irmão vivo dava-me a garantia de poder fazer as asneiras que quisesse. Se me acontecesse alguma coisa, tinha alguém que trataria das coisas. O meu irmão morto obriga-me a ser muito mais conservador naquilo que faço, nas viagens, nos riscos que corro. Nos riscos financeiros também. Fiquei com uma grande responsabilidade às costas. Já era o patriarca, agora estou mais isolado e sozinho. Sinto um vazio muito grande dentro de mim. Tem três filhas. Qual é a sua grande preocupação em relação a elas?Quero mandá-las estudar nos melhores colégios, nas melhores universidades, licenciatura, master, o que quiserem. Quero dar-lhes uma ferramenta forte, prepará-las para o futuro. Para que possam ser elas a fazer a sua vida. Não quero correr o risco de, daqui a 30 ou 40 anos, estar às portas da morte e ter três filhas imbecis, à espera que o pai morra para meter a mão em 20 milhões ou 30 milhões de euros cada uma. Elas sabem disso?Têm a noção de que o pai não lhes vai deixar nada. Se as deixar bem financeiramente, vou tirar-lhes o prazer de vencer, de construir. Se amanhã se alavancarem no dinheiro do pai, não vão ter esse prazer. Vão ter o complexo de fazer mais ou melhor que o pai; ou então entregam-se à morte: "Vamos lá torrar o dinheiro que o pai nos deixa. "Quando diz que não lhes quer deixar nada, significa literalmente, nada, além da educação? É uma declaração retórica, tem planos em relação a isso?Tenho. Estou a constituir uma fundação onde quero deixar parte considerável dos meus bens, e onde, naturalmente, se alguma coisa lhes acontecer, em termos de saúde ou incapacidade, tenham um apoio. Mas "toma lá um milhão para começares a vida", isso não?Não, definitivamente. Quero muito poder comprar o primeiro carro e a primeira casa e depois "faz-te à pista". O objectivo desta fundação é devolver à sociedade aquilo que ela fez por mim. Numa primeira fase quero que o projecto contribua para a formação de pessoas com valor que estão desaproveitadas, que as possa motivar e ajudar a encontrar aquilo que realmente querem fazer. Mais do que terem um canudo, um degree, ajudá-las a encontrar a vocação. E, simultaneamente, apoiar, em termos empresariais, micro e pequenos empresários. Pegar em empregados de longa duração, ou nos que estão desempregados aos 55 anos, que dificilmente vão voltar ao mercado de trabalho, que têm a ambição de ter o seu próprio negócio, e dar-lhes formação, ensinar gestão, tesouraria, a lidar com os impostos. Só tem 43 anos, mas por ter começado tão cedo, e por ter tanto que contar, às vezes parece que estou a falar com um homem mais velho. Mesmo a propósito da fundação: é raro ouvir um jovem falar assim do seu futuro. Sente-se velho?A fundação é uma ideia que venho a desenvolver há cinco ou seis anos. O falecimento repentino do meu irmão fez-me acelerar este processo e anunciá-lo publicamente. A morte dele fez-me perceber que não somos nada e que a qualquer momento desaparecemos. Isto faz com que fiquemos com um sentimento de maior maturidade, de envelhecimento precoce. Mas não me sinto nada velho. Sinto que mereço descansar um pouco mais. O que é que ainda o faz correr? No começo da entrevista falou de necessidade e não de vontade. É a competitividade, o vício de ganhar. Ganhar e construir coisas dá-me muito prazer. O dinheiro é importante, mas já não é só isso: é fazer, é ser o melhor, ter a melhor equipa. Por que é que perto de si tem a fotografia do seu avô e o quadro do leão? Quis colocar-se estrategicamente nesta posição, de modo a poder vê-los. É uma peça de um autor austríaco do século XIX. Foi a primeira extravagância, ou melhor, investimento, que fiz, em 1995, em Basileia. Revejo-me neste leão, nos finais de dia, quando chego a casa cansado depois de uma luta feroz. O meu avô, porque foi uma grande referência para mim. Ele e o meu padrinho são dois dos homens que, se tivessem sido apoiados pela fundação que quero constituir, teriam sido grandes homens. Gostava de contribuir para colmatar essas falhas e dar a essas pessoas com esse valor intrínseco, com garra e vontade, a oportunidade que tive, e que infelizmente poucas pessoas têm. Entrevista publicada na revista Pública de 27 de Junho de 2010
REFERÊNCIAS:
Incidência do HIV recua nos jovens entre os 15 e os 24 anos nos países mais afectados
A epidemia da sida recuou nitidamente nos jovens entre os 15 e os 24 anos para perto de metade nos 25 países mais seriamente afectados do mundo, particularmente na África Subsariana, anunciou hoje a Onusida. (...)

