A Bienal de Berlim declarou guerra
A guerra anunciada é um transformação da linguagem utilizada para falar de arte, uma linguagem inspirada pelas ciências sociais, em particular os estudos pós-coloniais e de género. (...)

A Bienal de Berlim declarou guerra
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 6 Africanos Pontuação: 7 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-07-16 | Jornal Público
SUMÁRIO: A guerra anunciada é um transformação da linguagem utilizada para falar de arte, uma linguagem inspirada pelas ciências sociais, em particular os estudos pós-coloniais e de género.
TEXTO: Quando a curadora sul-africana da Bienal de Berlim, Gabi Ngcobo, chegou à conferência de imprensa de óculos escuros com a sua equipa de curadores guerrilheiros associados (Thiago de Paula Souza, Nomaduma Rosa Masilela, Yvette Mutumba, Moses Serubiri), qual Black Panthers, percebeu-se que a linguagem seria de combate: "Nós estamos em guerra", declarou. Com a discussão que se seguiu percebeu-se melhor o programa estratégico desta edição em que o texto de apresentação é de uma cautela extrema. A imprensa estava preparada para transformar esta manifestação na bienal da descolonização, com uma maioria esmagadora de artistas ligados à diáspora africana, caribense e sul-americana (e um recorde de 72% de mulheres na lista dos artistas). Os curadores começaram então por recusar definições: "Somos todos pós-coloniais", afirmou a curadora para lembrar que estamos inseridos numa realidade que atravessou um processo de desumanização radical, para o qual não há volta atrás e que actualiza os seus efeitos sob outras formas. "É problemático considerar que os artistas da Bienal são descobertas apenas porque na Europa não são conhecidos. Nós conhecemo-los, eles conhecem-se a si próprios e nos seus países de origem", acrescentou. Mas a guerra anunciada é sobretudo um transformação da linguagem utilizada para falar de arte, uma linguagem inspirada pelas ciências sociais, em particular os estudos pós-coloniais e de género (na versão actual do feminismo, recusando qualquer identidade uniformizada). A curadora Gabi Ngcobo afirmou a necessidade de descolonizar e de levar a cabo um trabalho para desfazermos identidades, questionando construções históricas estabelecidas. Este princípio de recusa surge logo no título da Bienal, We don’t need another hero (citando Tina Turner numa canção numa perspectiva de auto-determinação), e prolonga-se no programa de actividades (intitulado "Eu não sou o que tu pensas que eu não sou", perturbando qualquer posição fixa). Não há bienal de arte contemporânea que não cite actualmente Fred Moten, poeta e investigador na área dos black studies (autor de The Undercommons com Stefano Harney). "Quando Fred Moten fala de comunidades fugitivas, com raízes na segregação, trata-se de elaborar um plano de fuga enquanto processo de subjectivação. Quer dizer, foge-se para fugir, não para atingir uma promessa de utopia. A ansiedade de chegar à promessa é na realidade a vontade de ser capturado, mas o mundo continua, as batalhas deslocam-se", como diz a artista Jota Mombaça. O tom de guerrilha poderia levar a pensar que esta bienal privilegiaria os discursos às formas. Não é o caso. Há momentos fortes: a surpresa de descobrir as pinturas abstractas em madeira da afro-americana Mildred Thompson (1936–2003) ou a forma como Belkis Ayón (1967–1999) inventa uma iconografia mística para a sociedade secreta cubana Abakuá, introduzindo um culto feminino. Mas esta edição é bem comportada, estudiosa e por vezes convencional. Oscar Murillo, um dos raros artistas expostos associado ao mercado da arte, bem pode explicar que a sua escultura intestinal já não digere os excessos do mundo, expulsando os humanos mas celebrando a livre circulação dos produtos; a Bienal parece querer posicionar-se do lado do bem, aquele que tem sempre razão. Não é de espantar que as obras mais perturbadoras sejam as que integram auto-crítica, humor e dissonâncias estéticas, como o vídeo da Sondra Perry fazendo um paralelo cáustico entre tipologias de jogadores de basquetebol (nos jogos de consola) e as classificações praticadas por museus ditos universais em relação a artefactos pilhados em África. A instalação vídeo marcante de Grada Kilomba (com a participação de Kalaf Epalanga como actor) lembra como uma voz doce pode demolir de forma radical as estruturas sociais arbitrárias assentes na violência - neste caso envolvendo o complexo de Édipo, mito "branco" perpetuando uma noção isolacionista de família. No meio das ruínas da instalação monumental da artista Dineo Seshee Bopape, inspirada num romance de Bessie Head sobre o mergulho na loucura de uma mulher colonizada, vê-se o rosto de Nina Simone, que gerou comoção, dizendo durante um concerto: "É impossível imaginar que possamos chegar à situação que faz com que esta canção se torne necessária". A Bienal de Berlim declarou guerra mas está sobretudo numa encruzilhada - como desfazer identidades quando é necessário lembrá-las para desencadear processos de emancipação? Falta para tal a capacidade de imaginar futuros desconhecidos.
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Partidos LIVRE
República Centro-Africana elege uma mulher para restaurar a paz
O Parlamento interino nomeou Catherine Samba-Panza para reconciliar o país e para pôr fim ao conflito étnico que dura desde Março. (...)

República Centro-Africana elege uma mulher para restaurar a paz
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 6 Africanos Pontuação: 14 | Sentimento 0.0
DATA: 2015-05-01 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20150501041100/http://www.publico.pt/1620387
SUMÁRIO: O Parlamento interino nomeou Catherine Samba-Panza para reconciliar o país e para pôr fim ao conflito étnico que dura desde Março.
