Zuckerberg deve estar outra vez a suar em bica
Walt Mossberg, o jornalista que um dia deixou o CEO do Facebook a suar por causa das suas perguntas anunciou aos seus seguidores no Facebook que no final do ano vai desactivar a sua conta. E não é o único que acha que o Facebook tem de mudar de rumo. (...)

Zuckerberg deve estar outra vez a suar em bica
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: Walt Mossberg, o jornalista que um dia deixou o CEO do Facebook a suar por causa das suas perguntas anunciou aos seus seguidores no Facebook que no final do ano vai desactivar a sua conta. E não é o único que acha que o Facebook tem de mudar de rumo.
TEXTO: Se fizermos uma busca pelas notícias que têm sido escritas ultimamente no PÚBLICO com a palavra Facebook encontramos títulos como: “Facebook clarifica partilha de ‘mensagens privadas’ com Netflix e Spotify”; “Falha no Facebook expôs fotos privadas e não publicadas de utilizadores” ou “Netflix, Airbnb e outras empresas tiveram acesso especial a dados do Facebook”… Isto faz qualquer um arrebitar as orelhas, ainda mais no ano em que estourou o caso Cambridge Analytica. Se formos até ao início de 2018 recordamos que, no encontro de Davos, o multimilionário George Soros avisou que empresas como o Facebook e o Google constituíam uma “ameaça para a sociedade” e representavam “obstáculos à inovação”. Na mesma altura, Roger McNamee, que foi um dos primeiros investidores da empresa de Mark Zuckerberg, afirmava que o Facebook e Google eram “ameaças à saúde pública”. Aliás McNamee não se ficou por discursos. No início do próximo ano, em Fevereiro, vai lançar o livro Zucked: Waking Up to the Facebook Catastrophe, publicado pela Penguin Random House. Two months until the launch of #Zucked . . . and @PenguinPress has chosen a new subtitle: Waking Up to the Facebook Catastrophe. Zucked will ship on February 5. Preorder hard cover: https://t. co/mnajnYOYskPreorder digital: https://t. co/prjeD9R217#ZuckedBook #ZuckedTheBook pic. twitter. com/FtzFWxRdU9Num post, publicado a 8 de Dezembro na sua página oficial no Facebook, McNamee escreve: “Durante uma década fui um verdadeiro crente. Até agora, ainda possuo acções da empresa. Em termos dos meus próprios interesses, não tenho razões para morder a mão do Facebook. Nunca me ocorreria ser um activista anti-Facebook”. Mas desde 2016 começou a ver acontecerem coisas no Facebook que não lhe pareciam correctas. No início, o Facebook pareceu-lhe a vítima. Só quis confortar os seus amigos. Mas o que foi sabendo entretanto chocou-o e desiludiu-o. No livro, afirma no post, vai explicar porque é que está convencido que “apesar de o Facebook proporcionar uma experiência convincente para a maioria que o usa”, “foi terrível para os Estados Unidos” e “precisa de mudar ou de ser mudado”. Vai também contar o que fez para tentar que isso acontecesse. “A minha esperança é que a narrativa da minha própria conversão ajude outros a perceberem a ameaça”, conclui. Também esta semana, a 17 de Dezembro, um dos veteranos jornalistas especializado em tecnologia, Walt Mossberg, anunciou aos seus seguidores no Facebook que no final do ano vai desactivar a sua conta e também a do Instagram, do Messenger e do WhatsApp (pertencem todos à mesma companhia). Para quem não se lembra, em 2010, Walt Mossberg e Kara Swisher entrevistaram Mark Zuckerberg na conferência D: All Things Digital e deixaram-no a suar em bica (literalmente) com perguntas difíceis. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Oito anos depois, Zuckerberg aprendeu a falar em público sem suar mas as controvérsias avolumaram-se. E Walt Mossberg tomou uma decisão: “Estou a fazer isto - depois de estar no Facebook há quase 12 anos - porque os meus valores e as políticas e acções do Facebook divergiram ao ponto de eu já não me sentir confortável aqui”, escreveu. Vai perder as novidades dos amigos que só comunicam através destas plataformas e tem muita pena. Estará disponível no Twitter (@waltmossberg), através de email e no telemóvel. “Não sou o primeiro a deixar o Facebook e não estou a incitar outros a fazê-lo, nem a tentar criar um movimento de debandada do Facebook. Também não estou a julgar quem cá fica ou quem trabalha aqui”, afirma. “Esta decisão é só minha. Se a empresa ou o serviço mudar de forma considerável para melhor, no meu ponto de vista, ou seja efectivamente regulado, eu poderei retomar o seu uso regular. ” Embora não tenha nenhuma esperança de que isso vá alguma vez acontecer.
REFERÊNCIAS:
Tempo Dezembro Fevereiro
Alexa, faz-me o trabalho de casa
As colunas com assistentes virtuais já estão a ajudar os estudantes mais preguiçosos. Até aqueles que só querem uma desculpa para não fazer os TPC. (...)

Alexa, faz-me o trabalho de casa
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DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: As colunas com assistentes virtuais já estão a ajudar os estudantes mais preguiçosos. Até aqueles que só querem uma desculpa para não fazer os TPC.
TEXTO: Se a preguiça é a mãe do progresso, o progresso é o explicador da preguiça. Um dos vídeos virais deste Natal nas redes sociais foi filmado por uma mãe norte-americana que apanhou o filho de seis anos a pedir ajuda a um assistente virtual Alexa, da Amazon, para fazer os seus trabalhos de casa. “Era um dia normal e ele estava a fazer os trabalhos de casa”, contou Yerelyn Cueva, de 24 anos, ao New York Post. “Estava na sala e oiço-o a fazer perguntas sobre Matemática à Alexa, e não podia acreditar!” As questões, diga-se, não eram especialmente complexas. “Alexa, quanto é cinco menos três?”, perguntou Jariel, que ainda está no primeiro ano da escola. O vídeo já foi visualizado mais de oito milhões de vezes no Twitter em pouco mais de uma semana. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. “O que é engraçado é que a Matemática é na verdade a sua disciplina favorita”, nota a mãe. “Fiquei surpreendida porque ele sabe estas coisas. Estava apenas a ser preguiçoso, a fazer batota”, explica ao diário nova-iorquino. O caso não será inédito, tanto que já existe todo um mercado de aplicações para a Alexa de apoio ao estudo, desde a Física à Gramática de língua inglesa. E também de desculpas para quem não quer fazer os trabalhos de casa — o Homework Excuses, por exemplo, gera automaticamente uma mentira para contar ao professor, incluindo o clássico “o cão comeu o meu trabalho de casa”. Por cá, a Alexa não será tão cedo um problema para os pais e professores, já que continua a ser difícil comprar o assistente pessoal da Amazon em Portugal. Mais acessível é o Google Home, que também permite fazer batota nos trabalhos de casa. Mas que, ao mesmo tempo, tenta incutir alguns hábitos de boa educação aos mais novos, pelo menos em inglês: através da funcionalidade pretty please, o assistente pessoal da Google responde com elogios a quem se lembrar de dizer “por favor” ao fazer um pedido.
REFERÊNCIAS:
O que é um Bandersnatch? É o novo Black Mirror, é interactivo e está a abanar o Netflix
Nem os autores concordam sobre quantos fins há para Black Mirror: Bandersnatch. E é um filme? Ou um episódio? O Netflix lançou esta sexta-feira um desafio para o fim-de-semana e para as férias de fim de ano – e para a televisão. (...)

O que é um Bandersnatch? É o novo Black Mirror, é interactivo e está a abanar o Netflix
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento -0.01
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: Nem os autores concordam sobre quantos fins há para Black Mirror: Bandersnatch. E é um filme? Ou um episódio? O Netflix lançou esta sexta-feira um desafio para o fim-de-semana e para as férias de fim de ano – e para a televisão.
TEXTO: Três perguntas. O que é um bandersnatch? O que é Black Mirror: Bandersnatch? Como acaba Black Mirror: Bandersnatch? A primeira é de resposta fácil: é uma criatura imaginada por Lewis Carroll. A segunda é relativamente fácil, mas não definitiva: é um episódio da série, ou será o novo filme que o Netflix lançou esta sexta-feira com o pedigree da ficção científica do seu sucesso Black Mirror. A terceira é a mais complexa de todas e o segredo de Black Mirror: Bandersnatch – é que esta é uma história interactiva e em poucas horas já está a criar fãs em todo o mundo, que têm poucos segundos para tomar decisões para avançar a história. Há perto de um ano o serviço de streaming fazia das suas lançando, sem grande fanfarra, a série de ficção científica Dark, que se tornou num fenómeno. Em época de festas e com muitos subscritores, sobretudo jovens, de férias e com tempo para explorar os múltiplos caminhos que oferece um filme interactivo, o Netflix lançou esta sexta-feira Black Mirror: Bandersnatch. É um filme que na sua versão “estanque” tem 90 minutos, mas que nas suas diferentes opções e possibilidades acaba por oferecer mais de 300 minutos de imagens. Trezentos e doze, para sermos mais precisos, já acompanhados por conselhos sobre como devemos ir até ao fim, talvez tentar outra vez, e muitos GIF a serem partilhados no Twitter de espectadores a reagir ou a viver nesse outro ecrã a sua experiência de tentativa-erro que tem outro enorme potencial: o da repetição, ou seja, poder recuar e fazer novas escolhas. Ambiente de anos 1980, medo de qualquer era. Tudo começa com a nossa escolha do que será o pequeno-almoço do protagonista. O ponto de partida é aparentemente linear. “Em 1984, um jovem programador começa a questionar a realidade quando está a adaptar um romance de fantasia negra para um videojogo”, começa a sinopse, enquanto o trailer mostra que o livro se intitula Bandersnatch e que é escrito por um mítico Jerome F. Davies. Imagens de comprimidos à escolha, à la Matrix, e o som dos Frankie Goes to Hollywood pintam de sangue cenas mais assustadoras de uma “história alucinogénia com vários finais”. O jogo Bandersnatch existiu mesmo na década de 1980 e na história Netflix, o seu autor perdeu o controlo mental e acaba por matar a mulher. O protagonista de Black Mirror: Bandersnatch, Stefan, teme estar também a perder a sanidade. Black Mirror: Bandersnatch é protagonizado por Fionn Whitehead (Dunkirk), Will Poulter e Craig Parkinson. Foi criado por Charlie Brooker e tem Annabel Jones como produtora executiva. O realizador é David Slade (Black Mirror – Metalhead). Joga-se, ou conta-se, com uma barra negra que surge na base do ecrã e que dá ao espectador escolhas: que tipo de cereais comer; gritar com um progenitor ou arremessar algo em protesto? Há quem termine Black Mirror: Bandersnatch até mais depressa, em 60 minutos. Um alerta: as escolhas não funcionam no Chromecast, Apple TV, mas sim nas consolas, nas televisões mais modernas, nos smartphones com Android ou iOS ou na maior parte dos browsers. Um bandersnatch é uma criatura que os leitores do criador de Alice no País das Maravilhas conhecem bem. Apesar de ter feito a sua primeira aparição num poema de Alice do Outro Lado do Espelho (1872), o peludo animal surge em vários trabalhos de Carroll. Um filme é um filme, e um episódio de uma série é um episódio de uma série. Uma série antológica é aquela que tem temas e histórias independentes, normalmente durante uma temporada (American Crime Story, American Horror Story, True Detective); uma série antológica como Black Mirror tem episódios com histórias independentes que funcionam por vezes como filmes. Black Mirror: Bandersnatch é, com a sua hora e meia, o que o New York Times chama “o único episódio para a sua quinta temporada”, corroborado pela revista Wired; mas o Netflix classifica-o como “filme interactivo”. Haverá mais episódios da quinta temporada de Black Mirror, mas não serão interactivos segundo diz o criador de Bandersnatch. Para explorar um conteúdo deste género, que tem na base um tom de mistério e aventura com o habitual tom de alerta quanto à nossa relação com a tecnologia que contêm todos os episódios de Black Mirror, há que voltar a ele muitas vezes. O número de visionamentos, que o Netflix nunca divulga para os seus produtos, só pode aumentar com o sucesso de Black Mirror: Bandersnatch e dar-lhe o potencial do comportamento de uma série de vários episódios. Independentemente das tentativas (é sempre possível voltar atrás nas escolhas), caminhos e sucesso ou falta dele que espectadores e Bandersnatch venham a ter nos próximos dias, este novo Black Mirror é um novo sintoma do estado do audiovisual. Experimentar, diversificar, sobretudo nos novos players do streaming. Segundo escreve esta sexta-feira o New York Times, que esteve na sede da plataforma de streaming a explorar o mundo de Black Mirror: Bandersnatch, o Netflix está a pedir aos produtores que lhe façam mais propostas de histórias interactivas, já terá mais na calha e já criou um software (o Branch Manager) que ajuda a organizar histórias e dar-lhe variáveis infinitas. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Este não é o primeiro produto narrativo do género, dos livros Dungeons & Dragons dos anos 1980 ou do filme Late Shift (2016) à mais recente série da HBO Mosaic, criada por Steven Soderbergh e não muito amada pelo público. Até o Netflix já criou uma história infantil interactiva em 2017. Bandersnatch “não foi desenhado como um jogo. Foi desenhado como uma experiência cinemática”, garante Annabel Jones ao diário norte-americano. “Com elementos de jogo”, acrescenta Brooker. Black Mirror: Bandersnatch é mais uma tentativa para ver o que dá. É que “aprendemos a carregar no ‘play’, deixar cair o comando e a recostarmo-nos e a deixar a televisão inundar-nos”, como reconhece a directora de inovação de produto do Netflix, Carla Engelbrecht, ao New York Times. Isso leva à definição de espectador, alguém que assiste, observa mas não participa necessariamente, diferente de um jogador. É também uma experiência narrativa, de testar ritmos, limites, variações. São 170 páginas de guião e duas horas e meia de imagens fragmentadas em 250 pedaços, como como escreve a revista Wired, que teve acesso às salas de montagem da série - os criativos tiveram de “reinventar como se faz televisão”. Há mais de um trilião de variações da história, detalha a Variety. Resposta à terceira pergunta? “Não sei quantos fins existem. Não sabemos o que criámos”, disse Annabel Jones ao New York Times. “Desculpa. Sabemos”, corrigiu Charles Brooker, que inicialmente recusou fazer este episódio-filme interactivo. O produtor Russell McLean não tem tantas certezas. Serão, diz o Netflix, cinco fins com muitas variantes.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave crime mulher ajuda medo género animal negra infantil
Paulo Branco vai deixar o Monumental, mas o Monumental não quer deixar de ser cinema
Centro Comercial Monumental vai entrar em obras em 2019, refazendo até a fachada, e reabre com a intenção de manter a exibição de cinema — mas já não com a Medeia Filmes. Exibidora vai ter Sessões Monumental aos fins-de-semana até início das obras. (...)

Paulo Branco vai deixar o Monumental, mas o Monumental não quer deixar de ser cinema
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: Centro Comercial Monumental vai entrar em obras em 2019, refazendo até a fachada, e reabre com a intenção de manter a exibição de cinema — mas já não com a Medeia Filmes. Exibidora vai ter Sessões Monumental aos fins-de-semana até início das obras.
TEXTO: O cinema Monumental vai entrar em obras em 2019 e deixar de ser explorado pela Medeia Filmes, suspendendo a partir de Fevereiro a exibição comercial de cinema — mas manterá, até à remodelação profunda do edifício numa das artérias nobres de Lisboa, sessões semanais programadas pela exibidora e distribuidora de Paulo Branco. O anúncio foi feito esta sexta-feira pelo produtor, com fonte do proprietário do edifício do Monumental a confirmar que, findas as obras, se manterá ali a existência de cinemas. O anúncio surge depois de semanas de rumores sobre o fim do cinema Monumental, mas também quanto às possíveis intenções dos proprietários do edifício em repensar a sua actividade. A MP Properties, detida pela Merlin, a imobiliária espanhola dona desde 2016 do edifício ocupado pelo Centro Comercial Dolce Vita Monumental gerido pela Inogi, planeia obras no valor de 20 milhões de euros para a estrutura, que vão refazer a sua fachada e manter depois de um ano de trabalhos as valências de lojas, escritórios e espaço para cinema. As obras devem começar no segundo semestre de 2019. A mesma fonte avançou que terá de ser encontrado um novo exibidor para explorar o espaço – composto actualmente por quatro salas, uma das quais o Cineteatro de 378 lugares. Foi ali que Paulo Branco adiantou que até 20 de Fevereiro vai manter a actividade normal da Medeia nos cinemas, encerrando esse ciclo com uma homenagem ao cineasta João César Monteiro. Depois, “as coisas quando acabam, acabam”, respondeu ao PÚBLICO sobre se voltaria após as obras a gerir o Monumental. “Não está contemplada da minha parte qualquer volta”, frisou sobre os cerca de 4 mil m2 que estão até agora a exibir filmes como Roma, de Alfonso Cuarón, e que programa desde 1993. O futuro da actividade de exibição da Medeia em Lisboa continuará no Nimas e, sugeriu Paulo Branco, “há muitas surpresas” que o futuro pode trazer sobre novos espaços onde programar cinema. Segundo Paulo Branco, a decisão já se perfilava “há algum tempo” e foi tomada por “ambas as partes”, “no interesse de ambas”. Agora, firma-se que “o último dia de actividade normal no Cinema Monumental será a 20 de Fevereiro”, com a homenagem a César Monteiro, e depois só o Cineteatro acolherá as Sessões Monumental, ao fim-de-semana “até à reestruturação completa do prédio”. Na origem da decisão, além de a Inogi e a MP Properties considerarem que o edifício estava já depauperado, está o contexto. “Há uma conjuntura económica que faz com que a rentabilidade não se coadune com uma actividade” como a cinematográfica, disse o produtor, bem como “a quebra dramática do número de espectadores” dos últimos anos. Em termos de renda, os proprietários do espaço deram-lhe “condições de excepção durante anos”. “[Porém, ] não era economicamente viável continuarmos”, observou. Continuar a explorar o Monumental, diz Paulo Branco, “era absolutamente incomportável”. O exibidor diz que quer “continuar a mostrar a diversidade das cinematografias que existem no mundo”, como faz há 30 anos na Medeia Filmes, e garante que “o Nimas vai continuar, reforçado”. A situação levou ao fim de contrato de quatro trabalhadores e os restantes cinco vão continuar afectos ao Nimas e às sessões no Monumental. A intenção manifestada pelos proprietários do imóvel de manter um espaço na zona comercial dedicada ao cinema coloca assim em suspenso um dos temores que as mudanças que se anunciavam no Monumental deixavam em aberto: o fim de mais um cinema no centro de Lisboa e de um cinema de programação independente. Quando está em cima da mesa a demolição ou reafectação de um recinto de exibição cinematográfica para outros fins, o Artigo 14. º do Decreto-lei 23/2014 mantém uma regra com décadas em Portugal: isso “depende de autorização do membro do Governo responsável pela área da cultura, a ser obtida directamente pelo interessado ou pela entidade a quem competir o controlo prévio da operação urbanística”. O inspector-geral das Actividades Culturais, Luís Botelho, reiterou ao PÚBLICO, por email, que de facto “a IGAC [Inspecção-Geral das Actividades Culturais] não foi até ao momento chamada a pronunciar-se sobre pedido” nesse sentido. Entre 2019 e 2020 decorrerá assim mais um hiato na exibição de cinema no Saldanha lisboeta. Há 67 anos que a Praça do Saldanha não sabe o que não é ter um cinema. O primeiro hiato durou quase uma década, quando foi demolido o imponente cineteatro original, datado de 1951, e que foi abaixo em 1984. O actual edifício é já uma versão distante da glória da sua primeira encarnação, decorada com lustres, mármores e uma gigantesca sala de cinema de 2710 lugares. O Monumental é o cinema resistente do Saldanha depois de Paulo Branco ter fechado as salas do Saldanha Residence, no quarteirão abaixo, e de os seus sucessores, os @Cinema, terem apenas funcionado três anos. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Para Paulo Branco, histórico produtor, distribuidor e exibidor de cinema de autor português, é mais um recinto que geriu durante décadas que vê mudar de mãos. Há cinco anos foram as salas do Cinema King (1990-2013), à Avenida de Roma e onde funcionava antes o cinema Vox, a encerrar devido ao valor da sua renda. Dois anos depois, as salas do Centro Comercial Fonte Nova, em Benfica, também faziam as últimas sessões. Em Lisboa, resta à Medeia — e bem perto do Saldanha, na Avenida de 5 de Outubro —, o Cinema Nimas, onde tem feito programação especial e temática, mas onde há dias já constava online uma nova programação, com exibição comercial regular de cinema em estreia. A Lisboa resta, no âmbito dos cinemas independentes, o Cinema Ideal, no Bairro Alto. A capital perdeu nos últimos anos, além dos cinemas da Medeia e da @Cinema, o histórico Londres, na Avenida de Roma, que era gerido pela Socorama, que pediu insolvência em 2013 e motivou uma transformação mais célere e profunda no mercado de exibição a nível nacional: fechou mais de cem salas, deixando algumas cidades e distritos sem exibição comercial regular de cinema, e permitiu a entrada de um novo operador, a brasileira Orient Cineplace, que no final de 2017 era a segunda maior exibidora em Portugal. Tal como no resto do país, a oferta tende a concentrar-se cada vez mais nos multiplexes. A Medeia Filmes tem ainda programação, fora de Lisboa, no Cine Estúdio Teatro do Campo Alegre, no Porto — onde em 2010 encerraram também os Cinemas Cidade do Porto —, no Auditório Charlot, em Setúbal, no Centro de Artes e Espectáculos da Figueira da Foz, no Theatro Circo de Braga e no Teatro Académico Gil Vicente, em Coimbra.
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Palavras-chave lei cultura campo circo
UHF: soprar as velas dos 40 com Legendary Tigerman, Frankie Chavez e João Pedro Pais
40 Anos Numa Noite é o nome dos dois concertos com estes três convidados e Renato Gomes, o guitarrista original, que a banda de António Manuel Ribeiro vai fazer. Primeiro em Lisboa, este sábado, na Aula Magna, e uma semana depois no Porto, na Casa da Música. (...)

UHF: soprar as velas dos 40 com Legendary Tigerman, Frankie Chavez e João Pedro Pais
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 1.0
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: 40 Anos Numa Noite é o nome dos dois concertos com estes três convidados e Renato Gomes, o guitarrista original, que a banda de António Manuel Ribeiro vai fazer. Primeiro em Lisboa, este sábado, na Aula Magna, e uma semana depois no Porto, na Casa da Música.
TEXTO: Não há muitas bandas portuguesas que cheguem aos 40 anos de actividade, mas foi isso que aconteceu aos UHF. A banda de António Manuel Ribeiro, o único membro original que se mantém, assinalou a ocasião com a reedição de três discos raros da era em que passaram pela editora Rádio Triunfo, mas também em cima dos palcos. A festa passa pela Aula Magna, em Lisboa, este sábado. Segue-se, exactamente uma semana depois, a Casa da Música, no Porto. Nas duas ocasiões a banda terá com ela convidados especiais: Paulo Furtado, ou The Legendary Tigerman, Joaquim Chaves, ou Frankie Chavez, e João Pedro Pais, bem como Renato Gomes, o primeiro guitarrista da banda. Na passada quarta-feira, os três convidados reuniram-se com a banda para ensaiar pela primeira vez. O encontro, para o qual foram convidados jornalistas, aconteceu no estúdio PontoZurca, em Almada. “Queria convidar gente mais jovem”, explica António Manuel Ribeiro ao PÚBLICO, a justificar os convites. “Quis ir buscar gente de outra linguagem, até”, prossegue, referindo-se ao facto de tanto Frankie Chavez quanto Legendary Tigerman cantarem em inglês (neste caso, nenhum vai sequer cantar). Pouco antes, a banda tinha ensaiado Cavalos de corrida com a guitarra eléctrica de Paulo Furtado e a guitarra slide de Frankie Chavez, que preferiram cingir-se à condição de instrumentistas — ainda estava por decidir, nessa tarde, se Frankie, que escolheu Matas-me com o teu olhar, iria ou não juntar também a sua voz aos refrães e coros. As diferenças entre os convidados e a banda não são assim tão grandes. Paulo Furtado, por exemplo, conta que reparou em “códigos de linguagem semelhantes” entre o seu rock’n’roll e aquele praticado pelos UHF. António Manuel Ribeiro comenta: “Quando nós agarramos num instrumento, vamos para uma sala e nos juntamos todos, a nossa linguagem é exactamente a mesma. ” Assegura, portanto, que a união bastante espontânea entre a banda e os outros músicos tem vindo facilmente, algo que todos os outros intervenientes confirmam. Nascidos entre as décadas de 1970 e 80, todos os convidados têm noção de quem são os UHF desde pequenos. “Apanhei o auge da Cavalos de corrida e da Rua do Carmo. Tive colegas que compraram o álbum e eu ouvia-o à pala deles. Sabia as músicas, como esta”, recorda João Pedro Pais, que pega no baixo para tocar e cantar um pouco de Estou de passagem, de 1982. Antes da conversa, sozinho na sala, estava a tocar temas dos Pearl Jam, que partilham com os UHF um fascínio pelos Ramones, algo de que se lembrou ao ensaiar com a banda. A relação com os UHF não fica por aí. Quando fez o seu primeiro álbum, Segredos, em 1997, a banda que o acompanhava era composta por ex-membros dos UHF. Em Agosto deste ano, o músico convidou António Manuel Ribeiro para se juntar a ele numa versão de Cavalos de corrida nas festas de Corroios. O vocalista aceitou e a banda ensaiou, mas afinal já tinha compromissos nesse dia e a colaboração não aconteceu. Frankie Chavez, o mais novo dos três, conheceu António Manuel Ribeiro “há uns anos” e deram-se logo bem, afirma. Mas conhece os UHF “desde miúdo, tal como toda a gente”. Paulo Furtado voltou a prestar atenção ao que a banda de António Manuel Ribeiro tinha feito nos anos 1980 através da compilação Os Anos Valentim de Carvalho, de 2008. Ouviu, diz, certos efeitos sonoros, como phasers ou flangers, aplicados a pratos de choque, que são “um bocado fora para a altura” em que os discos foram feitos e soam muito “bem”. Isso fê-lo perceber, argumenta, que às vezes as pessoas “não tomam muita atenção” a “coisas que são incríveis e estão aí há muito tempo”. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Os concertos em si vão tentar celebrar, como o nome, 40 Anos Numa Noite, indica, estas décadas de actividade. “Vai ser impossível, em duas horas e tal de espectáculo, resumir 40 anos”, assume o vocalista. “Vamos tentar não defraudar aquilo que as pessoas gostam de ouvir, sucessos com os quais cresceram, que fizeram parte das nossas vidas”, mas também trazer canções que estão “fora dos grandes palcos”. As duas noites servirão, diz António Ribeiro, para constatar “a emoção que os UHF trouxeram a muita gente”, o que “às vezes as pessoas não percebem”. “Vem gente de fora, das ilhas, de França, Suíça, Áustria, Tanzânia. . . ”, partilha. “É essa emoção e essa troca de energia, das pessoas que elevam os coros e colocam as palmas no sítio certo, o estarmos a tocar para uma audiência que faz parte de nós, que emociona até às lágrimas”, conclui.
REFERÊNCIAS:
Comecemos pelas 912 cadeiras da Rua Augusta
Podem não mexer em nada, mas tenham a simpatia de não insistir na falsidade de que é impossível melhorar o centro histórico de Lisboa. (...)

Comecemos pelas 912 cadeiras da Rua Augusta
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: Podem não mexer em nada, mas tenham a simpatia de não insistir na falsidade de que é impossível melhorar o centro histórico de Lisboa.
TEXTO: 14x4=56. 10x4=40. 10x4=40. Caminho devagar e conto ao mesmo tempo, não tem nada que saber. 16x4=64. 16x4=64. Algumas são iguais. Anoto no telefone e avanço. Estou a descer a Rua Augusta a partir do Rossio em direcção ao rio. Quando chego ao cruzamento com a Rua de Santa Justa já contei 264. Continuo a andar. 22x4=88. 24x4=96. 6x4=24. 6x4=24. 20x4=80. 12x4=48. 8x4=32. Ao passar pela H&M, já vou em 656. O Tejo continua distante. Retomo a contagem: 20x4=80. 13x4=52. A primeira clareira, e quase a única, é no Millennium BCP, do lado esquerdo. O passeio está vazio, podemos caminhar sem pedir licença nem bater em obstáculos. Vou em 788. Registo a conta, levanto os olhos do ecrã e a meio metro está um homem enorme e quase nu mascarado de índio americano. Já o tinha visto há umas semanas, mas voltou a surpreender-me. Os homens-estátua costumam ser mais sensatos e tendem a escolher personagens com roupa. A concorrência deve estar feroz. Falta pouco, mas ainda vejo mais algumas ao fundo. Atravesso a Rua da Conceição, sempre a andar para sul, e conto as últimas: 12x4=48. 19x4=76. Acabou. Estou à porta do MUDE, o Museu do Design e da Moda, já se vê o rio, não há espaço para mais. Decidi contar as cadeiras da Rua Augusta, no centro da Baixa de Lisboa, para dar esperança aos lisboetas. Aqui está: são 912 cadeiras. É muita cadeira num passeio só, para mais numa rua à qual ainda chamamos “pedonal”, do tempo em que celebrávamos as ruas conquistadas aos carros. Agora, são as cadeiras que conquistam as ruas. Venha o diabo e escolha. Há mais cadeiras na Rua Augusta do que no Teatro da Trindade (495), no grande auditório da Culturgest (612), no Teatro Municipal de São Luiz (730) e no São Carlos (844). Até o Dona Maria II tem quase o mesmo número de cadeiras (tem só mais 36 do que a Rua Augusta). Mas calma, não há razão para desesperar. Podemos olhar para as 912 cadeiras da Rua Augusta e ver boas notícias. Pelo menos duas. A primeira é que as cadeiras podem ser retiradas — não é preciso todas — mal o bom senso regresse à cidade. A outra coisa boa é que o 912 dá-nos mais um argumento para responder aos que, encolhendo os ombros, dizem que a transformação de Lisboa é inexorável e temos de aceitar o crescimento do turismo como quem engole óleo de fígado de bacalhau em colheres de sopa. Todos os dias alguém diz que “não há alternativa”, que “a cidade” não é um laboratório comunista, que não se pode controlar o capitalismo nem a autarquia pode intrometer-se nas decisões dos privados. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Não é verdade. A cidade pode — e deve — impor o bom senso no espaço público. Não sei se foi a Junta de Santa Maria Maior que autorizou estas 912 cadeiras ou se as decisões são anteriores à transferência de poderes da Câmara Municipal de Lisboa para as freguesias. Sei que o vírus das cadeiras está a alastrar-se a todas as ruas do centro histórico. Até o novo café Nicolau Lisboa, que há um ano era tão cool e desprendido, se tornou numa fábrica de meter cadeiras na rua e enterrar corta-ventos na calçada. Em todas as esquinas há um homem — às vezes são vários — a impingir menus. Há uns meses vi seis destes homens aos gritos. Estavam a disputar uma esquina dos Correeiros. Dizem que é território dos carteiristas do eléctrico 28 e do restaurante que muda de nome quando é apanhado a cobrar 500 euros por uns petiscos. Têm ar de seguranças do Urban e de empregados de retrosaria — as aparências iludem. Também ouço com frequência perguntarem por que razão Lisboa haveria de ser a excepção, quando os centros históricos europeus só têm ricos e turistas. Hoje não vou argumentar sobre isso, mas apenas dizer o óbvio: com ruas cheias de cadeiras, música e o lixo das esplanadas no chão, ninguém vai querer andar por aqui. Nem comprar casa para viver, nem escritório para trabalhar. Quem são os “ricos” que querem viver neste circo pobre?Se querem começar por algum lado, porque não pelas 912 cadeiras da Rua Augusta? Com metade das cadeiras, os restaurantes continuariam a ter lucro, os turistas continuariam a poder almoçar e os residentes e trabalhadores da Baixa talvez voltassem a usá-la. A outra opção é não mexer em nada. Nesse caso tenham a simpatia de não insistir na falsidade de que é impossível melhorar as coisas.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave homens homem circo
Milhares votaram para Ricardo ir numa expedição ao Árctico. E aí vai ele
Arqueólogo, escuteiro e com gosto pela aventura: Ricardo Carvalho vai representar Portugal num trenó pelo Circulo Polar Árctico. Foi ele um dos dez mais votados no concurso online Fjällräven Polar. (...)

Milhares votaram para Ricardo ir numa expedição ao Árctico. E aí vai ele
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: Arqueólogo, escuteiro e com gosto pela aventura: Ricardo Carvalho vai representar Portugal num trenó pelo Circulo Polar Árctico. Foi ele um dos dez mais votados no concurso online Fjällräven Polar.
TEXTO: Ricardo Carvalho ainda não se sentou para pensar na viagem que o espera em Abril. Só isso pode explicar que, quando lhe perguntámos quais as dificuldades que espera enfrentar no Círculo Polar Árctico, responda o seguinte: “Para dizer a verdade, não tenho receios. ” Pausa. “Só que me faltem umas meias quentinhas. ”Durante seis dias, o arqueólogo de 33 anos vai deslizar por 300 quilómetros de deserto gelado, passando pela Noruega e Suécia num trenó puxado por seis cães treinados. “Pois, se calhar ainda não pensei muito bem nisto”, ri-se, agora à gargalhada, o terceiro português a vencer o concurso online aberto a candidatos de todo o mundo. Não vai sozinho, é certo: Ricardo é uma das 20 “pessoas comuns” — leia-se, que tal como ele nunca fizeram nada assim — a participar na expedição Fjällräven Polar. Criado há mais de 20 anos, o desafio promove uma marca de roupa sueca de aventura passando uma mensagem simples: pessoas sem preparação específica conseguem sobreviver em condições inóspitas, salvaguardando que com elas levem o equipamento apropriado (fornecido pela organização, “meias quentinhas” incluídas). Escuteiro desde pequeno, em Vila Real, e alpinista amador, Ricardo já participou “em muitas actividades nas montanhas e na neve”. “Este é um desafio à minha medida”, atira. Mas, reconhece, “uma coisa são os Picos da Europa, outra é o Circulo Polar Árctico”. Apresentou-se no concurso de votação online como “mestre em cozinha selvagem”, garantindo ainda que “constrói o melhor abrigo” e que “está sempre feliz”: capacidades necessárias para quem vai ter de tratar dos cães, preparar a comida e montar acampamentos. “Ajudarei sempre os outros quando houver necessidade”, prometeu. Até 14 de Dezembro, dia em que os 20 vencedores (metade eleitos por votos do público, os outros pelo júri do concurso) foram anunciados, reuniu 17. 916 votos. Vai ser ele o representante da região mediterrânica entre 8 e 13 de Abril — em primeiro lugar global ficou Babz Sage, da Índia, com 82. 715 votos. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Nos últimos dias de concurso, quando chegou a maior parte do apoio, o arqueólogo quase não dormiu. “Estava fixado em vencer, mas não estava à espera”, confessa. Logo no início foi bloqueado do Facebook, culpa do spam que teve de fazer para pedir votos e, no fim, ia-se “vendo grego” para ganhar. Diz que faz parte da tradição portuguesa do concurso: ser ultrapassado, quase no último minuto, pela Grécia. Tanto Mónica Roldão Almeida, no ano passado, como Pedro Alves, em 2012, perderam contra um candidato grego, mas foram depois resgatados pelo júri, relembra. Foi a Mónica, bióloga, que recorreu a pedir conselhos para a campanha de angariação de votos que durou mais de um mês. Agora, os dois vão começar a falar da expedição. Ricardo Carvalho diz já ter começado o treino físico. O “espírito de aventura” e a “vontade de arriscar” já tinha. “É isso que preciso. Depois nada de mal se vai passar. " Pausa outra vez. "Espero eu. ”
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave cães
Os monumentais vinhos de João Póvoa, um “ourives” da Bairrada
Este texto é sobre os vinhos Kompassus. É sobre grandes vinhos portugueses feitos numa adega humilíssima com uvas de vinhas sem a imponência paisagística das encostas do Douro, por exemplo. (...)

Os monumentais vinhos de João Póvoa, um “ourives” da Bairrada
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: Este texto é sobre os vinhos Kompassus. É sobre grandes vinhos portugueses feitos numa adega humilíssima com uvas de vinhas sem a imponência paisagística das encostas do Douro, por exemplo.
TEXTO: São vinhas de aparência simples como tantas outras, mas com uma enorme riqueza intrínseca, fruto de uma conjugação perfeita entre videiras, solo e clima. Se fosse na Borgonha, estaríamos a falar de “Grand Cru”, designação atribuída apenas às melhores parcelas. Como é na Bairrada, são vinhas sem qualquer selo, como quaisquer outras, apesar de ano após ano, invariavelmente, originarem vinhos admiráveis, ricos e duradouros. A história dos vinhos Kompassus é também a história de João Póvoa, médico oftalmologista em Coimbra e desde criança ligado à vitivinicultura. Como os chefes que baseiam a sua cozinha nas memórias familiares, também João Póvoa faz hoje vinhos a partir das vivências na adega com o avô materno e o pai e na vinha com a mãe. Já se sabe como é: em jovens, os filhos são muitas vezes os maiores críticos dos pais; mais tarde, acabam a imitá-los e, por vezes, a sofrer as mesmíssimas penas (não é o caso). Também acontece muitas vezes os pais não acreditarem nos filhos e arrependerem-se mais tarde. Numa certa vindima, João “driblou” o progenitor e fez um vinho às escondidas. Era um rosado. Nesse tempo, as uvas iam inteiras directamente para uma lagareta. Entre a vinha e a adega, muitos bagos rebentavam e quando a dorna era despejada já levava muito líquido. Sem o pai saber, João foi desviando um pouco da “lágrima” inicial das várias dornas de uvas até encher uma barrica de 150 litros, que deixou fermentar de forma espontânea. Em jovem, João Póvoa chegou a trabalhar durante as férias na Adega de Cantanhede e gostava especialmente dos rosés que ali se faziam com os mostos pouco prensados. O seu vinho era inspirado nesses rosados. Quando, mais tarde, o pai descobriu o vinho, criticou o filho por ter feito uma “água-pé”. Mas, nas suas costas, era esse palhete que gostava de beber. Em 2017, João Póvoa voltou a fazer um vinho idêntico, mas agora com as lágrimas das várias prensas de Baga que foi fazendo para espumante. Vai chamar-lhe João Póvoa Colecção Privada. É um rosé austero, tenso e fresquíssimo. Uma delícia. No ano anterior, já tinha feito um outro vinho nostálgico, emulando uma criação do pai. Um branco de Maria Gomes e Bical em lagar. O mosto só era sangrado ao fim de quatro a cinco dias, quando a “manta” já estava mesmo em cima e a fermentação entrava na fase exponencial. A fermentação ao ar livre queimava os aromas de fruta mas extraía mais matéria das películas. Estes vinhos de curtimenta ficavam com uma textura mais rica e duravam muito mais tempo. Este branco de 2016 vai chamar-se “Gene”, em tributo à herança familiar de João Póvoa. Quem já o provou, como eu, pode atestar que se trata de um branco admirável. Já está engarrafado, mas ainda vai ficar mais algum tempo em adega. Antes, João Póvoa vai lançar um Gene tinto, de 2007, um vinho que incorpora ensinamentos e técnicas de três gerações. Trata-se de um Baga denso, extraído, fresco mas ainda com bastante tanino (o vinho estagiou 24 meses em barricas novas). Promete durar décadas, mas será difícil que algum dia atinja o nível do emocionante Kompassus Baga Colecção Privada 1991. Simplesmente porque vinhos como este só se fazem uma vez na vida. Um tinto ao nível dos melhores do mundo. Parece perfeito, mas o Baga 1991 nasceu e evoluiu literalmente aos tombos, como costuma acontecer com as grandes criações. Foi o primeiro vinho que João Póvoa produziu sozinho a partir de uvas de uma vinha muito velha que já arrancou. Dessa década, guarda ainda outros vinhos memoráveis, como os 1994, 1995 e 1997. O último clássico da fase Quinta de Baixo data de 2003. O 1991 não é um Baga puro. Na vinha havia também algumas videiras de Moreto e de outras castas antigas. Na Bairrada sempre foi tradição lotar a Baga com uvas de variedades mais mansas, como a Moreto ou a Bastardo, por exemplo. O vinho foi feito num lagar aberto na velha adega da mãe e com cachos por desengaçar. Começou por estagiar numa cuba de cimento e passou depois dois anos num tonel antigo, já fora de uso, que João Póvoa tinha herdado do avô e que ele próprio recuperou e limpou durante as férias de Natal. Era um vinho tão denso que entupiu o filtro de placas da Quinta das Bágeiras onde foi filtrado antes de ser engarrafado. O vinho era vendido pelo Pingo Doce. Na altura, passou despercebido. Em 2007, por motivo de doença, João Póvoa decidiu vender a marca Quinta de Baixo, as instalações e as vinhas mais novas a uns investidores de Águeda (que revenderam tudo em 2012 à Niepoort). Ficou apenas com algumas vinhas de argilo-calcário em Cordinhã e Ourentã (Cantanhede), um dos grandes spots da Bairrada, e com a marca Kompassus, que havia registado quando decidiu fazer uma vinha à moda antiga, de compasso apertado e com uma densidade de plantação mais alta. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Os primeiros vinhos com a nova chancela chegaram ao mercado em 2008, mas foi só a partir de 2012, já com o apoio enológico e comercial de Anselmo Mendes, que o projecto descolou (foi a conselho de Anselmo Mendes que João Póvoa plantou alguns talhões de Tinto Cão e de Alvarinho em terrenos de argilo-calcário expostos a sul; os primeiros vinhos, sobretudo o Alvarinho, deixam água na boca). Foi um pouco antes de Anselmo ter chegado que João Póvoa “descobriu” na velha adega uma palete de garrafas por rotular do Quinta de Baixo 1991. O vinho tinha passado vários anos quase ao abandono, à chuva e ao calor. Alguns trabalhadores achavam que era um vinho sem importância e foram-se servindo. Quando João Póvoa se mentalizou da relíquia que tinha li, sobravam apenas cerca de 250 garrafas. Uma boa parte vendeu-as, já com o rótulo Kompassus, a 500 euros, um preço superior ao Barca Velha. Agora guarda apenas umas quantas para consumo pessoal. Não sei se a Comissão Vitivinícola da Bairrada comprou algumas. Devia fazê-lo, porque este é o tipo de vinha que a região devia mostrar ao país e ao mundo, como testemunho do enorme potencial da Baga e da própria Bairrada. Luís Pato tem toda a razão quando diz que os tintos de Baga deviam ser a “ourivesaria” da Bairrada, produzidos em pequena escala e vendidos a preços mais altos.
REFERÊNCIAS:
No Muito Bey há todos os dias pequeno-almoço libanês
O restaurante libanês da Rua da Moeda, em Lisboa, passa a abrir às 8h30 e tem uma série de propostas, salgadas e doces, para começar o dia como se estivéssemos no Líbano. (...)

No Muito Bey há todos os dias pequeno-almoço libanês
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: O restaurante libanês da Rua da Moeda, em Lisboa, passa a abrir às 8h30 e tem uma série de propostas, salgadas e doces, para começar o dia como se estivéssemos no Líbano.
TEXTO: No Líbano, “bom dia” diz-se “sabah el kher” e no Muito Bey, o restaurante libanês perto do Mercado da Ribeira, em Lisboa, um bom dia começa agora com um pequeno-almoço, servido entre as 8h30 e a 11h30, no qual se podem descobrir novos sabores de uma gastronomia que nos últimos dois anos tem vindo a conquistar cada vez mais adeptos em Lisboa. Joseph Youssef, libanês que trabalhou no Dubai, é desde o Verão o novo chef consultor (e, desde Novembro, residente) – o que permite renovar a carta com mais frequência e apresentar propostas diferentes. “Acreditamos que contribuímos para aquela que é agora uma das tendências na cidade”, diz Ezzat Ellaz, o proprietário do Muito Bey. “Queremos continuar a ser a primeira oferta, agora que conhecemos bem o mercado e os sabores que as pessoas preferem. ” Os pequenos-almoços fazem parte dessa aposta, apesar de Ezzat saber que são algo de muito diferente daquilo que os portugueses estão habituados a comer a estas horas da manhã. A carta divide-se em Manhã Salgada, Manhã Doce e Padaria. O prato salgado que, diz Ezzat, é comum a todas as casas libanesas para começar o dia, é o zaatar, a mistura de especiarias, que inclui tomilho, sésamo e sumac (uma especiaria cítrica), servida com pão tradicional e azeitonas – e que se acredita que torna as crianças mais espertas e mais atentas na escola (ou, pelo menos, é esse o argumento usado pelas mães). Para além do zaatar, o labné, queijo fresco, aqui também com azeitonas e servido com um prato de legumes frescos, é o outro item obrigatório nas casas libanesas. Ezzat acredita que estes pequenos-almoços poderão ser bem recebidos pelos portugueses também porque são essencialmente vegetarianos, e em alguns casos vegan, “com grande enfoque na proteína” e “muito saudáveis”. O chef Joseph Youssef confirma, explicando que não há necessidade de incluir carne porque os queijos e algumas leguminosas já asseguram proteína suficiente. O grão-de-bico é, claro, um ingrediente imprescindível, tanto no húmus, aqui, curiosamente, servido com carne e pinhões (numa versão mais pequena de prato que está na carta de almoços e jantares) e em duas novidades: o foul, puré de fava com grão, azeite, alho, cominhos e a acidez dada pelo sumo de limão que os libaneses usam com generosidade na sua cozinha; e balila, grão-de-bico cozido, misturado com azeite, alho, cominhos e também pinhões. No Líbano, explica Ezzat, há lojas especializadas nestes dois pratos que são muito populares nos pequenos-almoços dos fins-de-semana. Outros pratos nas “manhãs salgadas” do Muito Bey são, por exemplo, a intensa beringela em azeite recheada com nozes, pimento vermelho e alho, chamada kabiss; ou beid & jebné que é uma omelete com queijo akawi. Na secção de padaria há diferentes propostas de manuché, o pão achatado quente que é coberto com legumes ou queijo ou outros ingredientes, numa versão de Médio Oriente das pizzas italianas. E, por fim, existem as “manhãs doces”, com o knefé, uma torta de queijo servida quente com massa de semolina e xarope de açúcar, pistácio e água de rosas; o mamounié, um pudim quente de semolina e leite com requeijão, canela e xarope de açúcar (algo de semelhante às papas de aveia, embora com uma textura diferente); e o sahlab, pudim à base de leite servido com kaak, um biscoito feito também à base de leite. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Para além do pequeno-almoço, o Muito Bey, que passa a estar aberto continuamente entre as 8h30 e a meia-noite, servindo durante todo o dia, promete para breve novidades na carta de almoços e jantares. E, para a época natalícia, propõe uma versão libanesa do peru de Natal, com arroz e especiarias orientais, confeccionada por encomenda (60€ para um peru com 5/6 quilos). Horário: todos os dias das 8h30 às 00h00Preço: Os preços de cada prato do pequeno-almoço variam entre os 6€ e os 9€ e podem-se combinar ou comer separadamente. Existe ainda um menu que inclui três dos pratos à escolha (em doses um pouco mais pequenas), com um café e um sumo de laranja natural, por 12€.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave escola carne
Palavras para um tempo de secura e esquecimento
Uma poesia que interroga o humano e o divino. Versos que se assumem portadores de um legado imponente, mas que se libertam do fardo da servidão, para encontrarem a sua voz, autónoma e livre, desprotegida. É o nosso livro de poesia do ano. (...)

Palavras para um tempo de secura e esquecimento
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: Uma poesia que interroga o humano e o divino. Versos que se assumem portadores de um legado imponente, mas que se libertam do fardo da servidão, para encontrarem a sua voz, autónoma e livre, desprotegida. É o nosso livro de poesia do ano.
TEXTO: Sombra Silêncio é descrito por Carlos Poças Falcão como uma reunião de “poemas muito esparsos no tempo, (. . . ) no espírito (. . . ) e no estilo” (p. 59). Essa “Nota final”, de uma honestidade, desde logo, marcante, fala de uma recolha que “não cumpre inteiramente a ideia que faço de um livro, que releva mais de exigências arquitectónicas que de organização” (id. ). Assim é. E, no entanto, mesmo os poemas aparentemente (ou realmente) específicos a um enquadramento que, na presente colectânea, necessariamente, se perdeu e que, por isso, são, efectivamente, esparsos, acabam por encaminhar-se para o cerne desta poesia: a busca por uma possibilidade de sentido para o humano, enquanto carne e espírito — “O fotógrafo trabalha num recorte de penumbras/ captando (capturando) espectros luminosos/ silêncios fugidios, movimentos, corpos tensos, / expostos numa sombra de uma sombra de uma sombra. ” (p. 47) Porque esta é uma poesia que procura sentidos, que se interroga e que, ao fazê-lo, se dirige ao mundo, interpelando o que é dele, mas também aquilo que o transcende. A escrita deste poeta é, por conseguinte, uma causa e uma consequência da inquirição do humano e do transcendente, aqui concebidos como dimensões irredutíveis. O que não quer dizer que, de repente, se iluda a dificuldade que há em saber se Deus é incomparavelmente obscuro ou incompreensivelmente simples. “Silencioso, último, sem préstimo, obscuro/ aí vem, com seu sorriso, a face arcaica: o Deus. ”, lia-se já em A Nuvem (A Pedra Formosa Edições, 2000, in Arte Nenhuma (Poesia 1987-2012), Opera Omnia). Autoria: Carlos Poças Falcão Opera Omnia Ler excertoEm Sombra Silêncio, Carlos Poças Falcão propõe a necessidade de uma espécie de raciocínio indutivo, que subverte a ordem dos factores; sempre questionando, avança a seguinte hipótese, em dois versos de um dos poemas aqui coligidos: “se nada encontras/ como hás-de procurar?” (p. 39) O sujeito desta poesia assume, portanto, a sua posição enquanto agente que se apresenta despido perante a violência da questionação — “aí, na indefensão, nos entregamos e vivemos” (p. 12). Um sujeito que se concebe perante uma ordem alternativa à dispersão do concreto, da sua energia imediatista e dissipada — “Eu sou a noite/ eu sou a espera inútil, a vasilha que ressoa. / A minha alma é nova, mas espero deste sempre. / Como o deserto espera pela gota que há-de vir. ” (p. 9) À concretude limitadora, esta poesia contrapõe, ou associa, uma perenidade que, ainda assim, se faz de matérias perecíveis, como uma vasilha, e de encontro a um lugar concreto, como o deserto — mas onde ressoam a informação cultural e a matriz bíblica, aspectos fundamentais nesta poesia. Um dos poemas reunidos em Sombra Silêncio abre com dois versos especialmente reveladores: “Aprendi a ver de longe a grande árvore das crenças/ com os seus frutos de álcool e sombras desejadas. ” (p. 48) Esta “árvore das crenças” não é, porém, um indício de endoutrinação, nem constitui qualquer assomo de uma piedade que cometesse a falha de esquecer o “deus inquietado”(p. 52), que, pelo contrário, comparece, poucas páginas depois. Porque a poesia de Carlos Poças Falcão nunca oculta que se escreve “Daqui deste ruído” (p. 24), mesmo quando se dirige a Deus, como sucede no poema cujo primeiro verso acabado de citar, nem se recusa a ouvir o “clamor civil” (p. 30). Sendo esta uma poesia de interrogação e busca do transcendente, ela parte do terreno — “O mundo é minha língua, quando falo escuto-me outro/ e as frases desunidas, por sentidos enganados/ conduzem-me a um lugar de desencontro. ” (p. 24) Contudo, também se pode dizer que a acumulação de elementos heterogéneos, difusos, e até certo elenco de banalidades, serve, paradoxalmente, para suplantar esse muro irreversível que é a taxatividade — “como pedir ajuda aos arrabaldes/ como fazer oferendas às rotundas/ seguir na ordem certa das fachadas?” (p. 42). Com o decurso dos versos, tudo se fortifica de novas implicações, níveis aventícios do sentido — “não ouças os apelos/ não despertes seus olhares// porque são apenas homens e demónios” (id. )Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Uma poesia como a de Carlos Poças Falcão é, necessariamente, uma revisitação (lúcida e emancipada) de um vasto legado. Ao lermos estes versos: “Subir uma montanha é fincar-se ainda à terra/ ascender a altos cumes é ainda horizontal. ” (p. 22), ou quando somos confrontados com ocorrências como “um desconhecer a pique” (p. 27), não é apenas da dualidade entre terreno e divino que se trata, mas de uma descodificação do que é idiomático, dentro dos códigos do texto bíblico, enquanto fonte cultural e literária. O conhecimento é ascensional, no sentido em que prefigura uma superação metafísica, ou um confronto superador entre a visceral incompletude humana e a totalidade infinita do transcendente — o temporal e o espiritual, se é adequado tal simplismo. Mas, além da poderosa imagem da montanha, esta poesia abeira-se, por exemplo, do sortilégio do Cântico dos Cânticos, para fazer uma releitura dinâmica daquele grande monumento lírico (e devocional). Este universo poético, altamente codificado, estatuído na sua gramática própria, é recalculado e refeito, na poesia de Carlos Poças Falcão, através de uma imagética subtil, profundamente sugestiva, e de hábeis apropriações, de timbre, mais do que sensual, insinuante, que colhem inspiração no texto bíblico para lhe dar nova vida e diferentes configurações — “percorre a minha pele/ é nela que lhe ofereço o coração// beija-me a sua boca é néctar/ olha-me o seu olhar protege-me” (p. 15). A memória e a reinterpretação da matriz bíblica opera poderosos efeitos na construção de sentidos vários e actuantes que estes poemas nunca deixam de ser. Uma sequência como: “o que é humano ao centro/ como um sacrifício vivo/ que não acha repouso” (p. 44) recorda-nos que o fardo — e a benesse? — do ser humano é, ao contrário dos restantes animais, não ter real quietude à sua disposição, nem verdadeiro abrigo com que possa contar. O que não pode deixar de ecoar as palavras de Mateus: “O Filho do homem não tem onde reclinar a cabeça. ” Trata-se, não de índices de erudição, mas da capacidade de transfigurar e transpor o que poderia fixar-se e petrificar, tornando-o, pelo contrário, uma parte da vida. Esta poesia reflecte sem receios acerca da condição humana, sem obliterar a desumanidade que, a maior parte das vezes, a define — “Perseguições e mortes são o tédio a história/ mas para os céus clementes tudo flui. ” (p. 13) Ao fazê-lo, não pretende coarctar as suas possibilidades como espécie, mas lançar as bases para um debate íntimo e quase silente, o que estes poemas levam a cabo. Uma tentativa de entender “a obrigação da liberdade” (p. 19) e o horizonte iniludível da adversidade — “o mal/ não está no escolher, mas na fractura de me ver” (p. 11) —, uma condição à qual o sujeito não foge. Ao poema, com a sua “voz pobre” (p. 37), mais não resta do que a humildade de assumir a “mais obscura idade” (p. 43) em que se forma e em que, também ele, deve “entrar no fogo/ e só arder” (p. 55). Mais não lhe cabe do que a oferenda de “palavras para um tempo de secura e esquecimento” (p. 37).
REFERÊNCIAS: