2019: o ano em que a Europa não vai acabar outra vez
Se a Europa não acaba em 2019, e se a questão decisiva é que Europa teremos a partir de 2020, a resposta a essa questão é ainda mais decisiva para Portugal. (...)

2019: o ano em que a Europa não vai acabar outra vez
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: Se a Europa não acaba em 2019, e se a questão decisiva é que Europa teremos a partir de 2020, a resposta a essa questão é ainda mais decisiva para Portugal.
TEXTO: Reparo frequentemente que se eu quisesse ser um opinador da moda, e estar sintonizado com as tendências do mundo editorial, o que eu deveria mesmo era escrever sobre o “fim da Europa”. Nos últimos anos têm saído tantos livros sobre o fim da Europa que já deveria haver uma estante especial para eles nas livrarias. Senão vejamos: temos O Fim da Europa, do jornalista americano James Kirchik; Onde a Europa acaba, do cientista político alemão (e meu amigo) Jan-Werner Müller; e até já temos Depois da Europa, do cientista político búlgaro Ivan Krastev. Todos estes livros estão na ponta mais “liberal” (no sentido político) do espectro ideológico, e são escritos a partir de uma perspectiva razoavelmente europeísta e razoavelmente preocupada. Na ponta mais irrazoável do espectro temos A estranha morte da Europa, do jornalista britânico Douglas Murray (resumo: “vêm aí os muçulmanos!”; “os europeus têm poucos bebés!” — e outros argumentos para racistas em linguagem de articulista da Spectator, para o leitor que não se considera racista) e A UE: um obituário, onde o historiador britânico John R. Gillingham dobra a aposta (resumo: viram O Sexto Sentido? A União Europeia é como aquele tipo que já tinha morrido mas ainda não se tinha dado conta disso). Alguns destes autores tentam diversificar as suas apostas — no estilo “a Europa está para acabar a não ser que faça como eu digo” — para que a previsão não lhes saia furada. Outros autores e opinadores, nomeadamente aqueles que escrevem para reconfortar o público britânico pela sua escolha no referendo do "Brexit", tentam concentrar num só argumento as duas versões opostas de porque é que, de acordo com os autores, o Reino Unido fez bem em optar por sair da União Europeia: a primeira versão é “toda a gente para lá do Canal da Mancha é idiota e em Bruxelas mais ainda e construíram um barco que se está a afundar e do qual há que sair antes que afunde”, e a segunda é exatamente a oposta, “toda a gente para lá do Canal da Mancha e sobretudo em Bruxelas é malignamente inteligente e estão a construir um super-estado europeu do qual há que fugir antes que se torne excessivamente eficaz”. Às vezes ouve-se a mesma pessoa sequenciar os argumentos “a UE é estado falhado” e “a UE é um super-estado aterrador” sem se dar conta da contradição — nem sequer do facto de que a UE não é, nem precisa de ser, um estado. Da mesma forma, uma parte destes e de outros autores consideram que o fim da UE é apenas um aspecto antecessório do fim do capitalismo, como no caso do sociólogo alemão Wolfgang Streeck. Para outros, como o supra-citado Gillingham, a UE já acabou exatamente pela razão contrária: por não ser suficientemente capitalista. Quando descontamos os traumas e obsessões ideológicas dos autores — “a UE é uma cabala de capitalistas!”; “não, a UE é uma armadilha socialista!” — acabamos por nos aperceber que o debate sobre o fim da UE nos diz muito mais sobre os autores do que sobre o objeto do debate propriamente dito. Irei ainda mais longe. Viram O Sexto Sentido? Pois bem, não é a UE, mas o debate sobre o fim da UE, que é como o protagonista do filme, aquele que pensa que está vivo mas ainda não se deu conta que já morreu. E a minha previsão para 2019 é que este será um ano em que a União Europeia não vai morrer outra vez, e também que esse facto só vai excitar mais ainda o debate sobre como a UE está à beira da morte — até ao momento em que nos cansemos desse debate e sigamos em frente. (Esse é, aliás, o destino de boa parte dos debates políticos que temos. Ao contrário do que acontece nas ciências, em política não resolvemos debates: aborrecemo-nos e passamos ao assunto seguinte. )Nas minhas previsões para 2018 escrevi que as esperanças dos eurofóbicos se iriam concentrar, no ano que agora acabou, nas eleições italianas. E erradamente, dizia eu, porque mesmo que saísse dessas eleições um governo eurofóbico, o público italiano não teria a menor paciência para um projeto de saída do euro. Resultado, um acerto e um bocejo: o governo da Liga Norte e das 5 Estrelas está a negociar com a Comissão Europeia um défice entre 2, 4% e 2%. Como então disse, num texto publicado nestas páginas, “decisiva mesmo será a década de 2020”. Só que a década de 2020 não será decisiva da mesma maneira que a década anterior. A questão vai deixar de ser se a Europa acaba para passar a ser como se faz a Europa. Não acreditam? Os primeiros indícios virão já aí no ano que vem. Em março teremos o "Brexit", mas o "Brexit" será irrelevante para este debate, em qualquer das versões que venha. Se for um "Brexit" duro, ou “sem acordo”, as sondagens dão uma maioria de escoceses a querer a independência e 50% dos norte-irlandeses a querer a unificação com a República da Irlanda — ou seja, um "Brexit" duro é capaz de acabar mais depressa com o Reino Unido do que com a União Europeia. Se for um "Brexit" suave, não se vai dar muito por ele, e o Reino Unido torna-se um mercado-satélite do mercado único da UE. A seguir virão as eleições europeias, em maio, e nelas ouviremos muita da retórica comum. Mas se prestarmos atenção a partitura será subtil mas crucialmente diversa. Os Orbáns, os Salvinis e as Le Pens não falarão de destruir a UE, mas de a tomar por dentro. Salvini já o fez uma vez: se bem se lembram, ele passou de querer destruir a Itália para usar como slogan “os italianos primeiro”. Agora basta passar de querer destruir a UE para “os europeus primeiro”. E isto não é um pensamento reconfortante, mas aterrador. Isto significa que a tal batalha decisiva dos anos 2020 — que começará a ganhar-se nas eleições europeias de 2019 — é decisiva de uma maneira diferente mas ainda mais importante do que a da década que agora acaba. Porque não se trata de uma batalha entre um plano irrealista de sair do euro ou acabar com a UE, de um lado, e do outro lado um mal que já conhecemos. Trata-se antes de saber que projeto europeu teremos e se na resposta a essa questão ganha a versão autoritária, xenófoba e racista dos Orbáns e Salvinis — a acompanhar o que sucedeu no resto do mundo — ou se a Europa conseguirá resistir à vaga ultra-conservadora e fascistóide que varreu o resto dos grandes países e federações do mundo para se manter como lugar de tolerância cultural e convivência democrática comparativamente alta que é. Aparte as eleições europeias, que serão a antecâmara dessa prolongada luta, só as eleições indianas terão mais importância em 2019. As recentes eleições estaduais em alguns dos estados indianos mais importantes deram sinais de cansaço com a política nacionalista de Narendra Modi; caso essa tendência se confirme nas eleições federais, pode ser que 2019 seja o ano de um início de inversão de curso após as vitórias nacional-populistas de 2016, 2017 e 2018. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. E Portugal? As eleições de 2019 trarão algumas novidades no parlamento, com a eleição de novos partidos à direita (e espero que também à esquerda), mas poucas novidades na governação, que continuará a ser gerida em regime de “geringonça”. Só que também em Portugal a questão decisiva é a questão europeia — precisamente aquela de que a "geringonça" atual não fala, por estar embaraçada pelos sectarismos e atavismos ideológicos que a embaraçam. Ora, se a Europa não acaba em 2019, e se a questão decisiva é que Europa teremos a partir de 2020, a resposta a essa questão é ainda mais decisiva para Portugal. Pois não há solução para Portugal — para as vulnerabilidades da nossa economia, para o nosso papel na globalização, para a maneira como valorizamos (ou não) as pessoas, o conhecimento e o território — sem Portugal ter uma estratégia para si no quadro europeu, e sem ter uma estratégia para a Europa pensada para Portugal e debatida pelos portugueses. A ausência desse debate — junto com a política ambiental, inexistente — foi a grande falha da "geringonça" entre 2015-2019. Se passarmos 2019 sem dar passos para resolver essa grande falha, será uma oportunidade perdida que nos fará entrar mal na próxima década. E uma nova década perdida para o nosso país seria uma falha imperdoável. O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico
REFERÊNCIAS:
Entidades UE
A HBO Europe vem para Portugal, mas ainda não se sabe bem como
A chegada da plataforma de video-on-demand do gigante norte-americano foi divulgada através de um anúncio colocado na rede social de emprego LinkedIn. (...)

A HBO Europe vem para Portugal, mas ainda não se sabe bem como
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: A chegada da plataforma de video-on-demand do gigante norte-americano foi divulgada através de um anúncio colocado na rede social de emprego LinkedIn.