TEXTO: O Conselho Nacional de Transição da República Centro-Africana (RCA) elegeu esta segunda-feira Catherine Samba-Panza como Presidente interina. As prioridades da nova governante – a primeira mulher no cargo – são terminar com o conflito armado que domina o país e a marcação de eleições até ao final do ano. As condições para os candidatos se poderem apresentar perante o Parlamento eram muito restritivas. De fora ficaram todos aqueles que tiveram cargos políticos durante a governação do anterior Presidente, Michel Djotodia, os responsáveis partidários, os militares no activo e todos aqueles que pertenceram a uma milícia ou rebelião nos últimos vinte anos. Apesar das condicionantes, perfilaram-se oito candidatos para ocupar o cargo deixado por Djotodia a 10 de Janeiro, na sequência de pressões da comunidade internacional, especialmente da França. A antiga potência colonial enviou no início de Dezembro 1600 soldados para apoiar as forças da União Africana (MISCA) no processo de contenção do conflito. Depois de uma primeira volta em que nenhum dos candidatos conseguiu obter a maioria absoluta dos votos, os 129 membros do Conselho Nacional de Transição acabaram por eleger Samba-Panza, com 75 votos. Désiré Kolingba, filho de um antigo chefe de Estado e apoiado por uma parte dos ex-Séléka (grupos rebeldes, na sua maioria muçulmanos, que apoiaram a ascensão de Djotodia), contou apenas com o voto de 53 deputados. A Presidente da Câmara de Bangui era vista como uma das favoritas, reunindo o apoio de associações de mulheres, mas sobretudo por ter boas relações tanto com as milícias anti-balaka (grupos maioritariamente de cristãos) como com os ex-Séléka. O resultado da eleição foi recebido com aplausos por todos aqueles que se encontravam no Parlamento, descreve o correspondente da AFP, acrescentando que foi entoado o hino nacional da RCA. As primeiras palavras de Samba-Panza dirigiram-se a ambos os lados do conflito que dura há quase um ano e que já obrigou um milhão de pessoas a abandonar as suas casas. “Manifestem a vossa adesão à minha nomeação dando um sinal forte de deposição das armas”, afirmou. Pela frente, a nova Presidente tem a tarefa árdua de pacificar o país e criar condições para que se realizem novas eleições. Segundo o calendário da transição, o sufrágio deverá ser realizado o mais tardar durante o primeiro semestre de 2015, embora Paris prefira que as eleições se celebrem ainda este ano, de forma a pôr termo à operação militar no país. Foi com um tom conciliador que Samba-Panza se dirigiu aos seus compatriotas: "A partir deste dia, eu sou a Presidente de todos os centro-aficanos sem excepção. "O Presidente francês, François Hollande, saudou a escolha, garantindo que "a França está ao seu lado nesta tarefa difícil. " Os elogios foram reforçados pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, Laurent Fabius, que considerou Samba-Panza "uma mulher notável. "Para além de Samba-Panza e de Kolingba, eram candidatos o ex-Presidente da Câmara de Bangui, Jean Gombé Ketté, o filho de um antigo Presidente, Sylvain Patassé, o alto funcionário internacional Faustin Takama, o empresário Emile Nakombo, a professora de inglês Regina Konzi-Mongo e o cirurgião Mamadou Nestor Nali. Apesar do reforço das forças de segurança com o envio do contingente francês, a violência tem sido difícil de controlar. Desde o início de Dezembro que os combates entre as milícias já fizeram mais de mil mortos. Notícia actualizada às 19:22 - Acrescentaram-se as declarações de François Hollande e de Laurent Fabius.
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Palavras-chave violência filho mulher comunidade mulheres
Pensão de alimentos mantém-se até aos 25 anos para filhos que estudam
Nova lei deixa de obrigar filhos a exigir a um dos pais a manutenção da pensão de alimentos. (...)

Pensão de alimentos mantém-se até aos 25 anos para filhos que estudam
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2015-10-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: Nova lei deixa de obrigar filhos a exigir a um dos pais a manutenção da pensão de alimentos.
TEXTO: A partir desta quinta-feira, os jovens que façam 18 anos e estejam a concluir os estudos ou a formação profissional vão deixar de ter que exigir, numa conservatória ou num tribunal, a manutenção da sua pensão de alimentos paga por um dos pais até concluírem a sua educação. Passam, por isso, a ter direito de forma automática à pensão, no máximo, até aos 25 anos. Até agora, quando o filho de um casal divorciado ou separado de facto atingia a maioridade o progenitor que tinha o jovem a seu cargo deixava de poder exigir ao outro o pagamento da pensão. A lei já previa a possibilidade do jovem adulto receber a pensão até concluir os estudos, mas, caso o progenitor não a pagasse voluntariamente, exigia que o filho fizesse essa reivindicação formalmente. O próprio filho tinha que apresentar um pedido na Conservatória do Registo Civil para tentar um acordo e, na ausência deste, interpor uma acção em tribunal. Nesse procedimento o filho maior tinha que provar que ainda não completara os estudos e que era razoável exigir o cumprimento daquela pensão até completar a formação. A acção não podia ser intentada pelo progenitor com quem vivia, na maior parte dos casos a mãe, que acabava por assumir a maior parte das despesas do jovem. “Os filhos raramente intentavam estas acções, porque não se queriam incompatibilizar com o pai, tinham medo dele ou temiam as retaliações de que ele ou a mãe poderiam ser alvo”, sustenta Teresa Féria, presidente da Associação Portuguesa de Mulheres Juristas, a instituição que apresentou uma proposta de alteração legislativa aos partidos com assento parlamentar. O PS levou o projecto à Assembleia da República e a versão final do diploma foi aprovada por unanimidade em Julho. E entra em vigor esta quinta-feira. Isabel Moreira, a deputada que foi a primeira subscritora do projecto-de-lei, explica que se pretendeu dar resposta a um problema detectado por aquela associação, que afecta “um número considerável de jovens”, que deixa de frequentar o ensino superior ou a formação profissional “por falta de dinheiro e por não ter coragem de intentar uma acção em tribunal contra o progenitor”. Com esta alteração, a pensão de alimentos mantém-se "uma obrigação legal, contínua até à conclusão da formação dos jovens” e, desta forma, eles deixam de “ter que passar por este constrangimento”. “Retirou-se do filho esse peso”, frisa Isabel Moreira. Quanto à determinação do limite dos 25 anos, a deputada defende que esta é “a idade calculada para se concluir um mestrado integrado”. No entanto, não é obrigatório que a pensão