Marlene Correia Ferraz é o prémio revelação Agustina-Bessa Luís 2012
O júri do prémio literário revelação Agustina Bessa-Luís, presidido por Vasco Graça Moura, distinguiu a estreante Marlene Correia Ferraz e o seu romance A Vida Inútil de José Homem, que será agora editado pela Gradiva. (...)

Marlene Correia Ferraz é o prémio revelação Agustina-Bessa Luís 2012
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2012-11-13 | Jornal Público
SUMÁRIO: O júri do prémio literário revelação Agustina Bessa-Luís, presidido por Vasco Graça Moura, distinguiu a estreante Marlene Correia Ferraz e o seu romance A Vida Inútil de José Homem, que será agora editado pela Gradiva.
TEXTO: Esta é a 5. ª edição do prémio e o júri elogiou a "apreciável desenvoltura narrativa e uma relação criativa com a língua portuguesa" que encontrou em A Vida Inútil de José Homem, além da temática - “evidencia situações dramáticas da memória histórica portuguesa africana, num enquadramento interessante e, em certa medida, original”, indica o júri, citado em comunicado. Marlene Correia Ferraz, 32 anos, que tem em A Vida Inútil de José Homem o seu primeiro romance, é de Viana do Castelo e decidiu começar o romance no Outono de 2011, "entre folhas soltas com anotações sobre a guerra civil de Angola e alguns amores imperfeitos". Em comunicado, a autora, psicóloga clínica de profissão, descreve o seu processo de escrita e as suas inspirações, que vão de documentários passados na RTP2 ao contacto com histórias de gerações passadas. "Na terra onde madurei há ainda homens que estiveram na guerra civil. Um deles pinta ainda hoje os animais e o arvoredo, as mulheres pretas e nuas e os homens soldados. Um vizinho também foi levado pela PIDE e nunca mais voltou, só num grande silêncio, mas a história já não é a mesma”, lê-se na nota. O prémio, no valor de 25 mil euros, é atribuído desde 2008 pela Estoril Sol e destina-se a autores com menos de 35 anos e que nunca tenham publicado um romance. O seu júri é presidido pelo escritor e ensaísta Vasco Graça Moura e composto por Guilherme D`Oliveira Martins, José Manuel Mendes, Maria Carlos Gil Loureiro, Manuel Frias Martins, Maria Alzira Seixo, Liberto Cruz, Nuno Lima de Carvalho e Dinis de Abreu. A decisão foi tomada por maioria.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave homens guerra homem mulheres
Escaravelhos orientados pelas estrelas ou ópera para ratinhos, os IgNobel estão aí
A 23 edição da edição da Primeira Cerimónia Anual dos Prémios IgNobel teve lugar na quinta-feira. Foram atribuídos dez prémios. (...)

Escaravelhos orientados pelas estrelas ou ópera para ratinhos, os IgNobel estão aí
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2013-09-13 | Jornal Público
SUMÁRIO: A 23 edição da edição da Primeira Cerimónia Anual dos Prémios IgNobel teve lugar na quinta-feira. Foram atribuídos dez prémios.
TEXTO: Quando é que foi a última vez que se sentiu atraente? É possível que tenha sido depois de jantar, com uns copos de vinho a mais. Já se sabia que o álcool torna os outros mais atraentes aos olhos de uma pessoa embriagada, mas uma equipa observou agora que quem bebe também se acha mais atraente, o que não é necessariamente verdade. Quem o diz são os autores do estudo que nesta quinta-feira à noite receberam o IgNobel da Psicologia, um dos dez prémios que “primeiro fazem as pessoas rir e depois obrigam-nas a pensar”. Esta foi a 23ª edição da Primeira Cerimónia Anual dos Prémios IgNobel no histórico Teatro Sanders da Universidade de Harvard, em Cambridge, Massachusetts, Estados Unidos. O nome do prémio é uma clara referência aos prestigiados Prémios Nobel, mas que, neste caso, são dados a investigadores cujos estudos causam, pelo menos, perplexidade. A cerimónia, produzida pela revista humorística de ciência Annals of Improbable Research, arrancou com um prometido lançamento de aviões de papel feito pelas pessoas que estavam na plateia contra um homem-alvo no palco, algo que só poderia acontecer nos IgNobel (onde o humor está sempre presente). Durante o espectáculo, representantes de sete dos dez prémios vieram ao palco explicar as suas pesquisas. A organização não pagou estas deslocações. “As pessoas sempre observaram que os bêbedos pensam que os outros são mais atraentes mas o nosso estudo é o primeiro que descobriu que beber álcool faz com que as pessoas pensem que são, ela próprias, mais atraentes”, explica Brad Bushman à BBC News, um dos autores da equipa que publicou este trabalho em 2012 na revista British Journal Psychology. Os investigadores deram bebidas alcoólicas a participantes que, depois, descreveram-se perante um grupo de avaliadores. Alguns dos participantes, que tomaram uma bebida-placebo estando convencidos que era uma bebida alcoólica, também se sentiram mais atraentes. O painel de avaliadores também teve avaliar a atracção sexual dos participantes, e não chegou às mesmas conclusões. “Apesar de as pessoas poderem pensar que se tornam mais atractivas quando estão intoxicadas, outras pessoas [que estão sóbrias] não pensam o mesmo”, acrescenta Bushman. “Foi apenas uma ilusão nas suas mentes. ”Epidemia de pénis cortados (às vezes comidos por patos)Os trabalhos premiados podem ter anos ou até décadas. O prémio IgNobel de Saúde Pública, um dos favoritos desta edição para Marc Abrahams, editor da Annals of Improbable Research, foi publicado em 1983 na revista American Journal of Surgery. Kazian Bhanganada e a sua equipa de médicos tailandeses desenvolveram uma técnica para tratar vítimas de amputações do pénis, um problema que estava disseminado na década de 1970. “Houve mesmo uma epidemia, e muitas vítimas foram levadas para o mesmo hospital onde os médicos tornaram-se bastante bons a lidar com isto”, refere Marc Abrahams, citado pela Reuters. Estes homens tinham o pénis cortado pelas mulheres zangadas por traições. “Os médicos recomendaram estas técnicas menos quando o pénis amputado era parcialmente comido por patos”, acrescentou Marc Abrahams, explicando que muitas vezes as casas na Tailândia eram construídas em palafitas sob as quais vivem patos. O prémio de arqueologia foi dado a Brian Crandall e Peter Stahl pelo estranho trabalho publicado em 1995 no Journal of Archaeological Science. Nesse estudo, foram analisadas as fezes de um homem que engoliu — sem mastigar — um musaranho previamente tratado e fervido. O objectivo era observar o que acontecia aos ossos do pequeno animal depois de passarem por todos os fluídos digestivos. Aparentemente, este conhecimento pode ser importante quando se analisam restos de ossos num contexto arqueológico. Escaravelhos no PlanetárioAs fezes também estiveram envolvidas no estudo que venceu o prémio conjunto de Biologia e Astronomia. Uma equipa da África do Sul com investigadores de instituições da Suécia, Austrália e Reino Unido confirmou que o insecto Scarabaeus satyrus, um escaravelho africano que transporta bolas de fezes para alimentar as suas larvas, orienta-se pelo Sol, pela Lua e, nas noites nas quais não há Lua, orienta-se pela Via Láctea. “Estamos muito encantados por ganhar o IgNobel”, diz em comunicado Marcus Byrne, um dos autores do estudo. “Achamos que o IgNobel também realça a investigação que nasce da curiosidade e que leva a uma compreensão de como funciona o nosso notável mundo”, acrescentou. A equipa questionou-se como é que estes escaravelhos encontravam o caminho certo quando transportavam as fezes para o seu ninho. Ao taparem os olhos dos escaravelhos à noite, verificaram que eles faziam rotas complicadas e não as rotas lineares de quem sabe ir para casa. Depois, quando colocaram escaravelhos no Planetário de Joanesburgo e puseram um céu com a Via Láctea, eles encontraram mais rapidamente o caminho de saída do que quando tinham poucas estrelas no céu do Planetário ou quando o céu estava escuro. O trabalho foi publicado no início deste ano na revista Current Biology. Verdi-1, Enya-0O Prémio da Medicina foi dado uma equipa da Universidade de Tóquio que estudou os efeitos da música clássica em ratinhos que tinham feito um transplante cardíaco. Os ratinhos normalmente sobrevivem sete dias após a operação. Mas quando ouviam a La Traviata, a ópera de Giuseppe Verdi, sobrevivam 27 dias. Com a cantora Irlandesa Enya, os ratinhos resistiam apenas 11 dias. O Prémio da Física foi atribuído a uma equipa que verificou que, com a gravidade existente na Lua, certas pessoas poderiam correr sobre uma superfície de água. Um grupo de investigadores que descobriu, em 2002, o composto que faz as pessoas chorarem quando cortam cebolas ganhou o Prémio da Química. Já o Prémio IgNobel das Probabilidades foi para um trabalho que determinou que 1) quanto mais tempo as vacas estavam deitadas mais provável seria que elas rapidamente se levantassem e 2) uma vez de pé, era difícil adivinhar quando voltariam a deitar-se. O Prémio da Engenharia foi dado a um norte-americano já falecido que, em 1972, patenteou uma invenção electro-mecânica para apanhar piratas do ar. Finalmente, o Premio IgNobel da Paz foi dividido entre Alexander Lukashenko, presidente da Bielorrússia, por criminalizar o aplauso público, e a Polícia Estatal da Bielorrússia, por ter aprisionado um homem que bateu palmas. Lukashenko não apareceu na Universidade de Harvard para receber o prémio. Em 2014, por esta altura, haverá mais Prémios IgNobel. Ou como disse Marc Abrahams no encerramento desta edição: “Se não ganhou nesta noite um dos Prémios IgNobel – e especialmente se ganhou – desejo-lhe mais sorte para o próximo ano. ”
REFERÊNCIAS:
Ney, camaleão excelentíssimo
Atento aos Sinais, que esgotou na noite de 7 de Maio o Coliseu de Lisboa (estará no do Porto no dia 10), mostra Ney Matogrosso no zénite da sua luminosidade. (...)

Ney, camaleão excelentíssimo
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 1.0
DATA: 2014-05-08 | Jornal Público
SUMÁRIO: Atento aos Sinais, que esgotou na noite de 7 de Maio o Coliseu de Lisboa (estará no do Porto no dia 10), mostra Ney Matogrosso no zénite da sua luminosidade.
TEXTO: Atento aos Sinais Ney Matogrosso Coliseu de Lisboa, 7 de Maio 5 estrelasQuem assiste aos espectáculos de Ney Matogrosso em Portugal, desde a sua estreia em 1983, no Coliseu, já lá vão três décadas, não pode deixar de notar que o tempo lhe tem trazido um refinamento que nada tem a ver com acomodação ou rotina, pelo contrário, dá a cada uma das suas apresentações o tom, mais ou menos exuberante, de um começo. Dos momentos de maior “exposição exagerada”, como ele lhes chama, aos de maior recato (como se à calmaria tivesse sempre de suceder a tempestade e vice-versa), Ney recria-se e renova-se nesse personagem feérico que ele próprio inventou, erguendo cada novo espectáculo com excelente minúcia. O actual, Atento aos Sinais, dá de algum modo continuidade à exuberância de Inclassificáveis (pelo meio houve Beijo Bandido, mais suave, porém não menos intenso) mas, em termos de cenário e figurinos, tem novos e acertados recursos: projecções (quatro enormes telas vídeo, verticais, no fundo do palco) e luzes extraordinariamente sincronizadas com as flutuações musicais. Sem concessões, o espectáculo recria o disco (que, por sua vez, embora gravado em estúdio, nasceu da rodagem do espectáculo no início de 2013). Ney surge no palco numa vertigem de animal alado com Rua da passagem (trânsito) e explode literalmente em Incêndio, enquanto pela tela passam imagens de um mundo em forte convulsão, das Primaveras árabes à Nigéria. Vida louca, vida breve (que Lobão escreveu e Cazuza celebrizou) foi o tema seguinte, fortíssimo, intenso: “Vida louca vida/ vida breve/ já que eu não posso te levar/ quero que você me leve. ” Roendo as unhas, samba de Paulinho da Viola transfigurado por Ney, abriu caminho à belíssima e melancólica Noite torta, de Itamar Assunção (quem ouviu Caetano, na mesma sala, cantar Estou triste, poderia ter estabelecido um paralelo na atmosfera criada): “Minh’alma chora/ lá fora, está tão gelado. ” A ilusão da casa, de Vítor Ramil, prolongou o fascínio e a melancolia, já depois de vermos Ney sombrio e magistral, silhueta negra sob um intenso foco de luz azul, enquanto os sopros elevavam a canção por sobre o tremolo misterioso da guitarra. E o camaleão, excelentíssimo, trocou de pele: as vestes negras deram lugar à prata, num “strip” calculado para agarrar o público (e feito junto a uma cadeira de espaldar alto, toda ela revestida a espelho), enquanto se ouviam assobios como nos cabarés. Ney sorriu, giocondidamente, e passou à frente. Ou seja, a Two naira fifty kobo, de Caetano, bem a propósito quando o Brasil anda revolvido por “Copa” e futebol: “No meu coração da mata gritou Pelé, Pelé/ faz força com o pé na África”. E a África, exuberante, nas telas, seguida por imagens de índios da Amazónia, mulheres e bebés na água, felizes. Freguês da meia-noite, de Criolo, e Isso não vai ficar assim, de Itamar Assunção, guinaram ao amor e aos seus sinais, evoluindo de um bolero e acabando com o cantor junto à plateia a ser salpicado por pétalas de rosas vermelhas por uma admiradora, enquanto cantava “Beije-me, beije-me muito/ como se fosse esta noite… la ultima vez. ” Piscadela de olho à velha canção mexicana de Consuelo Velásquez. Não era a última noite, claro. Do “happening” Ney trouxe uma rosa, inteira, consigo para o palco. Nas canções, o lugar era já dos novos. Depois de Criolo, ouvimos Beto Boing (Pronomes, com Ney a simular ondulações do sexo à boca do palco), Jerry Espíndola (Beijos de ímã, com duas bocas a preto e branco, na tela, a trocarem beijos) e Rafael Rocha (Não consigo, numa atmosfera sensualmente densa e vibrante). Para ficar ainda pelos novos, Ney apresentou Tupi fusão, do rapper alagoano Vítor Pirralho, alegoria à chegada dos portugueses ao Portugal mas olhada do ponto de vista dos índios. O resto continuou como no disco: primeiro o divertido Samba do Blackberry (um sujeito que se queixa porque a mulher o trocou por um telemóvel) e Todo o mundo o tempo todo, final perfeito para o concerto. Mas não era o final. Com a sala às escuras passaram, um a um, nas telas, evitando a apresentação oral do costume, os nomes e imagens dos músicos. E que músicos! Sacha Amback (teclas), Marcos Suzano e Felipe Roseno (percussões), Maurício Negão (guitarra), Dunga (baixo), Everson e Aquiles Moraes (sopros). Tal como com os figurinos e luzes, a exigência de Ney com os músicos é acertada e total.
REFERÊNCIAS:
Étnia Árabes
Os meninos que calçam as chuteiras da pátria
São rapazes privilegiados que transformaram a brincadeira de criança na profissão que muitos ambicionam. Os jogadores da selecção de futebol vão à África do Sul cumprir um desejo antigo, estar no Mundial, mas carregam a responsabilidade de representar uma nação inteira. Para o bem e para o mal. (...)

Os meninos que calçam as chuteiras da pátria
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-06-02 | Jornal Público
SUMÁRIO: São rapazes privilegiados que transformaram a brincadeira de criança na profissão que muitos ambicionam. Os jogadores da selecção de futebol vão à África do Sul cumprir um desejo antigo, estar no Mundial, mas carregam a responsabilidade de representar uma nação inteira. Para o bem e para o mal.
TEXTO: Certo dia perguntaram à escritora e teóloga alemã Dorothee Sölle como é que explicaria a uma criança o que é a felicidade: "Não explicava", respondeu ela: "Atirava-lhe uma bola de futebol para brincar. " Esta resposta talvez ajude a perceber por que razão os jogadores da selecção nacional foram chegando à Covilhã, onde decorre o estágio de preparação para o Mundial deste ano, com um sorriso na face e os olhos brilhantes. Talvez ajude a entender a razão de milhares de pessoas passarem uma manhã de sol a ver um simples treino de sete jogadores. Talvez ajude a compreender por que tantas pessoas se amontoam à saída do Complexo Desportivo da Covilhã para, pelo buraco da vedação, conseguir um autógrafo dos craques. Um aceno de mão de um jogador, uma rubrica numa bola, uma simples foto, um treino, um jogo ou uma final. Uns duram segundos, outros hora e meia, mas todos estes são momentos em que se une a paixão comum pelo futebol. De quem joga e de quem vê. De quem cumpriu o sonho de chegar à selecção e de quem nunca concretizou (ou de quem espera concretizar) o desejo de ser futebolista. O que significa, afinal, representar a selecção? "Significa que estou a concretizar um sonho", disse Miguel Veloso, médio do Sporting, nas primeiras palavras quando chegou ao estágio. "É o dia mais feliz da minha vida", garantiu Liedson, um avançado nascido no Brasil mas que joga com a camisola de Portugal. "Tinha o sonho de um dia estar presente num Mundial e felizmente esse dia chegou", acrescentou Pedro Mendes. E o desfile de frases podia continuar, porque cada um dos 24 futebolistas convocados pelo seleccionador Carlos Queiroz foi, com maior ou menor intensidade, abrindo o coração. Os sentimentos fortes não se resumem, no entanto, a quem está do lado de lá da vedação - o lado dos que andam no autocarro laranja da selecção, dos que são aplaudidos (ou assobiados), dos que são protegidos por seguranças (como se de obras de arte se tratassem), dos que chegam ao estágio de Ferrari (como Hugo Almeida) ou de helicóptero (como Cristiano Ronaldo). O futebol na vidaDo lado de cá, também há emoções fortes. Mesmo num estágio que é apenas um momento preparatório. Mesmo quando Queiroz ainda só tinha sete jogadores para treinar, o entusiasmo era grande. "Nani, Nani. " "Liedson, Liedson. " Crianças pequenas, de infantários e escolas do 1. º ciclo, gritam pelos craques logo no primeiro dia do estágio. E ainda faltava um mês para o Mundial, que se inicia a 11 de Junho. Sentado na bancada do campo da Covilhã, Miguel Galvão, de oito anos, olha os craques no primeiro treino da selecção. "Gosto de jogar à bola. Se pudesse, jogava de manhã à noite. Lá na escola até jogamos na lama", conta. Ainda é novo, mas já joga no Clube Académico do Fundão. Quer ser futebolista e o pai não se importa: "Vou ser o empresário", diz o pai, Cristóvão, não escondendo o sorriso. Um pouco ao lado, Diogo Rabasquim, de dez anos, segue pelo mesmo caminho. "Se puder, quero ser futebolista. " Mas porquê futebolista? A mãe de um outro miúdo haveria de dizer que é porque "se ganha bem", mas a inocência infantil guia-se por objectivos mais nobres e menos materialistas: "Gosto mais de futebol do que de outras actividades", justifica Diogo. "Gosto mais de actividades desportivas", completa o raciocínio, com um ar professoral, inesperado num miúdo de dez anos. Miguel e Diogo são apenas duas das 150 mil pessoas que em Portugal praticam futebol, de forma oficial (inscrita na federação) - o número inclui praticantes de futebol, futsal e futebol de sete