TEXTO: A HBO Europe, que é tanto um conjunto de canais quanto uma plataforma de video-on-demand, vai chegar a Portugal. Em meados de Junho, foi posto na rede social de emprego LinkedIn o primeiro de vários anúncios da HBO Europe a recrutar pessoal para trabalhos em gestão de marketing, distribuição de vendas, redes sociais e projecto no nosso país. O objectivo, dizia-se no texto que agora menciona que a plataforma se chamará HBO Portugal, era “posicionar a HBO como o melhor serviço de streaming no mercado português”. Na altura, a 25 de Junho, essa entrada foi noticiada pelo portal E-Konomista, tendo esta terça-feira sido publicada pelos jornais Meios e Publicidade, que cita Tom Nielsen, vice-presidente de relações públicas da HBO Europe, a confirmar o recrutamento de pessoal, mas sem adicionar mais informações, e Observador, que adianta que a chegada acontecerá em 2019. O que ainda não se sabe é em que moldes isso acontecerá. Ou seja, se a plataforma, à semelhança do que acontece noutros países europeus, disponibilizará a considerável biblioteca de conteúdos antigos da HBO, que inclui séries que vão de The Wire a Deadwood, passando por Girls ou Sete Palmos de Terra, com Curb Your Enthusiasm à mistura, quais serão os preços e formatos, nem se terá os episódios mais recentes das séries actuais e futuras – de A Guerra dos Tronos e os seus spin-offs a Big Little Lies. Contactada nesse mês de Junho pelo PÚBLICO, Tatiana Carral, gestora do departamento de relações públicas da HBO Espanha, respondeu que ainda não havia "qualquer comunicação oficial” sobre o assunto. Esta terça-feira, a NOS comentou que está “neste momento a rever o âmbito” da sua “parceria com a HBO”, sublinhando que “os Canais TVCine & Séries têm por missão disponibilizar os melhores, mais diversos e premiados conteúdos aos seus subscritores” e assegurar “a exibição do que de melhor e mais recente se faz na indústria”, trabalhando “directamente com os principais estúdios e distribuidores a nível mundial”. É que, desde 2015 que os canais TVSéries eram em Portugal “Home of HBO”, com uma relação privilegiada com o canal de cabo norte-americano e todas as novas séries do canal a estrearem-se na mesma madrugada que passavam nos Estados Unidos. A relação mantém-se. Ainda no início deste mês, os canais TVCine estrearam The Tale, um filme do canal norte-americano. Em Abril, quando Westworld chegou à segunda temporada, o TVSéries ainda mantinha a designação, entretanto desaparecida, “Home of HBO”, mas estreias recentes, como Succession ou Sharp Objects, que foi para o ar este domingo, não chegaram cá. Ainda assim, nunca foi o único canal com conteúdos HBO – a RTP, por exemplo, exibia até pouco tempo Last Week Tonight, o talk show de John Oliver. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Curiosamente, no início desse mesmo mês de Abril já tinha havido um dos primeiros vestígios da presença da HBO Europe no nosso país. O site da revista TBIVIsion noticiou que os direitos para Killing Eve, a criação de Phoebe Waller-Bridge para a BBC America e uma das estreias mais badaladas do ano, tinham sido adquiridos pela HBO Europe para, entre outros, os territórios de Espanha, Portugal e os países africanos de expressão portuguesa. A entrada da HBO Europe, que noutros países é também um conjunto de canais de televisão e tem produção própria, em terras portuguesas chega numa altura de profunda mudança na própria HBO. Ainda este domingo, o The New York Times publicou uma peça sobre como John Stankey, o executivo da AT&T – conglomerado do qual o canal agora faz parte, visto a AT&T ter adquirido a Time Warner –, agora a supervisionar o canal e a produtora, disse aos empregados da HBO numa reunião que, para sobreviver no panorama dos media actuais, a HBO tinha de ser mais como “um gigante de streaming” para ter conteúdos que enchessem todas as horas do dia dos subscritores. No ar desde 1972, a HBO (Home Box Office) é um conjunto de vários canais premium de cabo e uma produtora de conteúdos, que começou por transmitir filmes, eventos especiais de televisão e desporto, tendo a sua produção própria em termos de séries crescido nos anos 1990, com comédias como The Larry Sanders Show ou Sexo e a Cidade e dramas como Oz ou Os Sopranos. A faceta de produtora foi-se consolidando ao longo da década seguinte, tendo sido fundamental para a ascensão da chamada idade de ouro da televisão americana e arrecadado vários Emmy e Globos de Ouro ao longo dos anos.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave direitos guerra social sexo
Lula da Silva acusado de lavagem de dinheiro em negócio com a Guiné Equatorial
O ex-Presidente acumula casos na justiça brasileira, fruto das investigações da Lava-Jato. Ao todo, a megaoperação já pôs três dos cinco ex-chefes de Estado vivos na condição de réus. (...)

Lula da Silva acusado de lavagem de dinheiro em negócio com a Guiné Equatorial
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: O ex-Presidente acumula casos na justiça brasileira, fruto das investigações da Lava-Jato. Ao todo, a megaoperação já pôs três dos cinco ex-chefes de Estado vivos na condição de réus.
TEXTO: O Ministério Público do Brasil acusou nesta segunda-feira o ex-Presidente Lula da Silva de mais um crime, o de lavagem de dinheiro na sequência de um pagamento ilícito da Guiné Equatorial. Segundo o ramo de São Paulo da Lava-Jato, a megainvestigação à rede de corrupção que liga políticos a empresas, o antigo Presidente mediou negócios da empresa construtora brasileira ARG e, pelo seu papel, foi feita uma doação de um milhão de reais (cerca de 230 mil euros) ao Instituto Lula. Os procuradores consideram que não se trata de uma doação, mas de um pagamento ilícito camuflado, o que significa crime de lavagem de dinheiro. “Usufruindo do seu prestígio internacional, Lula influiu em decisões do Presidente da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang, que resultaram na ampliação do grupo brasileiro ARG no país africano”, diz a documentação citada pelo jornal O Estado de São Paulo. A acusação já seguiu para a justiça federal. Na sexta-feira da semana passada, Lula, que está preso por corrupção e tem outros processo pendentes na justiça, foi acusado em mais um caso — no do chamado “Quadrilhão do PT”, em que Lula, a ex-Presidente Dilma Rousseff e outros dirigentes do Partido dos Trabalhadores são acusados de associação criminosa e de desvio de verbas de várias empresas, entre elas a Petrobras (petróleo). No total, a Lava-Jato já pôs na condição de réus três dos cinco antigos Presidentes do Brasil que estão vivos: Lula da Silva, Dilma Rousseff e Fernando Collor de Mello. A justiça rondou outros dois e o actual pode vir a ser acusado. Lula, condenado a 12 anos de prisão devido à posse de um apartamento em Guarujá, responde também pelo caso de uma fazenda em Atibaia, estado de São Paulo (o ex-Presidente diz que também neste caso a propriedade não é sua), e é acusado de ter sido beneficiado pela construtora Odebrecht na compra de um terreno para instalar o Instituto Lula, em São Paulo. Fernando Collor (que foi destituído há 25 anos por corrupção) é acusado de corrupção passiva, organização criminosa e lavagem de dinheiro e está a ser investigado noutros processos. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Presidente de 1985 a 1990, José Sarney foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República em 2017, por receber recursos desviados de contratos da Transpetro, subsidiária da Petrobras. O caso aguarda análise no Supremo, diz a Folha de São Paulo. Fernando Henrique Cardoso foi alvo de um pedido de investigação devido a “pagamento de vantagem indevida” pela Odebrecht, mas o caso foi arquivado por irregularidades e porque um eventual crime prescrevera. O Presidente Michel Temer, em fim de mandato, é suspeito de ter recebido pagamentos indevidos das construtoras Odebrecht e do grupo de produção de carne JBS. As suspeitas não foram investigadas, pois, como Temer ainda é Presidente, era preciso autorização da Câmara de Deputados, que travou o processo. Porém, Michel Temer perde esta protecção a partir de 1 de Janeiro, quando o Presidente eleito Jair Bolsonaro toma posse.
REFERÊNCIAS:
Fundação Mário Soares: o fim anunciado de um arquivo único
A Torre do Tombo é destino provável de parte dos arquivos, mas o ambicioso projecto que o entusiasmo de Soares permitiu construir terá os dias contados (...)