se mantenha até o filho fazer 25 anos. A obrigação pode terminar antes, logo que forem concluídos os estudos, ou se o jovem tiver decidido “livremente” interrompê-los. Os pais que tiverem que pagar a pensão também podem pedir o fim da pensão fazendo “prova da irrazoabilidade da sua exigência”. Dulce Rocha, presidente executiva do Instituto de Apoio à Criança, diz que “muito raramente” os filhos propunham estas acções, o que deixava “as mulheres, que em geral possuem uma menor capacidade financeira, com um encargo muito injusto”. “Nas situações de violência doméstica era certo e sabido que quando o filho fazia 18 anos o pai deixava de comparticipar nas despesas”, lamenta. Nos casos de incumprimento desta obrigação, o progenitor que tem o filho a seu cargo pode exigir ao outro o pagamento da pensão, o que não acontecia até agora. Por outro lado, a lei determina que os pais podem acordar ou o juiz decidir entregar a contribuição “no todo ou em parte aos filhos maiores”. Desde 1977, que o Código Civil prevê a manutenção da obrigação dos pais sustentarem os filhos após a maioridade quando estes não completaram a sua formação profissional “na medida em que seja razoável exigir aos pais o seu cumprimento e pelo tempo normalmente requerido para que aquela formação se complete”. Os tribunais têm estabelecido os limites da razoabilidade desta obrigação, tendo em 2005 a Relação do Porto aceite que um pai deixasse de suportar as despesas com a formação da filha que reprovara no primeiro ano do curso durante três anos. O Supremo Tribunal de Justiça considerou, em 2008, como causa de extinção da pensão de alimentos o facto de o filho maior frequentar há oito anos, sem qualquer êxito, por circunstâncias a si imputáveis, um curso que tinha a duração prevista de cinco anos. com Alexandra Campos
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Partidos PS
Prémio Sakharov entregue a Malala
Edward Snowden e um grupo de dissidentes políticos bielorrussos eram os outros nomeados para o prémio atribuído pelo Parlamento Europeu. (...)

Prémio Sakharov entregue a Malala
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2015-05-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: Edward Snowden e um grupo de dissidentes políticos bielorrussos eram os outros nomeados para o prémio atribuído pelo Parlamento Europeu.
TEXTO: Malala Yousafzaï, a adolescente paquistanesa baleada na cabeça pelos taliban pela sua campanha em defesa do direito à educação das raparigas, venceu a edição de 2013 do Prémio Sakharov. A escolha de Malala, de 16 anos, foi unânime entre os presidentes dos grupos parlamentares. "O Parlamento Europeu saúda a força incrível desta jovem mulher", declarou o presidente Martin Schulz, através de um comunicado, citado pela AFP. "Malala defendeu com coragem o direito de todos os jovens à educação", um "direito muitas vezes negado às raparigas" em todo o mundo, acrescentou. O presidente do PE recordou ainda “que cerca de 250 milhões de raparigas no mundo não podem ir livremente à escola”, acrescentando que “o exemplo de Malala relembra-nos do dever e da responsabilidade de garantir o direito à educação das crianças. Este é o melhor investimento no futuro”. “Hoje, decidimos dizer ao mundo que a nossa esperança por um futuro melhor está em jovens como Malala Yousafzaï”, disse o líder do Partido Popular Europeu (PPE, o maior grupo político do parlamento), Joseph Daul. Também o líder dos Socialistas e Democratas (S&D, o segundo grupo), Hannes Swoboda, sublinhou que Malala é “uma jovem que arrisca a vida por valores e princípios em que ela, e nós, acreditamos: igualdade entre homens e mulheres e o direito à educação para todos”. Entretanto, os taliban afirmaram que Malala "nada fez" para receber o prémio. "Ela nada fez. Os inimigos do Islão deram-lhe esse prémio porque ela abandonou a religião muçulmana para se converter ao laicismo", defendeu, em declarações à AFP, Shahidullah Shahid, porta-voz dos taliban paquistaneses. Malala está também nomeada para o Prémio Nobel da Paz, que será anunciado na sexta-feira, prémio de que a própria não se considera merecedora, dizendo precisar ainda de trabalhar muito. Baleada na cabeça pelos talibanA paquistanesa tornou-se um símbolo da luta pelo acesso universal à educação, um direito recusado por aqueles que, como os taliban, querem impor uma versão radical da sharia (lei islâmica). A insistência de Malala em continuar a sua educação, à medida em que ia dando a conhecer ao mundo a sua luta através de um diário que mantinha para a BBC Urdu, fizeram da jovem um foco de rebelião que precisava de ser contido pelos fundamentalistas islâmicos, que a acusavam de veicular "propaganda ocidental". Há um ano, um grupo de taliban lançou um ataque à aldeia paquistanesa de Mingora, no Vale de Swat, na fronteira com o Afeganistão, que tinha como objectivo assassinar a jovem. Dois homens armados entraram no autocarro escolar em que seguia a jovem e perguntam por ela. Malala levantou-se, identificou-se e foi alvejada de imediato na cabeça. Entre a vida e a morte, foi levada para um hospital em Birmingham, Reino Unido. Ao fim de seis dias, Malala acordou, tal como o mundo acordou para a sua história. Esta semana foi publicada uma autobiografia da jovem, "I am Malala Yousafzaï", traduzida em cinco línguas. "Uma caneta pode mudar o mundo"Malala, discursando na sede das Nações Unidas em Nova Iorque, apelou ao acesso à educação para todas as crianças. “Um aluno, um professor, um livro e uma caneta podem mudar o mundo. A educação é a única solução. Educação primeiro”, destacou a jovem, que usava um xaile que pertenceu a Benazir Bhutto, a primeira-ministra paquistanesa assassinada em 2007. Em Abril, a activista inaugurou um fundo que visa garantir o acesso das jovens paquistanesas à educação. “Anunciar a primeira doação do Fundo Malala é o momento mais feliz da minha vida”, disse a jovem, na altura. “Permitam-nos que passemos da educação de 40 para 40 milhões de meninas. ”Malala vive em Inglaterra desde o ataque, mas pretende voltar ao Paquistão e dedicar-se à política e à defesa dos direitos das mulheres. No entanto, as ameaças dos fundamentalistas islâmicos continuam a ensombrar a vida de Malala, não se prevendo, para já, um regresso ao país natal. O Prémio Sakharov para a liberdade de pensamento, no valor de 50 mil euros, foi atribuído, em 2012, ao cineasta Jafar Panahi e à advogada e activista Nasrin Sotoudeh, ambos iranianos. Nelson Mandela e o dissidente soviético Anatoli Marchenko (a título póstumo) foram os primeiros galardoados, em 1988. Em 1999, o prémio Sakharov foi entregue a Xanana Gusmão (Timor-Leste) e, em 2001, a Zacarias Kamwenho (Angola).