masculinos e femininos. Mas há muitos mais a praticar este desporto de modo informal, nas escolas e nas ruas, nos pavilhões e nas praias, em grupos de amigos ou em jogos de empresas. Voltando a Miguel e a Diogo, e à ambição de ser futebolista, podemos dizer que as aspirações destes rapazes em 2010 não são muito diferentes dos desejos de outros que viveram a infância nos anos 1980 e 1990. Mesmo dos que estão hoje na selecção nacional. "Não sei se foi o futebol que entrou na minha vida ou se foi a minha vida que entrou no futebol. Certo é que, além dos habituais esconde-esconde e pega-pega [escondidinhas e apanhadas], eu não fazia mais nada a não ser bater babas [jogar à bola] com os amigos. De manhã, à tarde e à noite", conta Liedson na autobiografia, escrita pelo jornalista João Almeida Moreira. Liedson era um menino magrinho, no estado da Baía, no Brasil. Do outro lado do Atlântico, a mais de 5000 quilómetros, e alguns anos mais tarde, outro rapaz igualmente magricelas sentia a mesma atracção por esse objecto esférico que pode explicar a felicidade. "A bola sempre foi a minha melhor amiga. Para além de jogar futebol nos intervalos da escola, eram muitas as vezes que me escapava sorrateiramente às aulas para brincar com ela, inclusive na pré-primária, em que frequentei um colégio de freiras", lê-se na autobiografia de Cristiano Ronaldo, escrita por Manuela Brandão. "A primeira coisa que fazia quando regressava a casa era atirar com a mochila para o sofá ou para a cama do meu quarto, agarrar numa banana e num iogurte, fazer um "furinho" no fundo da embalagem e, com a bola debaixo do braço, correr para a rua. Sim, porque era na rua que eu jogava. Ou melhor, na estrada da Quinta do Falcão, onde nasci. "A atracção de muitos miúdos pela bola é quase inexplicável. Num destes domingos, enquanto decorria o treino da selecção na Covilhã, um menino de dois anos dava chutos na bola nos corredores de acesso às bancadas. Mal consegue falar, mas já sente aquele prazer (a felicidade, nas palavras de Dorothee Sölle) de içar a perna e pontapear aquele objecto esférico (e não redondo, como meio mundo diz). Uma felicidade que não andará muito distante daquela que Liedson, Ronaldo, Deco, Pedro Mendes, Hugo Almeida e muitos outros futebolistas da selecção viveram quando eram crianças. "Costumava imitar o Zico e o Maradona", disse à Pública Deco, que tem memórias vagas do Mundial de 1982 (tinha cinco anos) e recordações bem presentes do México 1986, em que Maradona levou a Argentina ao título mundial. "É tão bom sonhar"Pedro Mendes é quase dois anos mais velho do que Deco (tem agora 31) e dois anos fazem toda a diferença nas memórias do Mundial. "Tenho vagas ideias do Mundial de 1990, mas o mais antigo de que me recordo bem foi o de 1994, talvez por causa do penálti falhado pelo Roberto Baggio na final com o Brasil", diz este médio, recordando os jogadores que foi apreciando ao longo de vários Mundiais. "Gostava de ver o Redondo na Argentina, o Zidane pela França, o Ronaldo Fenómeno pelo Brasil. Gostei de ver quando o Owen aparece contra a Argentina e marca aquele golo [em 1998]. "Estas são memórias do Pedro Mendes criança e adolescente, que nem sonhava ainda com o Mundial. "Comecei a jogar com oito ou nove. Jogava no Vitória de Guimarães e quem eu mais idolatrava eram os jogadores do Vitória. Ia ver os treinos e havia aquela adoração", lembra o jogador: "Longe de mim pensar que iria estar num Mundial. Não fazia parte dos meus planos a curto prazo. "Hugo Almeida é um caso diferente. O avançado do Werder Bremen, que completou 26 anos neste mês, é um sonhador assumido. "É tão bom sonhar", suspirou, no dia de aniversário, em conferência de imprensa. Antes disso, já ele tinha confessado à Pública que desde miúdo pensava em representar a selecção. Mesmo quando tinha apenas dez anos e viu Roberto Baggio falhar o penálti na final de 1994 e Maradona ser apanhado com doping. "É o primeiro Mundial de que me lembro. "Nascido na Figueira da Foz, Hugo Almeida é um fã de Mundiais e de cadernetas de cromos. "Ainda hoje colecciono. Vou fazer a colecção do Mundial 2010", revela. "Agora é mais fácil, porque há mais sítios onde comprar. Antigamente era mais emocionante. Tinha de trocar os cromos na escola com os meus amigos. E só trocava se me dessem "x" cromos em troca. "Este fascínio pelos cromos é mais um ponto de ligação entre quem joga e quem idolatra. De um lado, o cromo - Hugo Almeida é o 561. Do outro, o coleccionador. Hugo Almeida é um e outro. E quando colecciona não é muito diferente de Miguel Galvão, o miúdo de oito anos, que na bancada do Complexo Desportivo da Covilhã se apercebe que deixou a caderneta dos cromos em casa: "Ainda tenho poucos. Comecei a fazer [a colecção] há pouco tempo, mas queria um autógrafo do Miguel Veloso", diz Miguel Galvão, sempre de olho no seu jogador preferido. Miguel Veloso era um miúdo traquinas, que partia as árvores em casa do pai, porque as usava como baliza. A história foi contada por António Veloso, ex-futebolista do Benfica, numa entrevista há dois anos ao site Maisfutebol. A mesma em que Miguel, o filho, recordou os tempos de criança, em que procurava autógrafos. "Quando tinha a idade deles e via um ídolo, fazia o mesmo. Agora os papéis inverteram-se. Sinto-me contente e lisonjeado. " Miguel Veloso partia árvores. Afonso Dias, de 12 anos, um rapaz que foi assistir a um dos treinos da selecção com os colegas da escola, estraga sapatilhas. Veio do Tortosendo, uma localidade nos arredores da Covilhã. - Quem são os teus jogadores preferidos?- Ronaldo, Nani e Liedson. - Queres ser o quê quando fores grande?- Futebolista. - Porquê?- Porque gosto de jogar. - Costumas jogar à bola?- Sim, nos intervalos das aulas. E também fora da escola. (Conta, sentado na bancada atrás da baliza. ) - E jogas onde?- Há um campo no cabeço. (Diz ele, recorrendo a uma palavra muito beirã. ) - Os teus pais não se importam?- Não. Só quando estrago as sapatilhas. - Gostavas de jogar pela selecção nacional?- Isso é que era, pá. Seria fixe. - E já imaginaste como seria vestir a camisola da selecção, entrar em campo num Mundial?- É pá, isso agora. . . Isso agora é demasiado rebuscado para a imaginação de um rapaz de 12 anos que está mais concentrado nas bolas que vão caindo na bancada - os jogadores estão a treinar livres e nem sempre acertam na baliza - do que na conversa com o jornalista. Mas ainda há tempo para mais duas perguntas. - O que é que gostas mais nos jogos da selecção?- Dos golos. E do hino. - Do hino? Sabes cantar o hino?- Sei. E desata a cantar, em plena bancada: "Heróis do mar/ Nobre povo/ Nação valente e imortal. . . " A certo ponto, pára e pergunta: "Já chega?"Já chega, sim senhor. Afonso vai à sua vida. E a sua vida é amontoar-se junto aos painéis de publicidade, ansiando por um autógrafo dos jogadores. É um daqueles (raros) momentos em que podem aproximar-se dos futebolistas, tocar-lhes, levar uma recordação para casa. Vuvuzelas, o chifre de kuduAfonso, Miguel, Diogo e muitos outros milhares de alunos das escolas da Covilhã receberam bilhetes para os treinos. Os ingressos são gratuitos, mas, como as entradas são limitadas a cerca de três mil espectadores, só quem tiver o "papelinho" mágico pode entrar no recinto dos treinos, isto claro quando as sessões são abertas aos adeptos. A maioria não é, porque o segredo é a alma do negócio e o seleccionador quer trabalhar tranquilamente. Quem não consegue lugar para assistir ao treino contenta-se a ver os jogadores a entrar no autocarro. Era assim no domingo, à porta do Hotel Turismo da Covilhã, um dos dois hotéis reservados para a selecção. Um a um, os jogadores iam saindo do hotel rumo ao autocarro. Cada aceno era festejado como se fosse um golo. "Apanhei o Ronaldo de lado", contava Sílvia, que fez 70 quilómetros, de Castelo Branco à Covilhã, só para ver os craques por uns segundos. Manuela Santos e a família ainda vieram de mais longe. Do Porto. Só para ver a selecção? "Sim. Como a selecção está cá, viemos passar o fim-de-semana à Covilhã. "É por casos como este que a cidade serrana está mais movimentada. O presidente da câmara, Carlos Pinto, reconhece que não é a vinda da selecção que vai resolver a crise em que vivemos, mas confia que pode retirar benefícios para o futuro. E, pelo menos por estes dias, a Covilhã é uma cidade diferente. Por todo o lado, há bandeiras de Portugal. Nos stands de automóveis, nas montras das lojas, nas janelas e em algumas casas. A mascote da cidade, com as cores da selecção, é exibida na principal rotunda da cidade e a toda a hora scooters de patrocinadores da selecção passeiam-se pelas ruas. Até fora do centro da Covilhã, há um cheiro a Mundial. Mesmo em Boidobra, Tortosendo e Canhoso, localidades dos arredores com nomes sonoros e desconhecidos, há cachecóis e bandeiras da selecção, especialmente nos cafés e restaurantes. E até vuvuzelas, essa corneta sul-africana que promete ser uma das estrelas do Mundial. Para já, são todas laranjas, da cor de um dos patrocinadores