Fundação Mário Soares: o fim anunciado de um arquivo único
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 | Sentimento -0.07
DATA: 2018-12-13 | Jornal Público
SUMÁRIO: A Torre do Tombo é destino provável de parte dos arquivos, mas o ambicioso projecto que o entusiasmo de Soares permitiu construir terá os dias contados
TEXTO: A administração da Fundação Mário Soares (FMS) quer reduzir drasticamente a sua actividade, centrando-se no arquivo pessoal do seu fundador e libertando-se das mais de duas centenas de fundos documentais que tem à sua guarda, e cuja transferência está já a negociar com a Torre do Tombo. O director do Arquivo Nacional, Silvestre Lacerda, mostra-se disponível para os acolher, mas nem todos aprovam esta solução, que poderá ainda esbarrar na vontade dos proprietários dos arquivos, já que mais de 90 por cento dos fundos estão apenas depositados na FMS e esta não os poderá ceder a outra instituição sem obter, caso a caso, a necessária autorização. O progressivo definhamento que a Fundação Mário Soares (FMS) vinha sofrendo desde a morte do seu fundador, em Janeiro de 2017, era uma realidade bem conhecida entre os investigadores mais próximos da instituição, e também nos países de língua portuguesa, onde a FMS, outrora um parceiro sempre disponível, deixara praticamente de estar presente. Mas apesar de algumas poucas notícias que foram surgindo na imprensa, o assunto não teve grande impacto público até o ex-presidente de Cabo Verde, Pedro Pires, ter manifestado à agência Lusa, no final de Novembro, a sua preocupação com o futuro do arquivo de Amílcar Cabral, um dos vários fundos documentais ligados às lutas de libertação das ex-colónias portuguesas que foram depositados na fundação para ali serem tratados, digitalizados e disponibilizados na Internet. Na sequência das declarações de Pedro Pires, uma fonte da administração da FMS confirmou ao PÚBLICO a intenção de desmantelar o arquivo, conservando apenas o de Mário Soares e os de alguns dos seus amigos mais próximos, como Francisco Ramos da Costa ou Manuel Mendes (ainda que este último pertença na verdade ao Estado e tenha sido depositado pelo Ministério da Cultura). Ainda segundo a mesma fonte, esta proposta iria ser discutida e eventualmente aprovada por estes dias, mas há muito que a administração, confrontada com crescentes dificuldades financeiras – em 2017, o saldo negativo terá atingido 388 mil euros – ia agindo como se a decisão de desinvestir no arquivo já tivesse tido tomada, dispensando boa parte da equipa que ali trabalhava, recusando um financiamento a três anos de cerca de 390 mil euros ao abrigo do projecto Rossio, promovido por um consórcio coordenado pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova, e suspendendo negociações já em curso para captação de financiamentos para novos projectos, designadamente em África, segundo o PÚBLICO soube. Carlos Monjardino, um dos administradores da FMS – ainda simbolicamente presidida por Mário Soares, a fundação tem como vice-presidente a sua filha Isabel – já em Janeiro deste ano afirmara ao Expresso que a instituição iria sofrer uma “reorientação” e recentrar-se nos seus objectivos centrais, ou seja, “os arquivos de Mário Soares e das figuras da I República”. Nessa altura, a intenção assumida era a de “fazer uma parceria com a Biblioteca Nacional”, cenário que terá sido afastado e foi agora substituído pelo da Torre de Tombo. O PÚBLICO tentou, sem êxito, ouvir Isabel Soares, e Carlos Monjardino recusou-se a fazer quaisquer declarações sobre o assunto. Também Alfredo Caldeira, que concebeu o arquivo, o coordenou desde o início e foi o grande responsável, com o apoio de Mário Soares, pela sua abertura aos países de língua portuguesa, declinou comentar a actual situação. Segundo várias pessoas ouvidas pelo PÚBLICO, ele próprio estará já de saída da FMS. O director da Torre do Tombo, Silvestre Lacerda, mostra-se disponível para acolher os arquivos da FMS e admite que o portal Casa Comum, um site lançado pela fundação para agregar arquivos dos vários países de língua portuguesa, cruzando a história da oposição à ditadura com a memória das lutas de libertação nas ex-colónias africanas e em Timor, possa transitar sem grandes alterações para o Arquivo Nacional. “Uma das garantias que demos à administração da FMS foi que temos capacidade técnica para fazer a transferência da Casa Comum e até para a manter com alguma autonomia”, diz Silvestre Lacerda, que não descarta mesmo conservar a designação – “se já existe e funciona, porque não?” –, embora a prática habitual seja a de identificar os materiais por fundo documental. Em todo o caso, observa, tudo o que possa vir a ser transferido terá a indicação da sua proveniência, o que “permitirá a qualquer momento reconstituir o que foi o trabalho da Fundação Mário Soares”. “O mais complicado”, reconhece, é que boa parte daquela documentação está em depósito e tem de ser a fundação a tratar com cada um dos depositantes que lhe confiaram os seus arquivos”. Mas o facto de alguns desses depositantes já terem tomado a iniciativa de contactar a Torre do Tombo para assegurar que não se opõem à transferência – dá o exemplo da família do fotógrafo Carlos Gil, cujo arquivo contém mais de 150 mil imagens –, parece-lhe um bom sinal. Certo é que a administração da FMS não parece ter ainda contactado ninguém. O PÚBLICO falou com Pedro Pires e com a filha de Amílcar Cabral, a historiadora Iva Cabral, e nenhum deles recebera qualquer informação directa da fundação. Fazendo questão de agradecer à FMS por ter recolhido o arquivo de Amílcar Cabral “numa situação crítica”, garantindo a sua “conservação, classificação, digitalização e difusão, tornando-o acessível aos investigadores”, Pedro Pires destaca ainda “o empenho de Alfredo Caldeira” e elogia “o excelente trabalho” que a fundação foi desenvolvendo, lembrando o simpósio sobre o Tarrafal promovido em 2009, e a criação do Memorial da Escravatura na Guiné e do Museu da Resistência em Timor. Mas embora aceite a decisão da actual administração de se libertar da generalidade dos arquivos – “eles é que sabem os recursos que têm ou não têm” –, defende que “não é correcto pensar em transferir os documentos de Amílcar Cabral para a Torre do Tombo” e lembra que a FMS “assinou um acordo com o governo guineense, na presença da filha mais velha de Amílcar Cabral”, Iva Cabral. “Não é razoável que proponham esta transferência sem conversarem com ninguém, e o mais sensato será marcarem um encontro para chegarmos a uma solução consensual”, diz o ex-presidente de Cabo Verde. Iva Cabral, que foi a responsável, com o antigo presidente cabo-verdiano Aristides Pereira, por envolver a FMS na recolha dos papéis de Amílcar Cabral – “muitos andavam pelo chão e uma parte já tinha sido queimada”, conta –, e que trabalhou um ano na fundação, a ajudar a organizar o arquivo do pai, mostra-se um pouco menos diplomática do que Pedro Pires. “Só posso estar grata à Fundação e ao trabalho do Alfredo Caldeira e dos demais funcionários”, diz, “mas acho que é um crime acabar com aquilo, seria uma grande desilusão para Mário Soares, uma pessoa extraordinária, para quem o dinheiro não era tudo e que compreendia o valor do simbólico”. Iva Cabral opõe-se frontalmente à transferência do arquivo de Amílcar Cabral para a Torre do Tombo, “onde se iria diluir completamente, como o arquivo da Pide”. Lembrando que a decisão de recorrer à FMS se deveu ao facto de Mário Soares ser “um símbolo da luta antifascista e anticolonialista”, diz que “se é para ir para a Torre do Tombo, então arranja-se um arquivo francês ou outro qualquer”. A filha de Amílcar Cabral defende ainda que “o Governo português devia fazer alguma coisa, já que se interessa tanto pelas relações com as antigas colónias”. Também o constitucionalista e deputado socialista Pedro Bacelar, que foi conselheiro das Nações Unidas junto da Presidência timorense, e que pôde testemunhar in loco “a atenção continuada e o trabalho inestimável” da FMS em Timor, na recolha, tratamento e divulgação de documentos e na criação e gestão do Museu da Resistência, considera “muito perturbadora e triste” a actual indefinição quanto ao destino dos arquivos da fundação e defende que “quem quer que venha a ficar com a responsabilidade de prosseguir o projecto não pode ficar aquém do nível de empenhamento e eficiência que a Fundação Mário Soares demonstrou até aqui”. O historiador Fernando Rosas, que esteve muito ligado ao arranque do arquivo da FMS, e que lá depositou também alguns documentos (também ele não foi ainda contactado para autorizar eventuais transferências) acha “estranho que os herdeiros de Mário Soares queiram transformar a fundação num recanto para se fazer uma memória ritual, em contradição total com o espírito do fundador”, e defende que “se a família não quer manter o projecto, o Ministério da Cultura deveria interessar-se, já que os arquivos são de interesse público”. Descrevendo o arquivo da FMS como “uma fonte incontornável para a história da oposição ao Estado Novo e para a história da colonização e dos movimentos de resistência”, Rosas valoriza também tudo o que rodeava o trabalho arquivístico propriamente dito: “promoviam colóquios e exposições, editavam livros, e aquilo era um centro permanente de discussão, de debate plural”. Se reconhece que se tem de aceitar a decisão da administração, o historiador já não se deixa convencer excessivamente pelo argumento da falta de verbas. “Não se pode subestimar a facilidade que Mário Soares tinha para angariar fundos, mas a verdade é que se conseguiram financiamentos para o projecto que foram recusados, houve iniciativas tendentes a