REFERÊNCIAS:
Partidos Partido Popular Europeu
Abdullah, o monarca que arriscou reformar para que tudo ficasse na mesma
Abriu a economia e usou os lucros do petróleo para tentar fortalecer-se como potência regional. Anunciou mudanças profundas mas acabou por deixar uma herança de “iniciativas largamente simbólicas", que "produziu avanços concretos extremamente modestos”. (...)

Abdullah, o monarca que arriscou reformar para que tudo ficasse na mesma
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2015-05-01 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20150501195652/http://www.publico.pt/1683221
SUMÁRIO: Abriu a economia e usou os lucros do petróleo para tentar fortalecer-se como potência regional. Anunciou mudanças profundas mas acabou por deixar uma herança de “iniciativas largamente simbólicas", que "produziu avanços concretos extremamente modestos”.
TEXTO: É possível descrever como reformista o líder de uma das últimas monarquias absolutas do mundo? A lógica diria que não, mas no caso da Arábia Saudita a complexidade parece desafiar a lógica. Como o antecessor, Abdullah navegou com prudência entre as alas mais liberais e os membros mais conservadores da família real, ao mesmo tempo que ensaiava mudanças desejadas pela população, metade com menos de 25 anos, sem desafiar realmente o establishment religioso ultraconservador, que desde a nascimento do país divide o poder com a família que o fundou. Rei antes de o ser, Abdullah, que morreu aos 90 anos, só ascendeu ao trono em 2005, com a morte do rei Fahd, mas a débil saúde do seu irmão fizera dele o líder não oficial da Arábia Saudita dez anos antes. Era já o rosto do poder no difícil período aberto pelos atentados do 11 de Setembro e parte do seu legado prende-se com o combate ao extremismo. Enquanto reforçava o poder da família real, tentava estabelecer o país como a grande potência regional e se esforçava por mantê-lo abrigado face às crises no mundo árabe, desiludia os reformadores. Promoveu o diálogo inter-religioso, prometeu atenuar o extremismo da doutrina ortodoxa wahhabita, que é lei no país, deu alguns passos para promover a educação das raparigas e o acesso das mulheres ao mercado de trabalho. Mas as revoltas de 2011 e o receio de consequências internas, assim como a rivalidade com o Irão, exacerbada pela guerra síria, trouxeram de volta as perseguições à crítica interna. “As reformas não existem na Arábia Saudita. Sejamos honestos, é uma monarquia absoluta”, escreve Ali al-Ahmed, ex-prisioneiro político no reino. “Abdullah deu grandes passos na abertura de novos horizontes para as mulheres sauditas, marginalizadas numa sociedade que usa várias interpretações da religião para suprimir os seus direitos e a sua identidade”, defende, pelo contrário Tariq al-Maeena, comentador político saudita, num texto publicado no jornal Gulf News. “Enfrentou os religiosos que pregavam o fundamentalismo e usavam os seus púlpitos para falar contra as liberdades das mulheres. ”Hala al-Dossari, uma activista dos direitos das mulheres da cidade de Jidá, diz à BBC que “houve algumas reformas mas, ao mesmo, a instabilidade regional foi tanta que os assuntos mais importantes da polícia nacional e local são negligenciados há algum tempo”. Dossari enumera “projectos bem-sucedidos, como a universidade mista e a abertura às mulheres do trabalho em lojas”. Mas sublinha que vive no único país que “prende as mulheres que conduzem” e “num dos poucos sistemas do mundo onde quem peça mais direitos e participação [política] é preso”. Em 2005, a sua chegada ao trono foi saudada pelos que viam nele a força motora de alguns pequenos sinais de mudança, como o convite à organização Human Rights Watch para visitar o país ou a organização de um encontro inédito que juntou sunitas e xiitas (uma minoria considerável e não reconhecida), liberais e tecnocratas para discutir extremismo, direitos e liberdades no reino, no Verão de 2003, a Convenção para o Diálogo Nacional. Combate ao extremismoFoi o culminar de um processo que se iniciara com o 11 de Setembro, movido pela sensação de urgência de mudança para combater o extremismo. A maioria dos responsáveis pelos ataques eram sauditas, como Bin Laden, e Riad promoveu uma avaliação dos responsáveis pelas 50 mil mesquitas do país para identificar pregadores com “falta de conhecimento” – mais de 1000 foram reenviados para a escola para serem instruídos na rejeição do “extremismo” da Al-Qaeda. Depois dos ataques contra o aliado histórico, o atentado suicida que matou 34 pessoas em Riad em Maio de 2003 pareceu reforçar ainda mais as correntes reformistas. “Somos uma parte deste mundo e não podemos isolar-nos. Não podemos ficar paralisados enquanto o mundo avança”, disse Abdullah. Numa mensagem à convenção de 2003, o então príncipe herdeiro e regente defendia que a defesa dos cidadãos sauditas contra “ideias prejudiciais” não podia continuar a ser feita com recurso a uma lógica de proibições. “As reformas no papel não conduzem a muito se as práticas governamentais permanecem iguais”, dizia então a Human Rights Watch, lamentando que muitas “anunciadas reformas” continuassem por se materializar. Os activistas lembram um rei que “foi um grande paladino do respeito pelas religiões no estrangeiro” – foi o primeiro chefe de Estado saudita, e guardião dos santuários do islão, a encontrar-se com um Papa, Bento XVI, em 2007 -, mas que pouco fez pela minoria xiita do seu próprio país.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave direitos morte guerra lei escola educação minoria mulheres
Vários tipos de maus-tratos não são detectados pelas comissões de protecção de menores
O estudo aponta a necessidade de mais meios humanos e mais formação dos profissionais que trabalham nesta área, no sentido de aumentar a eficácia na sinalização de vários tipos de abuso, dada a elevada probabilidade “ de estas ocorrerem ao mesmo tempo". (...)

Vários tipos de maus-tratos não são detectados pelas comissões de protecção de menores
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2015-05-01 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20150501175216/http://www.publico.pt/1692850
SUMÁRIO: O estudo aponta a necessidade de mais meios humanos e mais formação dos profissionais que trabalham nesta área, no sentido de aumentar a eficácia na sinalização de vários tipos de abuso, dada a elevada probabilidade “ de estas ocorrerem ao mesmo tempo".
TEXTO: Um estudo sobre crianças sinalizadas pelas comissões de protecção de menores revela que apenas em 17% dos casos analisados os relatos das jovens vítimas de maus-tratos coincidem com as provas que as comissões conseguiram reunir. “Vários tipos de mau-tratos na infância não são detectados pelas Comissões de Protecção de Crianças e Jovens (CPCJ), mesmo quando as crianças são sinalizadas” por estes organismos, conclui o estudo de doutoramento realizado na Escola de Psicologia da Universidade do Minho. O autor da investigação, Ricardo Pinto, disse à agência Lusa que o estudo procurou saber como é que jovens que foram identificados pelas CPCJ como maltratados na infância descreviam as experiências abusivas de que foram vítimas. Para isso, foram consultados processos arquivados em CPCJ de 380 crianças, com idades entre os cinco e os 12 anos, sinalizadas entre 1999 e 2006. Destas crianças, foram localizadas 136, entre 2010 e 2011, já adolescentes e jovens adultos (com idades entre os 14 e 23 anos) que voluntariamente decidiram participar no estudo. Um dos objectivos do estudo foi confrontar a forma como contam a sua história de infância com a informação que estava documentada nos seus processos. “O que verificámos foi que o acordo entre aquilo que os jovens relatam em termos de experiências adversas e a informação que constava nos processos é muito baixo (17%)”, adiantou Ricardo Pinto. A investigação revela que houve 40 jovens que relataram abuso emocional, mas esta informação apenas constava em 3 processos; de 37 jovens que descreveram abuso físico, apenas 12 tinham esta informação no seu processo; e de 23 que disseram ter sido vítimas de abuso sexual, apenas em 8 tinham esta situação no processo. No caso de 70 jovens que relataram negligência emocional, apenas 26 tinham esta informação no processo. Houve ainda 48 jovens que contaram ter sido vítimas de violência doméstica, mas apenas 18 tinha esta informação registada. A negligência física, “a adversidade mais reportada às comissões”, foi o tipo de mau-trato que “mais consistência” registou: de 49 jovens que relataram esta situação, apenas num processo não constava esta informação. De acordo com o estudo, a dificuldade é maior quando o tipo de mau-trato é mais facilmente ocultado pelo agressor (abuso sexual) e menos observável (abuso ou negligência emocional). Já a violência doméstica poderá não ser alvo de avaliação porque o foco da atenção é o mau-trato directo à criança. Para Ricardo Pinto, o facto de os jovens contarem situações que não correspondem com a informação nos processos “é o suficiente para se tentar perceber o que se passou”. Esta situação pode colocar várias questões: “será que os jovens estão a mentir? Será que estão a revelar coisas que não aconteceram? Não há forma de saber, mas se esse argumento é válido foram muitos jovens a fazer isso”. O investigador advertiu que “há uma elevada probabilidade de uma criança quando é abusada fisicamente, também ser negligenciada e abusada sexualmente”. “Isto exige sensibilidade do técnico [da comissão] e tempo para recolher” informação de várias fontes. Contudo, a sua tarefa “não será fácil” porque os maus-tratos “poderão ser ocultados por quem os perpetra”. A investigação também verificou casos em que os jovens ocultaram informação que constava nos processos. “Muitas vezes têm receio de contar o que se passa por vergonha ou porque são ameaçados pelos agressores”, mais um factor que “dificulta o trabalho do técnico a encontrar a verdade”. O estudo aponta a necessidade de mais meios humanos e mais formação dos profissionais que trabalham nesta área, no sentido de aumentar a eficácia na sinalização de vários tipos de abuso, dada a elevada probabilidade “ de estas ocorrerem ao mesmo tempo. O investigador defendeu ainda a importância de acompanhar a criança mesmo depois do arquivamento do processo na CPCJ. “A criança foi sinalizada, esteve em risco, o processo foi arquivado, mas ela veio a sofrer de revitimização, como é que esta criança fica”, questiona. Para o investigador, esta é uma matéria que “tem de ser mais discutida”. “Acho que ainda há muito a fazer em matéria de crianças e jovens”, rematou. Em 2014, 8. 470 crianças e jovens estavam em instituições de acolhimento.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave escola humanos violência criança estudo sexual maus-tratos doméstica abuso vergonha agressor
Observatório responde a urgência de prevenir violência contra as crianças
“A nossa ideia não é substituir nem competir com nenhuma instituição, mas desenvolver um trabalho de sensibilização”, diz Rui Pereira, ex-ministro da Administração Interna e presidente da associação constituída a partir de hoje. (...)

Observatório responde a urgência de prevenir violência contra as crianças
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2015-05-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: “A nossa ideia não é substituir nem competir com nenhuma instituição, mas desenvolver um trabalho de sensibilização”, diz Rui Pereira, ex-ministro da Administração Interna e presidente da associação constituída a partir de hoje.