da selecção, e ouvem-se frequentemente pela Covilhã. Na África do Sul, as vuvuzelas terão tido origem no chifre de kudu (um antílope) que antigamente era usado para chamar os habitantes das aldeias para as reuniões. Há já alguns anos, tornou-se num instrumento de apoio às equipas desportivas em África (lembram-se dos jogos da Taça das Nações Africanas?) e agora está a disseminar-se pela Europa. Na Covilhã, há adeptos que já sabem soprar na vuvuzela. Usam-na para dar colorido sonoro aos treinos e jogos. E até para chamar pelos jogadores, se bem que captar-lhes a atenção não é fácil. Há sempre cordões de segurança em redor da equipa, seja nos hotéis ou nos locais de treino. "As pessoas têm de compreender, porque estamos aqui para trabalhar", diz Carlos Godinho, director desportivo da Federação Portuguesa de Futebol (FPF). À volta dos jogadores estão sempre os seguranças. Ao todo, uma centena de elementos da PSP, GNR e de uma empresa de segurança estão no terreno para evitar problemas. O esquema de segurança (e não só) é condicionado por outra particularidade. O estágio da Covilhã divide-se por dois hotéis. Os jogadores dormem nas Penhas da Saúde, a 1550 metros de altitude, já a caminho da Serra da Estrela. Todos os dias de manhã descem a estrada serpenteante até à Covilhã e à noite fazem o percurso inverso, tendo oportunidade de contemplar uma paisagem inspiradora. É um local "calminho e porreiro", com o definiu Nani, um dos primeiros jogadores a integrar o estágio. Durante o dia, os jogadores têm estado na Covilhã. A treinar ou em repouso no Hotel Turismo, onde também há ginásio e piscina para lazer e recuperação. É lá que Pepe tem feito boa parte do seu trabalho de recuperação. Voltando à serra, e se não quiserem apenas ficar a pensar no futuro enquanto olham para a vista deslumbrante das Penhas da Saúde, os jogadores têm muitas formas de ocupar os tempos livres. Bilhar, matraquilhos, consolas Wii e PlayStation. Há sempre as tradicionais cartas e, claro, o pingue-pongue, de que Nani já falava ainda antes de Cristiano Ronaldo chegar à Covilhã. Os ex-companheiros de equipa no Manchester United costumam jogar ténis de mesa e, no estágio, não perderam o hábito. "Já houve alguns jogos. Ele [Cristiano Ronaldo] sempre foi melhor. Jogámos jogos equilibrados mas ele ganhou. Nunca desisto e continuo com esperança de ganhar", contou Nani, o mais "brincalhão" da selecção. Carlos Queiroz já tinha revelado numa entrevista ao jornal A Bola que o avançado dos Red Devils é o mais extrovertido e agora há informadores independentes que o podem confirmar. São jovens jogadores do Sporting da Covilhã e da Associação Desportiva da Estação (ADE), que foram chamados aos treinos da selecção. Primeiro, para se treinarem com os sete jogadores que estiveram a trabalhar na primeira semana do estágio, e alguns depois, para ajudarem em exercícios de recuperação com Pepe. "O Nani foi o que falou mais connosco. É muito divertido. Está sempre na brincadeira e até jogámos pingue-pongue com ele", conta Renato Silva, um jovem de 18 anos, jogador da ADE e estudante no 12. º ano. Os dez jovens jogadores, a que se juntaram depois mais alguns, nunca tinham sonhado sequer com a possibilidade de se treinarem com os ídolos. "No início, pensei que era brincadeira. Só depois é que percebi que podia mesmo acontecer", acrescenta Renato, que está a pensar concorrer a um curso na área da Gestão ou Economia. Rui Silvestre, também da ADE, foi outro dos privilegiados e diz que foi a melhor prenda de aniversário que já recebeu. Fez 19 anos no primeiro dia em que trabalhou com a selecção. "Foi uma semana marcante, que não se irá repetir", acrescenta este estudante, futuro candidato ao curso de Fisioterapia. Rui até marcou um golo num treino, algo inesquecível. "Ouvi palmas de 3000 pessoas. Deu para viver um bocadinho como é estar num Mundial. Vivemos momentos de fama, com aquele apoio do público", reconhece. Fama é, aliás, algo que não falta aos jogadores da selecção. Aparecem na televisão a toda hora, em anúncios ou notícias, a mostrar as casas luxuosas, os carros desportivos ou a peça de roupa de última moda. São membros do star system português, modelos para os jovens. Como escreveu o escritor uruguaio Eduardo Galeano, "[o futebolista] aparece nos jornais e na televisão, as rádios dizem o seu nome, as mulheres suspiram por ele e as crianças querem imitá-lo". É um dos lados da vida deles. Mas também há outro, menos acolhedor. Não têm direito "a cansar-se, nem a enganar-se", disse o mesmo Galeano. E essa exigência ficou à vista no jogo particular, frente a Cabo Verde. Os adeptos dão apoio, mas querem golos e vitórias em troca. Um empate a zero sabe a pouco. Foi, é e será sempre assim. As palmas e os assobios ao sabor dos resultados, as discussões nos cafés, as conversas à mesa, os comentários na Internet, as críticas aos treinadores e jogadores pouco apreciados e a defesa dos jogadores queridos são apenas os primeiros sinais da febre do Mundial. O momento em que, como postulou o escritor brasileiro Nelson Rodrigues, a pátria fica de calções e chuteiras. Neste caso, 23 jogadores representam dez milhões. Ou, pelo menos, os milhões (não sabemos quantos) que gostam de futebol. Cristiano Ronaldo, o capitão e ícone da selecção, já prometeu um grande Mundial. E também já revelou como gosta de enfrentar estes momentos. Publicou-o na autobiografia, em tom de compromisso. "Eu, Cristiano Ronaldo, gosto de me ver como um miúdo. Hei-de lutar para sê-lo sempre, mesmo que a idade o contrarie, porque só dessa forma acredito ser possível encarar as adversidades com mais leveza e optimismo. " E será assim que meninos anónimos transformados em adultos famosos e pagos principescamente vão jogar à bola. Já não em campos pelados, mas nos estádios sul-africanos a partir de 11 de Junho. Já não na brincadeira, mas muito a sério. Porque há milhões de euros em jogo e contratos milionários a defender. Porque são os representantes de uma nação desejosa de triunfos. Porque são eles que calçam as chuteiras da pátria. E, no fundo, porque, parafraseando Nelson Rodrigues, a selecção "representa os nossos defeitos e as nossas virtudes". Para o bem e para o mal.
REFERÊNCIAS:
Os cromos que não vão ao Mundial
Estão cansados, estão gordos, estão velhos, estão lesionados ou ainda mais simples do que isso: Maradona não vai com a cara deles. (...)

Os cromos que não vão ao Mundial
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-06-08 | Jornal Público
SUMÁRIO: Estão cansados, estão gordos, estão velhos, estão lesionados ou ainda mais simples do que isso: Maradona não vai com a cara deles.
TEXTO: Ainda faltam alguns dias para o início do Campeonato do Mundo, transformado numa ampulheta que deixa escapar estrelas por entre os dedos. Cromos em falta: 46, 67, 78, 104, 113, 114, 135, 186, 190, 196, 260, 264, 267, 268, 269, 325, 415, 417, 500, 502, 504, 540, 549, 554, 572, 618. . . Lançar a caderneta oficial de um Campeonato do Mundo a semanas de distância do pontapé de saída significa rasgar carteiras e colar autocolantes de uma série de jogadores que nem sequer estarão na África do Sul. Tarefa ingrata a da Panini (a editora da dita caderneta). Para a posteridade, fica mais uma colecção que não tem uma bola de cristal, que não adivinha quem pendurará as chuteiras, quem rebentará com a escala da balança lá de casa, quem andará com más companhias, quem não fará parte da lista de amigos Facebook de Diego Armando Maradona ou quem contrairá o vírus unglück (azar) na Alemanha. Ainda faltam algumas dias para o início de tudo. E nada garante que não tenhamos que arrancar mais alguns cromos aparentemente bem colados. Nos últimos dias, soltou-se o cromo de Rio Ferdinand (n. º 186), cuja lesão no joelho esquerdo fez cair outro capitão inglês (o "escandaloso" John Terry foi o primeiro), descolou-se o do nigeriano Obi Mikel (n. º 135), também com problemas num joelho, e perdeu força a cola que segurava Didier Drogba (n. º 542), Andrea Pilro (n. º 422) e Arjen Robben (n. º 348), trio supostamente recuperável. Por muitas voltas que se dê à caderneta, o plano das páginas 30 e 31 será sempre o menos fiel à realidade deste Mundial - e Joachim Löw o menos afortunado dos seleccionadores. Semana após semana, Löw, natural de Schönau, na Floresta Negra, foi riscando a vermelho nomes da sua lista. Ao contrário de muitos outros seleccionadores, o alemão não deu más notícias a quase ninguém (tirando talvez Kevin Kuranyi e Torsten Frings). Recebeu-as. A conta-gotas. Kevin-Prince Boateng. Durante muito tempo, os adeptos alemães não esquecerão o nome do jogador do Portsmouth que atirou para a enfermaria Michael Ballack, médio do Chelsea, capitão e estrela alemã. Aconteceu na final da Taça de Inglaterra, jogo que encerrou a temporada em Inglaterra. Foi protagonizado por dois jogadores alemães. E só um deles vai ao Mundial: Ballack, 98 internacionalizações, tão cedo não poderá atingir a centésima; Boateng, origens ganesas, será adversário da Mannschaft no Grupo D. . . Frustrado com o estado do tornozelo direito de Ballack (cromo número 268), Löw terá ainda que lidar com as ausências forçadas do defesa Heiko Westermann (n. º 264), do médio Simon Rolfes (n. º 267) e principalmente de Rene Adler (n. º 260), potencial titular da baliza alemã, isto para não falar da última vítima, Thomas Hitzlsperger (n. º 269), um dos poucos que perderam a vaga sem andar de muletas (não atingiu os mínimos ao serviço da Lazio). Entre as faltas de comparência no Mundial, muito poucos gozarão de um estatuto equivalente ao de Ballack nas respectivas selecções. Um deles é certamente Essien (curiosamente também é Michael, também é jogador do Chelsea, também disputaria o Grupo D e também ficará de fora devido a lesão), o mais influente ao serviço da selecção do Gana. "Privados do seu líder, os meus jogadores deverão ser mais inteligentes, mais combativos, deverão estar a 200 por cento", disse o seleccionador Milovan Rajevac. O mesmo poderia dizer-se de David Beckham, que há pouco tempo foi apresentado ao seu tendão de Aquiles, mas a verdade é que a recente lesão do jogador" dificilmente será sentida nos relvados deste Mundial, onde provavelmente Fabio Capello já esperaria mais de "Becks", de 34 anos, como mestre-de-cerimónias da comitiva inglesa do que como médio-do-pé-de-ouro. Aos saltos desde que saiu do Real Madrid, Beckham (cromo n. º 190) dificilmente seria a estrela na África do Sul - não tinha sequer garantida a presença na equipa de Capello -, onde o inglês "apenas" coleccionaria o seu quarto e último Campeonato do Mundo. Diplomata, o italiano Fabio Capello lamentou a pequena tragédia e seguiu em frente, agradecendo igualmente a Paul Scholes ("Tentámos convencê-lo a regressar, mas ele disse não. Prefere ficar com a família. Tentámos", disse Capello) a entrega em anteriores Mundiais. Com a boca aberta ficou Theo Walcott (n. º 196), cujo nome caiu no último desbaste da convocatória inglesa. O jovem de 21 anos tinha sido responsável, por exemplo, por um memorável hat-trick contra a Croácia, na qualificação para o Mundial. Dunga e MaradonaNão há memória de uma convocatória consensual. Uma utopia. "Alguém tem que ficar de fora", dizia Carlos Queiroz, na Covilhã, instantes depois de ditar uma lista de 24 jogadores na qual não constava nem o lesionado Bosingwa (cromo n. º 549) nem o até então confiante João Moutinho (n. º 554), que, segundo os informadores da Panini, também viajaria para a África do Sul. Vários ilustres foram ficando de fora das listas, cada vez mais magras no decorrer das últimas semanas. Chamaram a atenção as ausências de Francesco Totti, do holandês Ruud Van Nistelrooy, do francês Karim Benzema, de Marcos Senna, cuja nacionalidade espanhola parece ter perdido o prazo de validade. . . Muitos deles nem sequer chegaram a fazer parte do grupo de 30 pré-seleccionados. Todos eles terão que ver o Mundial através da televisão. Mas as escolhas de Dunga no Brasil e de Maradona na Argentina foram aquelas que mais pó levantaram. Danny Jordan, director executivo do Comité Organizador do Mundial, chegou a criticar publicamente Dunga por não ter convidado Ronaldinho Gaúcho (cromo n. º 500) a fazer parte da festa. "Às vezes penso que estes treinadores acreditam que são deuses e precisam demonstrar que podem fazer qualquer coisa, boa ou má", comentou, apelidando Ronaldinho de "génio do futebol" e dizendo que Dunga está "cego pelo poder". A jogada do seleccionador brasileiro apanhou desprevenida inclusive a Nike, que, em vão, pagou a Kobe Bryant para imitar o baile de Ronaldinho no incrível anúncio Escreve o Futuro. Dunga justificou-se, falando de renovação - a renovação que lhe exigiram em 2006, no rescaldo do Mundial. "Encerrámos um ciclo e trouxemos jogadores com atitude, compromisso e paixão pela camisola. " Consequência directa: Adriano (cromo n. º 504). Massimo Moratti foi outro dos indignados de alta patente. "Sentido", o presidente do Inter insurgiu-se contra a falta de comparência de Javier Zanetti (n. º 113) e de Esteban Cambiasso (n. º 114). "Recuso-me pensar que Maradona os tenha poupado em benefício do Inter", disse Moratti ainda antes de o clube de José Mourinho ter conquistado a Liga dos Campeões (e a tripla) com os dois argentinos em grande nível. Diego Milito e Walter Samuel foram chamados por Maradona, uma consolação para Massimo Moratti, consciente da temporada "monstruosa" do quarteto de argentinos ao serviço do clube de Milão. Nada que incomode "El Pibe", que nunca chegou a ponderar acrescentar uma errata à sua lista, da qual não constam Gago, Lucho, Lisandro. . . Troca de clubesA muitos jogadores de nada serviu a estratégia de trocar de clube no Inverno, passar do Inter para o Manchester City (como o francês Patrick Vieira), trocar o Real Madrid pelo Hamburgo (como o holandês Van Nistelrooy) ou viajar de Munique para Roma (como o italiano Luca Toni), procurando mais minutos e a confiança do seleccionador. "É sempre um momento difícil", disse, a propósito de Vieira, Raymond Donenech, que castigou Karim Benzema (cromo n. º 104), pouco utilizado no Real Madrid, "com talento, mas com um ano difícil", segundo o seleccionador francês, que não quis associar a sua decisão ao escândalo de prostituição que atingiu de frente o jogador de origem argelina. "Tem uma idade que lhe permite sonhar", completou Domenech, sem Samir Nasri na bagagem. A frase foi repetida um pouco por todo o planeta. Há dias, o sul-africano Benny McCarthy (cromo n. º 46) engordou a lista dos ausentes, juntando-se a nomes influentes como o do uruguaio do FC Porto Cristian Rodriguez (n. º 78), o do mexicano Miguel Sabah (n. º 67), o do costa-marfinense Bakari Koné (n. º 540), o do hondurenho Carlos Costly (n. º 618) ou o do suíço Marco Strellar, há algum tempo a contas com uma lesão. Marcello Lippi, seleccionador italiano, tem sido outro dos nomes na berlinda. Preso por ter cão, preso por não ter, criticado pela gestão do grupo campeão na Alemanha. "Não posso deixar em casa 23 jogadores só porque estiveram em Berlim, em 2006", explicou o seleccionador, que deixou de fora Totti, ansioso por regressar, Luca Toni, com um pouco secreto sonho mundialista, Antonio Cassano, Mario Balotelli, Nicola Legrottaglie (n. º 417), Fabio Grosso (n. º 415). . . Cromos em falta? O Mundial não se responsabiliza. A selecção dos excluídosNo futuro, os irlandeses continuarão a defender que os grandes ausentes do Mundial de 2010 foram os jogadores da sua selecção, afastados no play-off de qualificação com a ajuda da célebre mão de Thierry Henry. Muitos outros jogadores poderiam abrilhantar a competição, mas, aos poucos, foram ficando pelo caminho. O P2 ficou com os restos, tentou dividir o mal pelas aldeias e convocou 23 jogadores mais quatro suplentes. Guarda-redes: Petr Cech (República Checa); Shay Given (Irlanda); Akinfeev (Rússia)Defesas: Chygrynskiy (Ucrânia); O'Shea (Irlanda); Vermaelen (Bélgica); Riise (Noruega); Chivu (Roménia); Perea (Colômbia); Juan Vargas (Peru)Médios: Valencia (Equador); Modric (Croácia); Arshavin (Rússia); Misimovic (Bósnia-Herzegovina); Arda Turan (Turquia); Fletcher (Escócia); Jovetic (Montenegro); Benayoun (Israel)Avançados: Ibrahimovic (Suécia); Adebayor (Togo); Robbie Keane (Irlanda); Shevchenko (Ucrânia); Berbatov (Bulgária); Bellamy (País de Gales); Bryan Ruiz (Costa Rica); Falcao (Colômbia); Claudio Pizarro (Peru)
REFERÊNCIAS:
Da África do Sul à contracosta, com Ruy Duarte de Carvalho
Ninguém, à excepção do Ruy Duarte de Carvalho, sabia grande coisa sobre a África do Sul para além das suas tensões recentes. É ele que vai à frente nesta viagem de 13 dias e seis mil quilómetros, portanto, e logo a seguir os seus jovens amigos: o Luhuna, que ia recolhendo numa câmara materiais de observação directa; Miguel Carmo, certeiro nas impressões e navegações espaciais; e as Martas -a Mestre que ia avivando a conversa, e a outra Marta, esta que vos escreve, gerindo a logística de uma viagem redonda, de Joanesburgo a Joanesburgo, do interior à costa pela outra costa, deixando de fora a província do Cabo Oriental, berço de lutadores anti-apartheid, ainda assim presente nas histórias de bordo. (...)

Da África do Sul à contracosta, com Ruy Duarte de Carvalho
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-08-12 | Jornal Público
SUMÁRIO: Ninguém, à excepção do Ruy Duarte de Carvalho, sabia grande coisa sobre a África do Sul para além das suas tensões recentes. É ele que vai à frente nesta viagem de 13 dias e seis mil quilómetros, portanto, e logo a seguir os seus jovens amigos: o Luhuna, que ia recolhendo numa câmara materiais de observação directa; Miguel Carmo, certeiro nas impressões e navegações espaciais; e as Martas -a Mestre que ia avivando a conversa, e a outra Marta, esta que vos escreve, gerindo a logística de uma viagem redonda, de Joanesburgo a Joanesburgo, do interior à costa pela outra costa, deixando de fora a província do Cabo Oriental, berço de lutadores anti-apartheid, ainda assim presente nas histórias de bordo.
TEXTO: Desde cedo até ao fim da tarde: mãos rotativas ao volante, pneus a rasgar as boas estradas sul-africanas, olhos maravilhados e exaustos de reter as paisagens a cada solidão um monte ou deserto preferido -e dentro do carro uma voz que se ouve mais do que as outras. Antes da África do Sul, tinha havido um cozido à portuguesa na Baixa de Maputo, em Setembro. Decorria, no Dockanema, "E agora. . . vamos fazer mais como?", ciclo dedicado ao escritor e cineasta angolano Ruy Duarte de Carvalho, que acumula admiradores no mundo lusófono, e a viagem, patrocinada pelo Instituto Camões, começava a ganhar forma. Uma viagem espraiando-se por mudanças de relevo, animais, campos de pastagem, cores e brilhos que vão ocorrendo na paisagem: a sua adaptação morfológica ao clima e a metafísica que nos faz empatizar com ela. Uma viagem atenta à história das várias expansões e colonizações do país. Que fosse a origem, com base nos materiais recolhidos e nas conversas semeadas, do livro "As Paisagens Efémeras, Atas de Santa Helena", de Ruy Duarte de Carvalho, e também de um possível filme. Ou não estivesse a viagem sempre inscrita em tudo o que faz. Mas há outras ambições nesta viagem: problematizar o processo de ocidentalização do mundo e os seus efeitos, focalizados no espaço atlântico. Que relações existiram entre europeus e populações locais? Que fenómenos desencadearam? Isto tudo pelo gosto de entrelaçar tempos. De ver naquilo que é já passado, vestígio só, matéria de conjectura histórica. De encontrar os traços do antecedente na imagem presente e nas projecções do futuro. Então lá estamos nós dentro de um carro dias a fio. E acabamos por aprender qualquer coisa da complexidade deste país africano que está nas bocas do mundo por causa do futebol e da persistente violência. Conclusão: a África do Sul é um país bizarro. O Ruy está contente e só se cala esporadicamente para fixar um pormenor da paisagem e depois dizer coisas como "na vida ou se escreve ou se vive", citando Pirandello, ele que faz tão bem as duas coisas. Traz leituras e considerações, enche o espaço de referências e pensamento, de paisagens efémeras e propícias, de figuras da História. Conta episódios da vida e anedotas também. Fala no feminino quando conversa com as raparigas. "É uma narrativa sólida e quente que transforma a paisagem da África do Sul em nostalgia", há-de escrever um de nós. Angola, aonde regressa sempre apesar de agora viver em Swakopmund, na Namíbia, é tema recorrente e que nos liga naquela cumplicidade dos territórios do coração. A comer uma pizza na barragem Gariepdan, abro o seu último livro, "A Terceira Metade", e tropeço nisto: "enrolados para quem não pára porque não pode, não quer ou não sabe, tal como nós estamos todos desde há muito ao corrente são os caminhos das voltas que a vida dá, como são os que no sono levam sempre aos mesmos sonhos recorrentes. "Brancos contra brancos, e contra negrosPernoitamos em Vinburg. Uma cidadezinha de atmosfera "Twin Peaks" no interior do Free State onde os bóeres, brancos camponeses normalmente enormes, vivem e são senhores. O bóer é uma produção da África Austral, havemos de saber no curso da viagem. Na "guesthouse", um bancário bêbado pergunta-nos, meio em inglês, meio em afrikaans, crioulização da sua língua materna holandesa, se estamos a falar russo. Ao pequenoalmoço, a serviçal roliça diz que vai casar em Março e está muito feliz. "A minha mãe diz: 'Vai sempre atrás do teu marido'". E ela foi, e agora serve salsichas com ovos e carne agridoce a endinheirados rurais.
REFERÊNCIAS:
Étnia Africano
João Maria Tudela morreu hoje de manhã no hospital de Cascais
O cantor e apresentador de televisão João Maria Tudela morreu hoje de manhã, no hospital de Cascais, dois dias depois de sofrer um acidente vascular cerebral (AVC) “fulminante". (...)

João Maria Tudela morreu hoje de manhã no hospital de Cascais
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2011-04-22 | Jornal Público
SUMÁRIO: O cantor e apresentador de televisão João Maria Tudela morreu hoje de manhã, no hospital de Cascais, dois dias depois de sofrer um acidente vascular cerebral (AVC) “fulminante".
TEXTO: A mulher de João Maria Tudela informou à agência Lusa que o AVC ocorreu na quarta-feira, tendo o artista entrado depois em “coma profundo”. Segundo informações do hospital, João Maria Tudela morreu às 9h30 desta manhã. João Maria Tudela nasceu em Moçambique em 1929 na antiga capital Lourenço Marques, actual Maputo, começando a actuar como solista no Liceu Salazar. Sem saber música, tocava vários instrumentos como piano, guitarra, viola e harmónica. Os seus estudos continuaram em Coimbra antes de voltar a Moçambique, onde trabalhou como comercial em empresas. Mas continuaria a cantar, sobretudo fado de Coimbra, começando também a ter sucesso na música africana. Em 1959 surge o primeiro e maior êxito da sua carreira, Kanimambo, que levou Tudela a Portugal, Estados Unidos e América do Sul. João Maria Tudela afirma-se depois no meio artístico português e soma vários prémios na televisão. Em 1968, depois de ter cantado “Ao Vento e às Andorinhas” no Festival nacional da Canção, Tudela interpretou um poema de Ary dos Santos e Nuno Nazareth Fernandes intitulado “Cama 4, Sala 5” que foi censurado e o cantor foi proibido de voltar a trabalhar na RTP, decidindo terminar a sua carreira. Depois do 25 de Abril de 1974, Tudela voltou a participar em programas da RTP e em peças de teatro e noutros espectáculos. Entre os seus principais êxitos estão: Kanimambo, Hambanine, O Meu Chapéu, Diz que Gostas de Mim, Menina das Tranças, No País do Sol, Soldado Português, Moçambique, Liberdade, Fuzilaram um Homem num País Distante. Uma pessoa "muito dinâmica""Intérprete de inúmeros sucessos da música portuguesa, João Maria Tudela foi um cantor de projecção internacional que, pelo seu talento e pela cuidada selecção do seu repertório, conquistou a admiração e o respeito de várias gerações de portugueses", escreveu o Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, numa mensagem enviada hoje à família do cantor. "A música portuguesa ficou hoje mais pobre", referiu Cavaco Silva. Contactado pela agência Lusa, o músico António Calvário lamentou a morte Tudela, que classificou como um artista dinâmico e pessoa com muito valor. “Somos amigos de sempre. Lamento imenso esta notícia. João Maria era uma pessoa muito dinâmica, culta e de muito valor”, afirmou, recordando que “foi na canção que Tudela se tornou conhecido”. Já o apresentador de televisão Júlio Isidro descreveu João Maria Tudela como “um bom artista e um artista bom”, lamentando as dificuldades que teve para encontrar trabalho na fase final da sua vida. “Tinha múltiplos talentos, como cantor e como músico. Era um entertainer, um homem que gostava muito de comunicar”, afirmou Júlio Isidro à agência Lusa. Classificou ainda o amigo como “um verdadeiro gentleman”, que “sempre cultivou o charme e a elegância”. “É mais um artista que desaparece, que é lembrado na hora da morte, mas que viveu esta fase final da vida com grande dificuldade para ter trabalho”, lamentou Júlio Isidro, lembrando, no entanto, que João Maria Tudela conseguiu recentemente ter um projecto na RTP Memória. Notícia actualizada às 16h15
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave morte mulher homem
Pergunta sobre dor e tsunami abrirá entrevista inédita do Papa Bento XVI à televisão
Com uma pergunta sobre o "sentido da dor" após a tragédia que se abateu sobre o Japão em Março, será aberta a primeira entrevista que o Papa Bento XVI dará à televisão italiana por ocasião da Sexta-feira Santa. (...)

Pergunta sobre dor e tsunami abrirá entrevista inédita do Papa Bento XVI à televisão
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento 0.3
DATA: 2011-04-22 | Jornal Público
SUMÁRIO: Com uma pergunta sobre o "sentido da dor" após a tragédia que se abateu sobre o Japão em Março, será aberta a primeira entrevista que o Papa Bento XVI dará à televisão italiana por ocasião da Sexta-feira Santa.
TEXTO: Pela primeira vez na história, um Papa responderá em um programa da televisão pública italiana (RAI), chamado "À Sua Imagem", às perguntas de um grupo de fiéis. Segundo a RAI, o programa durará uma hora e vinte minutos, foi gravado antecipadamente e será transmitido às 14h10, aproximadamente na mesma hora em que se acredita que Jesus tenha morrido. As respostas do Papa foram gravadas a 15 de Abril na biblioteca do palácio apostólico. Entre as sete pessoas escolhidas para fazer uma pergunta das mais de duas mil propostas à redacção, está a de Elena, uma menina ítalo-japonesa de sete anos, que presenciou a morte de outras crianças, sentiu a casa tremer e ficou traumatizada pelo terramoto seguido de tsunami que devastaram seu país em 11 de Março. O Papa, que inicialmente aceitou responder a apenas três perguntas relacionadas com a vida de Jesus, tema de seu último livro, resolveu aumentar o espaço, devido ao sucesso que a iniciativa suscitou. Bento XVI aceitou abordar todos os assuntos, entre eles o destino das pessoas em coma e as perseguições contra os cristãos por muçulmanos no Iraque. Um dos assuntos mais comoventes sobre o qual o pontífice deverá responder é sobre a alma de quem está em coma irreversível, feita por uma mãe italiana que acompanha o seu filho nesta situação dramática. O tema não foi escolhido ao acaso, já que se abriu na Itália um debate sobre a eutanásia, após o caso de Eluana, que passou 17 anos em coma até que a família obteve autorização para suspender sua alimentação. Segundo informações antecipadas pelo jornal “La Stampa”, o Papa explicará que a alma não deixa o corpo, mesmo se o indivíduo estiver inconsciente, e lembrará que as pessoas em coma precisam receber amor, afecto e cuidados. Uma mulher africana e muçulmana, proveniente da Costa do Marfim - país que acaba de passar por uma violenta crise após as eleições presidenciais -, e sete estudantes cristãos residentes no Iraque, sob ameaça permanente, também farão perguntas. O Papa falará de temas variados, muitos relacionados com a dor, por se tratar da Sexta-feira Santa, dia em que os católicos comemoram o calvário de Cristo. Em seis anos de pontificado, Bento XVI concedeu poucas entrevistas, a primeira à televisão polaca, após a morte de João Paulo II, em 2005, e outra em 2006, à emissora de TV alemã, seu país de nascimento. Notícia corrigida às 13h07Nesta ocasião, trata-se de perguntas feitas por particulares, não por jornalistas.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave morte filho mulher corpo marfim eutanásia
A unidade de elite que matou Bin Laden
É raro ouvirmos falar deles e nunca os ouviremos gabarem-se dos seus sucessos. Eficiência e segredo são as suas máximas. Ao todo, não há mais de 2500 SEAL, as forças especiais da Marinha norte-americana que tiveram a cargo a operação que terminou com a morte de Osama bin Laden. (...)