Incidência do HIV recua nos jovens entre os 15 e os 24 anos nos países mais afectados
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.166
DATA: 2010-07-13 | Jornal Público
SUMÁRIO: A epidemia da sida recuou nitidamente nos jovens entre os 15 e os 24 anos para perto de metade nos 25 países mais seriamente afectados do mundo, particularmente na África Subsariana, anunciou hoje a Onusida.
TEXTO: “A prevalência do HIV entre os jovens está a baixar em vários países chave”, avança o relatório anual do Programa das Nações Unidas sobre o HIV. O documento recorda que 80 por cento dos jovens contaminados – ou seja, 4 milhões de pessoas – vivem na região da África Subsariana, e refere que a diminuição na incidência do vírus se deve ao aumento do uso de preservativos. Estes países “atingiram ou esperam atingir o objectivo internacional de redução de 25 por cento da prevalência do HIV entre os jovens, estipulado pela Conferência Internacional [das Nações Unidas] sobre a população e o desenvolvimento, em 1994”, continua o relatório. Entre os que conseguiram atingir o objectivo estão o Botswana, Costa do Marfim, Etiópia, Quénia, Malawi, Namíbia e Zimbabwe. E entre os países que esperam conseguir fazê-lo até ao fim deste ano estão o Burundi, Lesoto, Ruanda, Suazilândia, Bahamas e Haiti. O relatório adianta que isto é “essencial para inverter a trajectória da epidemia da sida”. Adianta ainda que, pela primeira vez, a redução da prevalência do vírus coincide com a alteração de um comportamento sexual. “Houve uma mudança entre os jovens em todo o mundo, em particular em certas zonas da África Subsariana”. O recuo é explicado por uma entrada mais tardia na vida sexual activa, por uma redução no número de parceiros sexuais e por uma “utilização acrescida” do preservativo entre os 15 e os 24 anos nos jovens com vários parceiros. Segundo a Onusida, cerca de 5 milhões de jovens com esta idade têm sida. Cerca de 900 mil foram contaminados em 2008, 66 por cento mulheres.
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Palavras-chave sexual mulheres marfim
Palco sem emoção, festa fora dele, no Sudoeste
Nota de popularidade para Jamiroquai. Nota artística para DJ Shadow. Foi assim, ontem, no Sudoeste, perante 40 mil pessoas que fizeram a festa, apesar da mediania do que se viu e ouviu. (...)

Palco sem emoção, festa fora dele, no Sudoeste
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-08-07 | Jornal Público
SUMÁRIO: Nota de popularidade para Jamiroquai. Nota artística para DJ Shadow. Foi assim, ontem, no Sudoeste, perante 40 mil pessoas que fizeram a festa, apesar da mediania do que se viu e ouviu.
TEXTO: Na noite anterior tinha existido emoção e agitação em palco, através de M. I. A. , Flaming Lips, Very Best, Bomba Estéreo ou Rye Rye, e uma resposta apagada do público, que apenas despertou aquando do concerto de M. I. A. . Ontem foi ao contrário. Espectáculo mornos, assistência em festa. Cerca de 40 mil pessoas, diz a organização. Vá-se lá perceber estas coisas. Ou tente-se. A generalidade do cartaz e a concepção do espaço, misto de parque de atracções e de arsenal publicitário com tudo o que é para adolescentes, está concebido para receber quem vai a um festival em missão de reconhecimento, não de descoberta. Só assim se percebe que o cantautor inglês James Morrison ou a americana Colbie Caillat, que não se distinguem por outra coisa a não ser por alguma fotogenia e por terem um ou dois sucessos radiofónicos pouco aconselháveis, sejam recebidos em festa. Só assim se entende que os repetentes Jamiroquai, capazes de apresentar um espectáculo profissional e competente, mas a léguas da excelência, sejam acolhidos com arrebatamento. Dizem-nos a toda a hora que este é o festival da “boa onda”. Na noite de ontem pareceu apenas o festival da falta de exigência. Quem acabou por beneficiar da letargia, das mensagens de amor bem intencionadas de Colbie Caillat e das versões mais do que ensaiadas por toda a gente (“No woman no cry”, a canção popularizada por Bob Marley), foi Jay Kay, com as inevitáveis penas engalanadas na cabeça, e os seus Jamiroquai. Depois de uma sessão delicodoce, o seu funk dançante até parecia que fazia levitar. Mas, claro, era apenas uma impressão inicial. Quem já o viu ao vivo antes, sabe do que é capaz: apresentar um espectáculo eficiente e dinâmico, coadjuvado por um numeroso naipe de músicos e cantoras, que resgatam os seus êxitos todos (de “Virtual insanity” a “Cosmic girl ou “Alright”), mas a frescura da sua música já lá vai e o gesto espontâneo que liberta um concerto da mediania já não quer nada com ele. Mas o público fez a festa. A nota de popularidade estava entregue. A nota artística teve outros protagonistas: a sueca Lykke Li e, principalmente, o americano DJ Shadow. Da primeira até já lhe vimos melhores prestações, mas as canções do álbum “Youth Novels”, e algumas novas que apresentou, nunca se desfiguram por completo, apesar da cantora e dos músicos que a