TEXTO: A criação do Observatório da Criança “100 Violência” não foi motivada pelos casos de violência extrema contra crianças que aconteceram nas últimas semanas. A iniciativa existe há meses e a cerimónia de apresentação, esta quinta-feira na Assembleia da República, já estava marcada desde Outubro. Mas o observatório é lançado para responder a uma urgência. E essa urgência prende-se, também, com os casos recentes de violência na família – os homicídios de cônjuges e ex-cônjuges. E de crianças: o bebé de meses em Oeiras e a menina de dois anos em Loures. “A criação do Observatório resulta em primeiro lugar de um diagnóstico acerca da criminalidade em Portugal. Hoje, a violência doméstica e, muito particularmente os crimes contra crianças, assumem uma enorme gravidade no nosso país”, diz Rui Pereira. O ex-ministro da Administração Interna preside ao observatório. “Nos últimos tempos, temos ouvido histórias verdadeiramente dramáticas, de crianças que são vítimas de homicídios, de abusos sexuais ou de maus tratos, e é necessário mobilizar a sociedade portuguesa para prevenir esse fenómeno”, acrescenta Rui Pereira, professor no Instituto Superior de Ciências Sociais e Política (ISCSP) e no Instituto Superior de Ciências Policiais e de Segurança Interna – os dois parceiros protocolares da associação. Outras parcerias vão permitir juntar as bases de dados das polícias e das comissões de protecção de crianças e jovens, por exemplo, com a investigação universitária. “Quando um pai mata uma criança por ter sido deixado sozinho com ele, sendo verdade que tem problemas de alcoolismo, toxicodependência, que está desempregado e deprimido, falha o pai que não pode ser desculpado e deve ser severamente punido, e falha a sociedade. É preciso haver políticas públicas que previnam estes fenómenos mas é necessário que toda a sociedade se mobilize”, alerta Rui Pereira. “É evidente que a resposta do direito penal, a resposta punitiva é importante. E muito se fez nos últimos anos para responder ao fenómeno. Hoje a violência doméstica é um crime público. Existe uma maior sensibilidade das pessoas relativamente à violência contra crianças. Mas é preciso adoptar políticas sociais integradas”, recomenda. E conclui: “A nossa ideia não é substituir nem competir com nenhum instituição, mas complementar, e sobretudo desenvolver um trabalho de sensibilização. A nossa pretensão é sensibilizar as pessoas, levar a que este fenómeno seja prevenido e, se possível, isso é o que desejaríamos, erradicá-lo. ”Sensibilizar e formarEntre os oradores na conferência vão estar a procuradora Dulce Rocha, presidente executiva do Instituto de Apoio à Criança (IAC), Armando Leandro, presidente da Comissão Nacional de Protecção de Crianças e Jovens em Risco (CNPCJR) e, entre outros, Gérard Greneron, secretário-geral do Conselho Europeu de Sindicatos de Polícia que em França lançou uma iniciativa para prevenir os crimes de pedofilia. O presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Henrique Gaspar, encerra os trabalhos, iniciados por Manuela Ramalho Eanes, presidente do IAC. O objectivo do observatório será sensibilizar e formar profissionais, como juízes, para prevenir a violência contra as crianças quando há indícios e situações susceptíveis de uma retirada da família. “As pessoas ficam muito chocadas quando uma criança é morta, mas o caso é esquecido rapidamente. Não há mobilização”, diz a socióloga e professora do ISCSP Carla Cruz. "Existe o risco de banalização ou de percepção de que esta violência extrema entrou numa normalização" pelo número de ocorrências, acrescenta. “A palavra certa é responsabilizar. Falta responsabilizar a sociedade”, levá-la a denunciar mais as situações, aponta Manuel Morais, agente da Unidade Especial da Polícia de Segurança Pública (PSP), licenciado em Antropologia, e vice-presidente do observatório. Ambos são membros fundadores do observatório. É preciso divulgar estes crimes para sensibilizar, dizem. Mas atenção: “A divulgação poderá suscitar alguma imitação”, diz Manuel Morais, embora não esteja provado que seja mesmo assim, como já está, através de estudos nacionais e internacionais, no caso de outros comportamentos como os suicídios. Os casos das duas crianças mortas, em Oeiras e em Loures, em que o pai e o padrasto são os suspeitos, são os mais presentes. Mas Carla Cruz lembra também o caso de uma mãe, a quem tinham sido retirados os filhos, de 12 e 13 anos, e que os matou, suicidando-se em seguida. Neste caso ocorrido em Janeiro de 2013, no Jamor, as crianças tinham sido entregues ao pai, por decisão judicial mas a entrega não foi imediata.
REFERÊNCIAS:
Entidades PSP
O Evangelho segundo Marilynne Robinson
Um fulgurante (e faulkneriano) romance sobre a redenção — e sobre o que é preciso penar para lá chegar (...)

O Evangelho segundo Marilynne Robinson
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2015-10-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: Um fulgurante (e faulkneriano) romance sobre a redenção — e sobre o que é preciso penar para lá chegar
TEXTO: Lila é o quarto romance da escritora americana Marilynne Robinson e o mais recente da trilogia que compreende ainda Gilead (2004) e Home (2008), onde a autora explora a relação de amizade que une profundamente dois pastores evangélicos — John Ames e Jack Boughton — e as suas respectivas famílias, cujos destinos estão intimamente ligados, no ambiente fechado das difíceis relações parentais e filiais, nos desgostos e nas alegrias que acarretam. A acção, centrada numa pequena cidade imaginária no Noroeste dos Estados Unidos — não muito diferente da terra natal de Robinson —, e as personagens transitam de livro para livro sem ordem cronológica fixa. Na realidade, Lila é uma prequela de Gilead e reencontramos aqui John Ames, que, com toda a sua bonomia e todo o seu amor pela vida, conhece bem a dor da perda: a primeira mulher e a filha morreram há muito e a sua vida solitária, dedicada aos membros da congregação, segue o curso monótono dos dias. Até que, já com 67 anos, é irresistivelmente atraído por Lila, uma jovem que vive sozinha numa cabana em ruínas e, que, tal como ele, é uma “especialista” em solidão e despojamento. Lila tinha apenas cinco anos quando Doll, uma mulher com uma mancha no rosto, uma vagabunda corajosa e livre — e, também, uma assassina —, a encontrou num alpendre à chuva e pegou nela, levando-a para longe da família que a negligenciava. Doll protege sempre Lila, ferozmente, e ambas calcorreiam a América, faça chuva ou faça sol, à deriva e ao sabor dos ventos, juntando-se esporadicamente ao bando de Doane e Arthur, uma espécie de trupe de saltimbancos que só se detém quando é necessário. O cenário, tão dramaticamente capturado nas fotografias de Walker Evans e de Dorothea Lange, é o da Grande Depressão na América, com os fantasmas da fome, do frio e da doença sempre a perseguirem o grupo. Doll e Lila, duas almas gémeas, duas sombras na paisagem, ligadas pelo desejo da fuga, da liberdade e da solidão, são como ecos das personagens do primeiro e fulgurante romance de Robinson, Laços de Família. Depois do medo, vencidas as resistências, Lila, que se sabe rude e ignorante mas que quer conhecer o significado das palavras — copia sozinha, e laboriosamente, trechos da Bíblia —, casa com Ames, não sem este a ter antes baptizado. Esse baptismo à beira-rio, com a água a escorrer sobre Lila e um peixe-gato a debater-se, agonizando na erva, ao sol, é uma das cenas mais comoventes do romance, aquela em que o conflito brutal que se desenrola permanentemente na cabeça de Lila parece, temporariamente, apaziguado. A sua permanente desconfiança em relação a uma possível felicidade — isto é, amor, conforto, protecção, companheirismo — é momentaneamente esquecida ao sentir a mão de Ames pousada na sua cabeça, nessa bênção que “queima” e também a faz chorar. A intimidade, pela qual tanto anseia e que rejeita com o mesmo grau de ferocidade, provoca nela um misto de profunda exultação e cruel sofrimento, uma vez que, ao abdicar da solidão, sabe que está a aceitar algo que desconhece. A inquietação de Lila não acaba com o casamento — tem sempre dinheiro guardado para apanhar a camioneta e fugir —, mas a maternidade transforma-a e será a esse filho que Ames escreve, no fim da vida, a longa carta que surge em Gilead. Há qualquer coisa de ferino e de primordial na personagem de Lila, reminiscente do ideal de Rousseau, cujo mito do “bom selvagem” vai ao encontro da concepção de que o contacto estreito com a natureza funciona como antídoto para uma sociedade em desagregamento. A diferença reside no facto de a “inocência” de Lila ser permanentemente desafiada, tanto pelo seu próprio intelecto como pelo confronto manso, mas determinado, com os outros. A sua luta silenciosa e interior tem a dimensão épica própria das heroínas que vencem as dificuldades de uma infância de abandono e privação, de uma juventude desenraizada e perigosa e de uma idade adulta na qual permanece o rasto de profundos danos emocionais. Robinson é claramente influenciada por William Faulkner que recorreu profusamente à Bíblia na sua obra, acentuando tanto o seu lado luminoso, redentor e inspirador como os seus aspectos mais sombrios, de castigo e perdição. (Repare-se que Gilead funciona como a Yoknapatawpha de Faulkner, um lugar para onde converge toda a acção. ) Lilaé uma obra sobre a redenção e sobre os desertos ou os caminhos de espinhos que é necessário atravessar para alcançar a suprema felicidade, se, por um acaso, ela existir, algures. A autora é incomparável na descrição das maravilhas do mundo imanente — em cada detalhe da matéria, da luz, das texturas, dos movimentos —, enaltecendo a sua insuperável beleza perversamente tingida por um perene sentimento de luto e de perda. Este é pois um romance com uma prosa inspirada e luminosa de cariz profundamente cristão — referências bíblicas (aqui, ao Livro de Ezequiel), luta entre o Bem e o Mal, entre a luz e as trevas, entre a inocência e a corrupção, entre o amor e o ódio, entre a solidão e a pertença — que nos remete claramente para o universo violento e severo da católica Flannery O’Connor, embora Robinson não faça uso da tremenda e incomparável comicidade negra e fulgurante, que caracteriza a obra da escritora sulista.
REFERÊNCIAS:
O Papa pediu clemência, mas Kelly foi executada nos EUA
A mulher fora condenada por planear o assassínio do marido. O autor material do crime negociou um acordo e foi condenado a prisão perpétua. (...)

O Papa pediu clemência, mas Kelly foi executada nos EUA
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2015-10-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: A mulher fora condenada por planear o assassínio do marido. O autor material do crime negociou um acordo e foi condenado a prisão perpétua.
TEXTO: O Papa Francisco pediu clemência, mas o estado da Georgia executou na terça-feira Kelly Gissendaner. Foi a primeira mulher a ser morta nesta região do Sul dos Estados Unidos em 70 anos. Os três recursos de última hora apresentados pela defesa ao Supremo Tribunal da Georgia e ao Supremo Tribunal dos Estados Unidos para travar a execução foram rejeitados – como foi ignorado o pedido de clemência feito pelo Papa Francisco à comissão de liberdade condicional e perdão, em nome da Igreja e dos dois filhos de Kelly Gissendaner. Kelly Gissendaner, de 47 anos, morreu com uma injecção letal na prisão de Jackson, sudeste de Atlanta. Tinha sido condenada por planear o assassínio do marido, em 1997. O crime foi cometido pelo homem com quem tinha uma relação extraconjugal, Gregory Owen, que foi condenado a prisão perpétua depois de conseguir um acordo de mudança de pena por ter colaborado com a polícia. O apelo do Papa foi feito numa carta escrita na terça-feira pelo seu representante diplomático nos EUA, o arcebispo Carlo Maria Vigano. Este escreveu que não pretendia minimizar a gravidade do crime, mas implorava pela "alteração da sentença para uma que pudesse expressar justiça e misericórdia". Os advogados de Kelly Gissendaner disseram que, na prisão, a mulher mudou a sua forma de viver e dedicou-se a ajudar as outras condenadas. Antes de lhe ser dada a injecção letal disse estar arrependida e pediu desculpa à família. Desde 1976 – o ano em que a pena de morte foi reintroduzida nos EUA –, o estado da Georgia executou 60 pessoas. Neste momento há 80 no corredor da morte. No histórico discurso que fez perante as duas câmaras do Congresso norte-americano, durante a visita aos EUA na semana passada, o Papa lembrou a “regra de ouro” de “fazer aos outros aquilo que gostaríamos que nos fizessem a nós” e partiu daí para, em poucas palavras, reafirmar a sua oposição à pena de morte. Aquela regra, disse perante uma audiência em que a maioria defende o contrário, “recorda-nos a nossa responsabilidade de proteger e de defender a vida humana em cada etapa do seu desenvolvimento”. “Esta convicção conduziu-me, desde o início do meu ministério, a defender, a diferentes níveis, a causa da abolição total da pena de morte”, sublinhou Francisco.
REFERÊNCIAS:
Entidades EUA
Big Little Lies: um elenco de luxo para falar do mundo feminino
Protagonizada por Reese Witherspoon, Nicole Kidman e Shailene Woodley, a nova série da HBO conta com sete episódios e tem estreia mundial marcada para este domingo, às 2h, no TVSéries. (...)

Big Little Lies: um elenco de luxo para falar do mundo feminino
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 6 | Sentimento -0.06
DATA: 2017-02-19 | Jornal Público
SUMÁRIO: Protagonizada por Reese Witherspoon, Nicole Kidman e Shailene Woodley, a nova série da HBO conta com sete episódios e tem estreia mundial marcada para este domingo, às 2h, no TVSéries.
TEXTO: Na soalheira Monterey, Califórnia, nada é tão perfeito como parece. Madeline (Reese Witherspoon) é uma dona de casa que se dedica à educação das duas filhas a tempo inteiro e que vive obcecada com o casamento do ex-marido. A ex-advogada Celeste (Nicole Kidman) é mãe de gémeos e tem um casamento aparentemente invejável com um homem mais novo. Jane (Shailene Woodley) é uma jovem mãe solteira recém-chegada à cidade que é integrada no grupo quando o filho de cinco anos é acusado de esganar a filha de Renata (Laura Dern), a arqui-inimiga de Madeline, no recreio da escola. A bolha superficial em que estas mulheres vivem rebenta quando uma morte misteriosa levanta suspeitas entre todos os pais. Big Little Lies tem por base o livro do mesmo nome de Liane Moriarty (Pequenas Grandes Mentiras, em Portugal editado pela ASA) e estreia-se de domingo para segunda, às 2h, no TVSéries. “Na verdade, [o crime] é um trampolim para explorar as personalidades destas mulheres e as relações que têm umas com as outras e com a comunidade”, diz o criador David E. Kelley (Ally McBeal, Boston Legal), ao telefone com o PÚBLICO a partir de Nova Iorque. Realizada por Jean-Marc Vallée (O Clube de Dallas), Big Little Lies é um series event de sete episódios de uma hora cada que se inicia com um crime sem ser, na sua essência, uma história policial. Ao contrário do que é habitual no género, não sabemos exactamente qual o crime que foi cometido, quem o cometeu e quem foi a vítima. “A questão fundamental é que aconteceu um assassinato e isso é usado para convidar os espectadores a entrar neste mundo”, esclarece David E. Kelley, reiterando que “à medida que se procura resolver o mistério, a verdadeira jornada trata de perceber quem são estas personagens”. A série parte do micro-sistema onde se deu a briga entre as crianças – que ninguém viu e que nunca é mostrada ao espectador, ficando a dúvida a pairar no ar – para se alargar a temáticas como o bullying, a violência doméstica, a competitividade feminina e o estatuto social, tratadas com “um toque de sátira social”. A série tem dado que falar pelo elenco de luxo que reúne reconhecidos nomes do cinema. Reese Witherspoon e Nicole Kidman são também produtoras executivas e trabalharam na adaptação do livro de Liane Moriarty ao pequeno ecrã. Além de Shailene Woodley e Laura Dern, Alexander Skarsgård veste pele de Perry, o jovem marido de Celeste, Zoë Kravitz é Bonnie, a instrutora de ioga casada com o primeiro marido de Madeline e Adam Scott é o segundo marido de Madeline, Ed. “Podíamos escrever qualquer coisa, porque tínhamos os atletas para o conseguir cumprir”, explica David E. Kelley, que entrou no projecto depois de Reese Witherspoon e Nicole Kidman e realça o “privilégio de poder imaginá-las nestes papéis e adaptar [a história] ao seu ritmo”. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Apesar da imagem de aparente perfeição, o grupo de mulheres retratado em Big Little Lies enfrenta diversos problemas nos quais os espectadores se poderão rever. “Não é que [o público] vá comparar as suas vidas às das protagonistas, mas deverão relacionar-se em alguma medida com os problemas delas”, afirma David E. Kelley. O criador refere que as “personagens bem construídas do livro” e o trabalho de actores que “estão no topo da sua profissão e seu ofício” possibilitaram a construção de uma trama que “inicialmente, parece superficial e tonta, mas que se torna mais relevante e séria à medida que se desenvolve”. A todos os que leram o livro, David E. Kelley assegura que “a série se mantém bastante fiel ao original”, mas promete que as reviravoltas e as surpresas serão abundantes, mesmo para quem está familiarizado com a comunidade de Monterey. Tida como uma combinação de Donas de Casa Desesperadas e Pequenas Mentirosas, Big Little Lies vai alternando entre o presente e o passado sem nunca adiantar muito sobre o crime anunciado no primeiro episódio. De acordo com a Variety, são dadas “pistas que são às vezes flashbacks, outras vezes são flash-forwards, e noutras são delírios”, dependendo do contexto. Além disso, a narrativa recorre aos testemunhos dos outros pais e funcionários da escola de Monterey, uma comunidade particularmente adepta de intrigas - sobretudo as que dizem respeito às influentes protagonistas do escândalo. Segundo a Vulture, “[os depoimentos] assemelham-se à discussão da final de um reality show no Twitter”. Big Little Lies é uma série limitada na narrativa e, por isso, não deverá estender-se para lá da primeira temporada, mas o elenco de luxo e o grande orçamento que, segundo o The Hollywood Reporter, provocou uma disputa entre os vários canais tornam-na uma das maiores apostas televisivas da HBO para este ano. A série será transmitida no TVSéries às segundas-feiras, às 22h45 e chega ao espectador com uma única certeza – em Monterey, todos podem ser culpados.
REFERÊNCIAS:
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