A unidade de elite que matou Bin Laden
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento -0.2
DATA: 2011-05-04 | Jornal Público
SUMÁRIO: É raro ouvirmos falar deles e nunca os ouviremos gabarem-se dos seus sucessos. Eficiência e segredo são as suas máximas. Ao todo, não há mais de 2500 SEAL, as forças especiais da Marinha norte-americana que tiveram a cargo a operação que terminou com a morte de Osama bin Laden.
TEXTO: “Os tipos que se tornam membros dos SEAL têm uma visão especialmente apurada, inteligência acima da média, e uma constituição genética que lhes permite suportar muito fisicamente. Há tipos qualificados para entrarem mas os que sobrevivem até ao fim são os cavalos de corrida”, disse à BBC Don Shipley, da Virgínia, que foi membro dos SEAL durante 20 anos. Há um número que dá uma ideia do que Shipley quer dizer com cavalos de corrida: a média de desistências durante o treino dos SEAL está entre os 80 e os 85 por cento. A primeira semana, com treino 24 horas por dia, é conhecida como “Hell Week”. Depois do treino básico, há uns 200 candidatos de cada vez que chegam à escola. No fim do processo costumam sobreviver 30 a 35. O grupo que treina neste momento, descobriu a BBC, começou com 245 homens (não há mulheres nos SEAL) e já perdeu 190 recrutas nas primeiras três semanas. São um “grupo com muita testosterona”, descreveu ao “Washington Post” Alden Mills, que esteve nos SEAL entre 1991 e 1998. “O fracasso não é uma opção” ou “a dor é a fraqueza a deixar o corpo” são alguns dos seus slogans. Os SEAL – a sigla é composta pelas iniciais das palavras em inglês para mar e terra, pois querem-se prontos para agir em qualquer meio – surgiram durante a Segunda Guerra, quando os Estados Unidos precisaram de combatentes rápidos para invadir o Japão. Ainda não se chamavam assim, eram a Naval Combat Demolition Unit, que esteve envolvida na invasão do Norte de África em 1942. A criação dos SEAL como existem hoje foi tornada possível com um pacote de 100 milhões de dólares disponibilizado pelo Presidente John F. Kennedy para fortalecer a capacidade das forças especiais. Estiveram envolvidos no Vietname, em Granada e no Panamá. Nos últimos anos, os SEAL actuam essencialmente no Afeganistão e no Iraque, mas também têm sido chamados para missões no Iémen, na Somália ou no Paquistão, como esta a que se chamou “Geronimo”, como o guerreiro apache que liderou a resistência aos brancos e se tornou numa espécie de símbolo do “wild west”. A morte de Bin Laden foi comunicada ao Presidente Barack Obama com as palavras “Geronimo EKIA” – Enemy Killed in Action (inimigo morto em acção). A Equipa SeisNão houve exactamente um comunicado dos SEAL com pormenores da operação, mas sabe-se que a missão foi entregue à Equipa Seis (ou DEVGRU), uma unidade que trabalha tantas vezes com a CIA que é conhecido como a Guarda Pretoriana da agência. Sabe-se que a Equipa Seis, cujos membros são seleccionados a partir de todas as unidades entre os que contam com cinco anos de experiência, tem a sua base nos arredores de Virginia Beach. Sabe-se, mas não se tem a certeza. Quando o mayor de Virginia Beach soube que tinha sido uma unidade dos SEAL sedeada perto da sua cidade a matar Bin Laden quis homenageá-los, escreveu o “Washington Post”. Mas um primeiro problema colocou-se de imediato a Will Sessoms: como encontrá-los?“Esta comunidade está extremamente orgulhosa. Gostava de encontrar uma forma de a cidade festejar. Mas é um desafio”, explicou Sessoms. Se os SEAL são os melhores entre os melhores, a Equipa Seis, criada em 1980, depois da tentativa falhada de salvar os reféns na embaixada dos Estados Unidos em Teerão, é constituída pelos melhores de todos. Ryan Zinkie esteve cerca de uma década na equipa e contou à National Public Radio que passou parte desse tempo nos Balcãs, nos anos 1990, à procura de suspeitos criminosos de guerra. “A determinada altura a nossa missão era realmente capturar”, disse.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave morte homens guerra escola comunidade espécie mulheres corpo morto
Seco que nem um carapau da Nazaré
Os peixes continuam a secar ao sol, indiferentes ao debate em torno deles. São um dos maiores bilhetes-postais da Nazaré, mas as mulheres que os vendem temem que "isto esteja a acabar". Há, contudo, uma nova geração que acredita neles: Inês tem 34 anos e voltou à Nazaré para trabalhar com a mãe na secagem do peixe. O irmão, Samuel, criou uma nova embalagem para explicar aos turistas o que isto é. E o projecto Endògenos está a reinventar o carapau seco nas cozinhas. São sete da tarde e o sol começa a pôr-se sobre a praia da Nazaré. Ana Palmira continua sentada por detrás da sua banca de peixe seco. Não tem grandes... (etc.)

Seco que nem um carapau da Nazaré
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 | Sentimento -0.06
DATA: 2014-05-13 | Jornal Público
TEXTO: Os peixes continuam a secar ao sol, indiferentes ao debate em torno deles. São um dos maiores bilhetes-postais da Nazaré, mas as mulheres que os vendem temem que "isto esteja a acabar". Há, contudo, uma nova geração que acredita neles: Inês tem 34 anos e voltou à Nazaré para trabalhar com a mãe na secagem do peixe. O irmão, Samuel, criou uma nova embalagem para explicar aos turistas o que isto é. E o projecto Endògenos está a reinventar o carapau seco nas cozinhas. São sete da tarde e o sol começa a pôr-se sobre a praia da Nazaré. Ana Palmira continua sentada por detrás da sua banca de peixe seco. Não tem grandes esperanças de vender alguma coisa, mas vai ficando, sempre pode ser que ainda passe alguém que queira comprar. Passa um casal de jovens. Ele faz perguntas. Ela olha com um ar desconfiado para os peixes escalados e secos. Como é que se cozinha?, pergunta ele. Parece tentado a levar. Ana Palmira ganha algum alento com a perspectiva da venda e garante que é um petisco de primeira. A rapariga abana a cabeça. Acabam por agradecer e ir embora sem levar nada. "Isto está a acabar", lamenta-se a peixeira. "Isto" é a venda de peixe seco, uma tradição antiga e um dos bilhetes-postais da Nazaré. São sete da tarde e a banca continua cheia. De nada adianta estar a pé desde as quatro da manhã e já ter corrido a Nazaré, primeiro a comprar o peixe na lota, depois a vendê-lo ainda fresco e por fim a abrir o restante, a passá-lo na salmoura e a pô-lo ao sol. "A malta nova hoje não quer nada disto. Só os mais velhos é que compram, e esses estão a desaparecer. "Ana Palmira andou toda a vida a vender peixe, conseguiu pôr os filhos a estudar, hoje todos têm cursos superiores e até mestrados, mas, afinal, contra todas as suas expectativas, isso não lhes serviu de garantia de uma vida melhor. "Estão todos desempregados. " E é isso que lhe deixa "o coração tão negro" como o lenço que tem enrolado à cabeça, e que agora desenrola para nos mostrar a cor - é preto mesmo. "Isto hoje é só entrevistas", lança-lhe outra peixeira, também junto da sua banca de peixe seco. Na praia, por trás delas, ergue-se o "estindarte" que é como aqui chamam ao estendal, os rectângulos de madeira e rede, inclinados e virados para sul, onde o peixe é colocado para secar ao sol. A tradição começou, não se sabe exactamente quando, como forma de preservar o peixe em tempos de maior dificuldade e garantir que a comida chegava para os dias em que os homens não podiam ir ao mar. Embora o carapau seja o mais emblemático, secam-se diferentes peixes, do cação à petinga e à sardinha (estes peixes mais pequenos não são escalados), passando pelo polvo. As técnicas também diferem: um carapau seco deve ficar uns dois a três dias ao sol, dependendo das condições atmosféricas e da temperatura e pode ser comido cru e desfiado ou cozido e regado com azeite, vinagre ou sumo de limão e alho picado. O carapau a que chamam "enjoado" fica apenas um dia, ou algumas horas ao sol, passa por uma salmoura menor e é geralmente grelhado. Por força do hábito, os nazarenos ganharam gosto a este peixe assim seco e deliciam-se quando o comem. Mas e os outros? Bem, os outros - os não nazarenos, entenda-se - passam, olham, fazem perguntas. E não compram. É por isso e porque dantes o "estindarte" era muito maior e a praia estava cheia de mulheres a vender, que Ana Palmira não está optimista. No entanto, esta história pode ser diferente - e muito mais feliz. Se nesse dia Ana Palmira estava mais a dar entrevistas do que a vender peixe, era porque dali a pouco ia realizar-se um jantar dedicado precisamente ao carapau seco da Nazaré. O que está a acontecer aqui é uma coincidência de interesses que pode ajudar a virar o destino à tradição do carapau seco. O jantar está marcado para a Taberna do 8 ó 80, casa aberta há dois anos na marginal, por Abel Santos, filho da Adélia, da Taberna d"Adélia, famosa na Nazaré pelo seu peixe fresco. Foi o restaurante de Abel o local escolhido pelo projecto Endògenos - uma iniciativa do empresário Nuno Nobre, que, em colaboração com o chef António Alexandre, pretende recuperar vários produtos tradicionais portugueses, das algas ao capão, passando pelo ouriço-do-mar - para este jantar em torno do carapau seco. Quem forneceu o carapau esta noite foi a Maria da Nazaré. Por isso, é tempo de conhe-cermos os irmãos Samuel e Inês Fialho, ele com 28 anos, ela com 34, netos e