acompanharam, estarem em regime de serviços mínimos, com as percussões tribalistas a darem lugar à elegância electrónica. Na noite anterior havia-se visto M. I. A. a tentar, com sucesso, apresentar um espectáculo total, que proporcione um tipo de experiência que não se restrinja ao habitual do concerto rock. Ontem foi a vez de DJ Shadow, de forma diferente, o ensaiar. E foi coroado de êxito, facto tanto mais assinalável porque é um alquimista sonoro, não particularmente comunicativo. Mas é autêntico na forma como interage. Apresentou-se dentro de uma bola gigante, que fazia girar, ora estando oculto da assistência ora deixando-se vislumbrar, enquanto as imagens se sucediam. O resto foi com a sua música, o habitual corte-e-cola inspirado em linguagens pós-hip-hop e também em variações rítmicas repescadas ao drum & bass. Foi uma sessão sonora versátil, do ponto de vista cénico surpreendente, que levou a assistência ao rubro. Um exemplo de como transformar uma actuação de um músico sóbrio, que não tem uma relação muito física com a matéria sonora, em qualquer coisa criativa e apelativa.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave cantora
Número de afectados pelas chuvas no Paquistão sobe para 15 milhões
Mais de 1600 mortos, 15 milhões de pessoas afectadas, 650 mil casas destruídas, pelo menos 550 mil hectares de terra agrícola alagada. As cheias no Paquistão, as piores dos últimos 80 anos, não dão sinais de abrandar. (...)

Número de afectados pelas chuvas no Paquistão sobe para 15 milhões
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-08-09 | Jornal Público
SUMÁRIO: Mais de 1600 mortos, 15 milhões de pessoas afectadas, 650 mil casas destruídas, pelo menos 550 mil hectares de terra agrícola alagada. As cheias no Paquistão, as piores dos últimos 80 anos, não dão sinais de abrandar.
TEXTO: O primeiro-ministro Yousuf Raza Gilani esteve a acompanhar as operações de salvamento, e disse que ainda não é possível calcular os estragos. “Peço ao mundo que nos ajude. Estamos a fazer tudo o que podemos. ”Embarcações da Marinha paquistanesa tentavam ontem resgatar sobreviventes na província de Sindh, Sudeste do país, onde as águas do rio Indus galgaram as margens e uma barragem transbordou. O alerta vermelho foi decretado na região e as barragens de Tarbela a Mangla atingiram também o nível máximo. Nos próximos dois dias a situação não deverá abrandar, uma vez que as previsões apontam para fortes chuvas. “Espero que estas águas desapareçam. Quero regressar”, disse à Reuters Sakina, uma das muitas mulheres que tentam fugir às cheias e entrar nos barcos da Marinha, por vezes com crianças ou sacos de roupas. Até galinhas, dos poucos animais que se conseguem salvar. As inundações já terão matado cerca de 10 mil vacas. Mohammad Saleem perdeu tudo na aldeia de Kot Addu. “Não recebemos qualquer ajuda do Governo ou de fora, e tenho a certeza de que a ajuda estrangeira não chegará até nós”, disse à Reuters. Ele é um dos muitos paquistaneses que critica a forma como o Governo tem lidado com a catástrofe, numa altura em que o Presidente Asif Ali Zardari está a ser contestado por ter mantido uma viagem à Europa em vez de ficar no país. No Reino Unido, onde Zardari se encontrou no sábado em Birmingham com apoiantes do Partido do Povo do Paquistão, chegou a haver protestos e do lado de fora da reunião ouviu-se: “Go Zardari, go!” Lá dentro um homem tentou atirar-lhe com um sapato mas foi travado a tempo pela segurança. Zardari é também criticado por manter a viagem ao Reino Unido depois de o primeiro-ministro britânico, David Cameron, ter sugerido, durante uma visita à Índia, que o Paquistão “promove a exportação do terrorismo”. Zardari, dizia o diário paquistanês Dawn em editorial, “parece ter desvalorizado o impacto que esta visita terá para a sua imagem enquanto Chefe de Estado. ”Extremistas no terrenoNo Noroeste do Paquistão está a ser distribuída ajuda humanitária pelo grupo de militantes islamistas Jamaat-ud-Dawa, com ligações à organização extremista Lashkar-e-Taiba, responsabilizada pelos ataques de Bombaim que, em Novembro de 2008, mataram mais de 160 pessoas. “Um dos grandes problemas é que, enquanto o Governo de Zardari e a comunidade internacional lutam para concertar a sua actuação, os militantes islamistas estão no terreno a ajudar”, disse à Reuters o analista Bruce Riedel, do Brookings Institute em Washington. O Jamaat-ud-Dawa está na lista de grupos terroristas da ONU. Nos últimos dias tem distribuído ajuda em Charsadda, Noroeste do país, incluindo alimentos e um serviço de ambulância para socorrer as vítimas, esceveu o Christian Science Monitor, que adiantou: “Através da ajuda humanitária, conquistam corações e mentes numa região ameaçada pela militância islamista e os taliban. ” Um dos voluntários no campo de Charsadd, Hajji Makbool Shah, de 55 anos, disse: “Se o Governo tivesse a fazer o seu trabalho, nós não seríamos precisos. Onde é que estão as ambulâncias do Governo?”
REFERÊNCIAS:
Entidades ONU
Nobel da Medicina para o pai da fertilização in vitro
A época dos Nobel de 2010 arrancou hoje com o galardão da Fisiologia ou Medicina que distinguiu Robert G. Edwards, o pai da fertilização in vitro. (...)

Nobel da Medicina para o pai da fertilização in vitro
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-10-04 | Jornal Público
SUMÁRIO: A época dos Nobel de 2010 arrancou hoje com o galardão da Fisiologia ou Medicina que distinguiu Robert G. Edwards, o pai da fertilização in vitro.
TEXTO: Robert G. Edwards nasceu em 1925 em Manchester, no Reino Unido, e está ligado à Universidade de Cambridge, no mesmo país. Depois do serviço militar na segunda Guerra Mundial, estudou Biologia na Universidade de Gales e na Universidade de Edimburgo, onde completou em 1955 o seu doutoramento com uma tese sobre o desenvolvimento embrionário em ratinhos. Em 1958 integrou o “National Institute for Medical Research”, em Londres, onde se dedicou à fertilização em humanos. A partir de 1963 passou a trabalhar em Cambridge, primeiro na universidade e depois na clínica Bourn Hall, o primeiro centro mundial de bebés-proveta, que fundou com Patrick Steptoe, o ginecologista que foi sempre o seu braço direito nestas investigações. “A sua descoberta permitiu tratar a infertilidade, uma condição médica que afecta uma larga proporção da humanidade, incluindo mais de dez por cento dos casais de todo o mundo”, explicou a academia sueca, em comunicado. Foi ainda na década de 1950 que Edwards percebeu que a fertilização in vitro poderia ser o caminho para o tratamento da infertilidade, trabalhando, desde aí, em experiências com óvulos e culturas de células. Um empenho que veio a colher frutos a 25 de Julho de 1978, dia em que nasceu o primeiro “bebé-proveta”. Nos anos seguintes, Edwards e os seus colaboradores refinaram as técnicas necessárias e partilharam-nas com médicos do mundo inteiro. De acordo com dados avançados pela Assembleia Nobel, até ao momento, o investigador já foi pai de quatro milhões de bebés, muitos dos quais já são adultos e até pais. “Uma nova era da Medicina emergiu, com Robert Edwards a liderar o processo desde as descobertas mais fundamentais às mais correntes (. . . ) O seu contributo representa um marco no desenvolvimento da Medicina moderna”, destaca o mesmo comunicado. Para a descoberta de Edwards em muito contribuíram outros cientistas que concluíram com sucesso as experiências com maturação de ovócitos de mamíferos, nomeadamente ratinhos e coelhos, em tubos de ensaio. Edwards percebeu, contudo, que nos humanos os ciclos são muito diferentes, comparativamente com animais como os coelhos, conseguindo clarificar como se processa a maturação, que hormonas a regulam e em que condição é possível haver fertilização. Conseguiu fertilizar um óvulo in vitro, pela primeira vez, em 1969, mas este não se subdividiu. Partiu para uma nova fase: recolher óvulos já amadurecidos nos ovários através de uma técnica chamada laparoscopia e que gerou grande polémica na época, a par com os diversos debates éticos e religiosos que lançou sobre recriar vida em laboratório. 25 de Julho de 1978O dia 25 de Julho de 1978 foi um sábado muito especial para o casal Leslie e John Brown, de Bristol, no Sul de Inglaterra. Mas também foi um sábado especial para muitos casais em todo o mundo, que estavam, até aí, impossibilitados de ter filhos naturalmente. Leslie preparava-se para ser a mãe do primeiro bebé-proveta de sempre, uma menina, chamada Louise Brown. “Comecei a fazer estudos com tecido ovárico humano recolhido em cirurgias. Mas tinha de conseguir fertilizar os ovócitos no laboratório”, contou Edwards, em 2003, aquando da celebração dos 25 anos da sua invenção. As primeiras experiências de Pincus e Saunders, com coelhos, tinham mostrado que bastavam 12 horas para o amadurecimento e fertilização dos ovócitos no tubo de ensaio. Ter acreditado que esses resultados poderiam aplicar-se a células humanas custou-lhe vários desgostos. Até que chegou o dia: "Decidi então esperar 25 horas por três ovócitos que me restavam. De repente, foi a alegria. Agora havia esperança para a fertilização in vitro".
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave guerra humanos
Reacções ao Prémio Nobel para Mario Vargas Llosa
Para o crítico literário Pedro Mexia, este é um prémio surpreendente do ponto de vista político, mas sem surpresas no aspecto literário, disse o autor ao PÚBLICO. O seu antigo editor, Nélson de Matos, considera que o prémio "tardava a ser atribuído.” Um amigo de longa data e editor argentino, Mario Muchnik, descreve a ambição literária de Vargas Llosa como sendo quase "inconsciente". (...)

Reacções ao Prémio Nobel para Mario Vargas Llosa
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-10-07 | Jornal Público
SUMÁRIO: Para o crítico literário Pedro Mexia, este é um prémio surpreendente do ponto de vista político, mas sem surpresas no aspecto literário, disse o autor ao PÚBLICO. O seu antigo editor, Nélson de Matos, considera que o prémio "tardava a ser atribuído.” Um amigo de longa data e editor argentino, Mario Muchnik, descreve a ambição literária de Vargas Llosa como sendo quase "inconsciente".
TEXTO: Pedro Mexia, crítico literárioPara Pedro Mexia, crítico literário, este é um Prémio Nobel surpreendente do ponto de vista político, mas expectável em termos literários. "Vargas Llosa faz parte daqueles autores canónicos" que está na eterna lista dos candidatos ao Nobel da Literatura, explica ao PÚBLICO ao telefone a partir de São Paulo. "É um prémio que é um pouco surpreendente do ponto de vista político, pelas posições políticas que tem assumido", nomeadamente como cronista e autor de obras como "Diário do Iraque". Mas tal como Phillip Roth ou Milan Kundera, indica, "autores que não precisam do Nobel" para a consagração, é um autor com uma longa obra e que, em termos literários e de correntes sul-americanas, "contraria o realismo mágico - sempre se interessou pelo realismo puro e duro, pelos regimes autoritários", remata. Nélson de Matos, editorNélson de Matos, editor durante vários anos de Vargas Llosa em Portugal durante os seus anos na Dom Quixote, recebeu a notícia da distinção do escritor peruano com muita satisfação. “É um prémio merecidíssimo e que de facto tardava a ser atribuído. ” O editor, agora responsável pelas Edições Nelson de Matos, reconhece que a lista dos candidatos a Nobel contemplava “outros autores, igualmente importantes”, mas destaca, por duas razões, a justiça da atribuição do prémio a Mário Vargas Llosa: “Por estar em atraso por parte da Academia, e por ser um grande escritor, com uma obra muito extensa e diversa, riquíssima sob todos os pontos de vista”. Da obra de Vargas Llosa, Nélson de Matos destaca “Conversa n’a Catedral”, “A Guerra do Fim do Mundo” e “A Tia Julia e o Escrevedor”. “São os seus livros mais conhecidos e mais importantes”, aponta. “Falam-nos quer da sua juventude, quer da sua vida de adulto no Peru onde nasceu, um país cheio de diversidades que aparecem bem relatadas nas suas histórias e de que a sua escrita, muito trabalhada, nos dá conta”. Mario Muchnik, editor e inspiração para personagem de "Travessuras da menina má” (2006)"Estava na hora", diz ao telefone com o PÚBLICO o argentino Mario Muchnik, sobre a chegada do Nobel às mãos de Mario Vargas Llosa. "Há muitos anos que o esperava". Muchnik, que já editou J. M. Coetzee (Nobel em 1993), Susan Sontag ou Bruce Chatwin, conheceu Mario Vargas Llosa entre 1966/7, em Londres. Muchnik, com formação na Física e apaixonado pela fotografia, "estava a começar no mundo editorial". O escritor peruano já tinha sido premiado por "A Cidade e os Cães" (1963) e estava a lançar "A Casa Verde" (1966). Do trabalho do amigo, com quem se encontra regularmente, diz que "é uma literatura mais difícil do que, por exemplo, a de Gabriel García Márquez". "Tem uma estrutura literária extraordinária e ideias muito ambiciosas. Tem romances que são reflexo dessa sua tal ambição literária, por que da outra [ambição] não tem", frisa ao telefone. "É tão ambicioso que é quase inconsciente", ignorando os perigos da possibilidade de não corresponder às suas próprias expectativas. Muchnik dirigiu as colecções Robert Laffont em Paris, criou em seu nome a Muchnik Editores e, mais recentemente, o Taller de Mario Muchnik, em Madrid. É também escritor e fotógrafo. A homenagem maior de Llosa à amizade dos dois foi tê-lo transformado em personagem de "Travessuras da menina má” (2006). "Sou editor [no livro], é uma efabulação do Mario, que me pediu autorização para o fazer quando jantávamos num restaurante italiano", conta. "Por um lado, é muito elogioso", diz, "trata-me muito bem como seu editor" ficcional. "Não sou editor dele, mas gostava de o ter sido". Porque nunca aconteceu? "Ele tornou-se muito conhecido rapidamente e não foi possível. Em pouco tempo tinha três ou quatro livro importantes nas livrarias, não estava ao meu alcance", diz, rindo-se. José Eduardo Agualusa, escritor
