Se quer perder peso, chega de desculpas!
Paula Martins, Nutricionista e Nutricoach, autora do site projecto NutriSABER, fala da importância da motivação e do papel da actividade física quando o objectivo é perder peso. (...)

Se quer perder peso, chega de desculpas!
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento -0.31
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Paula Martins, Nutricionista e Nutricoach, autora do site projecto NutriSABER, fala da importância da motivação e do papel da actividade física quando o objectivo é perder peso.
TEXTO: Que a obesidade é um problema instalado, já sabemos. Que o excesso de peso já chega a mais de metade da nossa população, já sabemos. Que temos de fazer algo por isso, alguns já sabem! E são esses que sabem que me chegam à consulta de nutrição ou às sessões de Nutricoaching. Nessas consultas, após uma partilha detalhada do histórico pessoal do cliente, seguido do estabelecimento de um objectivo, partimos juntos para as soluções. Estas, passam pela adequação do plano alimentar, mas (não menos importante), pela execução de um plano de exercícios, que grande parte das vezes é o assunto ao qual os clientes oferecem mais resistência. Perder peso sem exercício é possível? Sim é possível, mas. . . Peso, nem sempre significa gordura. O exercício físico vai permitir queimar gordura e vai impedir a perda de massa muscular, dependendo do tipo de treino até irá promover o seu aumento. Não esquecendo do papel da actividade física no alívio do stress ou ansiedade, sintomas muito associados a este grupo de indivíduos. E porquê? Das primeiras respostas que oiço, quando sugiro a realização de uma prática desportiva, é: “Eu não posso ir para o ginásio porque. . . ”. Depois disto, oiço as mais variadas e legitimas razões, tais como, os custos de mensalidades associadas, as despesas de viagem ou tempo perdido no trânsito até lá, os horários incompatíveis, o tempo dispendioso entre balneários, exercitar-se e chegar a casa, onde ninguém consegue gastar menos que duas horas, bem como outros pormenores que confundem ou desmotivam à partida qualquer iniciante. Mas, quem falou em ginásio? Será que não temos todos o nosso próprio ginásio particular? Será que nunca reparámos nele? Não temos todos um corpo super funcional, que faz tudo (ou quase) o que lhe mandamos? Não temos todos um caminho, uma estrada ou um passeio à porta de casa?Pois, isso eu tenho, é verdade! Não se apanha trânsito, equipamos-nos rapidamente em casa (não há a desculpa de se esquecer de levar o saco do ginásio), fazemos um horário à nossa medida, vamos sozinhos ou acompanhados com amigos, com o cão ou até com as crianças, e melhor, não se paga inscrição, seguro ou mensalidade. Por isso, quer perder peso? Exercite-se sim, no sofá ninguém emagrece!Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Paula Martins – Nutricionista e Nutricoach, autora do site projecto NutriSABER, com Programas de nutricoaching, educação alimentar, perda de peso, mudanças de estilo de vida, melhoria da auto-estima e também a trabalhar com Eneagrama na Nutrição.
REFERÊNCIAS:
Tragédia na aldeia: para além da simpatia
A remontagem da ópera Peter Grimes em cena no São Carlos é de altíssima qualidade. (...)

Tragédia na aldeia: para além da simpatia
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-06-02 | Jornal Público
SUMÁRIO: A remontagem da ópera Peter Grimes em cena no São Carlos é de altíssima qualidade.
TEXTO: A ópera Peter Grimes (a primeira de Benjamin Britten), estreada em 1945, impôs-se desde então como um dos exemplos mais impressionantes, e com maior sucesso, da ópera moderna; mas teve de esperar por 1994 para ser levada à cena entre nós, através de uma produção importada da Escócia, com encenação de Joachim Herz (quatro anos depois, a Gulbenkian apresentou uma versão de concerto com participação do próprio coro). Devido à história recente da nossa política cultural, que pôs em causa o planeamento artístico a médio prazo, o regresso de São Carlos a Britten não pôde fazer-se através de uma nova produção em parceria com outros teatros (como sucedeu no início do ano com a exemplar montagem da ópera Billy Budd no Teatro Real, em Madrid), mas através da remontagem de uma encenação alheia (para a English National Opera, em 2009). Felizmente, esta encenação do americano David Alden, com cenografia de Paul Steinberg e figurinos de Brigitte Reiffenstuel, é de altíssima qualidade, e a remontagem (dirigida por Ian Rutherford) envolveu não apenas o coro e a orquestra do Teatro Nacional de São Carlos, mas também seis solistas portugueses. A história é triste: um pescador de mau carácter, com assomos de violência, explora órfãos aprendizes; a morte acidental de um deles leva a aldeia a acusar o pescador de assassínio; perante a intolerância local, só quebrada pela camaradagem de um capitão e pela compaixão da professora primária, a queda mortal do segundo aprendiz e o consequente desmoronamento dos planos do pescador conduzem-no ao suicídio. Britten é um mestre a retratar a claustrofobia desta comunidade piscatória, entrelaçando, em tensão permanente, a psicologia individual e a psicologia social que conduzem ao trágico desenlace. Para além da simpatia que se possa ou não nutrir por Peter Grimes, a ópera é uma reflexão sobre a irracionalidade e os perigos das pulsões que atravessam a vida social e isolam, de forma por vezes irremediável, os indivíduos. Interpretação:Coro do Teatro Nacional de São Carlos, Orquestra Sinfónica Portuguesa Encenação:David Alden Composição: Benjamin Britten Coreografia: Maxine Braham Cenografia: Paul Steinberg Direcção musical: Graeme Jenkins Desenho de luz: Adam Silverman Figurinos: Brigitte Reiffenstuel Libreto: Montagu SlaterSubscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. A encenação apoia-se numa cenografia despojada, económica, elegante na sua preferência por triângulos, superfícies em rampa e cores sóbrias, com traços naturalísticos transformados por um rigoroso desenho de luz; uma cenografia que chega a ser francamente bela. A visão de David Alden manifesta-se ao longo da ópera com uma tripla tendência: a surrealizante, na incorporação da tempestade nos movimentos do coro (com presumível ajuda da coreógrafa Maxine Braham), ou no desbragamento da festa aldeã; a grotesca, na masculinização da estalajadeira ou no tratamento caricatural das suas sobrinhas; e a romantizante, ao dar relevo inusitado à relação entre Grimes e a professora, que é colocada no centro da tragédia. A direcção musical, a cargo do experiente maestro Graeme Jenkins, é excepcionalmente enérgica mas também atenta ao detalhe orquestral e às cambiantes expressivas da partitura, sendo difícil de imaginar maior eficácia a puxar por instrumentistas e cantores, que responderam com total entrega. O coro, a quem se pede imenso nesta ópera, e em particular nesta sua encenação, teve um desempenho avassalador, e merece ser colocado no topo do pódio. O elenco de solistas é bastante equilibrado e de alto coturno. O papel titular foi confiado ao tenor britânico John Graham-Hall, que faz valer com exemplar entrega a sua longa experiência de palco; apesar de um vibrato por vezes demasiado largo, os seus agudos são ainda fáceis e claros, e os recursos interpretativos, impressionantes. A soprano Emily Newton desempenha o papel da professora Ellen com verve e sensibilidade. O barítono Jonathan Summers compõe com perfeição e autoridade o personagem do capitão Balstrode. A meio-soprano Rebecca de Pont Davies, enquanto tia (Auntie), atravessa o palco com ironia e estudada contenção, servida por uma voz sólida e uma presença marcante. O metodista bêbado, Bob Doles, dá ao tenor James Kryshak uma oportunidade de exibição histriónica bem aproveitada. Swallow, a autoridade local, é um papel que parece feito de propósito para o baixo Graeme Danby, capaz da maior gravidade como do humor mais rasteiro. Maria Luísa de Freitas, como velha coscuvilheira (Mrs. Sedley), foi exemplarmente clara e convincente na atitude, no tom, na dicção. Também o barítono João Merino (Ned Keene, o boticário) teve uma prestação fantástica, quer na irrequietude que imprimiu ao personagem, quer na fluidez da emissão vocal. O tenor Carlos Guilherme (Reverendo) foi, como de costume, irrepreensível. No pólo mais jovem, o baixo Nuno Dias compôs com invejável segurança um imponente carroceiro (Hobson), enquanto às sopranos Bárbara Barradas e Mariana Castello-Branco coube o exigente papel, muito explorado pela encenação, de sobrinhas, papel no qual evidenciaram um largo leque de qualidades, difíceis de enumerar como de superar. Resta introduzir uma nota sobre a actualidade musical de Britten: como é sabido, a narrativa da vanguarda retratou-o como um conservador. Isto é injusto. Há na sua música uma renovação da linguagem herdada que é tanto devedora do expressionismo atonal como da actualização neoclássica das formas do passado, e vai selectivamente incorporando os recursos expressivos de que necessita, seja para evocar experiências externas, seja para invocar emoções psicológicas. Em Peter Grimes temos quer uma representação naturalística dos elementos (vento e ondas), quer um interlúdio em forma de Passacaglia, que alude ao obsessivo resvalar mental do pescador. Curiosamente, poucos dias antes da estreia deste espectáculo no São Carlos foi estreado um magnífico concerto em que se encontra tanto uma melancólica Passacaglia como uma feliz alusão ao mundo externo (canto de pássaros). Escrita por Sérgio Azevedo, esta obra (Giochi di Uccelli – Flute Concerto) decorre da mesma abertura ecléctica ao passado e ao presente que fez o sucesso de Britten, e atesta ainda hoje a sua fertilidade.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave morte violência suicídio ajuda comunidade social assassínio
Ambientalistas querem banir herbicida mais utilizado em Portugal
Glifosato foi considerado como “provável cancerígeno” por agência da Organização Mundial de Saúde. (...)

Ambientalistas querem banir herbicida mais utilizado em Portugal
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.2
DATA: 2017-06-02 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20170602192054/https://www.publico.pt/n1690295
SUMÁRIO: Glifosato foi considerado como “provável cancerígeno” por agência da Organização Mundial de Saúde.
TEXTO: Dez organizações ambientalistas portuguesas querem que a União Europeia proíba o herbicida glifosato, o mais utilizado em Portugal e agora considerado como suspeito de provocar cancro por uma agência da Organização Mundial de Saúde. – lançado comercialmente nos anos 1970 sob a marca Roundup –A IARC cita a existência de estudos sobre a exposição humana ao glifosato, sobretudo em trabalhadores agrícolas, nos Estados Unidos, Canadá e Suécia, que sugerem uma associação entre o glifosato e linfomas não-Hodgkin, um grupo de cancros do sangue. Um “provável carcinogénico” é a classificação mais próxima de um comprovado cancerígeno, na escala da IARC. A agência da Organização Mundial de Saúde também classificou os insecticidas malatião e diazinão como provavelmente cancerígenos, e o tetrachlorvinphos e o paratião como “possíveis carcinogénicos” – ou seja, sobre os quais só há provas de associação a cancros apenas em animais de laboratório. Os dois últimos estão proibidos na União Europeia e nos Estados Unidos. O diazinão é alvo de algumas restrições na UE e o malatião continua a ser utilizado. Mas foi a classificação do glifosato que tem feito correr tinta, não só pela sua larga utilização na agricultura, como por estar associado à polémica sobre os organismos geneticamente modificados. Nos Estados Unidos, o uso do glifosato subiu em flecha desde a introdução, no final dos anos 1990, de milho e da soja transgénica. Estas variedades são resistentes ao herbicida, que assim pode ser aplicado sobre as culturas, eliminando outras plantas indesejáveis. Em Portugal, apenas é plantada uma variedade de milho transgénico, em quantidades marginais – cerca de 5% da área total de culturas de milho. Mas o uso do glifosato também aumentou, de cerca de 700 toneladas em 2001 para pouco mais de 1100 toneladas em 2012, segundo dados da Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária. “A situação em Portugal é particularmente grave”, avalia, num comunicado, a Plataforma Transgénicos Fora, que reúne dez organizações não-governamentais portuguesas. O glifosato, segundo a Plataforma, também é utilizado nas plantas domésticas, na limpeza das ruas e passeios e em linhas de água. O glifosato está na composição de 84 produtos fitofarmacêuticos com venda autorizada em Portugal, segundo a Direcção-Geral de Alimentos e Veterinária. A classificação do produto como “provável cancerígeno” fez soar os alarmes entre os ambientalistas. “As implicações desta avaliação são profundas”, refere a Plataforma Transgénicos Fora. “Considerando que este ano o glifosato está em processo de reavaliação na União Europeia, impõe-se a coragem de proibir o seu uso antes que as consequências se agravem”. Do lado da indústria, porém, a decisão provocou reacções de incredulidade – mesmo porque vai contra as classificações vigentes nalguns países. Nos Estados Unidos, a Agência de Protecção Ambiental considera o glifosato como não cancerígeno. A multinacional Monsanto – que comercializa tanto o glifosato quanto as culturas transgénicas que a ele resistem – alega que a IARC baseou-se em estudos antigos e desconsiderou novas investigações sobre a toxicidade do produto. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Num comunicado, a Monsanto lembra que na mesma categoria em que a IARC agora classificou o glifosato estão “o café, os telefones celulares, o extracto de aloé vera e vegetais em conserva, bem como profissões como barbeiro”. A Associação Nacional de Produtores de Milho dos Estados Unidos também reagiu dizendo que a decisão da IARC “cria um temor desnecessário e confusão sobre a comprovada segurança deste importante instrumento agrícola”. A CropLife International, uma federação que reúne empresas e associações ligadas à biotecnologia e agricultura, alinha pelo mesmo diapasão. “Acreditamos que a IARC chegou às suas conclusões como resultado de uma revisão incompleta dos dados, na qual evidências centrais foram omitidas”, disse Howard Minigh, presidente da organização.
REFERÊNCIAS:
Entidades UE
Já se prefigura seca “terrível” para a agricultura no Alto Alentejo
Há 20 anos, a água potável que existia no planeta, por habitante, era “quatro vezes mais do que a que temos hoje” alertou, em Beja, o comissário europeu Carlos Moedas. (...)

Já se prefigura seca “terrível” para a agricultura no Alto Alentejo
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento -1.0
DATA: 2017-06-02 | Jornal Público
SUMÁRIO: Há 20 anos, a água potável que existia no planeta, por habitante, era “quatro vezes mais do que a que temos hoje” alertou, em Beja, o comissário europeu Carlos Moedas.
TEXTO: O que se previa há pouco mais de um mês, está a confirmar-se no Alto Alentejo. A região enfrenta um período de "seca terrível", reconheceu ao PÚBLICO, Fermelinda Carvalho, presidente da Associação Agricultores do Distrito de Portalegre (AADP). No último Inverno, a precipitação foi diminuta e as culturas arvenses de Outono/Inverno foram irremediavelmente afectadas. “Os agricultores semearam na expectativa de que chovesse”. Mas a precipitação acabou por ser muito escassa e agora “as searas estão muito curtas e por isso não vai haver palha nem grão”. Já se antecipa uma produção cerealífera “muito baixa” descreve a presidente da AAPD, dando ainda conta do que está a suceder ao pasto que resta: no período estival, o aumento do calor vai deixar nos prados um alimento “sem qualidade” para o gado. Nestas circunstâncias, a realidade, a curto prazo, pode ser dramática. A possibilidade de alimentar os animais à mão com forragens e palhas é tida como muito provável, dada a escassez de alimento na região, mas a sua aquisição pode atingir valores proibitivos. Os produtores pecuários temem ainda que a falta de água, que já é patente, venha a colocar em causa o abeberamento do gado. No campo das opções e colocados perante situações extremas, os agricultores “preferem não cultivar as terras adeixar o gado sem água”, vinca Fermelinda Carvalho, igualmente preocupada com a falta de humidade no solo, circunstância que “potencia a deflagração de incêndios”, impedindo os agricultores de fazer as searas de Primavera/Verão. As consequências da ausência de chuva, no norte alentejano, vão além do cenário já descrito: “as barragens e charcas particulares estão sem água e os furos artesianos “não rebentam” ou seja, estão secos”, observa a dirigente associativa. Nas circunstâncias actuais salvaguardam-se, até ver, as explorações agrícolas que recebem água das barragens públicas, como a do Caia, por armazenar alguma água. No entanto, as barragens do Xévora e Abrilongo apresentam baixos níveis de armazenamento, obrigando a limitar o fornecimento de água para os regadios. Fermelinda Carvalho constata que “há 20 anos havia um ano mau de tempos a tempos” mas, ao longo da última década, “a maioria dos anos foram maus” em termos de escassez de água e de temperaturasAo contrário do que se possa pensar, a água do Alqueva “não chega ao Alto Alentejo”, lamenta a presidente da associação de agricultores, advogando a construção de mais reservas de água na região para contrariar os efeitos “dramáticos” associados às alterações climáticas que, na sua opinião, “são um facto incontornável”. Na sua mais recente deslocação a Beja, em meados de Maio, o comissário europeu Carlos Moedas, responsável pelas pastas da Investigação, Ciência e Inovação, destacou dois temas “importantes para o futuro”: Alimentação e água. “Como vamos resolver o problema da água, que é dos mais complexos que temos à nossa frente” é o desafio que a União Europeu vai enfrentar, sobretudo nos países mediterrânicos, realçou Carlos Moedas, explicando que “há 20 anos, a água potável que existia no planeta, por habitante, era quatro vezes mais da que existe hoje”. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Assim, os Governos de Portugal e Espanha vão dar corpo ao projecto PRIMA que envolve um investimento de 400 milhões de euros (a União Europeia vai disponibilizar 220 milhões de euros), para desenvolver tecnologia e inovação nas áreas da produção agro-alimentar e da água. “Se não resolvermos os temas da água e da alimentação no futuro vamos ter um dos maiores problemas que a humanidade pode enfrentar, ou então como diz Stephen Hawking, vamos ter que descobrir outros planetas para viver, dentro de 100 anos” alertou o comissário europeu. A AADP já enviou um ofício ao ministro da Agricultura, Capoulas Santos, a inteirá-lo do que se passa no distrito de Portalegre. “Não pretendemos a concessão de subsídios”, sublinha Fermelinda Carvalho, frisando que os agricultores pretendem apenas a abertura de programas no PDR 2020, que possibilitem a “abertura de furos e a aquisição de equipamentos para assegurar o abeberamento do gado”. E, sobretudo, que a comissão de seca já anunciada por Capoulas Santos “dê resposta rápida aos problemas que já existem”, apela a presidente da AADP, uma associação de que fazem parte 3800 agricultores do distrito de Portalegre e ainda dos concelhos de Vila Velha de Ródão, Idanha-a-Nova e Penamacor, no distrito de Castelo Branco.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave campo corpo
Marlene Monteiro Freitas: mensageira de Dionísio
Figuras em situações de delírio, metamorfose e desdobramento, a força incontrolável da música: eis o encontro entre a coreógrafa cabo-verdiana e as Bacantes de Eurípedes. (...)

Marlene Monteiro Freitas: mensageira de Dionísio
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-06-02 | Jornal Público
SUMÁRIO: Figuras em situações de delírio, metamorfose e desdobramento, a força incontrolável da música: eis o encontro entre a coreógrafa cabo-verdiana e as Bacantes de Eurípedes.
TEXTO: Soam os trompetes e rufam os tamboris no Teatro Nacional D. Maria II. Do crescendo rítmico do Bolero de Ravel à intensidade de Berio, do sopro lânguido de L’après-midi d’un faune de Stravinsky à sensualidade das mornas cabo-verdianas — são ecos de As Bacantes. Prelúdio para uma purga, a leitura coreográfica que a coreógrafa e bailarina cabo-verdiana Marlene Monteiro Freitas propõe da tragédia de Eurípides. Com estreia mundial no D. Maria II, na quinta-feira, onde permanecerá em cena até ao final mês, a peça seguirá para alguns dos festivais europeus de maior relevo, como o Kunstenfestivaldesarts, em Bruxelas, e poderá ser vista também, entre outros, no Rivoli Teatro Municipal do Porto, em Junho, no FITEI – Festival Internacional de Teatro de Expressão Ibérica. Ao desafio lançado por Tiago Rodrigues, director do Teatro Nacional D. Maria II, de coreografar a partir de uma tragédia grega, sugerindo para o efeito a Medeia de Eurípides, Marlene responde com a proposta de coreografar As Bacantes porque, como refere, “trata-se da tragédia onde a polaridade entre racional e irracional é mais marcada e, por não a compreender inteiramente”, impôs-se assim o desejo e a curiosidade de trabalhá-la. É ainda a tragédia onde figura o desvario de uma mãe, Agave, que em estado de delírio sob as forças de Dionísio mata o seu próprio filho Penteu, convencida de se tratar de uma presa selvagem. E é no desfecho da tragédia, no confronto desta mãe em delírio perante o seu próprio pai Cadmo, rei de Tebas, aquele que lhe dá a ver o seu acto irracional, que Marlene encontrou um dos momentos mais marcantes para esta criação. Não nos surpreende que estas sejam algumas das premissas para estas Bacantes, de Marlene Monteiro Freitas, coreógrafa cuja obra se tem pautado pela “intensidade, estranheza e abertura”. A curiosidade pelo incompreensível e pelo irracional, e o desejo de construir situações em palco que escapam a linearidade sequencial da narrativa, e não se prestam a uma leitura da ordem da linguagem, mas da montagem onírica da imaginação são algumas das forças coreográficas de Marlene. Como tal, são obras plenas de contradições, de opostos em tensão, de forças que escapam a uma lógica do sentido. “É um pouco como nos sonhos”, refere, “em que as imagens se podem suceder de forma ilógica, contraditória, estranha, deslocando. . . com os estados emocionais que lhes são próprios”. Nas suas propostas dissolve-se a lógica de causa-efeito. A criação alicerça-se em pesquisas de referências que a vão informando. Da literatura, às imagens, às composições musicais, ao cinema, entre outros, a coreógrafa vai construindo uma montagem viva de elementos, qual atlas imagético-sonoro, que acompanha e contamina a criação. Esse reverbera depois no corpo, no movimento e na vida da própria obra, para a qual Marlene nem sempre encontra todas as respostas. Assim, muito embora tenha ancorado a criação da peça no texto original da tragédia, não o incorpora na peça. Porque “a dança é de outra ordem do teatro”, lembra, esta peça não se trata de uma encenação teatral, mas de uma leitura coreográfica da tragédia grega As Bacantes, de Eurípides. É a tragédia que propõe uma ficção a partir de rituais dionisíacos que eram praticados na antiga Grécia. Rituais extáticos e de delírio em honra do deus Dionísio, que não só evidenciam o elemento irracional no comportamento humano, como expunham o modo como os humanos, incautos, eram castigados se não reconhecesse a superioridade dos deuses. Dionísio era a divindade da fertilidade agreste, da hera e da vinha. Deus do vinho, e com ele da embriaguez e das alterações da consciência (para os Gregos vitais para suportar as agruras da vida). Era ainda o deus da máscara e do teatro. O estrangeiro de figura andrógina que vinha de fora, o deus da epifania que encarnava o animal de chifres, e que trazia consigo os seus mistérios, os cortejos chamados tíasos dionisíacos. Não se tratavam de fenómenos individuais, mas de manifestações colectivas que contagiavam aqueles por quem passavam, não admitindo a passividade da contemplação. As Bacantes, ou Ménades, eram as figuras que o seguiam, femininas ou travestidas, empunhando os tirsos, bastões com heras e poderes divinos, em plena comunhão não só com o deus mas também com a natureza. Nesta tragédia, Dionísio, o único deus filho de uma mãe humana, vinga aqueles que não o reconhecem como divino e os que resistem às suas forças incontroláveis com castigos imponderáveis. Dionísio propunha um outro modo de sabedoria que não a sophia sensata e racional dos filósofos atenienses, criticada a seu tempo por Nietzsche. Em O Nascimento da Tragédia, Nietzsche propôs que a verdadeira tragédia grega deveria reflectir as emoções humanas mais profundas, e não ser sacrificada pelas tendências do racionalismo e da autoconfiança optimista de que Sócrates e seus seguidores, onde incluía também Eurípides, seriam um exemplo. Para Nietzsche, toda a criação artística surgia do impulso complementar das forças apolínea e dionisíaca. Se a generalidade da obra de Eurípides foi recebida como confirmação do declínio moral e artístico da sociedade ateniense, privilegiando o intelectualismo em detrimento do instinto artístico, As Bacantes, em fim de carreira, terá sido a sua obra redentora que recupera a relevância de Dionísio. “A tragédia nasceu do génio da música”, continua Nietzsche, ideia recuperada por Marlene Monteiro Freitas, que coloca a música em estreita relação com As Bacantes, partindo da imagem inicial de uma orquestra de música para a criação desta peça. Assim, treze músicos e bailarinos em palco trabalham juntos a partir deste mote musical. São eles Andreas Merk, Betty Tchomanga, Cookie, Cláudio Silva, Flora Détraz, Gonçalo Marques, Guillaume Gardey de Soos, Johannes Krieger, Lander Patrick, Miguel Filipe, Tomás Moital, Yaw Tembe e Marlene Monteiro Freitas. Quase todos próximos da coreógrafa, recordamos alguns das suas criações anteriores, como em paraíso – colecção privada (2012), de marfim e de carne – as estátuas também sofrem (2014) e no magnífico dueto expressionista com Andreas Merk, em Jaguar (2015). “Música e mito trágico”, referiu Nietzsche, “são expressões da faculdade dionisíaca de um povo, e são inseparáveis”. Ou, como nos lembra Marlene, “a música pode tocar-nos de modos diversos, e em partes físicas e sentidos diferentes”. A propósito do trompete e da escolha dos instrumentos, nota Marlene: “este é o instrumento mais próximo da voz humana, da loucura, do sopro, do vento. . . ”. Além disso, trata-se de um objecto com uma relação íntima com o músico através da boca e da respiração, combinando forças tão opostas que vão desde “a tristeza e o fúnebre, à alegria, ao estridente e ao carnavalesco”. Curiosamente, e ainda sobre a composição musical, As Bacantes é a única tragédia grega onde há referência a instrumentos de percussão, os tamboris. A peça desenrola-se com figuras em situações de delírio, metamorfose e desdobramento, expondo o confronto e a tensão entre forças incontroláveis. A Marlene interessam-lhe não as dicotomias e as partições, mas “a circularidade de opostos, a tensão de forças que rasgam o espectável mas que inexplicavelmente se complementam”. Tanto os trompetes, como as estantes de orquestra metamorfoseiam-se, e prestam-se a usos e modos vários, ganhando vida própria. Os trompetes tornam-se narizes, flautas. . . e as estantes lembram os míticos tirsos dos rituais dionisíacos. Podemos falar de animismo e antropomorfismo, mas também de uma relação com a robótica, neste encontro entre os limites do homem com os objectos, a máquina e o cartoon. A liberdade a que se presta o antropomorfismo dos objectos, assim como o clownesco e o cartoon, permite escapar à lógica da causa-efeito, e tornar o improvável possível. Do mesmo modo, o recurso ao instrumento do deus ex machina, o artifício teatral que surge sem sentido nem contexto, permite fazer do teatro esse lugar de onde se pode ver o inesperado. E retomando esta noção etimológica do teatro—como lugar a partir do qual se vê—também para estas Bacantes o olhar, o rosto e, com ele, a máscara adquirem um relevo particular. O rosto como lugar de identificação do sujeito tem assumido desde sempre relevância em toda a obra da Marlene, nomeadamente, através da exploração dos olhos e da boca, e dos esgares de destabilização da face, a zona por excelência de reconhecimento (e metamorfose) do sujeito. Dionísio, por sua vez, era também o deus da máscara e do teatro. A divindade que entrava em contacto com os seus seguidores através do olhar. O modo como os gregos representavam as figuras pictoricamente nos vasos, na pedra, ou no teatro, tornou-se fulcral para a coreógrafa pensar a organização das figuras no espaço, a relação entre elas e com os espectadores. E para esta pesquisa, Marlene assinala a obra da historiadora Françoise Frontisi-Ducroux como uma referência na sua investigação, nomeadamente, o seu estudo sobre a relação muito particular entre máscara e rosto na Grécia antiga. A ideia de força que Frontisi-Ducroux propõe é o facto de a máscara na cultura grega não ocultar a face de quem a carrega mas, pelo contrário, servir para a revelar e identificar. Em grego antigo, a mesma palavra proposon significa máscara e rosto. A partir deste sentido dúplice e ambivalente, Frontisi-Ducroux explora a identidade na cultura grega, a relação com o outro e a representação artística da mesma. A máscara não esconde o rosto do ator trágico. A máscara é o rosto, a máscara é o deus, o que altera significativamente o modo como nós encaramos hoje máscara e o lugar do ator na representação dramática. Isso libertou a coreógrafa de filtros: “o que vemos é aquilo que é”, diz-nos Marlene. Autoria:Eurípides (a partir de), Marlene Monteiro Freitas Produção:P. OR. K Teatro Nacional D. Maria II, Lisboa, Quarta, de 20 de Abril de 2017 a 30 de Abril de 2017 às 19h Teatro Nacional D. Maria II, Lisboa, Domingo, de 20 de Abril de 2017 a 30 de Abril de 2017 às 16h Teatro Nacional D. Maria II, Lisboa, Quinta a Sábado, de 20 de Abril de 2017 a 30 de Abril de 2017 às 21hAlém disso, as figuras gregas eram representadas em posições diferentes consoante a situação em que se encontravam. Figuras de guerra, de morte, de amor ou de embriaguez eram geralmente representadas em posição frontal, interpelando em relação direta o observador. Figuras em diálogo, ou em estado de sono, era representadas em perfil, pois não estavam em relação direta com o espectador. Este ênfase do olhar e da expressividade do rosto, levaram a coreógrafa a concentrar a coreografia no proscénio, na parte frontal do palco, mais próxima do público. E serão muitas outras as referências que informam directa ou indirectamente este encontro coreográfico entre Marlene Monteiro Freitas e As Bacantes. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Desde as tragédias contemporâneas de barcos que se afundam, aviões que caem, à materialidade do plástico que invade os oceanos e que reconhecemos nos figurinos, às peças dos legos, aos cartoons, às diversas representações de Pietás, de mães que matam os seus filhos, ou que os fazem nascer. O excerto do documentário de Kazuo Hara que é projectado durante a coreografia, e que mostra a cena de um parto da sua ex-mulher, que decide ter o filho sem qualquer interferência nem ajuda é um desses exemplos extremos e de grande intensidade na peça. A exposição da animalidade da natureza humana, daquilo que, uma vez mais, escapa à ordem da linguagem e da razão, ao entendimento científico e antropocêntrico do mundo, também este, mais-do-que-humano. Relações e polaridades extremas que conectam a morte à vida, o nascimento à perda, e exploram a dinâmica circular entre estas. Certamente que As Bacantes. Prelúdio para uma purga, de Marlene Monteiro Freitas falará por si própria. Como nos adverte a coreógrafa, “daqui eu tenho de ir para ali, e entre estas duas coisas há um mundo que eu ainda desconheço”.
REFERÊNCIAS:
Souto de Moura põe Bragança a conversar sobre arquitectura
Arquitecto é o homenageado na edição deste ano do Plast&Cine, que decorre esta sexta-feira e sábado. Hoje encontra-se com Álvaro Siza, numa sessão moderada por Ana Sousa Dias. (...)

Souto de Moura põe Bragança a conversar sobre arquitectura
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-06-02 | Jornal Público
SUMÁRIO: Arquitecto é o homenageado na edição deste ano do Plast&Cine, que decorre esta sexta-feira e sábado. Hoje encontra-se com Álvaro Siza, numa sessão moderada por Ana Sousa Dias.
TEXTO: O premiado arquitecto português Eduardo Souto de Moura é o homenageado do Plast&Cine 2017, um certame que, esta sexta-feira e sábado, põe Bragança a conversar sobre arquitectura e a fazer arte pública, de acordo com a organização. Hoje e amanhã, Bragança junta Souto de Moura e Álvaro Siza, os dois arquitectos portugueses distinguidos com o prémio Pritzker, além de vários outros convidados, e promove exposições, conferências, espectáculos, envolvendo também a comunidade local. Esta será a segunda vez que a cidade transmontana acolhe o Plast&Cine, depois de, em 2015, a pintora transmontana Graça Morais ter sido a homenageada no evento, resultado de uma parceria entre a Câmara de Bragança e a Editorial Novembro - Edições Cão Menor. Há sete anos que o Plast&Cine homenageia, em cada edição, uma figura das Artes e a sua obra com eventos que permitem revisitar o espólio e o legado artístico e a interacção de diferentes públicos, contando para o efeito com a presença do homenageado. O Plast&Cine homenageou, em 2009, Emília Nadal; no ano seguinte José Rodrigues; em 2011, Cruzeiro Seixas; em 2012, Roberto Chichorro; e, em 2013, Júlio Pomar, tendo as primeiras edições decorrido na cidade de Lamego. Eduardo Souto de Moura é a personalidade em destaque nesta edição em Bragança, cidade onde assinou dois projectos de espaços culturais emblemáticos, nomeadamente o Centro de Interpretação da Cultura Sefardita do Nordeste Transmontano e o Centro de Arte Contemporânea Graça Morais. Estes dois equipamentos culturais localizam-se na Rua de Abílio Beça, que é já conhecida como "a rua dos museus". É no Centro de Arte Contemporânea que vão decorrer alguns dos eventos previstos para estes dois dias. Hoje será inaugurada a exposição Eduardo Souto de Moura - Proporção e Desígnio, e realizar-se-á a iniciativa À conversa com Souto de Moura e Siza Vieira, conduzida pela jornalista Ana Sousa Dias. Entre os dois eventos, está também programada uma visita ao Centro de Interpretação da Cultura Sefardita. A homenagem começa, contudo, na rua, em plena praça da Sé, a zona central da cidade que acolherá uma exposição de arte pública realizada pelos alunos das escolas e por utentes das Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS) de Bragança. Das escolas e das IPSS da cidade surgiram também outros trabalhos sobre o homenageado que podem ser visitados na exposição, a inaugurar no Centro de Fotografia Georges Dussaud. Esta edição do Plast&Cine conta com a colaboração da Atarqui, a Associação Transmontana de Arquitectos, que preparou a exposição Arquitectura na Rua, apontada pela organização como "um dos momentos altos do evento". Trabalhos da autoria de 14 arquitectos vão ser mostrados em expositores, nas montras e fachadas de lojas comerciais do centro da cidade, segundo a organização. Outro dos destaques desta edição fica reservado para o segundo dia do programa com a conferência Conversas de Arquitectos, no Centro de Arte Contemporânea Graça Morais. A iniciativa "vai tratar da arquitectura tradicional na actualidade, sem esquecer os temas que são caros à região como Pombais do Nordeste Transmontano, Construção sustentável /ecológica e Reboco/revestimento tradicional, entre outros". Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. A obra de Souto de Moura no Centro de Arte Contemporânea de Bragança será o tema da conferência de encerramento, precedida pelo lançamento do livro PLAST&CINE 2015 Graça Morais, Vida e Obra, alusivo à homenagem feita, em 2015, à pintora transmontana. O Plast&Cine 2017 encerra com o espectáculo teatral Variações de António, no Teatro Municipal de Bragança.
REFERÊNCIAS:
Fortaleza de Peniche deverá ser um museu nacional da resistência
Proposta do grupo consultivo prevê a concessão de espaços para restaurante e cafetaria, mas não para uma pousada. (...)

Fortaleza de Peniche deverá ser um museu nacional da resistência
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DATA: 2017-06-02 | Jornal Público
SUMÁRIO: Proposta do grupo consultivo prevê a concessão de espaços para restaurante e cafetaria, mas não para uma pousada.
TEXTO: O grupo consultivo nomeado pelo ministro da Cultura para encontrar uma solução para o futuro da Fortaleza de Peniche chegou à conclusão de que este monumento nacional não deve ser parcialmente transformado numa pousada, como previa o Revive, o programa criado pelo Governo tendo em vista a recuperação do património para fins turísticos. A fortaleza, diz o documento entregue esta segunda-feira ao ministro, deve ser, prioritariamente, afectada a um museu, mas a proposta prevê também a existência de restaurante, cafetaria, auditório e posto de turismo cultural. A Fortaleza de Peniche, cuja construção recua até ao século XVI-XVII, deve grande parte da sua fama a ter guardado a mais infame prisão política do Estado Novo, onde foram presos durante 40 anos os opositores ao regime ditatorial. Foi aqui que se deu a célebre fuga de Álvaro Cunhal, secretário-geral do PCP. A "afectação prioritária à função museológica", acrescenta o documento de 14 páginas, passa por um projecto capaz de se afirmar "como testemunho vivo da repressão nas prisões do regime fascista, mas também da luta pela liberdade e a democracia", permitindo "sobretudo às novas gerações um contacto directo, pedagogicamente orientado, com essas realidades e memórias". Ao mesmo tempo, "a recuperação e requalificação da Fortaleza de Peniche para esse fim é um acto de justiça". Foi com estes dois pontos que depois de receber a proposta o ministro da Cultura se comprometeu. "O que diz respeito à nossa parte é o museu nacional da resistência – se lhe quisermos assim chamar, depois veremos o nome –, e a recuperação patrimonial", explicou ao PÚBLICO Luís Filipe de Castro Mendes. O museu terá "uma dimensão nacional", mas para já é prematuro definir se o termo significa a sua integração no organismo da Cultura responsável pelos museus nacionais, que é a Direcção-Geral do Património Cultural. Para o modelo de gestão, o grupo defende "a criação de uma entidade gestora" da fortaleza, com "modelo e mandato legal" definidos, que tenha a "participação da administração central, local e outras entidades". Pediu também a designação "de uma comissão específica para a instalação do núcleo museológico". O presidente da Câmara Municipal de Peniche, António José Correia, sublinha ao PÚBLICO que o documento apresentado ao ministro pelo grupo de trabalho foi aprovado por unanimidade. A expectativa deste independente eleito pela CDU (PCP e Os Verdes), que está no seu último mandato, é que seja anunciada alguma coisa ainda em Abril, no mês da liberdade, a partir do "conjunto de pistas de utilização" avançado pelo grupo de trabalho. Mas avisa: “Sem dinheiro não se compram melões. ”“O grupo fez uma proposta ao ministro. Para lá do que o grupo propôs fazer, estou expectante com o que o Governo quer fazer. Ou seja, o que vai fazer com base nos contributos que recebeu. ” A unanimidade que o grupo foi capaz de encontrar, ressalva, não se reflectiu na Câmara Municipal de Peniche, onde o PSD votou contra a proposta apresentada no documento — por “não dar qualquer garantia de financiamento” e “não deixar claro” que entidades assumirão a gestão, justificou à Lusa o vereador social-democrata Filipe de Matos Sales. Actualmente, apesar de aí estar instalado o Museu Municipal de Peniche, com um núcleo dedicado à resistência ao fascismo e outro às artes da pesca, a Fortaleza de Peniche apresenta partes muito degradadas. Num orçamento preliminar feito no passado, a Câmara de Peniche avançava com 5, 5 milhões de euros só para obras de conservação. O projecto museológico, defende o grupo, deve incluir as diversas fases históricas da fortaleza e abrir-se à "criação de um núcleo de actividades e negócios ligados ao mar", albergando, nomeadamente, "uma incubadora de empresas ligada à economia do mar, atraindo startups associadas à indústria do surf e desportos de ondas, pesca, biologia marítima e turismo". Sobre a vertente tecnológica ou das startups ligadas ao mar, o ministro da Cultura diz que “há muitas ideias”, mas que os dois grandes objectivos do Ministério da Cultura são “o museu” e “a conservação do monumento, que tem a ver com a fortaleza seiscentista e com a memória da resistência contra o fascismo e a luta pela liberdade”. “A parte cientifica-tecnológica e a das startups ligadas ao mar são ideias excelentes, mas isso é melhor perguntar aos meus colegas da ciência e da economia, porque todos os planos são bem-vindos. "Avanços e recuosFoi em Setembro do ano passado que o Governo de António Costa anunciou a inclusão do projecto de adaptação da Fortaleza de Peniche a pousada no Programa Revive, que pretende concessionar cerca de 30 monumentos degradados a investidores privados durante períodos de 30 a 50 anos, tendo como contrapartida a sua reabilitação, num investimento previsto de 150 milhões de euros. Um mês depois, em Outubro, foi entregue uma petição na Assembleia da República, defendendo que a decisão punha em causa “a preservação da memória histórica do que foi o regime fascista e a luta pela liberdade, bem como as funções e características do monumento”. Já em Novembro, o Forte de Peniche acabaria por ser retirado do Programa Revive. Nessa altura, o presidente da Câmara, que defendia a instalação de uma pousada na fortaleza, apresentou o seu protesto junto do ministro da Cultura, lamentando que a fortaleza fosse retirada do programa sem uma contraproposta. Já este ano, o Ministério da Cultura nomeou o grupo de trabalho que agora apresentou esta proposta, com o objectivo de apresentar possíveis usos para a fortaleza. O grupo, presidido pela directora-geral do Património, é constituído por dez pessoas, quatro das quais foram nomeadas pelo ministro da Cultura (Adelaide Pereira Alves, do PCP; Alfredo Caldeira, do Arquivo e Biblioteca da Fundação Mário Soares; Gaspar Barreira, ex-preso político e cientista; e José Pedro Soares, ex-preso político e membro da União dos Resistentes Antifascistas Portugueses). Além de Paula Silva, os representantes da administração pública são Jorge Leonardo, chefe do gabinete do ministro da Cultura, Hernâni Loureiro, adjunto do mesmo ministro, Inês Sequeira, representante da Secretaria de Estado do Turismo, e António José Correia, presidente da Câmara de Peniche. Este último indicou ainda o historiador João Bonifácio Serra. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. O documento entregue pelo grupo tem ainda um último capítulo dedicado ao financiamento e ao modelo de gestão da fortaleza. Defende-se que é preciso executar o que já ficou previsto em sede de discussão do Orçamento de Estado para 2017, quando foi aprovado um plano urgente de reabilitação da fortaleza (apesar de isso não ter tido qualquer expressão no orçamento). Os peritos querem “um programa plurianual de financiamento para a recuperação e valorização da Fortaleza de Peniche, bem como uma rúbrica orçamental em sede de Orçamento de Estado destinada à gestão pública do complexo da fortaleza”. Na construção de um orçamento destinado à gestão do museu, prevê-se como “outras fontes de financiamento” a concessão de espaços, ao lado do mecenato, do crowdfunding, dos fundos comunitários, do orçamento municipal e da bilhética. O ministro diz que o projecto "não é para se fazer num espaço curto de um exercício orçamental": "Posso dizer é que este ano vamos fazer alguma coisa e que certamente entre as tarefas que temos está a elaboração desse orçamento plurianual. " Com verbas, "embora haja muitos números a circular", Castro Mendes não se quer comprometer.
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Partidos PSD PCP
No Museu do Dinheiro, Luís Silveirinha transfigura uma iconografia
No Museu do Dinheiro, Luís Silveirinha transfigura uma iconografia, fazendo nascer imagens de outras imagens. (...)

No Museu do Dinheiro, Luís Silveirinha transfigura uma iconografia
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-06-02 | Jornal Público
SUMÁRIO: No Museu do Dinheiro, Luís Silveirinha transfigura uma iconografia, fazendo nascer imagens de outras imagens.
TEXTO: O Museu do Dinheiro tornou-se um lugar em que os artistas mostram e fazem o seu trabalho. O mérito é de Sara Barriga (coordenadora do núcleo do museu), da sua equipa, e, claro está, dos artistas: Pedro A. H. Paixão, Teresa Milheiro, Pedro Valdez Cardoso e Nuno Henrique, aos quais se junta agora Luís Silveirinha (Campo Maior, 1969), com o seu paciente e generoso trabalho de desenho. Chama-se Arquivo, o projecto em que reinterpreta as moedas do museu, recorrendo a materiais que têm acompanhado a sua obra e objectos que, pela primeira vez, integram o seu fazer. Há, portanto, uma continuação e, em simultâneo, um desvio. Luís Silveirinha experimenta formatos e escalas distintas, diferentes modos de relação com as obras, abrindo o seu gesto a uma conversa com outra iconografia: a da numismáticaNo contexto actual da arte portuguesa, o desenho de Luís Silveirinha aparece peculiar, dir-se-ia mesmo, raro. Sopra contornos de monstros, de figuras humanas, de símbolos, de seres mitológicos, plantas e animais. É redondo, cheio, comunicativo, tão cheio de sombras, como de formas nítidas, tão acessível, em termos de estilo, como fugidio, pois não se completa, não se fecha. Como refere João Silvério, curador da exposição, Luís Silveirinha é um artista que parece remeter-nos para outro tempo, para referências passadas. Ouse-se, então, mencionar artistas cuja vizinhança Luís Silveirinha poderia partilhar: Joaquim Rodrigo, Pedro Proença, William Kentridge, Fátima Mendonça, Pedro AH Paixão. Vizinhança com intervalos, clareiras, distância. Artista(s):Luís Silveirinha Museu do Dinheiro, Lisboa, Quarta a Sábado, de 23 de Março de 2017 a 10 de Junho de 2017 das 10h às 18hSubscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. No Museu do Dinheiro, Luís Silveirinha estudou uma selecção de moedas e transfigurou-as sobre o papel, evocando com a memória, imagens mentais que resultaram não apenas dessa pesquisa, mas, igualmente, de outros desenhos, de outras exposições; há um bestiário, um vocabulário fantástico que desagua no Museu do Dinheiro. As efígies, as figuras, os símbolos, as tipologias, que ele descobriu (como se fossem desenhos perdidos, pinturas rupestres tapadas pelo negro), fazendo revelar o lápis de cera na tinta-da-china, resultaram de um processo de desenho que faz e liberta imagens. Esse deleite, quase obsessivo, marcara Impulsão, na galeria Alecrim 50, em Lisboa, no ano passado. Aí com um trabalho de sobreposição e revelação, acrescentou e fez novos desenhos sobre páginas de um Atlas Mundial. Esta inclinação para o palimpsesto retoma em Arquivo. Também aqui faz imagens de outras imagens, também aqui destrói objectos para deles fazer obras artísticas. Em Arquivo, Silveirinha confronta-se com a presença do simbolismo da moeda. Em frente do antigo altar-mor da Igreja de S. Julião (onde o Museu do Dinheiro está instalado) o espectador vê um conjunto de peças circulares assentes sobre plintos. Têm as superfícies gravadas com desenhos e embora possam ser rodados com as mãos, estão ali para serem vistos: o movimento é limitado. Já o conjunto de trabalhos que, na sala, surgem suspensos do tecto solicitam uma aproximação distinta. Construídos a partir de discos em vinil (em formato LP), apresentam dois lados, mas não rodam, nada os faz girar. Sem os elementos que lhes atribuíam uma autoria ou história, são objectos anónimos que o desenho destruiu antes de salvar. É como se Luís Silveirinha, contra o desgaste ou a ameaça do esquecimento, lhes devolvesse uma nova vida, acrescentando-lhes o seu, nunca fixo, sempre imprevisível reportório visual. Noutro trabalho, o desenho reaparece no papel, com guache sobre capas de discos, formando uma profusão de formas circulares que vão ocupando toda a superfície. Imagens de medalhões, moedas, objectos circulares. Tal acumulação dissolve-se ou reduz-se nos dois desenhos de maior dimensão, intitulados “Avareza” e “Fortuna” que podem ser vistos no coro alto, no segundo piso do museu. O espectador será tentado a estabelecer uma relação de sentido entre estes conceitos e os estranhos seres que habitam os desenhos. E a tentação é compreensível. Os traços, as sombras, o carácter
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave campo negro
O lugar-comum é uma arma de destruição maciça
Nuno Carinhas e Nuno M. Cardoso encenaram Os Últimos Dias da Humanidade, obra-prima de Karl Kraus, evitando domar o monstro feito das vozes da sociedade vienense que na sua atroz banalidade ajudaram a conduzir à I Guerra Mundial. (...)

O lugar-comum é uma arma de destruição maciça
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-06-02 | Jornal Público
SUMÁRIO: Nuno Carinhas e Nuno M. Cardoso encenaram Os Últimos Dias da Humanidade, obra-prima de Karl Kraus, evitando domar o monstro feito das vozes da sociedade vienense que na sua atroz banalidade ajudaram a conduzir à I Guerra Mundial.
TEXTO: Subiu esta quinta-feira à noite ao palco do Teatro Nacional de S. João (talvez seja mais exacto dizer que subiu à plateia, coberta para o efeito por uma plataforma onde decorre toda a acção) a primeira parte de Os Últimos Dias da Humanidade, do escritor austríaco Karl Kraus, uma peça que o próprio autor estimava só poder ser representada num teatro de Marte, já que o público terrestre não a conseguiria suportar, quer pela sua desmedida extensão, quer por ser feita das palavras que geraram a guerra e, por isso, ser “sangue do seu sangue”. Das 209 cenas da versão original, os encenadores Nuno Carinhas e Nuno M. Cardoso, com a colaboração de Pedro Sobrado e João Luís Pereira, do departamento de edições do TNSJ, seleccionaram cerca de metade, que em alguns casos sofreram ainda cortes significativos. Mesmo assim, o que resta chega para seis horas de representação, divididas em três partes — Esta Grande Época, Guerra é Guerra e A Última Noite — e obriga um já de si considerável elenco de 21 actores a desdobrar-se em quase 200 personagens. Até 18 de Novembro, as três partes em que se reformataram os cinco actos da peça original (aos quais se somam um prólogo e um epílogo) ir-se-ão revezando no Teatro São João, estando depois prevista para dia 19 uma verdadeira prova de resistência para actores e espectadores, com uma interpretação integral que, incluídos dois intervalos, durará nada menos do que oito horas, das 15h às 23h. No sábado anterior, dia 12, o tradutor de Os Últimos Dias da Humanidade, António Sousa Ribeiro, a jornalista Cândida Pinto e os historiadores José Pacheco Pereira e Rui Bebiano participarão na conferência Laboratórios do Apocalipse, organizada pelo TNSJ e moderada por Bruno Monteiro. Após a guerra, Kraus recusou várias propostas de produção da sua gigantesca peça, mas ele próprio escreveu mais tarde uma dramaturgia abreviada, na qual prescindiu de um par de personagens que aparecem quase sempre em diálogo e são recorrentes ao longo do texto: O Eterno Descontente, espécie de alter-ego do autor, e O Optimista, que dá ao primeiro as deixas para os seus discursos. Nuno Carinhas nota que também seria possível fazer o contrário e reduzir a dramaturgia aos diálogos do Eterno Descontente e do Optimista, mas ele e Nuno M. Cardoso não seguiram nenhum destes caminhos e propuseram-se “respeitar o lado monstro da obra”. Isto é, cortaram, mas tentando não sacrificar a espantosa diversidade de registos do texto, uma variedade que não reside apenas na profusão de vozes convocadas, mas no catálogo de formas dramáticas que a peça integra: “Há coisas que vão do drama burguês a um teatro épico avant la lettre, mas também alegorias ao estilo do teatro medieval, com cavalos que falam e forças naturais que intervêm”, nota Pedro Sobrado. Os ensaios só começaram em Agosto, um tempo francamente curto para os actores interiorizarem esta imensa colagem de vozes numa peça que, sublinha Nuno M. Cardoso, é “feita de fragmentos, de vozes, sem evolução das personagens”. Mas a pré-história desta encenação pode situar-se em Junho de 2013, quando os dois encenadores levaram ao Serralves em Festa leituras de Os Últimos Dias da Humanidade. Mais tarde, ao dinamizar no TNSJ um projecto chamado Ginásio de Actores, Nuno M. Cardoso pôs estudantes de teatro e jovens profissionais a trabalhar com o texto de Kraus, e muitos deles acabaram neste elenco, a contracenar com um núcleo de actores mais experientes. Kraus disse que, nesta peça, quis pôr o seu tempo entre aspas, isto é, quis citá-lo literalmente. As falas mais deliciosamente inverosímeis são quase sempre transcrições fiéis de jornais, cartas e outros documentos da época. Um bom exemplo disso é Schalek, uma correspondente de guerra inebriada com a frente de batalha (interpretada por Sara Barros Leitão), que se limita a repetir, enquanto personagem, o que a jornalista real escreveu nas suas reportagens. Numa das cenas desta primeira parte, a intrépida Schalek pergunta a um tenente cujo sargento acabou de morrer: “Ora diga-me, em que é que está a pensar agora, o que é que lhe vai na alma?”. Soa-lhe familiar? Esta é definitivamente uma peça que não se recomenda a jornalistas demasiado susceptíveis. Para lá do pretexto do centenário da I Guerra e do gosto de Nuno Carinhas por peças “não muito acabadas, com impurezas”, foi também a óbvia actualidade do texto que motivou “os Nunos”, como algum do pessoal do TNSJ se refere economicamente à dupla de encenadores. “Isto não está localizado na História, tem ecos muito presentes”, observa Carinhas, argumentando que, cem anos depois, as questões de cidadania que Kraus levanta, ou a sua crítica aos meios de informação, não perderam pertinência. E lembrando que “uma frase muito ouvida na peça é ‘foi lá acima e desenrascou-se’”, sugere que também “nessa movida de interesses e oportunismos não se vê mudança nenhuma”. António Durães, a quem coube a dura tarefa de dar corpo ao Eterno Descontente — é o único dos 21 actores que só desempenha um papel —, concorda que “a actualidade da peça é assustadora” e que isso não facilita a vida aos actores. “É que, no confronto com o passado, estamos constantemente a falar do presente, as coisas estão a acontecer”, observa. Mas se o presente se intromete no passado, há também o reverso da medalha: “Cem anos na história da humanidade não significam nada, mas para nós, que estamos a fazer esta peça, é um tempo longínquo, que fica muito para trás das nossas vidas, de que nos esquecemos, e trabalhar este material, trazer esta história novamente para a nossa mesa, comer com ela, conviver com ela, não é fácil”. Vendo no Eterno Descontente, cujas falas tanto se resumem a breves tiradas irónicas como se estendem por dezenas de páginas de indignada retórica, ���uma extensão do próprio Kraus”, Durães atribui à sua personagem o papel destinado ao Coro nas tragédias gregas. “O Eterno Descontente chega, reflecte, previne, adivinha, e se há dom que o Kraus teve foi o de ser capaz de antecipar muitas das coisas que nos atormentam há cem anos”, diz o actor, para quem uma das ideias centrais da peça é de que a decadência da linguagem é uma das causas da guerra. “A humanidade tornou a linguagem uma coisa imediata, sem pensamento, e isso facilita que a seguir à palavra suceda um gesto qualquer que dá azo a um conflito”. Há, de resto, um diálogo em que o Optimista pergunta ao Eterno Descontente se “está então em condições de estabelecer uma relação palpável entre a língua e a guerra”, e este responde que “aquela língua que mais se cristalizou na frase feita e no lugar-comum também tem a disposição para achar irrepreensível em si própria tudo aquilo que, nos outros, é digno de reparo”. O tradutor da peça, António Sousa Ribeiro, professor catedrático da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, que já tinha publicado uma primeira versão parcial de Os Últimos Dias da Humanidade na Antígona, e que agora concluiu e reviu o seu trabalho para esta encenação (a edição integral irá ser publicada pelo TNSJ), confirma que “aquilo que Kraus interpreta como degradação da linguagem é um fio condutor fundamental” da peça, e lembra que já quando o autor lançou a sua revista, Die Fackel, em 1899, assumira como programa “drenar o vasto pântano dos lugares-comuns”. E Kraus, acrescenta, “vai associar cada vez mais ao jornalismo este empobrecimento da linguagem, que destrói a imaginação, tornando os seres humanos capazes de ouvir falar das piores atrocidades sem compreenderem o que estas representam para as pessoas concretas e dispondo-os para a violência e para aceitação passiva da guerra”. Mas Kraus também não poupa os muitos escritores e intelectuais austríacos do seu tempo que alinharam na incendiária retórica nacionalista, e que figuram na peça com os seus próprios nomes. Uma das cenas mais divertidas da primeira parte é o diálogo entre O Assinante [do jornal Neue Freie Presse, que Kraus abominava], interpretado por João Cardoso, e a personagem do Patriota (Marcello Urgeghe), a propósito do poeta Hans Müller (Miguel Loureiro), que em Berlim “deu uma beijoca em plena rua a um simples soldado”, e que escrevia entusiásticos artigos da frente de combate confortavelmente instalado em Viena. “Naquele contexto”, diz Sousa Ribeiro, “a cultura tornou-se uma arma de destruição maciça”. Para o tradutor de Os Últimos Dias da Humanidade, Kraus é o maior autor satírico do século XX, e a sua sátira, explica, combina as duas grandes tradições do género, a que vem de Horácio, centrada na ironia, e a sátira indignada, de cariz patético, que remonta a Juvenal. Essa alternância entre ironia e pathos está bem presente no espectáculo do TNSJ, onde momentos divertidíssimos e tiradas da mais fina ironia convivem com alguns discursos inflamados do Eterno Descontente, que escarnecem sem pretender provocar o riso. Nesta encenação, e ao contrário do texto original, a acção começa já depois do assassinato do arquiduque Francisco Fernando, com um extenso telefonema em que o director de protocolo da corte austro-húngara, Nepallek, se diverte a lembrar ao seu interlocutor tudo o que foi feito para garantir que o funeral do herdeiro do trono tivesse o mínimo de pompa possível. É um notável one-man show do actor Pedro Almendra a abrir esta primeira parte, que inclui várias outras cenas hilariantes, como a do professor Zehetbauer (um dos vários papéis de João Castro), que põe a turma a cantar o hino patriótico Cuidai do Turismo!. É também no primeiro acto que está a cena em que Kraus dá um tom mais caricatural à sua crítica da imprensa, com três repórteres que recebem a actriz Elfriede Ritter (Teresa Arcanjo), recém-chegada da Rússia, e usam as suas palavras para a pôr a dizer o contrário do que efectivamente disse. Se na primeira parte o palco, montado sobre a plateia, é uma plataforma simples, que os espectadores vêem de cima, a partir da tribuna e das frisas, mas também de uma estrutura erguida no extremo oposto da sala (os actores estão sempre, por assim dizer, entre dois fogos), na segunda parte o cenário complica-se com a introdução de uma série de estrados, que servem para simular uma visita (ela própria simulada) às trincheiras, mas também, por exemplo, para hierarquizar no espaço os vários estratos da sociedade vienense. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Autoria: Karl Kraus Encenação: Nuno Carinhas, Nuno M Cardoso Cenografia: Nuno Carinhas Tradução: António Sousa Ribeiro Desenho de luz: Wilma Moutinho Música: Jonathan SaldanhaO momento mais notável desta segunda parte é provavelmente a conversa de quarto entre o conselheiro Schwarz-Gelber e a sua esposa. Num ensaio incluído no manual de leitura da peça organizado pelo TNSJ, Robert Calasso cita esta cena como exemplo de “comicidade aterradora” e não hesita em afirmar: “Nenhum dos grandes dramaturgos do século XX concebeu algo de comparável. E talvez só Ernst Lubitsch tivesse podido filmá-lo adequadamente”. No terceiro acto, prepare-se para um discurso do Eterno Descontente que é tão longo que se achou melhor que Durães o dividisse com outros actores, e também para o alucinado final, onde Kraus dá voz a cavalos e cães, a soldados mortos e até a um filho por nascer. E, cumprido o apocalipse, a última voz a ouvir-se é, claro, a de Deus, que diz apenas uma pequena frase, que não repetiremos aqui, embora Ele próprio estivesse a repetir o imperador alemão Guilherme II.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave guerra humanos violência cultura filho género espécie corpo assassinato cães
Para onde fica a guerra, Brad Pitt?
Com Máquina de Guerra, David Michôd inspira-se na história verídica de um general caído em desgraça, interpretado por Brad Pitt, para falar do mundo de hoje. (...)

Para onde fica a guerra, Brad Pitt?
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-06-02 | Jornal Público
SUMÁRIO: Com Máquina de Guerra, David Michôd inspira-se na história verídica de um general caído em desgraça, interpretado por Brad Pitt, para falar do mundo de hoje.
TEXTO: “Tive sempre consciência de que a maioria das pessoas viu os meus dois filmes anteriores em casa”, diz pragmaticamente o realizador australiano David Michôd, 44 anos. “Há algo de extraordinariamente libertador em não ter de ver a minha carreira depender do dinheiro que faço no primeiro fim-de-semana de exibição. É quase garantido que mais gente vai ver este filme do que viu os meus dois outros filmes” — a sua estreia, Reino Animal (2009), sobre uma família criminosa de Melbourne, tornou-se um filme de culto que em Portugal se estreou com quatro anos de atraso; o segundo, A Caçada (2014), nem chegou a estrear-se por cá. Máquina de Guerra, recém-estreado no serviço Netflix, foi inteiramente financiado pelo gigante americano do streaming, sem passar pelos grandes estúdios nem ter tido estreia em sala. Não é o primeiro filme produzido directamente pela Netflix, mas é o filme que melhor desenha as ambições do serviço a subir à “primeira liga”: uma longa-metragem de grande perfil e orçamento confortável, com Brad Pitt, uma das poucas vedetas globais dos nossos dias, no papel principal, e a presença de Tilda Swinton, Ben Kingsley ou Meg Tilly em papéis secundários. É uma narrativa ficcionada a partir da história verídica do general Stanley McChrystal, enviado para o Afeganistão para “vencer a guerra” e responsável pela “escalada” de tropas americanas, que caiu em desgraça depois de uma reportagem demasiado reveladora de um jornalista da Rolling Stone (o falecido Michael Hastings, cujo livro sobre a “semana de campo” que passou com o general serve de base a Máquina de Guerra). Por questões legais, a personagem chama-se aqui “Glen McMahon”. Máquina de Guerra é o tipo de filme que Hollywood ainda vai financiando quando tem um nome de peso no cartaz — aqui é Pitt, mas poderia ser George Clooney ou Matt Damon —, sobretudo na categoria cada vez mais esquiva do “filme de prestígio” apontado aos Óscares. Mas é significativo que tenha contornado, desde o início da sua produção, o sistema tradicional. David Michôd diz que, mesmo sabendo que o filme nunca foi pensado para ser visto em sala (apesar de ir ter uma estreia restrita em alguns territórios), “isso não mudou nada”. “É um filme que talvez não tivesse sido financiado pelos grandes estúdios no clima actual. O que eles estão a produzir não sai de um tipo muito limitado. E o que eu quis fazer com Máquina de Guerra era algo tonal e formalmente invulgar, politicamente contencioso. ”Ao longo de 15 minutos de conversa, Michôd, antigo jornalista e crítico que adaptou ele próprio o livro de Hastings, repetirá várias vezes ter querido fazer um filme de guerra “que abrangesse todo o seu absurdo, o seu horror e a sua brutalidade, que fosse ao mesmo tempo uma sátira mas fosse também escuro e negro e brutal”. É uma insistência que tem algo de conversa de marketing bem ensaiada; Michôd não se pode ter esquecido das sátiras que foram sendo feitas desde os tempos da Guerra Fria e sobretudo no pós-Vietname, desde o Artigo 22, de Mike Nichols, a Três Reis, de David O. Russell. Mas é verdade que o que ele tenta em Máquina de Guerra não é coisa que Hollywood arrisque muito. O tom quase coloquial do filme, que começa como sátira escarninha “contado ninguém acredita” para escorregar aos poucos para “tragédia de um homem ridículo”, está mais próximo do meio-termo entre a comédia e o drama que Adam McKay atingiu com A Queda de Wall Street. Filme que, não por acaso, também era baseado num best-seller que contava uma história verídica e também era oriundo da mesma produtora — a Plan B Entertainment de, surpresa!, Brad Pitt. Não é um acaso: foi a companhia, conhecida pelo seu apoio a autores em ascensão (Barry Jenkins com Moonlight, Steve McQueen com 12 Anos Escravo, James Gray com A Cidade Perdida de Z), que desenvolveu o projecto e que convidou Michôd a realizar. “A verdade é que eu andava há muito tempo à procura do projecto certo para falar das guerras do Afeganistão e do Iraque”, confessa o australiano. “Mas não conseguia encontrar uma história que eu quisesse contar, e que também soubesse que ia conseguir ser produzida. Foi aí que a Plan B me enviou o livro de Michael Hastings, e eu soube imediatamente como o adaptar. ”Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. A definição de Michôd é “esquizofrenia tonal” — “tem que ver com comprometer-me a fundo com ambos os tons do filme e não os tentar misturar num único. O filme é, em parte, sob a desconexão entre as altas instâncias militares e as tropas no solo, e isso implicava mantê-los separados, em mundos diferentes. O Brad e os actores que interpretam a sua equipa tinham de estar num mundo, o que implicava correr riscos, sobretudo ao nível da comédia; os actores que interpretam as tropas no terreno em Helmand tinham de estar num outro mundo, num filme de guerra sincero. O meu papel era manter esses dois tons independentes e depois, na montagem final, equilibrá-los de uma maneira que não traísse nenhum. Ia ser um desafio, mas era o modo perfeito de fazer um filme que não fosse só sobre a loucura da guerra, mas também sobre o mundo em que vivemos. ”Michôd insiste bastante nessa ligação, até porque Máquina de Guerra tem muito em comum com Reino Animal — são filmes sobre as “bolhas” insulares em que grupos muito íntimos, de famílias criminosas a unidades militares, se deixam isolar. “De certo modo, essa ideia da bolha é um dos temas que dou por mim a tratar”, admite o realizador. “A maneira como alguns tipos de personalidade interagem uns com os outros acaba por formar um todo que pode escorregar muito facilmente para a ilusão. Isso parece-me aliás uma das questões centrais na instituição militar americana, em parte porque é uma organização tão gigantesca que há bolhas a formarem-se constantemente. Mas interessava-me sublinhar que esse mundo militar em que a personagem do Brad vive tem muitos paralelos com as vivências pessoais de cada um de nós. Eu próprio, em dados momentos da minha carreira, dei por mim no plateau em pânico, em stress, a perguntar-me por que raio estou a fazer isto, a sentir-me prisioneiro da minha própria ambição. Mas sei porque estou a fazê-lo. Porque tomei uma decisão, há 20 anos, de fazer do cinema a minha carreira, e não sei que mais fazer com a minha vida. E é a mesma coisa com o general McMahon. ”
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave guerra campo negro homem animal pânico