revitalizar a fundação que foram vetadas”. Na actual situação, Fernando Rosas admite que a transferência para o Arquivo Nacional, cujo director actual “é uma pessoa com sensibilidade para estes arquivos contemporâneos”, seja a solução possível, e ficaria especialmente satisfeito se o portal Casa Comum pudesse manter a sua autonomia, mas nota que a Torre do Tombo “tem uma gestão pesada, com pessoal a menos e vários constrangimentos”, e não se pode esperar dela a “agilidade de um arquivo particular especializado no século XX”. Luís Andrade, coordenador de um dos mais importantes projectos integrados na Casa Comum, o portal Revistas de Ideias e Cultura, que vem digitalizando e abrindo à consulta digital algumas das principais revistas portuguesas de pensamento do século XX, das publicações anarco-sindicalistas às revistas ligadas, por exemplo, à Renascença Portuguesa, não está apenas preocupado com o futuro dos arquivos físicos, mas também com o arquivo digital. “A Casa Comum é o maior arquivo digital do país, com milhões de imagens, e é consultado diariamente por investigadores de todo o mundo que se interessam pelos assuntos de Portugal e das ex-colónias”, diz, chamando a atenção para o facto de a sua arquitectura informática “exigir um conjunto de manutenções” que já não estarão a ser feitas. Mas se o arquivo da FMS é incontornável para a investigação académica, a actividade da fundação tem também uma dimensão política que não deve ser ignorada: “Todo o trabalho desenvolvido com os arquivos de dirigentes dos movimentos de libertação criou um conjunto de relações pós-coloniais que são muito favoráveis ao Estado português”, argumenta. Para Luís Andrade, as mais recentes notícias dando conta de que a administração iria tomar decisões em breve “é pura gestão da informação”, já que “as decisões foram tomadas há muito”. E não lhe parece que a solução da Torre do Tombo seja a mais sensata, desde logo no que respeita aos fundos das antigas colónias, dado o simbolismo de se estar a “entregar estes documentos ao arquivo nacional do país colonizador”, mas também por recear que os arquivos da FMS “fiquem para lá arrumados, como ficou o espólio de Salazar”. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Também o historiador Luís Farinha, director do Museu do Aljube, dedicado à memória da resistência à ditadura, preza a agilidade do arquivo da FMS. “É um arquivo que funciona como tal, mas também como um centro de documentação capaz de mobilizar muito rapidamente e de forma simples e eficaz os materiais de que dispõe”, diz. “Por isso é que foi possível organizar tantas exposições e os museus temáticos em Timor e na Guiné: há ali um conhecimento muito grande do que existe no arquivo, e a preocupação de Alfredo Caldeira e das pessoas que trabalharam sob a sua orientação era disponibilizar com boa qualidade documentos que são fundamentais para se mostrar o século XX português”. E dá um exemplo. “Vou abrir para a semana uma exposição sobre Mário Ruivo [cientista pioneiro na defesa dos oceanos e opositor do Estado Novo] e pedi à fundação que me desse 40 ou 50 materiais fundamentais sobre ele: chegou tudo dois dias depois e com grande qualidade”. É essa capacidade de “saber onde estão as coisas, escolher o fundamental, e dar acesso rápido” que Luís Farinha diz não ser possível encontrar “na Torre do Tombo ou noutros grandes arquivos”. E receia que alguns dos depositantes não encarem bem a eventual passagem para o Arquivo Nacional. “Assisti a cedências de documentos a Mário Soares e era evidente que as pessoas os cediam porque era para ali, nem perguntavam como é que iam ser tratados, e poderão ser bastante sensíveis à questão da transferência”. Para o responsável do Museu do Aljube, uma instituição em cuja concepção esteve envolvida a FMS, “o ideal seria que a Fundação não se desmantelasse e continuasse a obra do seu fundador”, mas reconhece que “o definhamento provocado pela falta de recursos, que começou já um pouco no final da vida de Mário Soares, não ajuda a que se assumam grandes responsabilidades”. E conclui: “Estão confrontados com um problema que não é fácil de resolver, mas espero que o resolvam bem”.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave crime morte filha cultura ajuda escravatura
O “homem branco autoflagelado”
Não haverá ainda quem tenha feito a guerra e massacrado aldeias inteiras em nome e por ordem de quem governava Portugal? (...)

O “homem branco autoflagelado”
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-08-20 | Jornal Público
SUMÁRIO: Não haverá ainda quem tenha feito a guerra e massacrado aldeias inteiras em nome e por ordem de quem governava Portugal?
TEXTO: O novo museu celebratório dos Descobrimentos, como Fernando Medina quer (ou queria?) abrir em Lisboa, era, para Miguel Sousa Tavares (MST), “uma ideia absolutamente consensual e necessária”, mas suscitou uma discussão sobre a forma como descrevemos e musealizamos a experiência colonial portuguesa. Ora, entre muitos outros, dois Tavares (o Miguel Sousa e o João Miguel) acham que os “ativistas anti-Descobertas” querem “fazer uma espécie de museu de autoflagelação (. . . ), um museu contra a nossa História, contra uma História que foi tão grandiosa que, se calhar por isso mesmo, nem a conseguimos entender, na nossa pequenez actual” (MST, Expresso, 28. 4. 2018). Ao reacionarismo historicista de MST, João Miguel Tavares (JMT) juntou moralismo e psicologismo barato: na crítica ao discurso hegemónico sobre aquela “história grandiosa” carregada de silêncios e omissões sobre a violência colonial, há, diz ele, “uma estranha mistura de catolicismo com judaísmo” de gente que quer “assumir velhos pecados” (JMT, PÚBLICO, 14. 6. 2018). A isto chamam os anglossaxónicos “self-hatred”, o ódio de si próprio, de que fala gente da mesma tribo dos Tavares a propósito dos judeus que criticam a ocupação israelita da Palestina, ou dos homens que denunciam a dominação masculina, ou dos ocidentais que criticam o papel histórico do Ocidente, isto é, de tudo aquilo que o reacionarismo cultural diz hoje ser uma “moda” estrangeirada adotada por uma “intelligentsia ociosa” nacional. “Museu da Culpa do Homem Branco”, chama-lhe JMT, onde “homens brancos” querem, pelos vistos, musealizar a sua culpa. Eles carregam uma “culpa coletiva centenária (. . . ) – como se algum de nós tivesse qualquer razão para se sentir responsável pelos atos de quem viveu há 300 anos”. Que espantosa conceção da história e da relevância social do passado! Não havendo responsáveis vivos, para quê discutir o passado do colonialismo e da violência, da exploração e da desigualdade imposta, todas experiências intrínsecas do colonialismo? Ora se “é difícil argumentar que a geração pós-25 de Abril andou de chicote na mão”, se se volta a discutir tudo isto é porque se quer “permitir a vitimização histórica do português de origem africana no presente. ” Como se “o branco de 2018 [fosse] culpado pelos atos do esclavagista de 1718 para que o negro de 2018 possa ser vítima da escravatura de 1718. ” Vítima de 1718? Não: vítima em 2018! “Cultivar a ‘magia’ da época colonial alimenta o racismo histórico e estrutural e prolonga as hierarquias de controlo e repressão para com as comunidades negras no país”, como lembraram “os negros e negras deste país” que, “recusando a invisibilidade que nos é imposta”, entraram na polémica em nome próprio (“Não a um museu contra nós!”, PÚBLICO, 22. 6. 2018). O que é extraordinário é que JMT julgue que, porque nenhum de nós foi esclavagista em 1718, se possa deduzir que 300 anos sejam suficientes para apagar conceitos como o da continuidade da responsabilidade do Estado, ou da acumulação de riqueza colonial vertida na economia portuguesa, ou do simples dever de, nas políticas públicas de memória (por exemplo, os museus), assumir o passado por inteiro, e sobretudo aquele que se ocultou e manipulou. E se tiverem passado só 65 anos? E se houver ainda algum português de hoje que tenha participado no massacre de sãotomenses em Batepá, em 1953, quando se revoltaram contra o trabalho forçado e o governador achou que eles eram agentes soviéticos – podemos musealizar essa história ou é autoflagelação? E se houver ainda quem, barriga cheia de cerveja, tenha feito tiro ao alvo de cima de carrinhas de caixa aberta, em 1961, nos musseques de Luanda depois da revolta do 4 de fevereiro? Ou tenha integrado milícias no Norte de Angola, em 1961, enquanto a tropa não chegava de Portugal, e organizou batidas contra suspeitos de apoiar o “terrorismo”, matou milhares, enterrou gente viva com a cabeça de fora, passou com um trator por cima, espetou cabeças em paus ao longo da picada por onde depois chegaria a tropa – podemos musealizar isso ou o turista não gosta? E não haverá ainda quem tenha feito a guerra em tropas especiais e massacrado deliberadamente aldeias inteiras em Moçambique, em nome e por ordem de quem governava Portugal? “A geração do pós-25 de Abril”, nada tem a dizer sobre isto? Ou este é, como acha MST, “um problema deles”, de quem anda a exigir falar da violência colonial, “mas não pode ser problema dos outros”, isto é, “deste pequeníssimo povo, entalado entre o fim da Europa e o mar, [que] escolheu o mar como destino”?O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico
REFERÊNCIAS:
Religiões Judaísmo
É preciso devolver património, mas antes há que admitir o erro da colonização
Em Portugal ainda não se discute na esfera pública a restituição de objectos e documentos às ex-colónias, quando países como a França e a Alemanha já o fazem há anos. Por que razão está o país atrasado neste debate? Os museus e arquivos já receberam pedidos de devolução? (...)