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave guerra cães
Chile antecipa início do resgate dos mineiros para a meia-noite
As autoridades chilenas decidiram antecipar para as oito horas da noite (24h00 horas em Lisboa) o início da operação de resgate dos 33 homens soterrados a 700 metros de profundidade numa mina de ouro e cobre do deserto de Atacama desde 5 de Agosto. (...)

Chile antecipa início do resgate dos mineiros para a meia-noite
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-10-12 | Jornal Público
SUMÁRIO: As autoridades chilenas decidiram antecipar para as oito horas da noite (24h00 horas em Lisboa) o início da operação de resgate dos 33 homens soterrados a 700 metros de profundidade numa mina de ouro e cobre do deserto de Atacama desde 5 de Agosto.
TEXTO: O arranque do salvamento tinha sido inicialmente marcado para a meia-noite, mas depois de testados os equipamentos envolvidos na manobra, foi decidido antecipar o começo em quatro horas. A postos estão os 16 homens directamente envolvidos na operação – membros das forças especiais do exército chileno, médicos socorristas, mineiros e engenheiros. Eles vão trabalhar por turnos de doze horas. Dois deles vão descer até ao refúgio onde se encontram os mineiros, para poder assistir na preparação de cada um deles antes da subida de volta à superfície. A ascensão de cada homem deve demorar cerca de 20 minutos dentro da “Fénix”: a cápsula de quatro metros de altura, 53 centímetros de largura e 460 quilos de peso que rodopiará pelo túnel de 622 metros (e 72 centímetros de diâmetro) escavado em 33 dias. As autoridades estimam que com a preparação para entrar na cápsula o processo possa durar até uma hora. O treino dos mineiros para a viagem envolveu exercício físico e uma dieta líquida para prevenir náuseas e vómitos e assegurar as calorias suficientes para suportar o stress. Os homens vão usar um cinto abdominal que regista os seus sinais vitais, uns óculos de sol para bloquear os raios ultravioleta e tampões para os ouvidos. Uma lista com a ordem pela qual os homens vão ser retirados já terá sido feita, mas não foi divulgada à imprensa. O princípio usado pelas equipas de salvamento foi o seguinte: os homens mais experientes e mais capazes de controlar os nervos vão subir primeiro, porque saberão lidar com qualquer imprevisto durante o transporte. A seguir vão aqueles cuja condição física inspira algum cuidado (os hipertensos e diabéticos, por exemplo). Para o fim ficam os mais fortes. A segurança em redor da mina de San José, em pleno deserto de Atacama foi significativamente reforçada. Uma multidão de familiares, amigos, companheiros de profissão, curiosos, jornalistas e entidades oficiais está plantada junto à gigantesca grua que vai içar a cápsula metálica desenhada para retirar os mineiros, um a um, das profundezas. O Presidente do Chile, Sebastian Pinera, deve chegar ao local ao final da tarde. O seu congénere boliviano, Evo Morales, também pretende estar presente. As montanhas do deserto de Atacama estão a ser patrulhadas por polícia a cavalo e helicópteros. O “campo Esperança”, onde se instalou uma pequena aldeia de tendas, fervilha de actividade. Enquanto as centenas de equipas de televisão se preparam para a transmissão em directo da “hora H” em que o primeiro sobrevivente alcance a superfície, as mulheres e namoradas dos mineiros ensaiam penteados e fatiotas, e os cozinheiros ocupam-se dos petiscos para a grande celebração. Os 33 homens ficaram soterrados quando um muro de sustentação colapsou. Só 17 dias depois do acidente as equipas de busca conseguiram confirmar que todos estavam vivos. Desde então, os mineiros têm sido alimentados através de um ducto de diâmetro semelhante a um cano doméstico. Por esse tubo de ligação ao exterior chegaram cartas, vídeos e presentes. Os 68 dias que os mineiros do Chile já passaram debaixo da terra constituem um recorde absoluto em termos de sobrevivência.
REFERÊNCIAS:
“Que isto não volte a acontecer”, diz Piñera
Na mina de San José tocaram as sirenes, cantou-se o hino nacional do Chile. Emocionado, o Presidente Sebastián Piñera prometeu que o acidente que deixou 33 mineiros soterrados durante mais de dois meses não ficará impune. “Que isto não volte a acontecer”. (...)

“Que isto não volte a acontecer”, diz Piñera
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-10-14 | Jornal Público
SUMÁRIO: Na mina de San José tocaram as sirenes, cantou-se o hino nacional do Chile. Emocionado, o Presidente Sebastián Piñera prometeu que o acidente que deixou 33 mineiros soterrados durante mais de dois meses não ficará impune. “Que isto não volte a acontecer”.
TEXTO: No acampamento Esperanza a festa prolongou-se pela madrugada. Durante quase 24 horas, o Chile explodiu de alegria 33 vezes, tantas quantas a cápsula Fénix regressou das profundezas com mais um mineiro salvo a bordo. A esperança renascera 17 dias após a derrocada de 5 de Agosto, quando os mineiros conseguiram fazer chegar à superfície a mensagem “Estamos bien en el refugio, los 33”. Agora, já junto das famílias e do Presidente, seguravam uma faixa onde se lia “Están todos bien, en la superficie los 33!”. Cantou-se o hino. E gritou-se, muitas vezes, Chi-chi-chí, le-le-lé, los mineros de Chi-lé!”. Depois das lágrimas e dos abraços, das imagens que correram mundo com o primeiro mineiro, Florencio Ávalos, a sair da cápsula Fénix, e dos 32 mineiros que o seguiram a abraçar as mulheres e os filhos, chegava a hora de compreender o que se passou. “Que isto não volte a acontecer”, disse Sebastián Piñera, referindo-se às más condições de trabalho na mina. “Dizemos desde o primeiro dia. Isto não vai ficar impune, os que tiverem responsabilidade vão ter de assumir as suas responsabilidades, mas o que aconteceu foi também uma grande lição para todos os chilenos e para o nosso Governo: melhorar os nossos sistemas, as nossas atitudes, os nossos procedimentos para salvaguardar a vida, a integridade e a dignidade dos nossos trabalhadores, e não só na área das minas, mas também nas áreas da construção, dos transportes, das pescas. ”A falta de condições de trabalho na mina foi notícia desde o primeiro instante. Pouco após a derrocada chegou a ser referido que, se houvesse uma escadaria junto ao principal túnel de ventilação, os mineiros teriam conseguido escapar. Ontem, o segundo mineiro a ser resgatado, Mario Sepúlveda, falou aos jornalistas sobre isso, alertando para a necessidade de mudanças. Depois de abraçar os mineiros, Piñera anunciou que será construído um monumento de homenagem aos “33 heróis de Atacama”, e prometeu também que serão reformuladas as leis de trabalho na mina “para que não haja mais acontecimentos como este”. “Os que tiverem que pagar, pagarão”, garantiu o Presidente chileno no final de uma noite “que nunca mais será esquecida”. E adiantou, em inglês, para as televisões e os jornais de todo o mundo: “O Chile é agora mais respeitado no mundo inteiro. Não é o mesmo país que tínhamos há 69 dias”. O chefe da equipa de mineiros, Luis Urzúa Iribarren, de 54 anos, foi último mineiro a sair, já perto das 02h00 (22h00 no Chile), e entregou o turno ao Presidente. Há dois meses, a derrocada na mina fez prever o pior. Mas ontem, tudo o que tinha de correr bem correu mesmo muito bem. Mais cedo do que o esperado – chegou a falar-se num resgate pelo Natal -, e em menos horas do que o previsto, os 33 mineiros foram salvos. “Obrigada ao Chile e a todas as pessoas que nos salvaram”, disse Luis Urzúa após sair da cápsula Fénix. “Estou orgulhoso de viver aqui”.
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Palavras-chave mulheres
Judiciária detém no Bombarral capo mafioso em fuga
A Polícia Judiciária (PJ) de Leiria deteve na quinta-feira na localidade de Carvalhal, Bombarral, um capo siciliano há vários anos em fuga das autoridades do seu país e perseguido pela polícia espanhola desde Dezembro de 2009. Este homem, juntamente com mais seis pessoas - três outros italianos, dois portugueses e uma brasileira -, será responsável por inúmeros crimes de burla qualificada, falsificação de viaturas, branqueamento de capitais e associação criminosa. (...)

Judiciária detém no Bombarral capo mafioso em fuga
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-10-23 | Jornal Público
SUMÁRIO: A Polícia Judiciária (PJ) de Leiria deteve na quinta-feira na localidade de Carvalhal, Bombarral, um capo siciliano há vários anos em fuga das autoridades do seu país e perseguido pela polícia espanhola desde Dezembro de 2009. Este homem, juntamente com mais seis pessoas - três outros italianos, dois portugueses e uma brasileira -, será responsável por inúmeros crimes de burla qualificada, falsificação de viaturas, branqueamento de capitais e associação criminosa.
TEXTO: A quantificação monetária dos crimes ainda estava ontem a ser feita, mas o valor que já havia sido contabilizado rondava o meio milhão de euros. O italiano em causa, Giovanni Lore, de 45 anos, seria o principal mentor de uma organização que em Portugal se dedicava a clonar empresas já existentes. Aparentando idoneidade e solidez financeira, o grupo negociava, sobretudo, em produtos alimentares, acordando formas de pagamento prolongadas. Depois, revendiam os bens para o estrangeiro, obtendo lucros elevados, mas já não pagavam aos fornecedores originais. A actividade liderada pelo capo já estaria a ser desenvolvida em anos anteriores em Espanha. Em Dezembro de 2009, na zona de Vigo, o principal suspeito, juntamente com os três compatriotas agora detidos pela PJ, terá logrado escapar a uma operação policial de grande dimensão. Os indicadores recolhidos dizem que o italiano, com cerca de 120 quilos de peso, estaria implicado numa rede que traficava armas e droga e que também explorava a prostituição. A capa de Lore, a exemplo do que também acontecia em Portugal, era o negócio dos mariscos congelados. Nos tempos em que esteve na Galiza, terá movimentado, segundo a polícia espanhola, mais de 2, 5 milhões de euros. Em Itália, por sua vez, a "família" liderada por este homem terá igualmente sido alvo de grandes investigações, tendo sido detidas mais de 30 pessoas já acusadas pela prática de inúmeros crimes violentos e organizados. Parceiro portuguêsEm Portugal, os italianos estabeleceram os contactos que lhes permitiram continuar a actividade criminal. O principal parceiro encontrado foi um empresário português, de Torres Vedras, que funcionava não só como receptador dos bens alimentares comprados a empresas reais, como também procedia ao reencaminhamento dos produtos para empresas estrangeiras, nomeadamente espanholas. O grupo agora desmantelado, numa operação que a PJ denominou Máfia do Oeste, ocupava na localidade de Carvalhal uma casa denominada Vivenda do Sossego. Na zona, conforme referiu ontem a agência Lusa, raramente eram vistos de dia e à noite circulavam com frequência de táxi. O taxista da terra, que os levou em diversas ocasiões a Santarém (onde supostamente iam buscar mulheres), diz que era sempre Lore quem se encarregava de efectuar os pagamentos, mas, como os mesmos nem sempre eram feitos de imediato, tem agora a haver cerca de 3. 500 euros. Giovanni Lore é, ao que se sabe, o terceiro elemento com cargos de chefia na máfia italiana localizado em Portugal. O primeiro caso reportado pela PJ ocorreu no início da década de 1990. O chefe de uma família calabresa, que, anos antes, forjara a própria morte num acidente de aviação, vivia com identidade falsa em Cascais, onde dirigia uma empresa de pesca. Foi executado com dois tiros de revólver 38 na cabina telefónica onde semanalmente efectuava contactos com elementos que se lhe mantinham fiéis. Anos mais tarde, seria preso Mário Giovinni, outro chefe de uma família siciliana, tida como das mais violentas. Até ser extraditado, foram abortadas diversas tentativas de fuga das cadeias portuguesas por onde passou.
REFERÊNCIAS:
Entidades PJ