filhos de mulheres que dedicaram a vida ao peixe seco da Nazaré e que acreditam que esta é uma tradição com futuro. Foi essa razão que os levou a criar a marca Maria da Nazaré -uma homenagem a essa avó, chamada Maria da Nazaré, hoje com 91 anos, que é para eles um exemplo. Inês fez o curso de Educadora de Infância, viveu em Lisboa, tem um marido ligado ao cinema e, há três anos, quando ficou grávida da filha, decidiu ir viver para a Nazaré. "Pela qualidade de vida", explica. O facto é que a carreira de educadora de infância foi substituída pela venda de peixe. Encontrámo-la, bem-disposta e sorridente, pelas nove da manhã, junto à mãe, Isaura, a amanhar o peixe numa banca do mercado municipal. No café do mercado, há grande animação, com as vendedoras da praça a beber café de saco e a comer pão com manteiga. Isaura e Inês já receberam os carapaus e os batuques (têm um vendedor que compra na lota e lhes vende no mercado) e vão passar algumas horas a abrir cada peixe, a tirar-lhe a tripa, a escalá-lo à mão, fazendo correr o dedo junto à espinha, sempre debaixo de água corrente e, por fim, a passá-lo por duas ou três salmouras. Muito importante, sublinha Inês, é tirar-lhe completamente o sangue, porque é este que atrai as moscas, um dos maiores perigos para este produto. Quando já têm vários alguidares cheios de peixes abertos, põem-nos num carrinho de mão e atravessam as ruas da Nazaré, vazias àquela hora, até ao estendal. Na praia, de manhã cedo, só as gaivotas, que enchem o areal na esperança de apanhar um peixe, ou pelo menos as tripas, que algumas peixeiras têm o hábito de lhes dar. Os paneiros (as tábuas com rede) têm diferentes cores para se saber a quem pertencem. As duas desembrulham os seus paneiros, protegidos por um plástico azul, e aparecem os primeiros, verde-claro, e os restantes, vermelhos. "O vermelho foi sempre a cor da minha mãe", diz Isaura. Pega num e segura-o ao alto para mostrar o M e o N, pintados a vermelho, com os quais a Maria da Nazaré - que começou neste trabalho em 1928, tinha apenas seis anos, e continuou até aos 87 - identificava as suas tábuas. Samuel agarra no tablet para mostrar o site da marca e o filmezinho que fizeram com a avó a mostrar como se cozinha o carapau seco - na realidade, um processo muito fácil, semelhante ao do bacalhau. "O que nós sentimos foi que muitas pessoas, nomeadamente os turistas, tinham curiosidade em saber o que era o peixe seco, mas nem sempre é fácil explicar. " Sobretudo para as peixeiras na praia, que não falam outras línguas e têm apenas os gestos para se fazer entender. Por isso, numa assumida estratégia de marketing - até porque Samuel tem uma starp-up dedicada a projectos digitais, entre os quais, os recentemente lançados áudio-guias Nazaré Museum, com informação para os visitantes sobre as diferentes rotas que podem fazer na Nazaré - a "Maria da Nazaré" criou uma embalagem em triângulo e colocou lá dentro um, apenas um, carapau. Isto permite que quem não conhece prove e satisfaça a curiosidade. "Os estrangeiros não vão comprar meia dúzia ou uma dúzia de carapaus, como as mulheres vendem na praia, mas são capazes de comprar um para saber como é. " E ainda para mais porque a embalagem conta a história desta tradição, em português, inglês e francês. A Nazaré sempre se encheu de gente para o Verão. E ainda hoje se vêem as mulheres nas ruas segurando placas anunciando quartos para alugar. Mas foram as ondas gigantes surfadas por Garrett McNamara que recentemente lhe deram fama mundial. "Aparecem muitos turistas a perguntar a que horas é a onda gigante", ri Samuel. "Temos de melhorar a informação que damos porque as pessoas têm a expectativa de ver ondas grandes todos os dias, e não é assim. "O facto é que aparecem muito mais estrangeiros e, em particular, muitos japoneses e coreanos, que ficam surpreendidos a olhar para o peixe a secar. Quem não fica nada surpreendido são os africanos - que usam muito peixe seco nos seus cozinhados e chegam a vir à Nazaré de propósito para o comprar. A ideia de Samuel e Inês de vender um carapau com explicação incluída é boa, mas não será certamente suficiente para salvar o carapau seco se nada mais acontecer. É aqui que entra a tal convergência de interesses. Acontece que o Endògenos se interessou pelo carapau seco - até porque foi um produto que o chef António Alexandre já trabalhou no passado - e que a Câmara da Nazaré, dirigida por Walter Chicharro, está também muito empenhada em não deixar morrer a tradição, que considera parte fundamental da identidade nazarena. "Estas mulheres, com o seu trabalho, preservam grande parte do património da Nazaré", diz o presidente da câmara. "Por isso, queremos melhorar as condições em que trabalham. " O projecto que a autarquia está a desenvolver prevê o reaproveitamento de uma área no interior do centro cultural, que funciona no edifício da antiga lota, precisamente em frente ao estendal. Aí, as peixeiras terão um espaço para amanhar o peixe e fazer a salmoura - algo que hoje a Maria da Nazaré, ou seja, a Inês e a mãe, faz no mercado municipal e as outras fazem na praia. O objectivo é também permitir que os turistas e outros visitantes assistam ao processo. Depois da salmoura, as mulheres poderão atravessar a rua e pôr o peixe a secar nos paneiros, numa zona que hoje está muito danificada (até por causa dos recentes temporais) e que será reabilitada com um projecto do arquitecto paisagista Álvaro Manso. "Queremos tornar a secagem num museu vivo", frisa Walter Chicharro. "E isso é uma prioridade para a Nazaré. "Para já, e enquanto este projecto não se concretiza, a câmara está a planear, para o Verão, a primeira Mostra do Carapau Seco, mais uma oportunidade para mostrar o que acreditam que é o potencial gastronómico deste produto. Potencial que, para já, foi explorado por António Alexandre em colaboração com Ana Pereira, da 8 ó 80, no jantar acompanhado por vinhos da Quinta do Gradil, do Cadaval. Houve carapau - neste caso, foi o "enjoado" o único utilizado - de várias formas. Para entrada, apareceu em patê, em patanisca e em pizza. Depois, num wrap tradicional e noutro com couve, acompanhado por amendoim e mel (dois outros produtos que o Endògenos está a tentar valorizar), seguido por uma sopa de peixe com um ravioli de camarão, carapau e algas. Houve ainda um muito bem conseguido arroz malandrinho com o carapau enjoado desfeito, dando uma textura e um sabor surpreendentes; e, como prato de carne, um mais arriscado frango recheado com morcela de arroz, espinafres e carapau sobre um puré de maçã, pêra e beringela. No final, como é tradição nos jantares do Endògenos, até a sobremesa teve carapau: maçã assada com carapau, nêsperas, mel caramelizado, pêra grelhada e gelado de amendoim e mel. Samuel Fialho tem uma ideia muito clara do que gostaria que fosse o futuro do carapau seco. "Era importante que este produto começasse a ser usado nos restaurantes da Nazaré, porque as pessoas vêem-no aqui à venda e não conseguem prová-lo nos restaurantes. Era bom tê-lo pelo menos nas entradas, num patê por exemplo. " Mas há um grande obstáculo, que Samuel explica, e que Abel, o dono da Taberna do 8 ó 80, confirma: a fiscalização. Enquanto não estiverem garantidas as condições de higiene e segurança alimentar que cumpram os requisitos da lei os restaurantes da Nazaré, não vão servir o peixe seco, mesmo que muitos nazarenos o comam diariamente nas suas casas. Ninguém quer correr o risco de ter o estabelecimento fechado por causa disso. Solução? Avançar com o processo de certificação, algo em que a câmara, em colaboração com a Maria da Nazaré, quer apostar. Inês, sentada à mesa da taberna, está entusiasmada com o que provou: "Achei fabulosa a nova dimensão que o carapau seco pode ter. Há pouca malta nova a pegar nas coisas. Na minha geração, ninguém quer estragar as unhas a arranjar peixe. Mas neste momento este é o meu projecto de vida, quero levar o nome da minha avó mais longe. " Em casa, com 91 anos, Maria da Nazaré ainda insiste em fiscalizar o peixe para ver se a filha e a neta estão a fazer tudo bem. Há uma fama a respeitar, uma tradição a manter. Raul Brandão escreveu que as peixeiras da Nazaré "são a vida desta terra". No livro Os Pescadores, escrito no início da década de 1920, fala delas assim: "Surpreendo-as na labuta de todos os dias: carregando peixe, salpicando-o de sal e estendendo na areia sobre palha o cação, o polvo, o carapau, para a seca. " Também Alves Redol descreve a "lida sem fim" destas mulheres. Hoje já são poucas. São cada vez menos. "Só com a certificação podemos crescer", diz Inês, camisola e calças pretas, botas de borracha nos pés, o cabelo claro a vir-lhe para a cara, empurrado pelo vento da praia. Diz que gostava de usar um avental típico da Nazaré e que ainda vai pensar numa forma de também não deixar que estes desapareçam quando as mulheres que começam agora a montar à nossa volta os seus estendais um dia também desaparecerem. "Mas nós sozinhos, com a Maria da Nazaré, não vamos a lado nenhum", frisa Samuel. Este tem de ser um projecto comum às mulheres que toda a vida trabalharam na secagem do peixe, as mulheres, como Ana Palmira, que hoje têm medo que "isto esteja a acabar". Inês e Samuel vêm dizer precisamente o contrário: "Isto tem futuro. "
REFERÊNCIAS: