Marlene Monteiro Freitas ganhou um leão com asas mas não vai deixar de ir à caça
Quando o Leão de Prata da Bienal de Veneza (o primeiro de sempre para a dança portuguesa) lhe chegou às mãos, em Junho, já tinha estreado uma peça em Israel que foi toda uma educação política (além de coreográfica). A carreira promete prosseguir, fulgurante, para esta coreógrafa cujas peças têm a potência avassaladora, tão próxima da vida quanto da morte, dos Carnavais de São Vicente. (...)

Marlene Monteiro Freitas ganhou um leão com asas mas não vai deixar de ir à caça
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: Quando o Leão de Prata da Bienal de Veneza (o primeiro de sempre para a dança portuguesa) lhe chegou às mãos, em Junho, já tinha estreado uma peça em Israel que foi toda uma educação política (além de coreográfica). A carreira promete prosseguir, fulgurante, para esta coreógrafa cujas peças têm a potência avassaladora, tão próxima da vida quanto da morte, dos Carnavais de São Vicente.
TEXTO: Não a vimos muito por cá em 2018, mas foi por boas razões: Marlene Monteiro Freitas passou metade do ano em Tel Aviv a resolver o quebra-cabeças (para ela inédito) de criar uma peça para uma companhia estabelecida, a Batsheva, isto enquanto media cada passo que dava no campo minado do conflito israelo-palestiniano; e a outra metade a mostrar trabalhos anteriores como Guintche (2010), Jaguar (2015) ou Bacantes – Prelúdio para uma Purga (2017) num território que já domina, o circuito internacional. Exactamente a meio, em Junho, marcando um antes e um depois pelo menos simbólico – porque não o vê a afectar assim tanto o que fará a seguir –, recebeu das mãos de Marie Chouinard (e ao lado de Meg Stuart) o Leão de Prata da Bienal de Veneza, o primeiro de sempre para a dança portuguesa. Sempre em trânsito – por estes dias, entre Estrasburgo, Lisboa e Munique –, não foi fácil apanhar a mais selvagem das nossas coreógrafas, corpo de transformista, cabeça em mise en abîme, o killer-instinct de uma caçadora, para esta entrevista. Nisso, 2018 não foi um ano assim tão excepcional: em 2019 e 2020 continuaremos a ter saudades de a ver por cá. O que é que se faz com um Leão de Prata de Veneza? Literalmente: onde é que ele está?(Risos) Ficou muito tempo guardado numa caixa. Agora está visível, numa estante. Mas demorou a sair da caixa, não sei porquê. E não fui eu que o tirei (risos). Ser oficialmente consagrada como “um dos melhores talentos da sua geração” mexe com a cabeça de um artista?Um Leão de Prata de Veneza é aquele tipo de coisa que nunca imaginamos que vai acontecer: não é um prémio que se espere. Não me passava pela cabeça sequer que do facto de o Bacantes ter sido selecionado para o programa da Bienal de Dança resultasse uma distinção. É um marco importante, uma razão para celebrar, mas fundamentalmente acho que não muda nada: não muda a minha relação com o trabalho ou com os meus colaboradores, não muda os projectos que penso realizar. Conseguir fazer um projecto é um passo importantíssimo, traz tanta felicidade quanto uma distinção destas. O que é possível – e vejo isto com outra nitidez agora, porque depois de Veneza já estive em Cabo Verde [De Marfim e Carne – As Estátuas Também Sofrem abriu em Novembro o festival Mindelact] – é que este prémio abra uma possibilidade: para um jovem cabo-verdiano ter um percurso como o meu deixou de ser irreal. Cabo Verde é um país com poucos meios, onde não há uma formação artística convencional (sou um exemplo disso, tive de sair para passar por uma escola de dança)… O mediatismo do Leão de Prata, a recepção que ele teve por parte dos poderes políticos, a possibilidade de o Governo concluir que é necessário um investimento nas áreas artísticas: isso sim, pode dar uma forma valiosa a este prémio. O facto de o prémio ter sido proposto pela Marie Chouinard – que, embora numa direcção radicalmente diferente, também trabalha o corpo a partir da deformação e da mitologia clássica, dois tópicos seus – tem alguma importância simbólica? O trabalho dela faz parte da sua genealogia, ou é absurdo pôr as coisas nesses termos?Não é absurdo. Eu conhecia o trabalho da Marie Chouinard das aulas da história de dança, tem todo esse peso (risos)! E mais tarde, quando acabei a minha formação na P. A. R. T. S. e tive um programa comunitário na Cova da Moura [Não vamos ter aulas de dança, vamos ensaiar], fui com alguns jovens do bairro ver uma peça dela ao Centro Cultural de Belém: o impacto daquelas imagens foi extraordinário. Mas a minha história pessoal com a Marie Chouinard começa em 2012, quando levámos a Montréal o (M)imosa / Twenty Looks or Paris is Burning at the Judson Church [co-criação de Marlene Monteiro Freitas com François Chaignaud, Cecilia Bengolea e Trajal Harrell] e ela foi ver a peça. Foi por essa altura que me disse que se eu quisesse fazer parte da companhia dela podia ir quando quisesse (risos). Eu não tinha nada a ver com aquilo, acho que no fundo ela sabia que eu nunca iria (risos)! A verdade é que não nos encontrámos estes anos todos. Se há uma genealogia… certamente que eu venho de algum sítio. Mas posso encaixar-me em várias histórias da dança, não consigo escolher apenas uma parte dessa história. A questão das influências é sempre muito difícil para mim. Gosto de muitas coisas – e não digo isto por disparate. Tanto me sinto próxima de um instante de uma peça como de um instante de um filme ou de uma música; informam o meu trabalho de igual forma. Não posso afirmar descendência directa de uma linha ou de uma forma de fazer específica. Então que genealogia é relevante?O meu avô [Jorge Monteiro, conhecido como Jotamont] era compositor, tenho uma tia que veio muito nova para Portugal estudar música… Mas são coisas infinitas. O meu pai não tinha nenhum talento artístico (até tinha: conseguia construir coisas com as mãos…) mas tinha uma imaginação tão livre que ainda hoje é recordado por isso. A capacidade dele para criar uma realidade paralela e fazer-te vaguear dentro desse mundo era um talento muito presente, muito forte: eu cresci a ver e a sentir coisas que não existem. A minha mãe tinha uma relação com a música também, mas mais espontânea: tocava muito o piano lá de casa. E adorava dançar: era a melhor bailarina nas festas, lembro-me de ouvir as pessoas dizerem “esta música, vou ter de dançá-la com a Neuza”. A minha irmã, dez anos mais velha, com quem partilhava o quarto, tinha dois posters enormes com uma bailarina clássica, bailarinas nas capas dos cadernos… E tinha um livro, O Mundo do Ballet¸que eu acabei por herdar; muitos anos mais tarde, vim a descobrir que a minha imagem preferida, um homem todo pintado, a segurar um arco, era um bailarino do Béjart…Sempre dancei muito com a minha irmã em frente ao espelho, depois comecei a fazer ginástica rítmica. Mas não gostava das competições – e a partir de determinado nível tornou-se uma prática muito solitária. Nessa altura já coreografava: escolhia uma música e um figurino, treinava os passos. Fiz a minha primeira coreografia – não sei se posso dizer isto (risos) – aos seis anos, com uma amiga, para uma festa na rua: com o La isla bonita, da Madonna. Depois tive um grupo de dança com amigos, criávamos números para festas da escola, concursos de misses… Mas o meu primeiro contacto com a improvisação foi em casa de um músico, o Vasco Martins, teria eu uns 14 anos: estava sozinha num quarto, no outro uma data de músicos importantíssimos, e ele pediu-me que os ouvisse e fizesse o que me viesse à cabeça (risos). Acho que para mim tudo começou nesse quarto. Sempre gostei mais de trabalhar quando não está ninguém a ver. E houve o encontro com a Clara Andermatt…Que foi uma sorte. Eu não estava inscrita no workshop, mas ela viu-me tão interessada que disse que eu podia ir. Quando vi o resultado final, fiquei mesmo com vontade de fazer. Até aí eu sabia e não sabia. Também gostava muito de psiquiatria, mas o que me interessava na psiquiatria era a mente, e ter de passar pela medicina toda afastou-me. Acabei por ir para a dança, coisa ainda mais obscura (risos). A declaração do júri da Bienal de Veneza descrevia o seu trabalho a partir de expressões como “híbrido”, “metamorfose” e “deformação”. Reconheceu-se?Em parte. Também porque prezo muito a ideia de que as pessoas podem falar do meu trabalho à sua maneira. Eu trabalho justamente para que o espectáculo permita que as pessoas projectem ali a sua imaginação. Não tento controlar o que se diz sobre o meu trabalho; às vezes eu própria digo asneiras… Sim, o meu trabalho é sempre sobre o híbrido, a metamorfose, a intensidade, mas também é sempre mais do que isso. E quando eu falo do híbrido, não se trata de perseguir uma criatura estranha com asas – como o Leão de Veneza –, mas da possibilidade de colocar umas coisas ao lado das outras, coisas que não imaginarias juntas, para ver o que resulta a partir daí. O espectáculo tem a sua forma, tem princípio, meio e fim, tem um nome, tem uma estrutura que foi ensaiada, controlada… mas é uma entidade viva: só fala pela boca do público, só vê pelos olhos do público. Mesmo que para mim, antes, durante e depois disso, esteja o prazer de dançar, o prazer físico de procurar no corpo a dança específica de cada trabalho. E um brincar com os materiais e os códigos de cada espectáculo. Trata-se sempre de coleccionar coisas e experimentar o que vai acontecer a este corpo, nesta peça: é tão básico quanto isso. Mesmo quando eu não entro, como na peça mais recente: dançava com os bailarinos todos os dias. Não passo sem isso, tenho de pôr o corpo no centro. Mas há a tal fase em que está sozinha a acumular referências. Não são processos separados, um alimenta o outro. Às vezes parece que eu parto de uma ideia central para coisas muito periféricas, mas isso acontece com o corpo também. As referências que vou encontrando informam o que faço com o corpo, o que faço com o corpo leva-me à procura de referências: há um ir e vir muito conectado. E a música está lá sempre. Eu muito rapidamente sou alterada pela música, influencia-me tremendamente, é automático. Desde miúda. Quando fazia os meus esquemas para a ginástica, ia à rádio de São Vicente procurar músicas que não conhecia. Ainda faço isso. E em todas as direcções: o meu gosto musical é muito ecléctico. Mas isso também acontece com os filmes, com a pintura: o que me toca não é a forma, é a intensidade. O júri do prémio também fazia outra referência que se tornou um lugar-comum: o Carnaval de São Vicente. É mesmo essa a raiz do prazer da metamorfose e da deformação até ao limite do esteticamente incorrecto?É. Esse jogo do tornares-te qualquer coisa, do tornares-te outro, a permissão de uma certa desordem, ou da coabitação da desordem com a ordem, da fealdade com a beleza… Em pequena eu adorava ficar a ver os homens que comiam babosa [aloé vera], aquela textura como ranho na boca: era impressionantemente feio e ao mesmo tempo fascinante. Essa passagem de um estado ao outro, de um ritmo ao outro, é uma coisa que me fascina muito, pelo movimento que permite: um riso que se torna um grito, uns olhos desvairados que se tornam tristes. A tensão entre extremos, entre opostos, tem uma fragilidade qualquer. E essa experiência continua impressa mesmo passados… quando foi o seu último Carnaval em São Vicente?Há demasiado tempo. Queria ir este ano, mas não consegui ter duas semanas de paragem – porque há uma coisa que as pessoas aqui não percebem, o Carnaval em São Vicente não são só uns dias. Mas estive no fim de ano. Fala-se muito do Carnaval, mas também há o fim do ano, as festas do São João, fortíssimas, cheias de álcool, de terra, de dança, de música – sempre tomei parte, mesmo que acontecessem à noite e não fossem propriamente feitas para crianças… É difícil explicar, mas não é só o dia da festa, são os dias a fio a imaginar a roupa e as horas que passas no costureiro, que afinal não tem tempo e às tantas, quando vais lá no último dia para os acabamentos, tem mil pessoas à espera, e já tens as lantejoulas coladas e o cortejo já está na rua, e aquilo vai tudo mal mas é incrível na mesma. No primeiro dia de Janeiro, a banda (que dantes era dirigida pelo meu avô) vai pelas ruas a tocar sempre a mesma música horas e horas e horas – ninguém se cansa. Acompanhas a banda, a música é feliz, mas entras em casa das pessoas e sabes – porque numa ilha toda a gente se conhece – que no ano que passou esta família perdeu alguém, que naquela casa há alguém que está nos últimos dias, que na outra nasceu um bebé: tudo ganha uma potência desmedida. O cortejo cruza-se com as pessoas que saem das festas e que se puseram bonitas mas já não estão tão bonitas porque beberam, porque perderam um brinco, porque vêm com os sapatos nas mãos… Não há como isto não ficar contigo para sempre. E outra coisa de lá que ficou comigo: a relação entre a morte e a vida, que é muito diferente. Também coabitam?Em Cabo Verde a morte vê-se. O cortejo fúnebre é uma coisa muito presente, faz parte da vida. Mas é claro que só dei conta disso quando saí. Portugal foi um choque?O choque mais radical que se possa imaginar. Foi doloroso, em todos os aspectos. Porque parece um sítio familiar, de tão presente que está no imaginário cabo-verdiano – só quando chegas é que percebes a distância que há. No meu caso a própria relação com o que vim cá fazer – a formação na Escola Superior de Dança – não foi pacífica. Estava habituada a um ritmo de trabalho muito intenso, mesmo que a um nível amador, e na escola o corpo não estava assim tanto em movimento. Achei tudo muito pouco. Mesmo que eu já soubesse - talvez por vir de outro contexto – que a escola não era o sítio onde eu ia encontrar tudo, o onde eu ia estar 100% satisfeita. Só estou 100% satisfeita no palco. Mas não ficou 100% satisfeita como bailarina, também quis coreografar…Eu encontro muita satisfação como bailarina; é outra forma de fazer as coisas. E durante muito tempo, mesmo quando já trabalhava mais como coreógrafa, tentei arranjar tempo para isso – já não tento. Quando foi a última vez?Acho que foi com o Boris [Charmatz, Tout Cunnigham, 2008]… ou talvez tenha sido com a Emmanuelle Huynh [Cribles, 2009]. . . Ou o trio com a Tânia [Carvalho, O Reverso das Palavras, 2013]. Meu deus, já não sei! Mas não faço mais apenas por não poder. Quando as pessoas me convidam dá-me logo vontade, tenho de me controlar. 2018 foi o ano do Leão de Prata, mas também de outra primeira vez: a criação para o elenco de uma companhia, a Batsheva. Em Junho dizia: “Vai mudar a minha forma de trabalhar”. Mudou mesmo?Sim. Estou habituada a trabalhar com os intérpretes que eu escolho e aqui havia um elenco, ainda por cima grande. Os meus planos para ir trabalhando com pequenos grupos à medida que a peça evoluía foram por água abaixo. Mas criar o Canine Jaunâtre 3 [a peça chegará a Culturgest, em Lisboa, e ao Teatro Municipal do Porto em 2020] foi uma experiência incrível, com uma carga emocional muito, muito forte – quando acabei estava exausta. Ia assustada?Muito. As pessoas diziam-me que eu não tinha nada a ver com a Batsheva, mas as diferenças de vocabulário coreográfico não foram nunca uma questão. E acho que temos em comum uma dedicação visceral ao trabalho. Desde o início que tanto eu como eles tivemos bem presente que trabalharmos juntos implicaria eu ir na direcção deles e eles virem na minha. E entretanto estava a trabalhar com uma companhia de dança israelita numa peça a estrear no Israel Festival…. . . e a lidar com pedidos de boicote. Foi muito duro. Porque é uma situação muito séria e não se pode lidar com ela de forma ingénua. Tive de estudar o assunto para me sentir em condições de dar uma resposta e definir a minha posição em relação a este trabalho. Portanto foi uma questão?Foi sempre: antes de aceitar o convite do Ohad [Naharin], durante todo o processo de criação e até hoje. E não é por causa das cartas de apelo ao boicote, é porque sabes que estás a trabalhar num país que tem em curso uma limpeza étnica há 70 anos. Quando o Tiago Rodrigues, já em Maio, renunciou à participação no Israel Festival…Nessa fase eu já tinha trabalhado muito para chegar à minha posição – mas a carta mexeu comigo. Eu acho que é preciso boicotar, mas também é preciso perceber muito bem o que se está a boicotar para não se fazer o jogo do Estado israelita – porque os principais opositores à política do Estado de Israel estão em Israel. A minha resistência ao boicote nunca passou por qualquer tipo de ingenuidade; acho é que a situação é de uma complexidade tão grande que não se resolve com uma declaração, nem com um email, nem com um boicote. Nem com uma peça, claro. Mas a conclusão a que eu cheguei foi que a linguagem em que eu me sinto mais à vontade é aquela em que eu me movo: não consigo dizer com um boicote tudo aquilo que consigo dizer com o Canine, ou com as coisas que eu vou descobrindo nas minhas visitas à Palestina… Há a possibilidade de montar cá uma programação com artistas e ONG que têm trabalhado sobre a questão israelo-palestiniana. Por obrigação moral?Não no sentido de ter de expiar uma culpa, mas no sentido de achar que devemos perceber o que está a acontecer. O Canine já exprime a minha posição de um modo claro. Há sempre diferentes leituras possíveis, mas é um espectáculo em que duas equipas se dedicam com muita infantilidade a um jogo de construir e destruir, erigir e demolir – um jogo cujas regras podem mudar, conforme o que se quer conseguir… Isto é o Canine. Diz o que eu tenho a dizer. Portanto Israel fez da Marlene Monteiro Freitas uma programadora?Não! Seria uma catástrofe! Uma vez fiz isso em França e o que era suposto ser uma coisa pequena tornou-se gigante. Mais planos para 2019?Em 2020 há uma peça a fazer com os actores da Kammerspiele de Munique (ainda não sei se também haverá bailarinos) e o trabalho já está a começar. Mas este ano faço uma instalação para a [bienal] BoCA. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. E muita circulação internacional?Alguma, mas estamos a tentar reduzir porque terei de estar bastante tempo em residência. Mais fora de Portugal do que dentro, como sempre?Sempre foi assim. As peças de uma coreógrafa que vive em Portugal não sentem falta de ter um público português?Ninguém faz espectáculos para não serem vistos. E o trabalho que se faz numa peça a partir do momento em que ela finalmente contacta com o público é muito importante – privar um espectáculo disso é terrível. Mas é como se já nos tivéssemos habituado à dificuldade de apresentar o trabalho cá; temos de nos desabituar.
REFERÊNCIAS:
Diz-se Senhora Presidenta e é uma galeria de arte no Bonfim
Mariana Malhão, Dylan Silva e Luís Cepa, três jovens artistas vindos da FBAUP, juntaram-se a Célia Esteves, experiente designer e criadora da GUR, e juntos abriram uma loja-galeria. A Senhora Presidenta existe e mora no Bonfim, Porto. (...)

Diz-se Senhora Presidenta e é uma galeria de arte no Bonfim
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: Mariana Malhão, Dylan Silva e Luís Cepa, três jovens artistas vindos da FBAUP, juntaram-se a Célia Esteves, experiente designer e criadora da GUR, e juntos abriram uma loja-galeria. A Senhora Presidenta existe e mora no Bonfim, Porto.
TEXTO: A Senhora Presidenta — assim mesmo, “Presidenta”, sem pompa e circunstância — convida a entrar. Tem janelas de cima abaixo, muita luz, uma loja de tapetes e uma jovem galeria de arte montada pelos três jovens artistas que trabalham lá atrás, num atelier que esconde secretárias, provas, esboços, teares e o cão Xuxu que, às vezes, decide mostrar-se, divertido. Entremos, então. Lá dentro encontramos Mariana Malhão — “ilustradora, apesar da licenciatura em design”, 23 anos — Dylan Silva — 25, “considero-me sobretudo pintor” — e Luís Cepa, 24 — “assumidamente designer gráfico, sim”. Os três conheceram-se na Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto (FBAUP), muito próxima dali. “Há o quê, seis anos?” Mariana desvaloriza: “Não importa, também no início não éramos assim tão amigos. ”A ilustradora de Coimbra e o pintor da Marinha Grande já eram vizinhos. Da faculdade e, sem saberem, da antiga casa de sistemas de vigilância que, com a ajuda e "mentoria" da designer Célia Esteves, criadora dos tapetes GUR, transformaram na mais recente loja-galeria do Bonfim. Mas já lá vamos. Antes, há cerca de um ano, os dois artistas começavam a Sábado-Feira, uma "feira de artes diversas no Maus Hábitos”, aos sábados. Tinham trabalho, mas faltava-lhes um espaço próprio, “sério”, para trabalharem. Ao mesmo tempo, inquietavam-se. “Mas e a seguir?” Passo um, decidiram: “Encontrar um atelier. Tínhamos saído da faculdade há pouco tempo e queríamos focar-nos no nosso trabalho enquanto artistas. ”Arrendaram, então, um espaço soalheiro voltado para o Mercado do Bolhão, poucos meses antes do início das obras no mercado centenário. Seduziram Luís Cepa, arranjaram-lhe uma secretária e nesse primeiro atelier divertiam-se a imaginar as histórias da primeira Senhora Presidenta — que na altura ainda era só uma (senhora) gaivota de bico arrebitado, sempre atenta aos momentos de distracção das peixeiras. “Falávamos muito em ter uma galeria nossa”, confidencia Mariana Malhão. Mas precisavam de um “empurrão”. Coragem. Foram buscá-la a Célia Esteves, da Gur, e a Rui Vitorino Santos e Júlio Dolbeth, professores na FBAUP com atelier nas redondezas e fundadores da Dama Aflita, a desaparecida galeria de desenho e ilustração, uma das poucas no Porto. Sem ela, haveria um espaço por preencher na cidade?“Falo por mim, eu tinha algum saudosismo em relação à Dama Aflita”, começa por dizer Luís. “Mas não sei se queremos esse peso, não sei se o aguentamos. O legado que traz… Somos coisas distintas. ” “Ai Jesus do Céu”, deixa escapar Mariana. Dylan interrompe-os. “Claro que há a Ó!, mas nós sabemos que, em termos de galerias, o Porto comparado com Lisboa é muito mais fraco. Então porque não?”, atira-lhes. Foi uma “simbiose” de vontades. Célia Esteves queria abrir a primeira loja física da Gur, a marca de tapetes de lã feitos à mão com o auxílio de um tear através da técnica tradicional do puxadinho. Foi a designer que encontrou aquele espaço, na Rua Joaquim António de Aguiar. “Vamos?”, perguntou-lhes. “E nós confiámos”, explica Mariana, que não se cansa de repetir que este “não é um projecto só de três jovens artistas loucos”. Ou que “sem aquela rede de segurança não estariam ali”. “E seria um desperdício deitar fora os conselhos que os três nos deram. E os pregos e outros materiais que herdámos [da Dama Aflita]”, brinca Mariana. Tanto a Senhora Presidenta como a Gur partilham a porta 65 e o atelier com entrada pela galeria (um dos requisitos do grupo, para não terem de separar o artista do galerista). “Apesar de serem espaços teoricamente diferentes, contaminámo-nos”, poetiza Luís Cepa. Aproveitam para fazer do encontro uma das regras de ouro da loja-galeria: “Não nos vamos focar numa coisa só. Não nos sentimos obrigados a dizer ‘nós somos isto’. Não queremos estar a fechar as portas porque é uma coisa totalmente diferente, ou porque não a entendemos. ”Na galeria, que se inaugurou a 15 de Setembro, querem “essa mistura toda”. “O interessante é mesmo haver essa dinâmica entre alguém com projecção internacional e alguém da cidade que está a agora a começar", realçam. Aquando da visita do P3, uma das paredes ainda se revestia de guardanapos. Em vez de limpar a boca, a dupla portuense Chei Krew rabiscou-os e transformou-os numa exposição que reflecte o quotidiano dos cafés portugueses. Depois de Berlim, a mostra passou pelo Porto, marcando assim a estreia das exposições VRRRUMMM, caracterizadas pela “efemeridade”. A partir de 3 de Novembro, a galeria recebe 20 piscinas e uma garrafa de Rum, com pinturas e desenhos de Bruno Borges. Com o tempo, o calendário quer também preencher-se de exibições de filmes, workshops, conversas. Datas, só para o ano. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Na semana anterior, decorreu ali o lançamento da terceira edição do “jornalinho de bairro” O Bonfim, publicação de distribuição gratuita criada por uma tradutora, uma ilustradora e uma designer gráfica da freguesia na parte oriental do Porto. Algumas cópias ainda repousavam por estes dias na galeria. Folheada a primeira página, o leitor pode encontrar um levantamento “do circuito de arte no Bonfim”, cada vez mais preenchido também por nesta zona ainda ser possível encontrar "áreas acessíveis para arrendar por estudantes e artistas”. “Eu vivo a 20 metros daqui e tenho a noção que esta zona do Bonfim está a crescer muito. Acho que não queríamos ir para uma zona muito turística. Ou queríamos?”, pergunta, retórico, Dylan. “Eu não queria”, apressa-se Luís, e prossegue: “Uma das coisas boas daqui é que estás a dois minutos a pé do Coliseu, mas ao mesmo tempo esses dois minutos dão-te a segurança de estares um sítio calmo para trabalhar e onde ainda consegues ter a experiência quase de bairro, de cumprimentar as pessoas que passam lá fora. ” No jornal, a fotografia que acompanha o levantamento dos espaços artísticos da “vizinhança” mostra, precisamente, aquela galeria, a mais recente adição a um circuito “em crescimento evidente”. E deixa uma pergunta, à espera de novas respostas: “À hora do fecho desta edição, quem sabe se novos pontos neste mapa não se desenham?”
REFERÊNCIAS:
Na doença de Alzheimer nem sempre a morte de neurónios é má
Através de experiências com moscas-da-fruta, cientistas do Centro Champalimaud verificaram que, nas fases iniciais da doença de Alzheimer, a morte de neurónios danificados pode ser vantajosa. (...)

Na doença de Alzheimer nem sempre a morte de neurónios é má
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento -0.69
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: Através de experiências com moscas-da-fruta, cientistas do Centro Champalimaud verificaram que, nas fases iniciais da doença de Alzheimer, a morte de neurónios danificados pode ser vantajosa.
TEXTO: Era do consenso geral que a morte de neurónios no cérebro era responsável pelo caos cognitivo associado à doença de Alzheimer. Agora, uma equipa de cientistas do Centro Champalimaud (em Lisboa) – juntamente com investigadores da Suíça – desconstrói essa ideia através de experiências com moscas-da-fruta e refere que a morte neuronal pode não ser má. O que pode ser? Um mecanismo para controlar a qualidade celular com o objectivo de proteger o cérebro da acumulação de neurónios disfuncionais. O gatilho que desencadeou o trabalho apresentado esta quarta-feira na revista Cell Reports foi accionado em 2015 com a publicação de um estudo na Cell sobre o mecanismo de competição celular. Este mecanismo controla a qualidade dos tecidos e terá surgido na evolução dos organismos mais complexos para resolver conflitos entre células. “As células do mesmo tecido comparam constantemente os níveis de ‘fitness’ (aptidão) entre si. Aquelas que apresentam uma aptidão mais baixa, ou seja, que se encontram danificadas ou que sejam pouco funcionais são eliminadas por morte celular, deixando de fazer parte do organismo”, explica Dina Coelho, do Centro Champalimaud e primeira autora do artigo. A investigadora indica que isto é vantajoso por duas razões: para excluir células doentes que podem dar origem a um organismo defeituoso durante o desenvolvimento ou envelhecimento; e para proteger o organismo das “células egoístas” – como as células cancerosas – que não contribuem para o seu bom funcionamento. Ora, no estudo de 2015 descrevia-se a competição celular como um mecanismo de antienvelhecimento. Neste mecanismo, as células danificadas que normalmente se acumulam no corpo ao longo da idade são eliminadas, o que será benéfico tanto para a integridade dos tecidos como para a saúde do indivíduo. Fez-se então a pergunta: estará este mecanismo envolvido em doenças em que o factor de risco é a idade, como as doenças neurodegenerativas? “Isto nunca tinha sido testado”, assinala Eduardo Moreno, do Centro Champalimaud e coordenador do estudo juntamente com Christa Rhiner (também do Centro Champalimaud), num comunicado da Fundação Champalimaud. O teste foi feito em moscas-da-fruta. Para tal, a equipa manipulou geneticamente este animal para que expressasse no seu sistema nervoso a versão humana da proteína beta-amilóide (que forma placas no cérebro de doentes com Alzheimer). Observou-se então que apresentava sintomas semelhantes aos dos doentes de Alzheimer como a acumulação de placas de beta-amilóide no cérebro, morte precoce, dificuldade em movimentar-se e problemas de memória. Isto acontecia porque os neurónios estavam danificados e os que estavam menos aptos eram mortos por competição celular. Por fim, testou-se se a morte neuronal – desaparecimento das células responsáveis pela transmissão de impulsos nervosos e que processam a informação, os neurónios – seria positiva ou negativa. Quando se bloqueou a morte neuronal, o cérebro deteriorou-se mais depressa e as moscas desenvolveram problemas de memória e de coordenação motora ainda piores. “No entanto, quando a cientista [Dina Coelho] estimulou o processo de competição celular, acelerando assim a morte dos neurónios disfuncionais, as moscas que expressavam a proteína associada à doença de Alzheimer tiveram uma recuperação impressionante”, lê-se no comunicado. “Para nosso espanto, conseguimos ver uma regressão impressionante dos sintomas: a estrutura do cérebro apresentava-se mais intacta, a locomoção era mais rápida e ágil e a capacidade de formação de memória foi recuperada”, relata a cientista. “O principal resultado foi o facto de existir uma selecção de neurónios ‘mais aptos’ em detrimento de neurónios ‘menos aptos’ quando o cérebro é confrontado com a proteína tóxica que causa a doença de Alzheimer e que essa selecção (que implica a morte de alguns neurónios) é, na realidade, um mecanismo protector para o organismo”, frisa Dina Coelho. Nas fases iniciais da doença, a morte dos neurónios mais danificados e menos funcionais é vantajosa porque pode permitir ao cérebro reajustar-se e estabelecer novas ligações que compensem a falta desses neurónios, acrescenta. Nos doentes de Alzheimer, os principais tipos de neurónios afectados e os que morrem primeiro são as células do córtex e as do hipocampo. É nestas zonas que se forma a memória, a capacidade de planeamento e da linguagem, que podem ser perdidas durante a doença de Alzheimer. “Usando o modelo da mosca-da-fruta na doença de Alzheimer, percebemos que a morte neuronal é benéfica para o indivíduo porque identifica e elimina especificamente os neurónios danificados. É melhor perder esses neurónios do que tê-los no cérebro a interferir com o seu funcionamento normal. Portanto, a competição celular é uma resposta do corpo contra a doença de Alzheimer”, explica Eduardo Moreno. Quebrou-se assim um dogma científico? “Penso que sim, porque todos julgavam que a morte neuronal era má e que podia explicar os problemas cognitivos associados à Alzheimer”, considera o cientista. “As nossas experiências confrontam isso porque mostram que a morte neuronal não é uma manifestação aleatória que afecta todos os neurónios, mas um processo regulado muito cuidadosamente e que mata especificamente os piores neurónios para beneficiar o cérebro como um todo. ”Por sua vez, Dina Coelho considera que tem de existir um equilíbrio entre os neurónios perdidos e os restantes, que são necessários para executar funções cerebrais. “Em fases já avançadas da doença, o equilíbrio é perdido e a morte drástica de um grande número de neurónios é irreversível, causando danos irrecuperáveis no cérebro que estão na base do caos cognitivo que caracteriza a doença de Alzheimer. ”Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Estes resultados poderão contribuir para o desenvolvimento de novos tratamentos que acelerem a morte celular. “Além dos inibidores dos Bcl-2 ou Bcl-XL [genes que permitem às células cancerosas sobreviverem], estamos a tentar descobrir medicamentos baseados em anticorpos que poderão aumentar ou reduzir a competição celular”, indica Eduardo Moreno. Já Dina Coelho diz que este estudo sugere que os novos tratamentos deverão ser direccionados para fases mais iniciais da doença e ter como alvo neurónios menos aptos, “para que a saúde do cérebro possa ser prolongada por mais tempo”. “A comunidade científica tem chegado à conclusão de que, dada a complexidade da doença, um só medicamento que vise um único alvo não será suficiente e que o mais eficaz será gerar um tratamento que vise vários factores da doença. Os neurónios ‘menos aptos’ podem ser um deles. ”Mas antes de tudo isso (e porque é cedo para saber se a competição celular é um caminho a seguir), ainda terá de se verificar se os resultados deste estudo são replicáveis em ratinhos e humanos. “Até agora, sabemos que os mesmos genes responsáveis pela competição celular também existem em humanos, mas não sabemos se a sua função é conservada no que respeita à neurodegeneração e envelhecimento”, diz Dina Coelho. A equipa quer perceber ainda os detalhes envolvidos no reconhecimento e eliminação dos neurónios menos saudáveis e entender por que é que os neurónios eliminados são tão prejudiciais.
REFERÊNCIAS:
Documentário explica o fim da epopeia da caça à baleia nos Açores
Estreia-se esta sexta-feira um documentário com produção portuguesa sobre a transformação da indústria baleeira na actividade de observação de baleias no arquipélago açoriano. (...)

Documentário explica o fim da epopeia da caça à baleia nos Açores
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.05
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: Estreia-se esta sexta-feira um documentário com produção portuguesa sobre a transformação da indústria baleeira na actividade de observação de baleias no arquipélago açoriano.
TEXTO: Havia uma temática que não saía da cabeça da realizadora Sandra Cristina Sousa e da sua equipa constituída maioritariamente por açorianos: a caça à baleia nos Açores. “Era preciso fazer alguma coisa para arrumar este assunto”, conta-nos. Como tal, procuraram o que tinha sido feito sobre o tema e perceberam que faltava contar como a baleação nos Açores se tinha transformado na observação de baleias. Acabou-se por realizar o documentário Fortuna Escorregadia que se estreia esta sexta-feira na RTP1 às 21h. Sandra Sousa, agora com 42 anos, chegou aos Açores com apenas nove meses. “Portanto, posso considerar-me uma açoriana”, brinca a realizadora. “A baleação é um assunto que está no sangue dos açorianos. Foi uma epopeia e esta geração gostava de explicar de uma vez por todas que os [baleeiros] não foram assassinos e que estavam mesmo a tentar sobreviver. ” A explicação surge neste documentário de 52 minutos feito pela produtora audiovisual Comunicar Atitude, com sede na ilha do Pico, e com imagens subaquáticas de Nuno Sá. Os antigos baleeiros são uns dos protagonistas da história. “O meu avô começou a levar-me ‘à baleia’ com 14 anos de idade [quando se podia ser tripulante de uma canoa baleeira]”, recorda Manuel Medina Azevedo no documentário. Mas este é apenas um dos testemunhos. “Íamos lutar contra um animal que tinha muita força, mais do que a gente”, ouve-se de outro ex-baleeiro. “A grande maioria – e falo por conhecimento pessoal do meu pai – foi àquela vida por necessidade, não por gostar de matar baleias”, diz por sua vez António Manuel Garcia, também antigo baleeiro. “Houve uma fase em que se descrevia os baleeiros como assassinos, como os maus da fita”, recorda ao PÚBLICO Sandra Sousa. “Queremos mostrar que tudo se fez por uma questão de sobrevivência e por estabilidade financeira. ” E até o nome do documentário – Fortuna Escorregadia – se refere aos baleeiros. A expressão (greasy luck, em inglês) pertence a um poema que os baleeiros costumavam escrever nos dentes de baleia durante viagens de baleação. Este poema é declamado por Orson Welles no filme Barbed Water (1969) realizado na ilha do Faial no Verão de 1968. “A caça às baleias nunca deu dinheiro aos baleeiros para se sustentarem”, explica Sandra Sousa sobre o uso da expressão. Este documentário também pretende mostrar alguns “mal-entendidos e segredos” sobre o fim da baleação nos Açores. Em 1982, a Comissão Baleeira Internacional anunciou a suspensão da caça de todas as espécies de baleias com início a partir de 1985 e 1986. Ora, por esta altura, Portugal entrou para a Comunidade Económica Europeia (com a sigla de CEE e actual União Europeia) e fica mesmo impedido de caçar baleias, acabando por ser o último país europeu a abandonar a prática. “Pelo facto de estar à distância e pela sua insularidade, a maioria destas comunidades [açorianas] não terá entendido na altura o que era isto da CEE e porque iam acabar com a caça à baleia”, indica Sandra Sousa. Na altura, os baleeiros acabam por “culpar” o eurodeputado açoriano Vasco Garcia. Além disso, a realizadora diz que os baleeiros não perceberam que havia um cheque de 100 mil dólares (87 mil euros) da CEE para conversão da indústria baleeira na observação de cetáceos. Em 1987, caçou-se um cachalote (na verdade, foram três), a CEE não gostou e cancelou o projecto. Vasco Garcia conta este episódio no documentário. Sandra Sousa refere ainda que o mais interessante foi saber que foram os ambientalistas que criaram as bases para fomentar a criação das empresas de observação de baleias nos Açores. “Percebe-se que a baleação pode passar para whale watching [observação de baleias], que pode haver aqui um negócio”, diz a realizadora. “Foram os ambientalistas que falaram com as comunidades. Hoje os filhos dos baleeiros trabalham nessas empresas. ”Por exemplo, em 1989, o velejador francês Serge Viallelle – outro dos protagonistas do documentário – criou o Espaço Talassa, a primeira empresa de observação de cetáceos em Portugal. Hoje, a protecção das baleias é a grande questão sobre estes cetáceos nos Açores e o turismo tem o seu contributo. “O facto de já existir muito turismo a recair sobre as baleias faz com que não exista um controlo efectivo da protecção destes cetáceos”, avisa Sandra Sousa. “Há muitas embarcações no mar, tudo a correr atrás das mesmas baleias. ” Portanto, no final do documentário questiona-se se as baleias estão a ser protegidas e deixa-se no ar o que poderá ser feito. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. “Ainda temos de encontrar um equilíbrio e é por isso que continuo a insistir neste trabalho: para falar do equilíbrio da biodiversidade e do bom senso que o homem tem de ter com o nosso planeta. Não é só com as baleias”, aconselha Serge Viallelle no documentário. Mesmo com a proibição da baleação foram capturadas em todo o mundo 50. 751 baleias desde 1985, segundo dados de 2017 da Comissão Baleeira Internacional. No topo da lista está o Japão com a caça de 5519 baleias sem autorização e 15. 315 para fins científicos. A seguir está a Noruega com a captura de 11. 900 e Rússia com 6056, ambos os países sem autorização. A realizadora conta que já está a preparar um documentário sobre turismo sustentável (não só sobre as baleias) nos Açores. Chama-se Terras d’um Caim, expressão que nasce a partir de uma comunidade no Pico que consegue ser auto-sustentável em terrenos de basalto. Na Bíblia, Caim refere-se a uma terra árida. Por agora, fiquemos com o Fortuna Escorregadia esta noite na RTP1, na RTP Internacional às 21h15 e em 2019 na RTP Açores e na RTP Madeira.
REFERÊNCIAS:
O (ainda) mistério da estrela de Belém
Que fenómeno astronómico está por trás da designada “estrela de Belém”? A astronomia tem algumas hipóteses para este símbolo do Natal. E agora, se olharmos para o céu, quais as estrelas visíveis mais brilhantes em Portugal? (...)

O (ainda) mistério da estrela de Belém
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: Que fenómeno astronómico está por trás da designada “estrela de Belém”? A astronomia tem algumas hipóteses para este símbolo do Natal. E agora, se olharmos para o céu, quais as estrelas visíveis mais brilhantes em Portugal?
TEXTO: Um dos grandes símbolos da época natalícia é a estrela. Por estes dias, quer seja no topo da árvore de Natal ou em músicas, a estrela brilhante está omnipresente. Tudo se deve ao relato bíblico (representado depois no presépio) de magos que seguiram uma estrela até Belém, onde terá nascido Jesus Cristo. Mas, do ponto de vista da astronomia, o que é esta estrela?“Ninguém sabe o que é. Do ponto de vista da astronomia, não há ninguém que possa afirmar que a estrela de Belém foi isto ou aquilo”, começa por dizer Rui Agostinho, astrónomo da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Ao longo dos anos, tem estudado esta questão, que aglomera várias componentes, desde o estudo de registos históricos e de datações usadas por várias civilizações para se apurar o ano de nascimento de Jesus Cristo à leitura e interpretação de textos bíblicos. No final, junta-se a astronomia. “Tendo Jesus nascido em Belém da Judeia, no tempo do rei Herodes, chegaram a Jerusalém uns magos vindos do Oriente. E perguntaram: ‘Onde está o rei dos judeus que acaba de nascer? Vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-lo. ’” Esta é uma passagem bíblica do Evangelho de S. Mateus, onde a estrela é referida. Comecemos então pela utilização do vocábulo “estrela”. “A palavra ‘estrela’ é usada erroneamente. O termo correcto será ‘astro’, era o que as línguas antigas utilizavam genericamente para indicar o que estava nos céus”, diz Rui Agostinho. “Fazer a tradução dos textos bíblicos para ‘estrela’ cria problemas, porque hoje em dia a palavra ‘estrela’ é atribuída muito especificamente a tipos de objectos que existem no céu. ” No fundo, ‘estrela’ significaria um sinal no céu. Máximo Ferreira, astrónomo e director do Centro Ciência Viva de Constância – Parque de Astronomia, explica: “O que se pensa é que ‘estrela’ teria (como ainda hoje pode ter) o significado de ‘luz que orienta’, ‘luz que serve de guia’. Assim, um ‘sinal no céu’ teria o mesmo significado. ”Afinal, a estrela de Belém pode não ter sido uma estrela. Mas, como destaca Rui Agostinho, não houve um cuidado em fazer uma descrição exaustiva, detalhada e o mais exacta possível sobre esta suposta estrela. Além disso, S. Mateus (dos quatro evangelistas incluídos no Novo Testamento) é o único que faz uma referência a este fenómeno e fá-lo de uma forma vaga e ambígua. O astrónomo frisa que nem S. Lucas – que era médico e muito rigoroso sobre aquilo que escrevia – refere o fenómeno. Quanto aos restantes pormenores desta história, não se sabe ao certo qual é ano do nascimento de Jesus Cristo, mas pensa-se que terá ocorrido entre o ano sete a. C. e um a. C. Sobre os magos do Oriente também não se sabe muito. O Evangelho de S. Mateus não dá pormenores sobre estes homens, apenas refere que levavam como presentes ouro, incenso e mirra. É só no século XIII que aparecem representados como três reis magos no presépio criado por S. Francisco de Assis. Também se sabe que o Oriente – até muito antes do nascimento de Cristo – era berço da astrologia e da astronomia e lá fazia-se, por exemplo, previsão de eclipses. Mas o que poderão então estes sábios do Oriente ter observado? Rui Agostinho refere como a resposta mais favorável a conjunção por três vezes entre os planetas Júpiter e Saturno (a Lua também estava muito próxima deles). Este fenómeno terá ocorrido ao longo de meses (e especulando): a primeira vez terá acontecido em Junho, colocando os magos de sobreaviso; a segunda terá sido em Setembro, o que fez que iniciassem a sua viagem de camelo para Jerusalém; e a terceira em Dezembro, o que os guiou até Belém. Sugerida pelo alemão Johannes Kepler (1571-1630), esta conjunção tripla entre Júpiter e Saturno pode ter acontecido no ano seis a. C. e é algo raro que só acontece a cada 300 e 400 anos. Uma conjunção acontece quando um planeta passa extremamente próximo de outro visualmente, ou seja, quando o ângulo de separação entre eles é pequeno. E Rui Agostinho acrescenta que este é um fenómeno discreto o suficiente para que a maioria das pessoas não preste atenção, mas que alguém como os magos do Oriente observassem. Além disso, esta conjunção terá acontecido na constelação de Áries, que estava associada ao povo judeu, salienta o astrónomo. Mas há mais hipóteses de “acontecimentos rápidos” como uma supernova e um cometa. Quanto às supernovas (estrelas que morrem e provocam uma explosão brilhante), à vista desarmada são muito rápidas e duram apenas semanas. E os magos terão demorado meses a andar pelo deserto de camelo até chegar a Belém. “E não há registo de nenhuma supernova nesses séculos ou que possa ser associada ao nascimento de Cristo”, sublinha Rui Agostinho. Um cometa também parece ser hipótese incompatível com o tempo de viagem dos sábios pelo deserto e seria um fenómeno a que mais pessoas teriam dado importância. “O que acontece é que quando os magos chegaram a Jerusalém e perguntam ao rei Herodes onde nasceu o menino porque o vinham adorar, Herodes não sabia de nada. Mandou chamar os sacerdotes e estes também não sabiam de nada”, assinala o astrónomo. “Aquilo que aconteceu não chamou a atenção de ninguém. ”Máximo Ferreira indica ainda que naquela época os cometas eram encarados como um “mau augúrio e, portanto, isso é contrário ao anúncio do nascimento de um ser que seria filho de Deus, salvador da humanidade e, além disso, ainda por não se encontrarem registos nem deduções de que um tal astro tivesse aparecido naquela época”. O cometa acabaria mesmo por figurar no fresco Adoração dos Magos do pintor italiano Giotto di Bondone datado entre 1304 e 1306. Contudo, o símbolo pintado refere-se à passagem do cometa Halley em 1301, que terá impressionado Giotto. A partir daí, a estrela de Belém começou a ser representada como um cometa. Máximo Ferreira também aponta como hipótese a supernova e a conjunção tripla de Júpiter e Saturno, mas acrescenta outras duas. Uma delas é a conjunção de Júpiter com a estrela Régulo, que no ano três a. C. terá tido a particularidade de também ter sido uma conjunção tripla. “O planeta passou por Régulo, da direita para a esquerda, estacionou e retrogradou, tendo passado de novo pela estrela, da esquerda para a direita, parou de novo e retomou o sentido de deslocamento habitual, tendo efectuado uma terceira passagem pela estrela”, explica Máximo Ferreira. A outra hipótese é que até poderia ter sido um grupo de estrelas, caso na época isso fosse considerado um sinal no céu para os magos. “A estrela Régulo e a constelação a que pertence, Leão, eram associadas à tribo de Judá, segundo uma profecia, e ‘traria ao mundo o Messias’. ”E pode não ter acontecido nada? “Estamos convencidos de que algo aconteceu”, responde Máximo Ferreira. “Podemos não saber interpretar o significado de ‘sinal no céu’ para procurar o que terá sido, mas é muito provável que a referência tenha alguma justificação. ” Já Rui Agostinho refere que a hipótese de não ter mesmo acontecido nada também pode ser colocada. A partir das 21h30 de 4 de Janeiro na Fábrica Centro Ciência Viva de Aveiro, Rui Agostinho vai juntar as peças deste fenómeno astronómico e mostrar simulações do céu naqueles anos, assim como conjunções triplas, supernovas e cometas. A entrada é livre e Rui Agostinho assegura que “vai ser giro”. Já agora, se em Portugal continental nos quisermos colocar no papel de magos do Oriente e observar o céu nocturno, quais as estrelas mais brilhantes que descobriremos? Por ordem decrescente, as oito estrelas mais brilhantes e visíveis em Portugal são: a Sírio (na constelação de Cão Maior), Arcturo (Boieiro), Vega (Lira), Capela (Cocheiro), Rígel (Orionte), Prócion (Cão Menor), Betelgeuse (Orionte) e Altair (Águia). Com excepção de Arcturo, todas as outras estrelas podem ser observadas agora (entre Dezembro e Janeiro) desde o anoitecer até à meia-noite, segundo Máximo Ferreira. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Para quem queira começar a identificar estrelas e constelações, o astrónomo aconselha que participe em locais de divulgação de astronomia (como planetários e centros Ciência Viva). Depois, terá de se treinar individualmente com a ajuda de livros, mapas de constelações e aplicações informáticas. Quanto a estas aplicações, Máximo Ferreira aconselha: “Há apenas que ter a garantia de que a bússola do telemóvel está em pleno funcionamento para evitar que dê indicações erradas sobre a parte do céu então visível. ” Por fim, terá de se ter em conta o incómodo produzido pela luz do ecrã do telemóvel, se não tiver a funcionalidade de luz vermelha. Afinal, nada nos deverá distrair ou tirar uma boa observação do céu seja de uma estrela brilhante ou de um outro “sinal no céu”.
REFERÊNCIAS:
Seferovic salva Benfica em Vila das Aves
Os minhotos estiveram a ganhar e criaram oportunidades suficientes para seguir em frente na prova. A exibição pálida dos “encarnados” acabou por bastar. (...)

Seferovic salva Benfica em Vila das Aves
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DATA: 2018-12-30 | Jornal Público
SUMÁRIO: Os minhotos estiveram a ganhar e criaram oportunidades suficientes para seguir em frente na prova. A exibição pálida dos “encarnados” acabou por bastar.
TEXTO: O Benfica encerrou um ciclo de sete triunfos consecutivos, o melhor da temporada, com um empate no terreno do Desportivo das Aves a um golo. Um resultado penalizador face à exibição da equipa da casa, mas com sabor a vitória para os “encarnados” que estão na final a quatro da Taça da Liga. Com um empate a servir para seguir em frente na prova, o conjunto orientado por Rui Vitória entrou no encontro relativamente descontraído e acabou por ser surpreendido pela equipa da casa logo nos minutos iniciais. Em duas transições atacantes rápidas, o ataque do Desp. Aves esteve muito perto de marcar (7’ e 9’), mas falhou incrivelmente na finalização. Apontou o golo do Desportivo das Aves e esteve também muito perto de marcar no primeiro tempo. A velocidade deste jogador emprestado pelo Sporting foi sempre uma dor de cabeça para a defesa “encarnada”. O sérvio foi o mais inconformado do Benfica na primeira metade e também o mais clarividente nos lances ofensivos dos lisboetas. Cruzou para o golo de Seferovic que valeu a final a quatro. Depois dos seis golos apontados ao Sp. Braga para o campeonato, a equipa voltou a manifestar dificuldades na finalização e mesmo na construção de lances de perigo. E até defensivamente esteve particularmente desastrada. Os “encarnados” foram paulatinamente assumindo o controlo do encontro, mas longe de o dominar. Mesmo assim, faziam circular a bola, empurrando o adversário, mas com pouca criatividade ofensiva. A excepção era Zivkovic, que procurava desenhar jogadas e abrir espaços para os seus companheiros, sem efeitos práticos. E, aos 39’, voltaria a ser o Desp. Aves a colocar a defesa benfiquista em sentido. Com um grande passe em profundidade, Vítor Gomes assistiu Amílton, na esquerda, mas o extremo, isolado perante Svilar, atirou às malhas laterais. O Benfica acusou o toque, ainda que timidamente, e criou duas oportunidades na baliza dos minhotos já nos instantes finais da primeira metade, mas sem grande perigo. O nulo ao intervalo penalizava mais os homens da casa, face ao rendimento dos “encarnados”, que entraram em campo apenas com três novidades em relação àquele que é o seu “onze” titular. Rui Vitória chamou à equipa Svilar para render Odysseas na baliza; Yuri Ribeiro no lugar de Grimaldo, no lado esquerdo da defesa e Seferovic substituiu Jonas no ataque. As ameaças do Desp. Aves deixaram de o ser logo no arranque do segundo tempo. Um passe errado do Benfica (e foram muitos), aos 49’, resultou em mais um contra-ataque dos minhotos, com Mama Baldé a antecipar-se de cabeça aos centrais benfiquistas e a bater, desta vez, Svilar. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. A vencer e com o acesso à final a quatro na mão, o Desp. Aves não baixou o bloco e Baldé voltou a estar perto do golo aos 57’, atirando ligeiramente ao lado. Rui Vitória tirou as suas conclusões e respondeu prontamente com a chamada de Jonas (para o lugar de Cervi) para reforçar o ataque. As coisas estavam bastante complicadas para os visitantes, mas a felicidade acabou por estar do seu lado. Após uma jogada de Zivkovic, na esquerda, o sérvio cruzou para o segundo poste, onde Seferovic, apesar da má recepção, acabou por conseguir empurrar a bola para as redes, aos 70’.
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Palavras-chave homens campo ataque aves
Marcelo promulga lei que define acesso aos domicílios em acções de fiscalização
Presidente da República promulgou diploma que define, após obtenção de mandado judicial, o regime de entrada num domicílio sem o consentimento do proprietário no âmbito de fiscalizações de operações urbanísticas. (...)

Marcelo promulga lei que define acesso aos domicílios em acções de fiscalização
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: Presidente da República promulgou diploma que define, após obtenção de mandado judicial, o regime de entrada num domicílio sem o consentimento do proprietário no âmbito de fiscalizações de operações urbanísticas.
TEXTO: O Presidente da República promulgou o diploma que define, após obtenção de mandado judicial, o regime de entrada num domicílio sem o consentimento do proprietário no âmbito de fiscalizações de operações urbanísticas, anunciou hoje a Presidência. Segundo a página da Presidência na Internet, Marcelo Rebelo de Sousa promulgou o diploma do Governo que, "ao abrigo da autorização legislativa concedida pelo artigo 327. º da Lei do Orçamento do Estado para o ano de 2018, altera o Regime Jurídico da Urbanização e Edificação no sentido de proceder à definição do regime de entrada no domicílio de qualquer pessoa sem consentimento, após obtenção de mandato judicial prévio, no âmbito de eventual fiscalização administrativa no âmbito de operações urbanísticas". O decreto-lei que altera o Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação tinha sido aprovado em Conselho de Ministros no passado dia 13, estabelecendo que a entrada no domicílio de qualquer pessoa sem o seu consentimento depende da obtenção de prévio mandado judicial, tendo por fundamento a actividade de fiscalização administrativa a quaisquer operações urbanísticas e abrangendo quer operações urbanísticas em curso, quer operações urbanísticas já concluídas. As pessoas habilitadas a entrar são os fiscais municipais ou os trabalhadores das empresas privadas contratados pelas câmaras, para além das forças de segurança e dos elementos que integram o serviço municipal de protecção civil, sempre que haja "fundadas dúvidas" ou possa "estar em causa a segurança de pessoas, animais e bens". Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. A legislação estabelece que a entrada no domicílio "deve respeitar o princípio da proporcionalidade", ocorrer "pelo tempo estritamente necessário à actividade de fiscalização" e incidir "sobre o local onde se realizam ou realizaram operações urbanísticas", devendo a prova a recolher limitar-se à actividade sujeita a fiscalização. O Presidente da República promulgou também este sábado três outros diplomas: um onde se define “o modelo de governação para a implementação da facturação electrónica nos contractos públicos”; outro que “altera o regime jurídico que estabelece os requisitos de acesso e de exercício da actividade de intermediário de crédito e da prestação de serviços de consultoria”; e outro ligado aos bancos. Neste último caso, o diploma “estabelece os limites máximos das perdas por imparidade e outras correcções de valor para risco específico de crédito dedutíveis para efeitos do apuramento do lucro tributável em imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas relativamente a empresas do sector bancário.
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Palavras-chave lei
Para estes bailarinos, a diferença é uma condição e não uma limitação
Desde 2015, o projecto Dança para Todos, da Fundação Nuno Silveira, em Gondomar, recorre à dança como estímulo para pessoas com deficiências físicas e cognitivas. Semanalmente, 24 utentes entregam-se de corpo e alma a uma arte que não tem fronteiras. (...)

Para estes bailarinos, a diferença é uma condição e não uma limitação
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-11 | Jornal Público
SUMÁRIO: Desde 2015, o projecto Dança para Todos, da Fundação Nuno Silveira, em Gondomar, recorre à dança como estímulo para pessoas com deficiências físicas e cognitivas. Semanalmente, 24 utentes entregam-se de corpo e alma a uma arte que não tem fronteiras.
TEXTO: “Gosto de fazer aqueles passinhos ao som do Dura”, conta Mónica, referindo-se ao êxito mundial de Daddy Yankee que invadiu as rádios em Janeiro. Mal ouve a palavra-chave, o resto do grupo irrompe em aplausos para reforçar a preferência pela faixa. Não demora muito até que todos se ponham em fileira para dar início à coreografia. Afinal, conhecem cada passo de cor e salteado e sabem que são imbatíveis nos movimentos da cintura para cima. À medida que o compasso acelera, o bater dos pés faz estremecer o chão do pavilhão da Fundação Nuno Silveira, em Gondomar. É mais um ensaio do grupo Dança para Todos, criado em 2015 para mostrar que a força de vontade é o único requisito para dançar. Começou com uma dezena de utentes, mas são já 24 os bailarinos que compõem o projecto. Tal como Mónica, alguns vivem na instituição há vários anos, ao passo que outros são externos, mas participam diariamente em actividades como yoga, música, teatro e storytelling. A dança, enquanto expressão artística particularmente sensorial que comunica o que não cabe em palavras, surgiu para potenciar as capacidades dos utentes e evitar que sejam reduzidos às limitações motoras e cognitivas. Então, criaram-se três turmas de trabalho por níveis: o grupo mais autónomo, o grupo menos autónomo e a junção dos dois. Pedro tem 30 anos e faz parte do Pétalas Soltas, colectivo de exibição que se apresenta regularmente em público. Já tinha experimentado hip-hop antes de entrar para a instituição, mas considera-se “muito dançarino” e afirma que gosta de “todo o tipo de dança”. “Aprendo as coisas rápido e gosto de aprender muito”, confessa ao PÚBLICO. Além de actuar com os colegas, Pedro já subiu a palco a solo na Exponor, conquistando uma estrondosa ovação em pé. Na audiência estava, de olhos marejados e peito a inchar de orgulho, a sua maior fã – Sofia Almeida, técnica superior de educação social na fundação. “Quando todos se levantaram para aplaudir, eu senti que era a família dele”, diz. “Não há nada que pague isso”. Foi, aliás, Sofia quem batalhou para dar vida ao projecto, por isso faz questão de acompanhar as actuações do grupo sempre que pode. “A dança permite uma criatividade e libertação que são muito boas para eles”, reconhece. A satisfação dos utentes reflecte-se no passa-palavra que, volta e meia, traz um novo membro aos ensaios. “Na primeira aula experimentam e, à partida, ficam, porque todos conseguem fazer alguma coisa”, reconhece. Ana Cláudia é a mais recente bailarina do grupo. Ainda “não tem muito a dizer”, como novata que é nestas andanças, mas é prova viva de que aqui não há impossíveis. “Ela não sai da cadeira [de rodas], mas tenta levantar a parte superior do corpo com a ajuda de uma faixa”, revela Sofia Almeida, que exemplifica também com o caso de “Cristiano, que dança muito com os ombros”. “Todos eles conseguem, desde que tenham vontade”, reforça. É esse espírito de superação que Maria Manuel Mendes, professora e responsável pelo projecto, tenta incutir nos alunos a cada aula, combinando as capacidades de cada um. “Há uns que têm mobilidade, mas têm dificuldade em sentar-se, então nós jogamos com uns nas cadeiras e outros no chão”, exemplifica, notando “que há movimentos mais difíceis, mas é igual quando pessoas que não têm deficiência se sentem limitadas com certos passos”. A noção muito própria de espaço e tempo e a existência de diferentes destrezas dentro do grupo exige um trabalho adaptado às necessidades de cada turma. “No Pétalas Soltas, eles aprendem rápido e decoram muito bem”, conta Maria Manuel. “Nos outros dois, fazemos o primeiro passo, depois o segundo, depois vamos juntando e treinando”. Em média, são precisos dois a três meses para que interpretem duas coreografias de forma mais autónoma. A estrutura dos ensaios é semelhante: primeiro faz-se o aquecimento, depois recapitula-se o que foi feito, pratica-se a coreografia e, no final, há espaço para jogos e brincadeiras, “como se fosse um espectáculo ou um concurso”. A aprendizagem é constante e mútua, sublinha Maria Manuel. Formada em dança, actividade física e saúde, foi na Fundação Nuno Silveira que teve oportunidade de trabalhar pela primeira vez a dança como motor de inclusão social. “No início, encarava-os como pessoas diferentes, achava que tinha que ter outro comportamento”, recorda. “Ao longo do tempo, fui aprendendo a falar com eles como os adultos que são”. No Dança para Todos, não há lugar para estereótipos nem preconceitos. “Eles não gostam de sentir que é música mais para crianças, ou coreografias infantis a imitar os animais”, conta a professora. Nesse sentido, há o cuidado de escolher músicas que passam na rádio e que todos conhecem. Para decorar, “pegam em palavras-chave e vão lá por associação”. Jorge, 46 anos, revela que gosta muito de dançar o “fado”. Refere-se não à canção portuguesa, mas aos versos do mesmo nome que compõem Lusitana Paixão, música interpretada por Dulce Pontes. Tanto nas coreografias lentas como mexidas, “é preciso alguma paciência”, diz o bailarino, que tem que “fazer um esforço maior por causa da perna”. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Se é verdade que a dança goza aqui de uma cadência e sensibilidade próprias, também os contratempos assumem outra escala. “Ás vezes não trouxeram um brinco e para eles é um problema”, diz Maria Manuel. “Mas não dura muito, porque eles relativizam tudo”. O ano lectivo arrancou há algumas semanas, mas o Dança para Todos já treina as novas coreografias e pensa em vôos maiores. Sonham ir a um programa da tarde na televisão nacional e inspirar toda a gente a dançar independentemente da sua condição. “Eles são felizes com as suas limitações – essa é a grande lição que todos podemos levar para a vida. ”
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave educação ajuda social corpo
Jornalismo e financiamento do Estado
Está efectivamente em causa a existência de imprensa livre, com capacidade para exercer a sua actividade com independência e imparcialidade e até para assegurar aos jornalistas as condições necessárias ao exercício da sua profissão com dignidade e respeito pelo código deontológico. (...)

Jornalismo e financiamento do Estado
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-22 | Jornal Público
SUMÁRIO: Está efectivamente em causa a existência de imprensa livre, com capacidade para exercer a sua actividade com independência e imparcialidade e até para assegurar aos jornalistas as condições necessárias ao exercício da sua profissão com dignidade e respeito pelo código deontológico.
TEXTO: O problema da falta de sustentabilidade económica dos meios de comunicação social entrou finalmente em debate com as declarações do Presidente da República sobre a necessidade do Estado ajudar o sector. A opinião publicada começou logo a inclinar-se para o lado contrário a esta possibilidade, com os argumentos principais de que tal coisa é comprometedora da independência do jornalismo e iria distorcer o mercado. Por exemplo, Pedro Santos Guerreiro, no Expresso, defendeu que os jornais não precisam de “ajudinhas” que classificou como intervencionismo do governo. Henrique Monteiro, também no Expresso, afirma que a ajuda estatal aos media iria matar a criatividade “porque é o engenho que aguça a arte”, e João Miguel Tavares, no PÚBLICO, considera que se trataria de uma “esmola”, e que o jornalismo passaria a ser um cão de guarda alimentado pelo ladrão. Os dois últimos autores entendem que está em causa o modelo de negócio, e que o jornalismo terá futuro se os órgãos de comunicação social tiverem uma boa gestão, com criatividade e capacidade para se reinventarem e aproveitarem as novas tecnologias. A questão é bem mais funda. Radica no modelo de financiamento, pelo que ultrapassa o modelo de negócio. Ou seja, o jornalismo pode até não dever ser um negócio. Qualquer modelo de negócio, independentemente do grau de criatividade e da capacidade da gestão, é do âmbito do mercado, e o jornalismo é uma função demasiado importante para depender apenas da economia de mercado. O jornalismo corresponde a uma função de interesse público fundamental, de tal forma que historicamente se reconhece como o quarto poder; um poder constitucional material. I. e. , um dos poderes com que a Constituição assegura e prossegue o equilíbrio através da separação de poderes, embora neste caso não formalmente consagrado. Dai o alerta de Marcelo Rebelo de Sousa, de que está directamente em risco a democracia. É por esta componente de natureza pública que o jornalismo não pode ser função tão dependente da lógica do mercado. Há um serviço público muito relevante – de escrutínio da vida pública – prestado pelos jornalistas e pela comunicação social. É com isso que se justifica a existência de meios públicos. Independentemente da avaliação que fazemos da realidade da comunicação social pública em Portugal, todos percebemos que a rácio da sua justificação assenta no serviço público que lhe está subjacente. Esse serviço público não se esgota na oferta alternativa, na preocupação com as minorias e outros aspectos decorrentes das externalidades do funcionamento da economia de mercado, nem é exclusivo dos meios detidos pelo Estado. Os meios de comunicação social que são propriedade privada também prestam um serviço público, precisamente porque esta qualidade – a utilidade para o interesse público – é da natureza do jornalismo. Este facto é já minimamente reconhecido desde que se aceitou que, no plano da televisão em português para o estrangeiro, o serviço público não é um exclusivo da RTP Internacional. Sucede que a capacidade dos meios estarem à altura do serviço público que prestam depende da sua capacidade económica. E os privados em Portugal já não têm essa capacidade. Sabendo que os jornais e restantes meios lutam pela sobrevivência, facilmente concluímos em que estado está este serviço. Comparemos o jornalismo a um exército que combate pela verdade. Como acabará uma guerra em que esses combatentes, pela falta de meios e recursos, em vez da batalha com os inimigos da verdade, travam uma outra luta, pela sua própria sobrevivência? Recorrendo ao exemplo do cão de João Miguel Tavares; como pode o cão que morre de fome recusar o alimento que o ladrão lhe dá?O jornalismo hoje, em Portugal, está neste nível, na luta pela subsistência, sem capacidade para recusar os modelos de negócio criativos, mesmo os nocivos e perversos, que passam pela crescente subordinação das opções editoriais ao interesse comercial. Os programas que se produzem são os que têm maiores audiências, os temas das edições especiais dos jornais e revistas são as que geram mais publicidade, as rubricas informativas das rádios são aquelas que os anunciantes estiverem dispostos a pagar. Os conteúdos e os alinhamentos já são decididos mais em função do comercial do que do leitor. E quanto mais caem as vendas em banca mais isto é verdade, e vice-versa, numa espiral assustadora que não augura nada de bom. Com o sector embrenhado nesta luta pela subsistência, sem meios e sem recursos, onde está a capacidade dos meios para investir na investigação, na reportagem de fundo, na diversidade e na qualidade?O panorama português da comunicação social é conhecido. É grave, genericamente, nos meios de âmbito nacional e, nos planos regional e local, agrava-se ainda mais. A dependência económica dos meios, sobretudo dos locais, é um óbice, actual, real, concreto e grave, ao desempenho da sua missão. Está efectivamente em causa a existência de imprensa livre, com capacidade para exercer a sua actividade com independência e imparcialidade e até para assegurar aos jornalistas as condições necessárias ao exercício da sua profissão com dignidade e respeito pelo código deontológico. Feito o diagnóstico – negro mas honesto –, temos de partir para o debate sobre o financiamento dos media, e com as premissas de que o jornalismo é serviço público, tem relação directa com a existência e a qualidade da democracia, e constitui um bem demasiado importante para estar entregue apenas ao mercado. Resta-nos debater como pode o Estado cumprir o seu dever no financiamento dos media sem intervencionismo dos governos. O Estado já ajuda o sector da cultura, e ninguém rasga as vestes por estar em causa a liberdade de criação e de opinião. No caso do jornalismo, cuja importância não é menor, o financiamento justifica-se igualmente, embora se admita que as regras têm de ser diferentes. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Para ser do Estado e não do governo, o financiamento requer um acordo de regime, como defende o Presidente da República, e obriga a mecanismos de garantia de transparência, justiça e independência, para garantir que o cão de guarda não precisa do alimento do ladrão. Entretanto, o Estado, todos os estados e organizações internacionais, como a União Europeia, têm muito a fazer no domínio da regulação, nacional e supra nacional, da actividade dos gigantes da Internet, como Facebook, Google e YouTube, quanto a direitos de autor, fiscalidade e acesso à publicidade. Enquanto o alimento vier do mercado, o nosso cão, que é o guarda do portão – a teoria do gatekeeper cruzada nos domínios de Kurt Lewin e David White –, pouco caça com estes lobos à solta.
REFERÊNCIAS:
Projecções demográficas e economia: agir antes que seja tarde de mais!
Se nada fizermos, os padrões de prosperidade que conhecemos em cada escalão etário pura e simplesmente desaparecerão. (...)

Projecções demográficas e economia: agir antes que seja tarde de mais!
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento -0.37
DATA: 2018-12-18 | Jornal Público
SUMÁRIO: Se nada fizermos, os padrões de prosperidade que conhecemos em cada escalão etário pura e simplesmente desaparecerão.
TEXTO: A Europa, e muito especialmente Portugal, estão confrontados com um enorme desafio demográfico que urge enfrentar quanto antes, sob pena de nós, cidadãos, sermos esmagados pelas suas consequências no nosso modelo de sociedade e nos níveis de prosperidade de cada um ao longo da vida. A fim de ajudar a despertar consciências para a urgência de o país abandonar a inércia perante o problema e pensar no que pode fazer diferente, o centro de reflexão Cidadania Social promoveu uma conferência no passado dia 11 em torno de quatro temas. Estes temas correspondem às quatro áreas da economia nas quais as projecções demográficas maior impacto poderão ter: território e desenvolvimento, prestação e financiamento de cuidados de saúde, digitalização e envelhecimento activo no mercado de trabalho, e poupança e pensões de reforma. A nível nacional, Portugal regista desde 2010 um duplo fenómeno demográfico: perda e envelhecimento populacionais. O Instituto Nacional de Estatística (INE) produz a cada três anos projecções de muito longo prazo que visam antecipar tendências e dar, precisamente, a todos os cidadãos e aos decisores económicos informação útil para prepararem o futuro. A actualização mais recente deste exercício prospectivo consta da publicação Estatísticas Demográficas 2017, divulgada em 15 de Novembro último. Com a devida vénia, evidenciam-se nos gráficos juntos os dois fenómenos acima mencionados. Os dados posteriores a 2017 são as projecções resultantes do cenário central, que corresponde à assunção de hipóteses que não são pessimistas nem optimistas quanto à evolução das componentes fertilidade, mortalidade e migrações. Assim, após o pico atingido em 2009 (10, 6 milhões de indivíduos), a população residente em 2017 baixou para 10, 3 milhões de habitantes, podendo cair para 7, 7 milhões em 2080 (vide Gráfico 1) no cenário central. A queda será substancialmente mais acentuada no grupo etário dos 15 aos 64 anos de idade, que concentra a população activa (Gráfico 2). Actualmente, temos cerca de 155 idosos (pessoas acima dos 64 anos) por cada 100 jovens, definidos como indivíduos com menos de 15 anos — Gráfico 3. Em 2080, este rácio, conhecido como índice de envelhecimento, poderá chegar a 309. As projecções são assustadoras, no sentido de que se nada fizermos para mitigarmos a sua concretização nem nada mudarmos na organização social então os padrões de prosperidade que conhecemos em cada escalão etário pura e simplesmente desaparecerão, ainda que lentamente. A nível nacional, o duplo fenómeno demográfico ocorre desde 2010. Porém, custa ainda mais aceitar nada fazermos quando é verdade que temos territórios a perder população e a envelhecer há, pelo menos, 60 anos! Dir-se-á que são meros interstícios do todo nacional e onde habitam poucos eleitores, poucos consumidores, poucos empreendedores e que o país passa bem sem eles. Os fenómenos começaram em meia dúzia de freguesias rurais nas Beiras e em Trás-os-Montes, a seguir à 2. ª Guerra Mundial. Mas, paulatinamente, galgaram fronteiras político-administrativas e hoje poderemos estar já a falar de 60% da superfície nacional. Em 2011, ano do último censo, mais de 60% da superfície nacional tem menos de 45 habitantes por km2, contra a média nacional de 115. Cerca de um milhão de pessoas vive naqueles 60% do território nacional, com um poder de compra inferior a 60% da média nacional. Se não provámos ser capazes de conter espacialmente as tendências demográficas e económicas, como é que seremos capazes de impedir que elas atinjam o litoral e o coração económico do país?Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Ao longo das últimas três décadas, colocámos no terreno dispositivos de política pública com o objectivo de promover a coesão e a competitividade nos territórios demográfica e economicamente mais frágeis. Várias avaliações mostram, à escala NUTS III, que o país progrediu imenso em coesão: mais e mais indivíduos passaram a aceder a bens e serviços de interesse colectivo, como electrificação, saneamento, educação, cuidados de saúde, mobilidade. . . Porém, o progresso em indicadores de competitividade tem sido espacialmente heterogéneo, havendo cada vez mais territórios de baixa densidade a ficar para trás. Promover a coesão é relativamente fácil. Havendo financiamento (e a UE foi pródiga neste campo) e planeamento público (e Portugal avançou imenso neste domínio), quase que basta espalhar cimento nos territórios para os graus de cobertura da população aumentarem. Incrementar o valor acrescentado pelas empresas, atrair investimento directo, valorizar e reter capital humano, atrair visitantes, são tarefas muito mais difíceis de concretizar e que exigem a mobilização de parceiros privados, sociais e públicos em torno de estratégias de médio e longo prazo orientadas para a criação de valor e adequadas aos recursos e capacidades de cada região. No painel que moderei, intitulado “População, Território e Desenvolvimento”, os oradores convergiram na necessidade de as políticas públicas com maior impacto estrutural no desenvolvimento (saúde, ambiente, educação, mobilidade, cultura, economia. . . ) não poderem mais ser territorialmente cegas nem desarticuladas. Precisam de um modelo de governança que as coordene ao serviço de uma visão comum de médio e longo prazo para o desenvolvimento das regiões. Neste sentido, a proposta fundamentada [1] que fiz no primeiro artigo que assinei para esta coluna — “Desenvolvimento de Portugal e a orgânica do próximo Governo”, edição PÚBLICO de 5 de Março de 2018 — retém a sua oportunidade. É irrealista pensar que voltaremos a ter o povoamento que tínhamos na economia rural de 1950, nem as pessoas que ainda vivem nos territórios de menor densidade querem regressar a esse tempo, pois hoje estão melhor. Precisamos criar massa crítica nos locais de residência, em torno de vilas e cidades de pequena e média dimensão, mas, ao mesmo tempo, temos de favorecer a produção dos diversos bens e serviços que só pode existir no meio rural e que tanto beneficiam os cidadãos das áreas metropolitanas: qualidade ambiental, património material e imaterial, terra arável, prevenção de fogos florestais, diversidade de habitats naturais, humanos e animais e, claro, a tranquilidade e a paz de espírito que há muito se perderam nas grandes cidades. Com ou sem regionalização político-administrativa, é possível e imperioso fazermos mais e fazermos diferente. Antes que seja tarde de mais. . . [1] Baleiras (2016), Rui Nuno, “Bloqueios institucionais e possíveis soluções para a operacionalização de políticas transversais: O caso do desenvolvimento económico em Portugal”, Public Policy Portuguese Journal, Vol. 1, n. º 1, pp. 28-56. ?Cidadania Social – Associação para a Intervenção e Reflexão de Políticas Sociais – www. cidadaniasocial. pt
REFERÊNCIAS:
Entidades UE