É preciso devolver património, mas antes há que admitir o erro da colonização
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 0.25
DATA: 2018-12-07 | Jornal Público
SUMÁRIO: Em Portugal ainda não se discute na esfera pública a restituição de objectos e documentos às ex-colónias, quando países como a França e a Alemanha já o fazem há anos. Por que razão está o país atrasado neste debate? Os museus e arquivos já receberam pedidos de devolução?
TEXTO: A discussão não é de hoje mas, a avaliar pela sua presença mediática nos últimos dois anos, acentuada no final de Novembro com a publicação de um relatório oficial defendendo a restituição do património de origem africana incorporado nas colecções públicas francesas, e com a devolução ao Benim de 26 peças, numa esteve tão presente, nem com tanta acutilância, como agora. Este estudo encomendado pelo Presidente Emmanuel Macron, cujas principais directrizes começaram a inundar as páginas dos jornais mesmo antes de lançado oficialmente, levou já a que curadores, antropólogos e directores de museus por toda a Europa – sobretudo nos países que no passado tiveram impérios ultramarinos – se posicionassem. E como seria de esperar perante um documento que propõe a restituição plena e incondicional de todos os bens que foram retirados “sem consentimento” dos territórios africanos, as opiniões dividem-se, mesmo quando a maioria dos especialistas que já se pronunciaram concorda com a premissa de que a colonização foi um crime, afirmação na base deste estudo feito por Bénédicte Savoy, historiadora de arte francesa radicada em Berlim, e Felwine Sarr, economista e escritor senegalês. De um lado os que o aplaudem e vêem nele um passo decisivo para que França e outros Estados sigam os bons exemplos de países como o Canadá e a Holanda e possam fazer da devolução do património às suas ex-colónias um acto simbólico que pressupõe a assunção das suas responsabilidades num dos episódios mais negros da história universal. Do outro os que temem um esvaziamento dos museus europeus de etnologia e antropologia e os que questionam a capacidade das instituições dos países de origem para preservar e divulgar os bens restituídos. Entre uns e outros, os que duvidam da aplicabilidade prática de boa parte das propostas do relatório e argumentam que o debate ainda é feito de cima para baixo, ou seja, sem tratar os territórios que foram colonizados como iguais em direitos. Afinal, o que pretende Macron com este relatório? Trata-se de um documento estratégico que deverá enquadrar as relações de Paris com o continente africano ou, como dizem os mais críticos, de um golpe de teatro no palco da diplomacia? Por que razão fala apenas em restituições a África quando França teve (tem) uma presença importante noutras geografias, nomeadamente no Pacífico? E que papel tem este relatório no debate internacional?As perguntas sobre o processo de restituição multiplicam-se, assim como os adjectivos que se lhe colam como uma segunda pele: complexo, exigente, demorado, desafiante, casuístico, controverso, urgente. Mas onde está Portugal neste debate? O que pensam de uma eventual devolução historiadores, antropólogos e directores de museus? E o que teria o país de restituir partindo, por exemplo, da colecção do Museu Nacional de Etnologia (MNE)?António Pinto Ribeiro, programador cultural que acompanha há muito a produção artística do continente africano, está entre os que consideram que o relatório encomendado por Macron é um “contributo notável” na tentativa de encontrar soluções, “necessariamente múltiplas e diversas”, para um “problema inevitável e global” – o do regresso aos países de origem do património que de lá saiu quando estavam sob domínio europeu. Lembrando que o discurso da restituição faz parte de uma narrativa mais ampla que engloba outro tipo de reparações pós-coloniais e que desafia o desequilíbrio histórico entre os países do hemisfério Norte – as “metrópoles” dos antigos impérios ultramarinos – e os do Sul, Pinto Ribeiro defende que essa restituição deve ser analisada caso a caso. “É um problema apaixonante do ponto de vista intelectual, mas muito complexo, traz muitos obstáculos. Apurar em que circunstâncias muitas das peças chegaram aos museus europeus não vai ser fácil, assim como não vai ser fácil introduzir alterações à lei em vários países para que elas possam voltar a casa”, diz este investigador do Projecto Memoirs/Universidade de Coimbra, centrado nas memórias dos filhos e netos daqueles que estiveram envolvidos nos processos de descolonização dos impérios português, belga e francês. Apesar das dificuldades, há já alguns indicadores de sucesso, e não se resumem ao anúncio de que a França vai restituir ao Benim 26 obras de arte espoliadas pelo seu exército numa expedição punitiva ao antigo reino do Daomé em 1892. Na Holanda as negociações com os indonésios decorrem a bom ritmo; a Bélgica prepara-se para inaugurar já este domingo o novo Museu Africano, que vai associar as colecções etnográficas do velho Museu Real da África Central à arte que se faz hoje naquele continente, de acordo com um programa que reflecte bem a sua condição pós-colonial; e na Alemanha o debate em torno do genocídio dos herero no começo do século XX entrou já pelo discurso de Angela Merkel, ajudou a pôr em causa o Fórum Humboldt, projecto concebido para reunir todas as colecções etnológicas de Berlim, e instalou-se nos tribunais. “Este movimento está a tornar-se consensual porque é reconhecido que muitos objectos foram recolhidos sem o consentimento dos povos coloniais e, pior do que isso, em condições predatórias, às escondidas”, diz o historiador Francisco Bethencourt, professor do King’s College, em Londres, e autor de várias obras sobre a temática dos impérios, incluindo a aclamada Racismos – Das Cruzadas ao Século XX (Temas e Debates, 2015). “A restituição faz sentido pois os países em desenvolvimento precisam de ter as suas colecções e de reflectir sobre as suas próprias formas de identidade ao longo do processo histórico. ”A historiadora de arte moçambicana Alda Costa reconhece a violência da colonização e as suas formas de discriminação, social, económica e racial, mas, “sem querer legitimar ou desculpabilizar” este período, diz que também ele faz parte da história do continente africano e não deixa de fora as relações que entre colonizados e colonizadores se estabeleceram. “Embora compreenda o movimento de restituição do património africano às ex-colónias, tenho sobre ele reservas”, admite, pedindo também uma análise cuidadosa das práticas de preservação patrimonial de cada país, da capacidade das instituições para receber, proteger e divulgar os bens, e da importância e do uso que lhes vão ser dados pela sociedade. “O continente africano vive enormes problemas e os países não contemplam, em geral, nas suas prioridades a preservação do património cultural”, explica esta académica. “Veja-se o número de museus existentes, de profissionais, e a carência de recursos de muitas das nossas instituições. Considero mais importante desenvolver as relações de trabalho entre países, incluindo as ex-metrópoles, o acesso a arquivos e museus por parte dos investigadores ou mesmo a criação de facilidades para a sua recuperação digital. No caso de Moçambique/Portugal houve já numerosas iniciativas de colaboração. ”António Sousa Ribeiro, professor da Universidade de Coimbra e autor de Geometrias da Memória: Atitudes Pós-coloniais, compreende que a restituição não esteja entre as prioridades das ex-colónias portuguesas, mas não tem dúvidas de que os pedidos de restituição chegarão. Porque o direito ao objecto é um direito à memória. “A devolução de património às ex-colónias não é diferente da das obras confiscadas aos judeus pelo nacional-socialismo na Segunda Guerra – tem de ser feita. Pode demorar décadas, mas é preciso começar. E é urgente fazê-lo com verdadeira vontade política porque são processos para muitas gerações. ”Lembra Sousa Ribeiro que Portugal devia ser dos primeiros a compreender a situação das ex-colónias porque “sempre foi visto pelos países do Norte como semi-bárbaro” e porque foi saqueado várias vezes ao longo da história: “Nas Invasões Francesas e muito antes. A principal biblioteca de Oxford tem entre os seus volumes iniciais cerca de 100 que pertenciam ao bispo de Faro e que foram roubados pelo conde de Essex no século XVI. ”Portugal devia ser dos primeiros a compreender, mas ainda não o faz. Porquê? Porque tarda a assumir as suas responsabilidades na colonização, sublinha o professor de Coimbra. “O esbulho só foi possível no seio das relações de poder e de violência que são as relações coloniais. Há que dizer em primeiro lugar que a colonização foi um erro. E o roubo do património das ex-colónias é apenas um aspecto. Portugal tem de assumir as responsabilidades dos crimes cometidos nas ex-colónias, e não estou a falar só do período da guerra. ”Reflectir sobre a colonização, defende Sousa Ribeiro, não é um exercício fútil de autocrítica porque nos ajuda a entender fenómenos contemporâneos como o das migrações. É claro que descolonizar o senso-comum não é tarefa fácil e deve começar a fazer-se, diz, por cima. “Os nossos políticos têm de deixar de papaguear chavões herdados da propaganda do Estado Novo e que falam dos portugueses como colonizadores bons. Não há colonizadores bons. O mito da excepcionalidade do nosso colonialismo prolonga-se no nosso presente e isso é gravíssimo. ”O historiador Francisco Bethencourt lembra que as guerras de ocupação foram devastadoras e que embora a escravatura fosse já antes da chegada dos europeus um fenómeno interno africano a globalização do tráfico de escravos teve enormes consequências demográficas. “A colonização deve ser vista como um crime contra a humanidade, tal como outras formas de perseguição e tentativas de extermínio de povos em diversos períodos e diversas partes do mundo. ” O facto de boa parte da opinião pública portuguesa não o reconhecer ainda, diz, deve-se a “um défice de educação cívica num país que preferiu curar as feridas da ditadura e do colonialismo através da amnésia”. Sem o reconhecimento de responsabilidades neste processo histórico, qualquer acto de restituição de objectos ou documentos pouco ou nada significará, defende por seu lado a antropóloga Elsa Peralta. “O reconhecimento de que a colonização foi um erro deve ser universal e imediato, mas a devolução é sobretudo simbólica. E não tem de ser generalizada e absoluta. ”Para esta investigadora da Faculdade de Letras de Lisboa, “Portugal nunca descolou da narrativa da excepcionalidade do colonialismo português” porque ela é fácil de adaptar e foi recuperada pela democracia. “Passar de uma lógica de propaganda para outra de maior complexidade histórica e intelectual demora. Aquilo a que eu chamo o ‘senso-comum colonial’ está enraizado e só se combate com medidas pedagógicas. ”Para o investigador António Pinto Ribeiro, Portugal está completamente arredado deste debate. “Aqui ainda estamos a discutir se deve haver um museu sobre os descobrimentos e o que lhe vamos chamar, o que é uma discussão de século XIX e de grémio literário… Estamos atrasados 100 anos nesta questão que é fracturante. ” Porquê? “Pela nossa condição periférica, pelo facto de as nossas elites serem ainda muito conservadoras… Continuamos a olhar sempre para nós isoladamente, para o nosso caso particular, quando este debate não pode separar-se de outro que diz respeito à história global – é a partir dela que temos de considerar o nosso passado, também ele colonial. ”Para já, diz, urge fazer um inventário do património das antigas colónias que está nos museus portugueses e rever o direito do património começando, desde logo, por redefinir o seu conceito, sem delimitações materiais e ideológicas, e sem esquecer a tal história global. Difícil? “Certamente. Mas urgente. ”O que há a fazer na melhoria da relação dos portugueses com o passado colonial do país não passa só pela restituição; passa também, defendem os especialistas ouvidos pelo PÚBLICO, pela revisão dos currículos escolares de vários graus de ensino e pela renovação da museografia nas instituições que têm à sua guarda colecções relacionadas com este período. “Os nossos museus continuam, por exemplo, a mostrar obras em que se vêm negros em posições subalternas sem uma linha de contexto. É preciso rever as narrativas à luz das grandes questões coloniais”, argumenta Pinto Ribeiro. Todo este debate vai também obrigar a repensar a circulação de obras entre instituições para que a Europa não fique privada de objectos deste período que também faz parte da sua história. “Agora agitar o fantasma de que os arquivos e museus europeus de etnologia e antropologia vão ficar vazios é um disparate. Nem todas as ex-colónias estão a exigir restituições. As coisas vão ser feitas com dimensões e velocidades diferentes. Tudo vai depender das negociações entre Estados. E algumas delas poderão levar a soluções intermédias de depósito ou empréstimo. ”Joaquim Pais de Brito, antropólogo que durante 22 anos dirigiu o MNE e que deixou o cargo depois de renovado o projecto expositivo das colecções no seu núcleo central, concorda com o movimento de restituição que se desenha há décadas e diz que ele obriga a uma reflexão interna sobre a pertinência dos museus etnológicos e antropológicos, que começaram a perder públicos e poder nas décadas de 1960 e 70. “Quando nasceu o Museu do Homem, em Paris, já estava em crise. Já se debatia com problemas de legitimidade. O do Quai Branly [que reuniu grande parte do acervo vindo das ex-colónias francesas] tem meia dúzia de anos e, mesmo sendo um museu de arte e não de etnologia, até antes de abrir levantou polémica. Os museus antropológicos, hoje num limbo, têm de questionar a sua pertinência para levar a uma renovação que faça sentido, mesmo dependente dos objectos”, diz este antropólogo. Lembrando que os objectos mais prestigiados, singulares e por isso “essenciais à construção de discursos de identidade nas ex-colónias” chegaram à Europa no final do século XIX, Pais de Brito defende que o Ocidente tem de retomar os aspectos dolorosos da sua história e pôr fim à fragilidade das narrativas que acompanham os objectos nos museus. “Os museus ainda querem esquecer o que não se pode esquecer. E como transferiram as funções do conhecimento para as universidades, foram ficando ausentes do pensamento crítico, fora do debate, do tempo. Como os próprios objectos”, que no caso do MNE são na maioria "peças produzidas em série nos ateliers que África montou, de forma notável”, desde os anos 1960. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Quanto à relação da opinião pública portuguesa com a memória colonial, Pais de Brito reconhece que está cheia de “buracos”, mas o mesmo se passa noutros países. “O relatório Macron tem uma circulação restritíssima, não traduz a vontade de um colectivo. Não é a sociedade francesa a dizer que a colonização foi um crime. ”A Portugal, e segundo a Direcção-Geral do Património Cultural, entidade que tutela os museus públicos, não chegou até à data nenhum pedido de restituição. O mesmo se passa no universo dos arquivos, onde são já múltiplos os programas de colaboração com os países de língua portuguesa, de que são exemplo Cabo Verde (centenas de imagens digitais sobre a Colónia Penal do Tarrafal) e Moçambique (foram enviados pelo menos 15 mil documentos produzidos pelos serviços de informação do Estado Novo relativos às lutas de libertação). “Não temos qualquer pedido de restituição. A troca de documentação digital com os territórios que estiveram sob administração portuguesa tem acontecido com muita regularidade, o que significa que o acesso está garantido”, diz Silvestre Lacerda, director-geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas. O PÚBLICO procurou contactar os ministérios da Cultura em Moçambique e Angola para apurar se estariam a trabalhar no dossier da restituição, mas não obteve qualquer resposta. Em Lisboa, Graça Fonseca, a nova titular da pasta, também optou por não comentar a pertinência do debate em torno da eventual devolução de património às ex-colónias.
REFERÊNCIAS:
Entidades MNE
Israel aprova lei que declara Estado para judeus e despromove a língua árabe
A decisão foi tomada depois de meses de debate. (...)

Israel aprova lei que declara Estado para judeus e despromove a língua árabe
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-07-19 | Jornal Público
SUMÁRIO: A decisão foi tomada depois de meses de debate.
TEXTO: O Knesset (Parlamento de Israel) aprovou nesta quinta-feira uma controversa lei que define Israel como o Estado para os judeus, que estes têm "um direito exclusivo à auto-determinação", e que despromove o árabe como uma das línguas oficiais. Além disso, reconhece Jerusalém como capital. Um dos principais receios da aprovação desta lei é que reduza os direitos dos que não são judeus. A proposta inicial da lei estabelecia a possibilidade de serem criadas comunidades homogéneas, de uma só nacionalidade, fé ou etnia. Mas o Presidente da República israelita, Reuven Rivlin, e outras figuras do poder, como o conselheiro legal do Parlamento, apelaram contra a aprovação – e essa cláusula acabou por ser retirada. Rivlin argumentava que esta cláusula poderia “prejudicar o povo judaico, os judeus pelo mundo e o Estado de Israel”. Já o primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, é um acérrimo defensor dessa cláusula. Acabou por ficar uma formulação mais genérica, que o Estado "encorajará comunidades judaicas". Já uma cláusula que aumentava o papel da religião, considerando que a halacha (lei judaica) pode ser usada pelos tribunais em casos em que não haja precedentes na lei civil, caiu. Já uma cláusula que aumentava o papel da religião, considerando que a halacha (lei judaica) pode ser usada pelos tribunais em casos em que não haja precedentes na lei civi, foi retirada. Netanyahu considerou que a aprovação desta lei foi um “momento marcante” na história do país. "Continuaremos a assegurar os direitos civis na democracia de Israel, mas a maioria também tem direitos e a maioria decide", disse o primeiro-ministro na semana passada. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Na lei, é referido que “Israel é a pátria histórica do povo judaico e, nele, ele tem um direito exclusivo à autodeterminação”. A sessão em que foi debatida a lei durou mais de oito horas; 62 deputados votaram a favor, 55 votaram contra. A aprovação foi alvo de críticas da esquerda, associações de defesa de direitos humanos e civis, e também por parte da comunidade árabe (um quinto da população de Israel). A organização não-governamental Adalah ?referiu que se trata de uma tentativa de obter “superioridade étnica ao promover medidas racistas”. O deputado árabe israelita Ahmed Tibi considerou que a aprovação representava “a morte da democracia”.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave direitos morte lei humanos comunidade
“Falta transformar a diáspora em força política global”, defende Marques Mendes
A criação da RTP-Internacional há 26 anos foi o pretexto que levou o ex-líder do PSD a lançar agora um livro com outras ambições politicas: “Afirmar Portugal no Mundo”. E algo mais. (...)

“Falta transformar a diáspora em força política global”, defende Marques Mendes
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: A criação da RTP-Internacional há 26 anos foi o pretexto que levou o ex-líder do PSD a lançar agora um livro com outras ambições politicas: “Afirmar Portugal no Mundo”. E algo mais.
TEXTO: Estavam lá muitos PSD diferentes, alguns PS e uns quantos CDS, muitos advogados e homens de negócios, gente das televisões e do desporto. Dez anos depois do seu último livro, o lançamento de Afirmar Portugal no Mundo, de Luís Marques Mendes, foi muito mais do que um encontro de amigos. Foi uma afirmação de ambições políticas. Não tanto pessoais, mas de um ideal - o que dá o nome à obra. A história do nascimento da RTP-Internacional é o pretexto, o esteio, o ponto inicial de uma reflexão política que o comentador e conselheiro de Estado leva muito mais longe. Na geografia e na ambição. Marques Mendes tira várias ilações da história daquele que, em 1992, se tornou um dos dez canais globais de televisão, numa época em que ainda não havia Internet nem televisões privadas em Portugal. E que ele fez nascer, enquanto ministro-adjunto e para os Assuntos Parlamentares, com o empenho do então primeiro-ministro Cavaco Silva - que escreve um dos pósfacios. O outro é de Jorge Sampaio e o prefácio é da autoria de Marcelo Rebelo de Sousa. No livro e no discurso da sua apresentação, o advogado defendeu a importância da diáspora portuguesa e da lusofonia, dos consensos políticos e da ousadia, da qualidade e do mérito. “Somos um país pequeno, mas não somos uma nação irrelevante”, afirmou, para defender as qualidades de um povo que se encontra espalhado pelo mundo. Mas, disse, “falta transformar a diáspora em força política global, capaz de defender Portugal, os interesses e os seus valores”. Preconizou que “é preciso pensar em grande e agir com ambição” e defendeu a criação de “uma espécie de TV Portugal”, partilhada por todos os operadores de televisão, “porque lá fora o que conta não é a concorrência, mas a excelência”. Sustentou que a aposta na lusofonia “tem de ser ainda mais reforçada” e apontou sobretudo para o continente africano: “Se não formos nós a investir em África, outros o farão”, avisou. Depois abriu ainda mais o horizonte do discurso e regressou à política nacional. Perante figuras como Jorge Coelho e Fernando Medina (PS), Fernando Negrão, Hugo Soares, Castro Almeida, Álvaro Amaro, Paula Teixeira da Cruz, Miguel Pinto Luz ou Miguel Relvas (PSD), Diogo Feio ou João Gonçalves Pereira (CDS), defendeu a importância dos consensos políticos para grandes projectos e reformas. Como a do sistema político. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. “De eleição para eleição, de geração para geração, baixa a qualidade da competência do decisor político”, diagnosticou, para defender a urgência de reformar o sistema político, investindo no mérito e na responsabilização. É uma questão nacional”, defendeu. Podia ser também um programa de acção, mas para já foi apenas um desafio aos presentes - e eram muitos e influentes, como Leonor Beleza, Nunes Liberato, Miguel Frasquilho, Manuel Queiró, António Monteiro, Guilherme Figueiredo, Francisco George. Foi a partilha de uma “inquietação”, a mesma de que falou Fernando Santos, o seleccionador nacional de futebol, que apresentou a obra. “Pensei que era um livro simples, sobre a história da RTP-Internacional – e em boa parte é. Mas o que ele fez foi inquietar-me”, disse Fernando Santos. “É dizer que não podemos ficar por aqui, há que continuar a afirmar Portugal no mundo, que é um desiderato de todos os portugueses”, acrescentou o seleccionador, que ainda hoje a primeira coisa que faz quando chega a um hotel por esse mundo fora é ver se há RTP-I.
REFERÊNCIAS:
Associação 25 de Abril disponível para receber conferência de Nogueira Pinto cancelada na Nova
A associação liderada por Vasco Lourenço manifestou repúdio pelo cancelamento da conferência com Jaime Nogueira Pinto. (...)

Associação 25 de Abril disponível para receber conferência de Nogueira Pinto cancelada na Nova
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 0.4
DATA: 2017-03-08 | Jornal Público
SUMÁRIO: A associação liderada por Vasco Lourenço manifestou repúdio pelo cancelamento da conferência com Jaime Nogueira Pinto.
TEXTO: É uma das "sete ofertas de espaços públicos" que Jaime Nogueira Pinto recebeu desde que a Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH) da Universidade Nova de Lisboa decidiu cancelar a conferência Populismo ou Democracia: o Brexit, Trump e Le Pen, que estava marcada para esta terça. A Associação 25 de Abril, liderada por Vasco Lourenço, disponibilizou as suas instalações para receber a palestra do historiador, manifestando "ao professor Nogueira Pinto o repúdio por este silenciamento da sua opinião". Em declarações ao PÚBLICO, o politólogo considerou a oferta de Vasco Lourenço "simpática" e mostrou-se disponível para responder afirmativamente ao convite, acrescentando, no entanto, que cabe aos organizadores (Nova Portugalidade) a decisão de realizar a conferência e escolher o local. E foram precisamente os organizadores desta conferência que estiveram no centro da polémica. O director da FCSH, Francisco Caramelo, explicou na segunda-feira ao PÚBLICO que o cancelamento da conferência se deveu a preocupações com as condições de segurança do evento, devido a um aparente extremar das posições. A conferência foi cancelada depois da pressão efectuada contra a entidade responsável pela organização, a Nova Portugalidade, considerada pela Associação de Estudantes (AEFCSH) como "nacionalista e colonialista". Na Reunião Geral de Alunos (RGA), realizada a 2 de Março, foi apresentada uma moção por um grupo de seis alunos a título individual em que se argumentava que o evento estaria "associado a argumentos colonialistas, racistas, xenófobos", pedindo-se desta maneira o cancelamento da reserva da sala onde se realizaria o debate. A proposta foi aprovada, segundo a acta da reunião divulgada pela AEFCSH, com 24 votos a favor, quatro contra e três abstenções. Com 31 alunos presentes na reunião, a AEFCSH explicou ao PÚBLICO que o número de presentes não variou daquele que, normalmente, comparece às outras reuniões do género. Assim, e tendo em conta o carácter, previsto pelos estatutos, de "órgão deliberativo máximo dos estudantes da FCSH" da RGA cujas "decisões são de aplicação imediata e vinculam todos os estudantes e estruturas estudantis da FCSH", a AEFCSH transmitiu à direcção a moção. Num primeiro momento, a direcção decidiu manter o evento, mas, depois, considerando estar confrontada com possíveis riscos para a segurança, decidiu mesmo cancelar o evento. A associação que representa os estudantes da faculdade esclareceu ao PÚBLICO que desconhece quaisquer ameaças, acrescentando que apenas seguiu os requisitos estatutários. Em comunicado, a Nova Portugalidade rejeita as acusações apresentadas na moção, afirmando que a equipa que constitui a organização "integra indivíduos de todos os géneros humanos". Diz ainda que o texto da moção "é ridículo". O caso chegou mesmo à mais alta esfera da política nacional, com o ministro do Ensino Superior a ligar nesta terça-feira ao reitor da Universidade Nova de Lisboa (UNL) para pedir garantias de que o cancelamento da conferência com Jaime Nogueira Pinto não coloca em causa o direito à liberdade de expressão. O CDS-PP pediu esta terça-feira esclarecimentos ao Governo sobre o cancelamento da iniciativa que considerou um "ataque à liberdade de expressão e ao pluralismo democrático", noticia a Lusa. Em declarações aos jornalistas no Parlamento, o deputado do CDS-PP Telmo Correia disse que o partido enviou requerimentos aos ministros da Ciência e Ensino Superior, Manuel Heitor, e ao ministro Adjunto, Eduardo Cabrita, que tem "a tutela das matérias de cidadania" em que pergunta o que está a ser feito para evitar situações futuras. "Não estamos no PREC [Processo Revolucionário em Curso], não podemos viver num país onde as pessoas não podem emitir a sua opinião", sublinhou, citado pela Lusa. Para Telmo Correia, "não é aceitável" o cancelamento da conferência, até pela "tradição universitária, que deve ser pluralista, de ouvir opiniões contrárias". Também o antigo líder do CDS Ribeiro e Castro apelou esta terça-feira ao boicote a conferências na FCSH enquanto não for dada uma explicação sobre o cancelamento da conferência com o politólogo. "Já participei em debates na FCSH. Não tornarei a participar enquanto não for tomada uma posição e apelo às pessoas que tenham apreço pela liberdade a fazer o mesmo, enquanto não for dada uma explicação sobre o que se passou, um pedido de desculpas e uma garantia de que não voltará a verificar-se uma situação como esta", disse à agência Lusa. O antigo deputado centrista considerou que estas posições devem ser tomadas pela Associação de Estudantes, pela direcção da FCSH e pela reitoria da Universidade Nova de Lisboa, que não pode ficar indiferente a uma questão que "mancha o prestígio de uma universidade de referência portuguesa". "Fez-me lembrar o PREC [Processo Revolucionário em Curso] e 1975, mas nessa altura havia Mário Soares, Salgado Zenha e Manuel Alegre e agora leio que há vozes no PS que apoiam este desmando autoritário. Isto é muito grave. Considero essencial que o PS se demarque, pelo menos com o mesmo vigor com que Mário Soares se comportou em 1975", sustentou. Para José Ribeiro e Castro, o cancelamento da conferência com Nogueira Pinto é "um ataque à liberdade, à inteligência e ao espírito académico", configurando uma "iniciativa persecutória", que é "um prenúncio péssimo para o futuro". "Na história, sabe-se quando estas coisas começam, não se sabe como acabam", disse. Outra das personalidades a reagir à polémica foi o embaixador Francisco Seixas da Costa, que, através do Facebook, afirma que, "como membro do conselho de faculdade da FCSH", lamenta "que a direcção da escola tenha sido forçada, contra a sua vontade, a tomar esta atitude, para salvaguarda da estabilidade funcional da instituição". Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. "E porque convém chamar os bois pelos nomes, que fique claro que esta inadmissível atitude censória foi tomada por uma estrutura de estudantes identificada com o Bloco de Esquerda", diz ainda o diplomata. E conclui: "Há meses, em Cascais, teve lugar um debate público com três intervenientes: Jaime Nogueira Pinto, Francisco Louçã e eu próprio. Ninguém se lembrou de boicotar a sessão. Claro. "Também o eurodeputado socialista Francisco Assis criticou o cancelamento da conferência. "Isto é um acto de censura. Acho gravíssimo, não apenas a posição da associação de estudantes – mas, enfim, aí ainda poderemos ter em conta a sua juventude – mas que a direcção da faculdade tome uma posição desta natureza”, criticou Francisco Assis, em declarações à Rádio Renascença. O director da faculdade, Francisco Caramelo, referiu na segunda-feira ao PÚBLICO que a decisão foi tomada face ao ambiente em redor da conferência. Francisco Caramelo garante que o cancelamento "nada teve que ver" com Jaime Nogueira Pinto ou com o tema em questão. Além disso, o director admite vir a convidar o escritor para futuros debates sobre o tema.
REFERÊNCIAS:
Partidos PS
Governo em “alerta vermelho” com manifestações de sexta-feira
Executivo e polícias acreditam que protesto que imita em Portugal o movimento "coletes amarelos" de França terá grande adesão e temem que manifestações possam ser infiltradas por movimentos extremistas e por criminosos comuns, que provoquem violência, destruição e roubos. (...)

Governo em “alerta vermelho” com manifestações de sexta-feira
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-19 | Jornal Público
SUMÁRIO: Executivo e polícias acreditam que protesto que imita em Portugal o movimento "coletes amarelos" de França terá grande adesão e temem que manifestações possam ser infiltradas por movimentos extremistas e por criminosos comuns, que provoquem violência, destruição e roubos.
TEXTO: O Governo está “muito preocupado” e em “estado de alerta” com a manifestação marcada para a próxima sexta-feira, sob o lema “Vamos Parar Portugal”. A organização do evento está a convocar os cidadãos através das redes sociais para virem para a rua em vários pontos do país, que faz revindicações de vária ordem e que tenta imitar o movimento dos "coletes amarelos" de França. Um membro do Governo admitiu ao PÚBLICO a sua preocupação com a possibilidade de os protestos virem a ter uma adesão significativa, nomeadamente na sequência da revolta dos "coletes amarelos" em França e com a reacção de Macron. Ou seja, o facto de o Presidente francês ter cedido a algumas das revindicações feitas pelos manifestantes, nomeadamente o aumento de 100 euros no salário mínimo, pode eventualmente levar os portugueses a acharem que vale a pena protestarem porque há exemplos de governos a cederem sob a pressão da rua. O Governo também teme que a manifestação - que se diz independente dos partidos (até agora não teve a adesão de nenhum deles) e da qual as centrais sindicais também já se demarcaram - seja infiltrada por movimentos extremistas e até por criminosos comuns e que estes, tal como aconteceu em França, provoquem desacatos, destruição de propriedade e até pilhagens. O facto de os manifestantes estarem a ser convocados para alguns locais considerados sensíveis em termos de segurança, como é o caso das portagens da Ponte 25 de Abril, é outro dos factores de apreensão. As preocupações dos governantes estão espelhadas nas informações que as forças policiais têm revelado nos últimos dias sobre as medidas de segurança adoptadas para o dia das manifestações, que a PSP acredita serem “de grande dimensão”. Todas as folgas e créditos horários dos agentes foram suspensos no dia 21, de forma a conseguir ter espalhado por todo país um efectivo de cerca de 20 mil agentes, segundo estimou o presidente da Associação Sindical dos Profissionais de Polícia (ASPP/PSP), Paulo Rodrigues. Também na GNR haverá um contingente de prevenção. “Vamos ter manifestações de grande dimensão em todo o país e mandam as regras do bom senso ter pessoal operacional”, disse à Lusa o porta-voz da Direcção Nacional da PSP, intendente Alexandre Coimbra, na passada sexta-feira. Já nesta segunda-feira, a direcção nacional da PSP emitiu um comunicado em que diz estar a preparar um "dispositivo adequado" para dia 21 e no qual apela ao respeito pela lei. A direcção da força policial lembra que os promotores das manifestações “têm de comunicar aos presidentes das câmaras municipais, por escrito e com a antecedência mínima de dois dias úteis, a intenção de realizar a manifestação”. A PSP apela ainda “a todos os cidadãos que decidam exercer o seu direito de manifestação, que o façam de forma pacífica e em respeito pela lei”. Segundo a Lusa, a PSP já se reuniu com os promotores das iniciativas previstas para Braga e Porto, estando agendado para terça-feira uma reunião com os organizadores do protesto de Lisboa. Os apelos às manifestações começaram a ser feitos nas redes sociais, especialmente no Facebook, há cerca de três semanas, por cidadãos anónimos que apenas assumiam ser da zona Oeste do país. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Ao longo do tempo algumas pessoas têm-se assumido como promotores de algumas das acções de protesto e começaram a ser convocadas manifestações em Lisboa, Porto, Faro, Beja e Viseu. Porém, nos últimos dias, na página do Facebook do movimento, tem-se multiplicado o número de pessoas a fazer convocações de manifestantes para outras cidades, vilas do país e até estradas. No apelo inicial ao protesto, os promotores pedem manifestações sem violência, “de forma humana e civilizada” e com “respeito, sem xenofobia e racismo”. “Somos um dos países que recebe menos e paga mais imposto etc, etc e ficamos caladinhos como sempre. Temos países a receber o dobro de nós, assim que existe algo que não agrade, reclamam, exigem, protestam até serem ouvidos. E nós portugueses? Chega, vamos dizer basta ao aumento de combustíveis, portagens e tudo o resto que está mal”, diz a convocatória inicial. “Percebam uma coisa, isto não é nenhuma manifestação. Isso já se fazem 200 por ano e nada. Isto é um bloqueio! Protesto! Revolta do povo unido até o povo ser ouvido! Não somos nenhum partido político, nem algo do género. Apenas somos o povo português, que quer um país mais justo”, acrescenta.
REFERÊNCIAS:
Entidades GNR PSP