Autarquias reconhecem problema das alterações climáticas, mas ainda não estão preparadas
Num combate necessariamente global de mitigação e adaptação às alterações climáticas, também a nível local há espaço para implementar medidas. O entendimento é comum às quatro autarquias questionadas pelo PÚBLICO. Mas todas elas admitem que não estão preparadas para as mudanças. (...)

Autarquias reconhecem problema das alterações climáticas, mas ainda não estão preparadas
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-17 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20181217185709/https://www.publico.pt/n1844780
SUMÁRIO: Num combate necessariamente global de mitigação e adaptação às alterações climáticas, também a nível local há espaço para implementar medidas. O entendimento é comum às quatro autarquias questionadas pelo PÚBLICO. Mas todas elas admitem que não estão preparadas para as mudanças.
TEXTO: O desenvolvimento de estratégias municipais de adaptação e mitigação das alterações climáticas parece mover-se a dois ritmos. Se, por um lado, há municípios que ainda não têm um plano concreto, há outros com diagnósticos e projecções feitas. Évora faz parte deste segundo grupo. A cidade aqueceu 0, 8ºC nos últimos 17 anos em comparação com o século passado e sabe-se que os efeitos das alterações climáticas até ao final do século podem ser especialmente extremos. A temperatura média anual pode subir 1º a 5ºC, sendo que no Verão e no Outono as máximas podem aumentar entre 2º e 6ºC. Dias muito quentes (acima dos 35ºC), ondas de calor e noites tropicais (com mínimas acima dos 20ºC) serão mais frequentes, ao contrário dos dias de chuva. Haverá, no entanto, mais fenómenos de precipitação extremos. A agricultura é um dos sectores que mais preocupações traz a Carlos Sá, presidente da Câmara de Évora. “Estamos muito preocupados [com a seca] e temos procurado sensibilizar quem decide de que as culturas intensivas — aquelas que usam muita água — não são culturas de futuro para o Alentejo e, portanto, têm que ser alteradas. ” O que é que isso significa na prática? “Que não podemos ficar nas mãos do mercado para decidir aquilo que são as nossas produções. Tem que haver uma intervenção do Estado, com uma orientação estratégica clara para que a resposta a este problema seja compatível com o uso das águas. ” Para isso, diz, é precisa “uma outra agricultura”, que privilegie as culturas de sequeiro, as castas de vinha adaptadas ao Alentejo e o ecossistema de montado. Graças à iniciativa Climadapt Local – um trabalho concertado entre os órgãos institucionais, a academia e cidadãos – pelo menos 25 outros municípios têm este tipo de diagnóstico, que serviu de base à elaboração das respectivas estratégias de adaptação às alterações climáticas. João Camargo, mestre em Engenharia do Ambiente e Produção Animal e autor do Manual de Combate às Alterações Climáticas, foi um dos especialistas envolvidos no Climadapt Local. “Fomos às câmaras e dissemos: ‘Isto é o cenário para a região. Queremos que nos dêem um levantamento das maiores vulnerabilidades do município (porque normalmente são essas que são agravadas) e desenhar algumas medidas que possam adaptar perante este cenário e estas vulnerabilidades’”, recorda. “Depois, quando tínhamos esse pré-plano, fazíamos uma reunião com stakeholders, identificávamos as questões chave no município, seja agricultura, seja floresta, seja água, seja recursos hídricos, subida do nível médio do mar. . . E fazíamos oito a nove painéis que discutiam a proposta e as medidas", recorda. O Porto também aderiu ao Climadapt, mas os municípios da Área Metropolitana do Porto optaram também por delinear uma estratégia comum através do projecto “Metroclima”, apoiado pelo Programa Operacional Sustentabilidade e Eficiência na Utilização de Recursos (POSEUR) do Portugal 2020. Depois de apuradas as principais consequências do aumento da temperatura (ocorrência de eventos climáticos extremos, precipitação elevada, secas), alinhavaram-se propostas locais. Em Vila Nova de Gaia, destaca o vereador do Ambiente Valentim Miranda, em resposta escritas enviadas ao PÚBLICO, o foco está na promoção sustentável do turismo, na gestão de bacias de retenção hídrica, no controlo fitossanitário e na construção de infra-estruturas para actividades ao ar livre. A estratégia da autarquia vai ainda no sentido de recuperar e requalificar as linhas de água do concelho, fazer a limpeza preventiva da rede de águas pluviais e proteger o ecossistema dunar. Só por si, o poder local não terá forma de solucionar o problema. Mesmo assim, Paulo Magalhães, jurista, investigador na Faculdade de Direito da Universidade do Porto e presidente da Casa Comum da Humanidade — uma organização criada em 2016 que defende a alteração do sistema jurídico no sentido de valorizar o sistema terrestre — afirma que “ao nível da adaptação e mitigação das alterações climáticas muita coisa pode ser feita ao nível das cidades”. João Camargo também não tem dúvidas: “Ninguém vai resolver isto sozinho, mas se ninguém começar a resolver, não se resolve de maneira alguma. ”Algumas cidades já têm alguns projectos em desenvolvimento. Em Évora, por exemplo, há um “laboratório vivo para a descarbonização” (em Almada também já há uma iniciativa semelhante), que visa estudar a redução das emissões de dióxido de carbono em questões de mobilidade; um estudo para o melhoramento da climatização de estabelecimentos de ensino, cuja implementação pode “demorar alguns anos”, segundo o presidente da câmara; a disponibilização gratuita de 300 bicicletas normais e 200 eléctricas à comunidade da Universidade de Évora; e a identificação de áreas que precisam de ser reflorestadas. Prevê-se ainda a recuperação de antigas origens de água, para usos não-domésticos, como o aqueduto da Água de Prata. Em Lisboa, onde a previsão é de que a temperatura aumente entre 1, 2ºC e 2, 4ºC até ao final do século, os planos de drenagem são “o rosto mais visível de uma medida de adaptação”, diz fonte do gabinete do vereador do Ambiente. Em breve, a Avenida Almirante Reis vai ter dois túneis que vão permitir o escoamento das águas, para evitar fenómenos de cheias. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Mas há outras ideias em curso. Tal como aconteceu no Porto, a capital também vai ter um projecto iTree, cujo objectivo é avaliar o ecossistema de arvoredo da cidade. A medição exacta das zonas mais quentes da cidade é também uma preocupação. Em Lisboa, vai ser feita uma cartografia de vulnerabilidade térmica, que tem como objectivo o mapeamento dos efeitos das ondas de calor em Lisboa face às projecções climáticas. O estudo é financiado pelo POSEUR. Já no Funchal, a autarquia tem procurado melhorar a eficiência energética dos edifícios municipais e substituído a iluminação pública por lâmpadas LED, explica a vereadora do ambiente, Idalina Perestrelo. Foram fechadas à circulação automóvel ruas no centro da cidade, para reduzir emissões. E, a curto prazo, a câmara espera aumentar a taxa de 29% de recolha selectiva de resíduos urbanos. Para além de um incremento da reciclagem, no início do próximo ano deverá arrancar um projecto de compostagem caseira que inclui a recolha porta-a-porta destes resíduos, de forma a reduzir volume incinerado. “Apesar de existirem alguns dias com temperaturas elevadas, o aumento de temperaturas ainda não é um grande problema. ” O diagnóstico feito pelo município de Matosinhos coincide com o de Ponta Delgada e Aveiro: as três autarquias dizem não sentir qualquer impacto das alterações na temperatura nas últimas duas décadas. Pelo contrário, as câmaras de Vila Nova de Gaia, Lisboa, Setúbal e Funchal dizem que as mudanças de temperatura afectaram de forma negativa o modo de vida nas cidades nesse período. Gaia, por exemplo, detectou mais incêndios florestais com origem humana, um aumento do consumo de água acompanhado pela diminuição da qualidade dos recursos hídricos e do solo e alterações na biodiversidade e no património ambiental do município. Sintra experimentou tanto efeitos negativos como positivos, diz a autarquia. Estas conclusões constam das respostas dadas por estes oito municípios ao questionário da European Data Journalism Network (EDJNet) — rede de jornalismo de dados que o PÚBLICO integra — sobre as respostas locais às mudanças de temperatura. Estas cidades admitem ter poucas investigações sobre as possíveis consequências locais do aumento das temperaturas nos próximos 20 anos. E consideram não estar suficientemente preparadas para lidar com os efeitos que tal possa ter na saúde pública, transportes e infra-estruturas, turismo, planeamento e gestão da cidade, fauna e flora e na educação. Todas à excepção de Aveiro, que se considera bem preparada em todas as áreas, menos no que diz respeito aos recursos naturais, e Setúbal que reconhece boa preparação para os impactos na saúde pública e turismo. Há ainda autarquias que remetem as competências de mitigação e adaptação para o poder regional. É o caso de Coimbra. A autarquia respondeu ao PÚBLICO que, tendo competências limitadas à recolha de resíduos e limpeza urbana, “não é a autoridade sobre a matéria em causa – alterações climáticas e aumento das temperaturas”. “Não faz medições, não analisa e não detém informação para poder concluir e agir”, explica a divisão de Ambiente, remetendo para a Comissão de Coordenação de Desenvolvimento Regional do Centro.
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Árvore Portuguesa de 2019 é uma azinheira de Mértola com uma sombra majestosa
Com cerca de 150 anos e uma copa com mais de 23 metros de diâmetro, a Azinheira Secular do Monte Barbeiro (concelho de Mértola) foi escolhida pelos portugueses para árvore de 2019. Se hoje tem uma sombra majestosa, podemos agradecê-lo a três guardiões. (...)

Árvore Portuguesa de 2019 é uma azinheira de Mértola com uma sombra majestosa
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-17 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20181217185709/https://www.publico.pt/n1851853
SUMÁRIO: Com cerca de 150 anos e uma copa com mais de 23 metros de diâmetro, a Azinheira Secular do Monte Barbeiro (concelho de Mértola) foi escolhida pelos portugueses para árvore de 2019. Se hoje tem uma sombra majestosa, podemos agradecê-lo a três guardiões.
TEXTO: A uns sete quilómetros da aldeia de Alcaria Ruiva (no concelho de Mértola), permanece na ponta de um montado, há já cerca de 150 anos – estima-se –, uma azinheira que com a sua copa pode envolver quatro ou cinco outras da sua espécie que tenham um tamanho normal. Não há como enganar quando chegarmos ao terreno, garante-nos Jorge Rosa, presidente da Câmara Municipal de Mértola: “Esta árvore é uma gigante no meio de outras azinheiras de tamanho normal. ” Chama-se Azinheira Secular do Monte Barbeiro e agora foi a vencedora da votação online Árvore Portuguesa de 2019. Esta azinheira (Quercus rotundifolia) conquistou a medalha de ouro com 3445 votos e vai representar Portugal no concurso Árvore Europeia do Ano, em Fevereiro. Ainda no pódio, ficou o Plátano do Rossio (de Portalegre) com 2989 votos e o Quercus do ISA (Lisboa) com 1667 votos. “[A Azinheira Secular do Monte Barbeiro] é especial pela idade que conseguiu atingir e porque se desenvolveu de uma forma extraordinária”, destaca o autarca do município de Mértola, que foi a entidade responsável pela candidatura desta árvore no concurso. E este desenvolvimento extraordinário guarda uma história, aponta Miguel Sampaio, filho da proprietária (Maria Antónia Sampaio) do terreno onde se encontra a árvore, a Herdade do Monte Barbeiro. “Esta árvore distingue-se porque pode estar num sítio onde haverá alguma fonte de água subterrânea e por isso começou a desenvolver-se mais”, especula. Mas destaca que a azinheira teve três grandes guardiões. “Durante muitos anos, o meu avô [Álvaro Sampaio] só permitia que duas pessoas intervencionassem a árvore e que a orientassem enquanto estivesse em crescimento. Eram dois funcionários: Francisco Bartolomeu e Joaquim Guerreiro”, conta Miguel Sampaio. Estes dois trabalhadores rurais foram os guardiões da árvore, provavelmente, desde os anos 20 até aos 70. “Tinham indicações do meu avô para defender o mais possível a árvore, para que as pernadas ficassem a pouco mais de 90 graus. Era para que chegassem o mais longe possível do pé, o centro da árvore”, explica. Hoje, tornou-se na tal azinheira gigante: tem uma copa de 23, 28 metros de diâmetro e que ocupa uma área com cerca de 487 metros quadrados. Como tal, a sua sombra em dias de muito calor (afinal, situa-se no Baixo Alentejo) foi a principal característica destacada num comunicado da UNAC – União da Floresta Mediterrânea, que organizou o concurso nacional e que tem o apoio do Ministério da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural. “Sentarmo-nos debaixo da sua copa faz com que o calor abrasador do Alentejo nos pareça suportável e nos permita contemplar a vastidão da planície envolvente respirando a sua tranquilidade”, refere-se no comunicado. Jorge Rosa sublinha então a forte ligação da comunidade a esta árvore. “Desde logo, há uma ligação sentimental das pessoas à volta daquela zona. Há uma série de pequenos povoados que conhecem a árvore há muito tempo”, indica o autarca. “Essas pessoas sabem que os seus pais, avôs e bisavôs já conheciam esta árvore e que já tinham estado debaixo dela. ”Depois, há ainda a ligação da árvore às novas gerações. “Temos procurado dá-la a conhecer a todo o território do concelho de Mértola, nomeadamente aos mais novos, porque ela é realmente um ser vivo excepcional”, refere. Desta forma, sempre que há um dia especial nas escolas, há turmas que se deslocam para ver a azinheira do Monte Barbeiro. Nessas visitas de campo, os alunos fazem desenhos desta árvore: há quem desenhe rebanhos de ovelhas a descansar lá debaixo ou quem prefira representar os seus frutos. “Penso que já todos a conhecem. Para nós, aqui no concelho, já era a árvore de todos os anos porque é a maior que temos. Agora ficamos muito satisfeitos e felizes por saber que também é a árvore do ano de Portugal”, diz entusiasmado o autarca. Como está inserida na Zona de Protecção Especial do Vale do Guadiana, Jorge Rosa refere que isso é uma ajuda para que estes reconhecimentos aconteçam. Além disso, para si, esta distinção também marca o que se tem feito pelo turismo de natureza no concelho. “A Azinheira Secular é um digno representante de um sistema de produção mediterrânico único, de cariz agro-florestal, que sustenta uma economia de territórios frágeis e contribui para a biodiversidade, a mitigação das alterações climáticas e o combate à desertificação, sendo um elemento marcante na paisagem do Alentejo”, frisa-se ainda no comunicado. E Jorge Rosa concorda: além de o montado ter uma importância económica muito grande na região – o fruto da azinheira pode ser aproveitado na pecuária ou pode vender-se a lenha –, este ecossistema é determinante na resiliência dos territórios às alterações climáticas. Mas, além da azinheira, do plátano e do Quercus do ISA, houve mais árvores no concurso (ao todo, um júri seleccionou dez a partir de 29 candidaturas). Para além do pódio, foi esta a classificação por ordem decrescente: Nosso Sobreiro (Abela, em Santiago do Cacém); Zambujeiro Milenar (Foros de Vale de Figueira, Montemor-o-Novo); Carvalho de Calvos (Bouça da Tojeira, Póvoa do Lanhoso); Oliveira do Mouchão (Mouriscas, Abrantes); Dragoeiro (Lisboa); Aroeira A Fazedora de Chuva (Valongo, Avis); e a Tuia-gigante (Sintra). Ao todo, o concurso online – que decorreu até às 23h59 desta terça-feira – teve 19. 328 votos e, como frisa o comunicado, o período de votação suscitou o entusiasmo e apelo ao voto das comunidades locais. Em Fevereiro do próximo ano, a Azinheira Secular do Monte Barbeiro vai tentar igualar o Sobreiro Assobiador da aldeia de Águas de Moura, no concelho de Palmela, que conquistou o primeiro lugar no concurso Árvore Europeia de 2018. Com 17 metros de altura e 30 metros de diâmetro de copa, estima-se que este sobreiro tenha mais de 230 anos. E por que lhe chamam assobiador? Devido à sua copa muito larga, as aves pousam nele e chilreiam imenso. Representa ainda a forte importância do sobreiro no território português. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Quanto à azinheira gigante de Mértola, como é que se pode visitar? “Quem quiser, é ir: o caminho é livre”, responde Miguel Sampaio. Mas, como há uma cerca, deve-se avisar alguém para abrir a porta, avisa. O autarca de Mértola aconselha ainda que se peça indicações do caminho a alguém nas povoações vizinhas, porque tem de se passar por caminhos de terra batida e não há placas que indiquem o trajecto. Também se podem pedir informações na Junta de Freguesia de Alcaria Ruiva ou na Câmara Municipal de Mértola. Neste momento, como se espera que mais pessoas queiram visitar a árvore, Jorge Rosa diz que irá “intensificar” a maneira de lá chegar facilmente – que está a ser avaliada – e de falar com a proprietária do terreno. Contudo, avisa que terá de haver um controlo. “A intenção não é que vá lá muita gente, porque a árvore pode ficar a perder com isso. Mas tem de haver oportunidade para quem o quiser fazer. ”
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Partidos LIVRE
Ataque ao VIH nos laboratórios e por cientistas portugueses
A terapia anti-retroviral evoluiu até ao ponto de transformar a sida numa doença crónica. Apesar do estigma, é cada vez mais fácil lidar com uma infecção por VIH. Mas esse progresso não travou os esforços dos cientistas que procuram a resposta definitiva: vermo-nos livres deste vírus para sempre. (...)

Ataque ao VIH nos laboratórios e por cientistas portugueses
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-12 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20181212192603/https://www.publico.pt/n1794529
SUMÁRIO: A terapia anti-retroviral evoluiu até ao ponto de transformar a sida numa doença crónica. Apesar do estigma, é cada vez mais fácil lidar com uma infecção por VIH. Mas esse progresso não travou os esforços dos cientistas que procuram a resposta definitiva: vermo-nos livres deste vírus para sempre.
TEXTO: Atacar os reservatórios onde o VIH se “esconde” e resiste meio adormecido numa pessoa infectada e em tratamento? Aumentar as hipóteses de autodefesa do nosso organismo para evitar a infecção ou para melhor a combater? Encontrar um tratamento que funcione como uma “cura funcional”, uma espécie de vacina terapêutica? Sim, sim e sim. Carla Ribeiro e Susana Valente são duas investigadoras portuguesas que, na Holanda e nos EUA, procuram respostas definitivas para a epidemia que a ciência já ajudou a transformar numa doença crónica nos países mais desenvolvidos. São apenas dois bons exemplos da persistência dos cientistas contra este vírus resistente. “O vírus é muito esperto”, diz Carla Ribeiro ao PÚBLICO, confessando que isso é um dos mais interessantes desafios do seu trabalho. A investigadora está no Departamento de Imunologia Experimental do Centro Médico Académico da Universidade de Amesterdão, na Holanda, procura uma forma de fortalecer as nossas armas naturais para combater este vírus. Quer provar que podemos ser mais espertos do que o VIH. Há um ano, Carla Ribeiro publicou um artigo na revista Nature onde nos contava que existiam umas células (Langerhans) presentes na epiderme que eram resistentes ao VIH. Estas células, explicava, usavam um mecanismo (autofagia) para “triturar” o vírus, e que funcionava como uma “barreira natural” à infecção. Um ano depois, Carla Ribeiro não deu um, mas vários passos em várias direcções. Está agora a analisar uma série de amostras de sangue recolhidas entre os anos 80 e 90 de doentes infectados com VIH. E o recuo ao início da epidemia, numa altura em que as pessoas infectadas não eram tratadas com as eficazes terapias anti-retrovirais, já deu resultados. Limitada à análise do sangue, longe das células da epiderme que estudou antes, a cientista centrou-se no estudo do mecanismo da autofagia, que funciona como uma autodefesa do organismo, e procurou genes com um papel importante nesta operação de limpeza do vírus que as células conseguem fazer. “Identifiquei um gene que, com uma determinada mutação, confere uma vantagem para este mecanismo de autofagia”, adianta, admitindo que está a estudar outros genes suspeitos de funcionarem como aliados na luta do organismo contra a infecção. “Num grupo de cerca de 300 doentes do início da epidemia e que não receberam terapia anti-retroviral percebemos que cerca de 10% sobreviveu mais tempo, cerca de 180 meses, e que esses tinham essa mutação genética”, explica. O trabalho desvenda, assim, uma espécie de “vantagem natural” genética de algumas pessoas para combater o vírus. Agora, o plano é estudar melhor este mecanismo e perceber se esta mutação genética também funciona para atenuar os efeitos secundários (como doenças cardiovasculares e início precoce de demências) que têm sido associados a doentes que fazem terapias anti-retrovirais. Depois, mais tarde e a confirmar-se esta “vantagem” natural, já “só” faltará desenvolver um fármaco que imite os efeitos deste mecanismo conseguindo que todos os doentes partilhem o mesmo benefício desta “barreira” à infecção. “As pessoas com esta mutação genética parecem ter melhores níveis de autofagia e também uma redução das reacções inflamatórias. Primeiro, precisamos de perceber bem como e por que é que isto acontece e, depois, vamos tentar simular o mesmo mecanismo com fármacos”, diz Carla Ribeiro. A investigadora fala com entusiasmo do trabalho que desenvolve na Holanda desde 2011 e que, além de vários artigos publicados em revistas científicas, já mereceu um reconhecimento público. Esta semana, a cientista portuguesa recebeu o prémio atribuído pela Fundação Holandesa de Monitorização do VIH ao melhor trabalho de investigação sobre o vírus, numa cerimónia que contou com a presença de Timothy Ray Brown, a única pessoa que, até hoje, ficou livre do vírus da sida, depois de um transplante de medula em 2007, e que ficou conhecida como o paciente de Berlim. “Foi um momento muito especial”, diz a investigadora, valorizando a presença de Timothy Ray Brown que reconhece como um caso especial (e único) mas, nota, que é sobretudo um exemplo importante pela mensagem de esperança que transmite a todos os doentes. Apesar dos “passos gigantes” dos cientistas no estudo desta doença, o objectivo continua a ser encontrar uma cura, seja uma vacina preventiva ou terapêutica, e essa meta ainda não foi alcançada, constata. “Acredito que estamos perto. Mais perto do que nunca, ainda que tenha consciência que ainda vai demorar alguns anos”, refere, apontando para as várias estratégias que vão desde a procura de uma vacina que impeça a infecção até à destruição dos reservatórios que o vírus mantém no organismo das pessoas infectadas e que têm a doença controlada com a terapia anti-retroviral. Numa outra frente de trabalho (e do outro lado do planeta), a investigadora portuguesa Susana Valente foi notícia também pelos avanços conseguidos nesta área do VIH. Num artigo publicado na revista Cell Reports, a cientista que trabalha no Instituto de Investigação Scripps, na Florida (EUA), divulgou os resultados de experiências com ratinhos que apontam para uma possível “cura funcional” da infecção por VIH. Simplificando os resultados da sua investigação, Susana Valente usou um composto químico para colocar as células infectadas com VIH num “estado de coma profundo”. Segundo explicou ao PÚBLICO, a equipa usou um composto (dCA) para bloquear a replicação do vírus em células infectadas através da inibição de uma proteína chamada Tat, que já se sabia ter um papel decisivo na replicação do vírus. E quando a produção da proteína Tat é bloqueada, “é como se tivéssemos ali um carro parado sem gasolina que não consegue funcionar”, explica. O objectivo é usar este composto para transformar todas células infectadas (mesmo as que se escondem em reservatórios no organismo) num monte de sucata inútil e inofensiva para as pessoas. Ou seja, fazer com que o VIH seja “mais um” dos muitos retrovírus que transportamos no corpo mas que não nos fazem mal. Mas há um longo caminho a percorrer até se chegar a esse final feliz. A experiência em ratinhos mostrou, entre outros resultados, que o tratamento de um mês com o composto mantinha as células em estado de coma durante cerca de duas semanas. “Ao combinar o fármaco com a terapia de anti-retrovirais, em ratinhos com VIH-1 humanizado, o nosso estudo mostrou uma redução drástica do ARN do vírus, o que é realmente a prova de conceito para uma cura funcional”, refere a investigadora. Falta agora responder a todas as outras perguntas que ficam em aberto. Quanto tempo tem de durar o tratamento para ser eficaz? Com que doses? Este coma induzido pode ser permanente? Como? E, talvez a mais importante de todas as questões, será que esta abordagem funciona nas pessoas?Para já, adianta Susana Valente, a única certeza é que será preciso investir para que o duro e demorado processo de ensaios clínicos, com as suas várias etapas e regras rígidas, avance. No laboratório, já começaram algumas experiências com macacos que podem esclarecer alguns pontos importantes, ainda que a versão do vírus seja diferente. “Seria, pelo menos, outro modelo animal em que podemos provar a eficácia deste fármaco e há experiências no campo da imunologia que nos ratinhos não se podem fazer”, explica a investigadora. Mas, mais do que o dinheiro ou o esforço que é preciso investir nesta área, o maior desafio nesta luta conta o VIH é o próprio vírus. “Não só é esperto”, diz Susana Valente concordando com Carla Ribeiro, como é rápido a adaptar-se e tem uma forma muito especial de invadir as nossas células. A verdade é que há muitos outros vírus que conseguimos travar e para os quais existem vacinas. O que é que o VIH tem de especial? “A biologia deste vírus faz com que tenha uma capacidade de estar sempre a mudar. Muda muito rapidamente e está coberto de açúcares e o sistema imunitário não sabe muito bem o que aquilo é e não desenvolve anticorpos específicos. O problema ‘número um’ deste vírus é a resistência. Replica-se muito depressa e esconde-se. Vários pormenores fazem do VIH um vírus muito especial”, responde Susana Valente. “Têm sido feitos muitos progressos na compreensão de questões como a latência do vírus e dos reservatórios que ele mantém e o campo dos anticorpos específicos contra VIH também tem sido muito explorado”, enumera Susana Valente, referindo ainda os avanços recentes com uma molécula modificada associada ao principal receptor do vírus nos linfócitos T (o receptor CD4) que também pode vir a funcionar como uma vacina. “O que queremos é vermo-nos livres do vírus para sempre, ponto final. Tirar de lá o material genético. Mas para fazer isso é preciso saber distinguir quais as células infectadas das que não estão infectadas e, quando o vírus está a dormir, não expressa proteínas ou expressa muito poucas, não sabemos onde estão essas células”, refere ainda Susana Valente. Seria decisivo, por exemplo, encontrar um marcador específico para todas células infectadas com VIH. Enquanto isso, joga-se com as cartas que temos. Hoje há, por exemplo, nota a cientista, formas de eliminar ou introduzir uma mutação num gene mas, nesse cenário, é preciso saber o que se está a procurar. “No caso do VIH não se sabe bem, portanto isso teria de ser combinado com uma abordagem em que, primeiro, tem de se acordar o vírus e depois eliminá-lo. ” A estratégia conhecida como “shock and kill” (choque e morte) é uma das áreas mais exploradas nos últimos anos na investigação do VIH. Susana Valente vê alguns riscos nesta abordagem popular. “É algo arriscada porque estamos a falar de drogas que estão a acordar o vírus e que, em muitos casos, não são específicas para o vírus e, por isso, vão activar outros genes que deviam estar dormentes e podemos estar a criar outros problemas fora deste alvo, como cancro ou outras coisas”, argumenta. Por outro lado, acrescenta, a reacção à reactivação do vírus depende de um sistema imunitário capaz de funcionar bem, em que os linfócitos T CD8 sejam capazes de reconhecer os linfócitos T CD4 infectados e, na verdade, os doentes após vários anos a fazer terapias terão um sistema imunitário menos competente. “Neste campo do ‘shock and kill’, todos os esforços estão agora a chegar ao ponto em que se percebeu que é preciso arranjar fármacos que activem o vírus de uma forma muito mais específica e que sejam muito fortes, porque temos de conseguir acordar até ao último vírus e, por outro lado, temos de promover uma imunocompetência dos linfócitos CD8”. Por fim, refere, “o ‘shock and kill’ no cérebro é uma péssima ideia porque a vigilância imunitária aí é muito pior do que no resto do corpo”. Parece ser fácil concluir que esta não é a abordagem escolhida por Susana Valente. À sua estratégia a cientista chamou “block and lock” (que traduzindo significa “bloquear e prender”), ou seja, bloqueia-se a reactivação do vírus nas células e prende-se o VIH num estado de coma e, espera-se, duradouro. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. A verdade é que mesmo com todos os avanços feitos nos tratamentos, os esforços para conseguir uma cura para a sida não parecem abrandar ao contrário do que aconteceu com outras doenças “controladas”, como a hepatite B. “O VIH é diferente. Existe o problema da resistência, que faz com que seja preciso procurar sempre novos medicamentos e é uma epidemia mundial”, diz Susana Valente. Há uma expressão que já se tornou um lugar-comum: a sida transformou-se numa doença crónica. Mas, Carla Ribeiro avisa que isso apenas vale para “uma fracção do mundo”, a dos países mais desenvolvidos, para a Europa, EUA, entre outros. Em regiões como África, por exemplo, a luta é mais dura e o vírus cresce com a ajuda de aliados como a pobreza, que cria barreiras ao acesso a tratamentos e da cultura muitas vezes baseada no “domínio do homem” em relações íntimas, onde ainda não há espaço para o recurso ao preservativo. “Nós já temos a cura para a sida. É o preservativo”, constata. Cada vez que publica um artigo científico sobre VIH, Susana Valente recebe cartas ou emails de doentes com VIH a contar as suas histórias. Quer dizer-lhes, um dia, que foi encontrada a solução. Uma vacina, um final feliz. É para isso que trabalha. Para o preconceito e estigma que ainda roubam um beijo, um simples toque na mão, um emprego, um amigo a muitas pessoas infectadas com VIH, já existe uma vacina: é informação.
REFERÊNCIAS:
Partidos LIVRE
O que é que o isolamento social faz ao cérebro?
Estudo em ratinhos mostra que um isolamento social prolongado leva à produção em excesso de um produto químico no cérebro que, por sua vez, está associado a um aumento de agressividade e medo. (...)

O que é que o isolamento social faz ao cérebro?
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.033
DATA: 2018-07-18 | Jornal Público
SUMÁRIO: Estudo em ratinhos mostra que um isolamento social prolongado leva à produção em excesso de um produto químico no cérebro que, por sua vez, está associado a um aumento de agressividade e medo.
TEXTO: Primeiro estudaram os efeitos do isolamento social crónico em moscas-da-fruta, um modelo animal muito usado pelos cientistas, e descobriram que existia um produto neuroquímico que desempenhava um papel importante na agressividade. Agora, a mesma equipa de cientistas encontrou o mesmo sinal químico no cérebro de ratinhos que estiveram isolados durante um período longo e demonstraram como está associado a um aumento do medo e da agressividade. Mais do que isso, perceberam que é possível bloquear a produção deste composto químico no cérebro e anular os seus efeitos negativos. O estudo publicado na revista Cell pode ser importante para novas estratégias de tratamento de doenças mentais em humanos. Uma equipa liderada por David J. Anderson, do Instituto de Tecnologia da Califórnia, em Pasadena, nos EUA, publicou um artigo em 2014 na Cell que mostrava como um sinal químico estava associado a um aumento da agressividade após uma situação de isolamento social, num estudo com moscas-da-fruta. Agora, a mesma equipa observou o que se passava no cérebro de ratinhos, dissecando as raízes do stress causado pelo isolamento social crónico. No artigo publicado agora, os cientistas apresentam um dos mecanismos desencadeados pelo isolamento social crónico em ratinhos e que faz com que o cérebro mude de uma maneira profunda. E, desta vez, mais do que apenas a agressividade, os investigadores procuraram também o “gatilho” para o medo ou a ansiedade que estão associados ao stress provocado pelo isolamento social crónico. “Conseguimos identificar um neuropeptídeo – uma pequena molécula no cérebro que as células usam para comunicar umas com as outras – que controla vários comportamentos que estão associados ao isolamento social crónico. Percebemos que este componente da família de neuropetídeos da taquiquinina, o Tac2, era produzido em excesso no cérebro dos ratinhos. Aumentava em várias regiões do cérebro”, explica ao PÚBLICO a primeira autora do artigo, Moriel Zelikowsky. O comunicado do Instituto de Tecnologia da Califórnia refere um exemplo de uma das experiências. “Ao encontrar um estímulo ameaçador, os ratinhos que foram socialmente isolados permanecem imóveis no mesmo local por muito tempo depois de a ameaça passar, enquanto os ratinhos normais retomam a sua actividade logo depois de a ameaça desaparecer. ”O trabalho permitiu ainda que os investigadores percebessem que um dia de isolamento social não é suficiente para causar um efeito. Segundo explicam, a overdose do sinal químico e os seus efeitos negativos no comportamento surgiram quando os ratinhos foram submetidos a uma espécie de pena na “solitária” no laboratório, privados de qualquer contacto com outros animais durante duas semanas. O aumento do sinal químico no cérebro dos ratinhos não era subtil. Era evidente. “Entre oito e dez vezes mais do que o normal”, esclarece a investigadora. Por outro lado, esta produção em excesso do composto neuroquímico acontecia em diferentes regiões do cérebro. Uma das mais importantes revelações desta investigação estará no facto de ser possível reverter estes efeitos com um fármaco que actua nos receptores destes sinais. “Descobrimos que, se tentássemos manipular este mecanismo para bloquear o sinal químico em determinadas regiões do cérebro, conseguíamos atenuar ou mesmo anular alguns destes efeitos negativos do isolamento social”, sublinha Moriel Zelikowsky. Na experiência com ratinhos, os cientistas verificaram que o “tratamento” com um composto levava a uma recuperação do comportamento dos ratinhos isolados, permitindo mesmo uma nova reinserção no grupo sem que atacassem os companheiros, ao contrário do que faziam os isolados e agressivos animais que não foram tratados. Para testar o “poder” deste composto neuroquímico, os investigadores também encontraram uma forma de produzir artificialmente este sinal no cérebro de ratinhos que estavam inseridos em grupos. “Quando fizemos isso, vimos que imitavam muitos dos efeitos do isolamento social”, constata David J. Anderson. Por fim, usaram o mesmo fármaco para fazer um levantamento dos sinais em diferentes regiões do cérebro e perceberam que têm diferentes efeitos. Assim, o bloqueio do sinal na região cerebral da amígdala eliminou o medo, mas não a agressão. A mesma estratégia usada no hipotálamo eliminou a agressão, mas não o medo. Depois do passo entre a mosca-da-fruta e os ratinhos, falta saber se este conhecimento pode ser útil para os humanos. As experiências ainda não foram feitas, mas o ponto de partida é promissor, uma vez que sabemos que este sinal químico também é produzido no nosso cérebro. “O facto de haver alguma conservação das moscas-da-fruta para os ratos faz-me pensar que esse peptídeo pode ter algum papel em algumas formas de stress e nos seus efeitos no cérebro dos seres humanos”, diz David Anderson no comunicado da revista Cell sobre o estudo. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Por outro lado, o fármaco que os investigadores usaram no estudo com ratinhos para bloquear esta reacção “tóxica” do cérebro e atenuar ou eliminar os seus efeitos negativos tinha sido desenvolvida para tratar distúrbios como a esquizofrenia e a doença bipolar, mas sem grande sucesso. “Este nosso estudo levanta a possibilidade de que este fármaco possa ser reaproveitado para tratar outros distúrbios psiquiátricos que estão associados ao isolamento social em seres humanos – não apenas em casos de encarceramento em celas solitárias, mas talvez no stress de um luto ou outros tipos de stress”, admite o líder da equipa de cientistas. Moriel Zelikowsky refere outra importante vantagem que este estudo poderá trazer para os humanos: “Identificar um neuropeptídeo que está especificamente relacionado com o stress de isolamento crónico e saber quais são as regiões associadas a certos comportamentos, como fizemos neste estudo, pode ajudar-nos a definir um alvo para atacar com um fármaco que, assim, terá melhores resultados e menos efeitos secundários, em vez de afectar todo o cérebro. ”Num esforço de tradução dos resultados obtidos em ratinhos, a investigadora calcula que uma situação de isolamento de duas semanas possa equivaler a um período de seis meses a um ano para uma pessoa. E que tipo de isolamento estamos a falar? “A tradução literal seria algo muito semelhante ao que acontece quando colocamos uma pessoa numa cela solitária. Sabemos que isso provoca danos na saúde mental”, diz, admitindo que há actualmente outras formas preocupantes de isolamento social que podem ter consequências na saúde mental. Por exemplo: “Sabemos que, com o aumento do uso das redes sociais, há jovens que passam muito menos tempo a interagir fisicamente com outras pessoas, por isso estão, na verdade, muito mais sozinhos do que alguma vez estiveram. E isto pode provocar algum tipo de resposta nalgumas zonas do cérebro. Não sabemos. ”
REFERÊNCIAS:
A alimentação é o que mais pesa na pegada ecológica de Portugal
Saldo entre a pegada ecológica e a capacidade de regeneração dos recursos naturais coloca seis municípios portugueses sempre no papel de devedores. Concelhos do interior querem ser compensados pelo desempenho produtivo. (...)

A alimentação é o que mais pesa na pegada ecológica de Portugal
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.4
DATA: 2018-12-02 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20181202192824/https://www.publico.pt/n1849552
SUMÁRIO: Saldo entre a pegada ecológica e a capacidade de regeneração dos recursos naturais coloca seis municípios portugueses sempre no papel de devedores. Concelhos do interior querem ser compensados pelo desempenho produtivo.
TEXTO: O conceito de pegada ecológica é quase sempre colado à emissão de dióxido de carbono com origem nos transportes. E ainda que esta seja a segunda componente mais relevante, a alimentação é a principal alavanca das pegadas excessivas de seis municípios portugueses que quiseram calcular a pressão que o consumo dos seus cidadãos exerce sobre os ecossistemas. Foi isso que um projecto que junta a associação ambientalista Zero, a Global Footprint Network (responsável pelo conceito e métrica da pegada ecológica) e a Universidade de Aveiro fez para Almada, Bragança, Castelo Branco, Guimarães, Lagoa e Vila Nova de Gaia. É a primeira vez que se olha para a pegada ecológica ao mesmo tempo que se calcula a biocapacidade dos municípios. A pegada ecológica mede a área – em terras de cultivo, pastagens, florestas, áreas de pesca – que um cidadão precisa para produzir o que consome e absorver o lixo que produz. A biocapacidade mede aquela que está disponível para regenerar esses recursos. Ambas são medidas em hectares globais (gha) por pessoa e, para este estudo, baseiam-se em dados de 2011 a 2016. Ficou demostrado que estes municípios – como, aliás, Portugal e outros cerca de 130 países – consomem mais recursos do que aqueles que estão disponíveis, ficando a dever à natureza. O peso do consumo insustentável de produtos alimentares é tão evidente neste cálculo que os investigadores decidiram desagregá-lo e calcular a pegada ecológica da alimentação. Não é surpreendente que os municípios com mais população sejam aqueles com maior peso na pegada nacional: Vila Nova de Gaia, Almada e Guimarães representavam, respectivamente, 2, 9%, 1, 7% e 1, 4% da pegada ecológica de Portugal, em 2016. E que a biocapacidade seja mais elevada nos concelhos com vasto manto florestal e agrícola. Castelo Branco e Bragança são, por isso, os que mais contribuem para o total nacional, com 0, 9% e 0, 7%, respectivamente. O que não era esperado, diz Sara Moreno Pires, coordenadora científica do projecto e professora na Universidade de Aveiro, eram as elevadas pegadas ecológicas nestes dois municípios interiores. Um cidadão de Castelo Branco precisa de 4, 02 gha – e um de Bragança de 4, 01 gha – de área produtiva para suportar o seu estilo de vida. Em média, os portugueses precisam de 3, 94 gha por pessoa. Isto explica-se pelo que os cidadãos colocam no prato. Bragança tem uma pegada ecológica na alimentação 19% superior à média nacional (1, 27 gha, quando a média é 1, 16 gha). E a alimentação já é, para todo o país, o elemento que mais pressão traz aos ecossistemas. “Os nossos padrões de consumo são de tal forma similares nas zonas urbanas que o impacto que a interioridade poderia ter é diluído”, diz a investigadora da Universidade de Aveiro. Nestes seis municípios, o consumo de proteína animal corresponde a mais de metade da pegada da alimentação: a carne pesa entre 23% a 28%, e o peixe cerca de 26%. E se tivermos em conta que a produção de carne vermelha, de bacalhau, atum e salmão – os peixes mais consumidos em Portugal – exige muitos recursos naturais, justifica-se por que Portugal é dos países mediterrânicos cuja alimentação mais mal faz ao planeta. É também dos que precisa de mais espaço produtivo para ter que comer, demonstrou um estudo de 2015 da Global Footprint Network. “Isto reflecte a forma como vivemos em torno da comida. Temos que assumir uma mudança no consumo – passar de um quilo de bacalhau para um quilo de cavala, por exemplo”, diz Sara Moreno Pires. A mudança deve passar também pela redução do desperdício na restauração, a compra de produtos locais para as cantinas e a criação de redes de produtores locais. Depois disso, só os transportes têm um peso significativo na pegada ecológica (entre 19 e 23%). Em termos de pegada ecológica, os concelhos de Castelo Branco e Bragança só são ultrapassados por Almada, que chega aos 4, 8 gha por pessoa. Aliás, se a população mundial consumisse como os cidadãos de um destes três municípios, seriam necessários 2, 4 planetas para repor os recursos naturais. A questão pode ainda ser vista noutro prisma. Se a população mundial consumisse como consome, em média, um cidadão de Almada, os recursos que o planeta é capaz de produzir num ano teriam esgotado a 27 de Maio. O mesmo acontecia a 30 de Maio se todos fossem como os bragantinos ou os albicastrenses. No mais tardar, o dia de sobrecarga da Terra acontecia a 4 Julho, se o consumo humano seguisse o padrão dos habitantes de Lagoa. Este é o concelho com a menor pegada (3, 25 gha), facto que os investigadores atribuem ao menor poder de compra. Também por isso, este valor diverge tanto da pegada ecológica média de um cidadão da região do Algarve (é 16% menor). Estes dados, vistos de forma isolada, permitem aos municípios tomar políticas mais informadas e entender melhor os problemas ambientais do território. Mas Sara Moreno Pires considera que não se pode assumir que todas as cidades têm que ser, por si só, sustentáveis. Ainda que haja oportunidade para valorizar e proteger os recursos naturais, de forma a tirar melhor proveito deles, há condicionantes locais – como a densidade populacional em concelhos fortemente urbanos, os padrões de consumo e poder de compra, ou o perfil das actividades económicas – que são difíceis de ultrapassar para se equilibrar a balança entre o que se gasta e o que se produz. Por isso, as “zonas urbanas precisam de valorizar os territórios do interior, porque é aí que está a capacidade produtiva”. São esses que permitem que a balança não seja mais desequilibrada. Esta necessidade de valorizar economicamente a biodiversidade e compensar os municípios que gerem territórios importantes para a sustentabilidade do país, que tem sido defendida por académicos e ambientalistas, foi apoiada pelos autarcas dos concelhos com maior biocapacidade, Bragança e Castelo Branco, durante a apresentação dos estudos, esta semana, nestas cidades. Afinal, o “equilíbrio litoral-interior é também vital para a sustentabilidade do país”, diz Sara Moreno Pires. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. O mesmo é aplicável a nível local, por exemplo, se se “compensar um proprietário privado que tem uma área florestal importantíssima para o concelho para a poder preservar", exemplifica. A partir do próximo ano, estes concelhos vão poder aprofundar estes resultados e testar opções de mitigação com o auxílio de calculadoras online de pegada ecológica que, pela primeira vez, serão alimentadas por dados portugueses, calibrados para o contexto de cada município. E outros municípios podem juntar-se ao projecto, conhecendo mais de si e ajudando a construir uma imagem mais completa da pegada que, localmente, se deixa no ecossistema nacional.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave carne consumo estudo animal
Boom: mais do que um festival, um exemplo a seguir
Devido às notícias sensacionalistas, as pessoas assumem que o Boom Festival é "só para gente doida ou drogada", o que revela uma completa falta de conhecimento. (...)

Boom: mais do que um festival, um exemplo a seguir
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.5
DATA: 2018-08-30 | Jornal Público
SUMÁRIO: Devido às notícias sensacionalistas, as pessoas assumem que o Boom Festival é "só para gente doida ou drogada", o que revela uma completa falta de conhecimento.
TEXTO: Todos os anos anseio que chegue o Verão para ver em palcos nacionais os melhores artistas e DJ nacionais e internacionais. Mas há um festival pelo qual tenho vindo a ganhar um apreço especial: o Boom. Este ano decorreu mais uma edição. É um dos maiores festivais do mundo dedicado aos espíritos livres e, como descrito pela organização, quer reunir "a tribo psicadélica global”. Leva, de dois em dois anos, mais de 30 mil pessoas a Idanha-a-Nova; no entanto, nem sempre é visto de forma positiva. Apesar de receber rasgados elogios internacionais, arrecadando prémios na área ambiental, sendo aclamado por órgãos de comunicação social como o The Guardian ou a Rolling Stone e contando até com o reconhecimento da ONU, continua a ser denegrido pelos média nacionais. As únicas notícias a que dão destaque são as que referem as apreensões de droga, não dando o devido valor e destaque ao evento e às individualidades que dele fazem parte — este ano, por exemplo, esteve presente Leo Axt, o embaixador alemão da Campanha Internacional para a Abolição de Armas Nucleares (ICAN), organização que em 2017 ganhou o Prémio Nobel da Paz pelo seu trabalho de sensibilização para as consequências catastróficas deste tipo de armamento. Devido a estas notícias sensacionalistas, as pessoas assumem que este festival é "só para gente doida ou drogada", o que revela uma completa falta de conhecimento. Fui pela segunda vez ao Boom e nunca consumi estupefacientes, à semelhança do que acontece com outros festivaleiros. Em qualquer festival, há pessoas que cometem excessos. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Mas o Boom não é apenas um festival de música, é também um festival de arte, de cultura e de diversidade, onde pessoas de mais de 100 países se juntam para ouvir música electrónica e trance, celebrar a vida em comunhão com a natureza. A organização é exímia nos detalhes e pensa em nós, festivaleiros. É bonito ver famílias e pessoas a conviverem umas com as outras, não havendo distinção entre raças, género ou orientações individuais, políticas ou ideológicas. Além disso, este é talvez um dos festivais que mais se preocupa com o ambiente, quer na preservação da natureza e na promoção da reciclagem, quer nas acções que promove, transmitindo esses valores à sociedade. Este ano, os festivaleiros foram convidados a partilhar boleias e foram colocados à disposição 230 autocarros (que representaram 30% das deslocações), reduzindo as emissões de poluentes. Prova dessa mesma preocupação são ainda as 378 casas de banho de compostagem onde não são utilizados químicos ou água, sendo que os resíduos são utilizados para fertilização do solo. Além disso, toda a louça utilizada na zona da restauração, bem como nos bares, era biodegradável, o que diminui drasticamente a utilização de plásticos. Existia também uma eco team responsável pela recolha e separação de resíduos, evitando assim qualquer poluição no solo. E em 2014 nasceu o Boom Karuna Project, que tem ajudado o Centro de Resgate de Animais de Castelo Branco e que apoiado o centro de necessidades especiais (AERID) e o movimento escolar local Sementes do Interior. Leave no trace é o lema. Mais do que um festival é, acima de tudo, um exemplo a seguir.
REFERÊNCIAS:
Entidades ONU
Deitas lentes de contacto na sanita? O ambiente é que sofre
Investigação mostrou que muitas pessoas não deitam as lentes no lixo indiferenciado, como é desejável. E isso significa mais microplástico a poluir o ambiente. (...)

Deitas lentes de contacto na sanita? O ambiente é que sofre
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento -0.31
DATA: 2018-08-30 | Jornal Público
SUMÁRIO: Investigação mostrou que muitas pessoas não deitam as lentes no lixo indiferenciado, como é desejável. E isso significa mais microplástico a poluir o ambiente.
TEXTO: Usou lentes de contacto boa parte da sua vida e um dia uma dúvida começou a bailar na sua cabeça. O que aconteceria às pequenas lentes de plástico que todos os dias milhares de pessoas como ele deitavam fora? Rolf Halden, investigador na Universidade Estadual do Arizona, tinha há muito o alerta plástico accionado, com vários trabalhos na área da poluição por este material publicados, mas não conhecia nada sobre o impacto das lentes de contacto descartáveis no ambiente. Por isso pôs-se a investigar. Este domingo, 19 de Agosto, o resultado foi apresentado num encontro na Sociedade Americana de Química, em Boston, e tornou-se um alerta para milhões de utilizadores de lentes. Se têm como hábito deitá-las na sanita ou no lavatório, fiquem a saber que estão a contribuir para a poluição do planeta. Apesar da pequena dimensão — e de parte da sua constituição ser água —, as lentes não se dissolvem completamente e as estações de tratamento de águas residuais não têm capacidade de as eliminar. Segundo dados recolhidos pelos investigadores, 15 a 20% dos 400 participantes no estudo deitam as lentes na sanita ou lavatório em vez de as depositarem no lixo. E se olharmos para a estimativa do número de utilizadores de lentes descartáveis a dimensão do problema torna-se significativa: são 45 milhões só nos EUA. O caminho percorrido pelas pequenas lentes, já sabemos, é uma espécie de ciclo e volta sempre ao ponto de partida. Depois de estarem nas estações de tratamento de águas, as lentes, que não são biodegradáveis, são apenas parcialmente destruídas. Depois, juntam-se a outros microplásticos que frequentemente são ingeridos por animais aquáticos. E é aí que voltam muitas vezes a nós. À hora da refeição. Rolf Halden, Varun Kelkar e Charles Rolsky, estudante de pós-graduação e principal autor do estudo, entrevistaram trabalhadores de estações de tratamento e confirmaram a existência de lentes no lixo. Por outro lado, ao fazerem a vistoria a resíduos tratados, os investigadores encontraram fragmentos de lentes de contacto, percebendo que em dois quilos de lama de águas residuais havia, em média, um par de lentes. Esta lama é frequentemente aplicada na terra, o que abre caminho à introdução de plásticos também nos ecossistemas terrestres. “Quando o plástico da lente perde parte da sua força estrutural, ele rompe-se fisicamente. Isso leva a partículas de plástico menores, o que acabará por formar microplásticos”, explica Kelkar num artigo publicado no site da Universidade Estadual do Arizona. “Isto são materiais médicos, não era expectável que fossem super biodegradáveis”, aponta Rolf Halden, sublinhando que tal característica é boa para o utilizador mas pouco interessante para o ambiente. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. A pesquisa inédita quer chegar à indústria das lentes e alterar comportamentos. “Um primeiro passo simples seria que os fabricantes fornecessem na embalagem do produto informações sobre como descartar adequadamente as lentes de contacto, simplesmente colocando-as no lixo com outros resíduos sólidos”, explica Halden, deixando um desejo em forma de desafio para o futuro: a criação de lentes que sejam biodegradáveis. Enquanto isso não é possível, deitem as vossas lentes no lixo indiferenciado. E jamais na sanita ou lavatório. Artigo corrigido às 19h40.
REFERÊNCIAS:
Entidades EUA
Cidade na Austrália põe redes nas saídas de canos para reter o lixo
Uma cidade na Austrália está a testar a instalação de redes que prendem o lixo que sai dos tubos de drenagem, de forma a impedir a contaminação de uma reserva natural. O teste "foi um sucesso" (até no Facebook) e a câmara já está a pensar em novas localizações. (...)

Cidade na Austrália põe redes nas saídas de canos para reter o lixo
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-08-30 | Jornal Público
SUMÁRIO: Uma cidade na Austrália está a testar a instalação de redes que prendem o lixo que sai dos tubos de drenagem, de forma a impedir a contaminação de uma reserva natural. O teste "foi um sucesso" (até no Facebook) e a câmara já está a pensar em novas localizações.
TEXTO: A cidade de Kwinana, na Austrália, está a testar uma solução que permite diminuir as descargas de lixo dos sistemas de drenagem: instalou redes nas saídas dos canos que prendem o lixo, impedindo-o de sair do tubo. O sistema foi montado em Março, em duas localizações da reserva de Henley, próxima de zonas residenciais. Pretende prevenir que resíduos sólidos, de dimensões médias, oriundos das zonas residenciais e transportados pelas águas das chuvas acabem por contaminar a reserva natural. Desde aí, as duas redes foram limpas três vezes. Foi recolhido um total de 370 quilogramas de lixo, maioritariamente “embalagens de comida, garrafas, areia e folhas de árvores”, lê-se no portal de notícias da câmara. O lixo recolhido por camiões é transportado para uma central de separação que também processa os resíduos biodegradáveis, transformando-os em adubo. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Até à data, nenhum animal ficou preso nas redes, que tiveram um custo total, da instalação à manutenção, de 20 mil euros. Espera-se que a iniciativa “poupe custos relacionados com a recolha do lixo espalhado na reserva, que antes era feita à mão”. Nestes primeiros cinco meses, o teste focou-se em áreas “onde os canos de drenagem fazem a descarga em espaços públicos abertos e em reservas”. E foi “um sucesso”, pelo que já foram identificadas mais três localizações onde as redes poderiam ser instaladas. O projecto vai agora ser proposto para o orçamento de 2019/2020. A câmara partilhou a medida no Facebook, a 4 de Agosto, e a imagem de uma rede cheia de lixo já foi partilhada mais de 125 mil vezes. A “atenção internacional” que o projecto agarrou, escreveu depois a mayor Carol Adams, “só mostra o quão importante é para os governos começarem a focar-se em iniciativas ambientais” e “perceberem que pequenas acções podem ter grandes impactos”.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave animal
Andamos a temperar a comida com sal que tem microplásticos
Estudo analisou 17 amostras de sal de mesa vendido em oito países (incluindo Portugal) e confirmou contaminação com microplásticos. Uma das três amostras portuguesas testadas atingiu o máximo observado com dez microplásticos por quilo de sal. (...)

Andamos a temperar a comida com sal que tem microplásticos
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-10-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Estudo analisou 17 amostras de sal de mesa vendido em oito países (incluindo Portugal) e confirmou contaminação com microplásticos. Uma das três amostras portuguesas testadas atingiu o máximo observado com dez microplásticos por quilo de sal.
TEXTO: Sim, é verdade, andamos a temperar a nossa comida com microplásticos. Mas, calma, não é (ainda) caso para alarme. Uma equipa de cientistas procurou minúsculas partículas de plástico em 17 marcas de sal vendidas em oito países, incluindo Portugal. A maioria estava contaminada mas com doses baixas, que dificilmente têm qualquer efeito imediato na saúde dos consumidores. O problema é que estas “microbombas” estarão em muitos outros produtos que vêm do mar (e não só). “Os plásticos são o lobo mau do século XXI”, avisa Ali Karami, investigador na Faculdade de Medicina e Ciências da Saúde da Universidade Putra, na Malásia, e principal autor do artigo publicado na revista Scientific Reports, do mesmo grupo da revista Nature. O processo é simples. Todos os anos despejamos entre cinco e 13 milhões de toneladas de plásticos para os oceanos. A luz solar e a água desfazem este lixo até às mais minúsculas partículas. Quando têm menos de cinco milímetros são chamados “microplásticos”. Fazem, por isso, parte da dieta de muitas espécies marinhas, desde o zooplâncton (que serve de alimento a outros animais) até às baleias. A este ingrediente que envenena o mar, o homem conseguiu juntar ainda outros como as microesferas plásticas, que estão em muitos produtos de higiene e cosmética (pasta de dentes, champô, gel de banho ou detergentes) e que, depois do esgoto, também acabam nos oceanos. Mas, tal como na história do feitiço que se volta contra o feiticeiro, há uma parte do plástico que despejamos no mar que estará a voltar para nós, em pedacinhos minúsculos, em tudo o que retiramos de lá. Incluindo, como prova este estudo, o sal. E, aparentemente, o plástico que regressa será ainda pior do que o que deitamos ao lixo. “Os plásticos funcionam como esponjas e, por isso, conseguem absorver um elevado volume de contaminantes da água onde estão. Como normalmente ficam na água durante bastante tempo, existe a oportunidade para absorverem uma quantidade significativa de poluentes”, explica Ali Karami. O cientista fala em “microbombas”. “Os microplásticos podem libertar poluentes no nosso organismo que, a longo prazo, podem provocar problemas de saúde. Por isso, dizemos que são microbombas”, explica o investigador, em resposta ao PÚBLICO, sublinhando que o perigo não será muito elevado tendo em conta o reduzido tamanho destas partículas. Assim, conclui, “apenas o consumo contínuo e a longo prazo de produtos com microplásticos será motivo para preocupação”. Infelizmente, presume-se, que seja precisamente isso que esteja a acontecer. “Estamos a consumir microplásticos em vários produtos, incluindo marisco, mel e até cerveja. Assim, o sal não é o único culpado”, avisa Ali Karami. O que o estudo liderado por investigadores na Malásia, com a colaboração de cientistas em França e no Reino Unido, fez foi, precisamente, confirmar que o sal é um das boleias que o plástico apanha para fazer a viagem de regresso até nós. Como? Procuraram microplásticos em 17 marcas de sal à venda na Austrália, França, Irão, Japão, Malásia, Nova Zelândia e África do Sul. “Os microplásticos só estavam ausentes numa das marcas, enquanto as outras continham entre um a dez microplásticos por quilo de sal”, referem no artigo. Três das amostras analisadas eram portuguesas e são marcas que são actualmente comercializadas. A análise foi particularmente cuidadosa se tivermos em conta que os cientistas só procuraram microplásticos até um milímetro de tamanho (a regra mais comum e geral é considerar as partículas com menos de cinco milímetros). Além de microplásticos, foram encontradas outras coisas no sal. Assim, das 72 partículas extraídas de todas as amostras, 41, 6% eram polímeros plásticos, 23, 6% eram pigmentos (associados muitas vezes a aditivos colocados nos plásticos), 5, 5% eram carbono livre e 29, 1% ficaram por identificar. Num dos gráficos do artigo, encontra-se informação mais detalhada sobre as análises às diferentes amostras. Uma das três marcas portuguesas analisadas destaca-se pelos piores motivos, alcançando o máximo registado de dez partículas de microplásticos (nylon, polipropileno, polietileno, entre outros) por quilo de sal. As outras duas marcas não continham qualquer partícula de polímeros plásticos mas, em compensação, tinham partículas de diversos pigmentos. Em resposta ao PÚBLICO, Ali Karami refere ainda que a possibilidade de contaminação das amostras pelas embalagens (algumas delas eram de plástico) foi tida em conta e descartada. “Assegurámos que a fonte dos microplásticos na amostra do sal não era a embalagem”, confirma. No artigo, os cientistas acrescentam que o facto de alguns dos fragmentos encontrados estarem já bastante degradados indica que já se encontravam há muito tempo no ambiente. “É preocupante saber que o sal, um ingrediente que se usa com muita frequência na alimentação, pode estar contaminado com microplásticos. Mas se estou surpreendida com isso? Não, não estou nada surpreendida com isso. Tenho a certeza que encontraremos o mesmo tipo de compostos e partículas noutros produtos alimentares que nunca foram analisados”, reage Paula Sobral, professora na Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa que coordenou o projecto Poizon, dedicado à investigação sobre microplásticos nos oceanos. “Este estudo confirma que os microplásticos estão em todo o lado. São coisas que não vemos mas existem”, diz, juntando ainda a esta fotografia “todas as fibras sintéticas que se desprendem todos os dias para o meio aquático e não só”. “Basta olhar para um raio de sol a entrar por uma janela para ver uma data de partículas suspensa, muitas são microfibras sintéticas”, acrescenta. A investigadora nota, no entanto, que sobre a investigação científica nesta área está ainda numa fase inicial e com muitas incertezas e que falta, por exemplo, fazer uma cuidadosa análise de risco sobre os microplásticos. “Não temos nenhuma bitola. Não sabemos até que ponto é que há um risco ou não”, afirma ao PÚBLICO, defendendo que o que podemos dizer, para já, é que “existe um perigo potencial”. Por outro lado, acrescenta, há muito plástico no mar mas também em terra. “O plástico afirmou-se com algo de imprescindível e essencial no nosso quotidiano e, para nós, ainda representa mais uma conveniência do que um perigo”, diz, esclarecendo que não existe qualquer legislação específica sobre os microplásticos. Os autores do estudo defendem que as quantidades de microplásticos encontradas no sal (de Portugal e dos outros países) não são suficientes para ter qualquer tipo de impacto na saúde. Até porque, adiantam, o consumo máximo de partículas antropogénicas (que resultam da actividade do homem) para um indivíduo estará em 37 partículas por ano. Porém, a verdade é que ainda não se sabe muito sobre os microplásticos. Nem sobre as possíveis fontes, as quantidades que “entram” em alguns produtos ou o mal que nos podem fazer à saúde. “Os estudos em microplásticos estão numa fase muito inicial”, concorda Ali Karami, que acrescenta: “Ainda não sabemos quantos outros produtos estão contaminados com microplásticos, mas acreditamos que a maioria dos produtos que vêm do mar provavelmente tem. Por isso, os microplásticos no sal serão apenas uma minúscula parte da orquestra. ” Antes deste estudo apenas tinha sido publicado (em 2015) um outro trabalho por investigadores na China, mas que apenas dizia respeito às análises de sal da China, comprovando a sua contaminação com microplásticos. Agora, foi analisado sal de várias partes do mundo que confirma um efeito a nível global. Portanto, o investigador revela que encontraram microplásticos no sal, ao mesmo tempo diz-nos que isso (por si só) não nos fará mal mas logo a seguir acrescenta que o mais provável é que os microplásticos estejam em muitos outros produtos. O que, no final das contas e ao fim de algum tempo, nos poderá fazer mal. Perante isto, o que fazer?Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. É preciso saber mais sobre este problema para conseguir uma imagem mais completa, acredita Ali Karami. “Estamos a fazer vários estudos, cujos resultados ainda não foram publicados, e encontrámos microplásticos noutros produtos que vêm do mar. Infelizmente, a maioria dos produtos que testámos também está contaminada”, adianta ao PÚBLICO, concluindo que “o nosso planeta está a ser silenciosamente conquistado por estas microbombas”. Mais: “Se os microplásticos estão nestes produtos, isso significa que é impossível removê-los porque são tão minúsculos e tão numerosos. ” Então, mais uma vez, o que fazer? “As autoridades de saúde devem começar a monitorizar regularmente a presença destas microbombas. E, além disso, devem ser estabelecidas novas regras para garantir a segurança dos consumidores, assegurando que os produtos não contêm microplásticos. ” Isso quer dizer que, nesse futuro com regras, a amostra portuguesa que continha dez partículas de micropl��sticos por quilo de sal deveria ser retirada do mercado? “Possivelmente, sim”, responde o investigador. A maioria das pessoas não sabe que pode estar a ingerir plástico na comida, admite Ali Karami que também acredita que os próprios produtores de sal, neste caso, desconhecem esta realidade. E, insiste o cientista, é preciso frisar que o sal não será seguramente a única fonte de microplásticos na nossa dieta. A verdade é que a culpa não é do sal, nem de qualquer outra boleia que o plástico poderá estar a aproveitar para entrar nos nossos organismos e, potencialmente, prejudicar a nossa saúde. A culpa é mesmo toda nossa. Afinal, quem é que levou o plástico para os nossos oceanos?
REFERÊNCIAS:
Hélder Valente, o “original gangster” da permacultura
De Lagos à Amazónia, do México aos Açores. Há 20 anos que Hélder Valente viaja pelo mundo para difundir uma filosofia que só agora tem ganho popularidade: a permacultura. (...)

Hélder Valente, o “original gangster” da permacultura
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 | Sentimento 0.375
DATA: 2018-12-10 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20181210184409/https://www.publico.pt/n1838889
SUMÁRIO: De Lagos à Amazónia, do México aos Açores. Há 20 anos que Hélder Valente viaja pelo mundo para difundir uma filosofia que só agora tem ganho popularidade: a permacultura.
TEXTO: Na conferência em que esteve presente, no Anarcha Portugal, foi apelidado de “original gangster” da permacultura. E não é para menos. Há 20 anos que Hélder Valente se apaixonou pela permacultura, um conceito que só agora está a chegar ao grande público (em Portugal e no mundo). Hoje, com 38 anos, já percorreu mais de 40 países para dar a conhecer o sistema de princípios agrícolas que se pode tornar num estilo de vida e esteve no Porto, a 19 e 20 de Julho, para partilhar o que tem aprendido. Mas o que é a permacultura? Definições há muitas. Uns vêem-na como uma prática que está “um passo à frente da agricultura biológica”, outros já a associam a um movimento cultural e filosófico. Para Hélder, professor de permacultura há uma década, a forma mais simples de a explicar é através da imagem de “paraíso”. “A permacultura é criar o paraíso outra vez. Não apenas os jardins do paraíso, cheios de frutos deliciosos, mas também a parte social do paraíso – o vivermos em harmonia uns com os outros, não em competição, mas em colaboração. É aí que está a verdadeira sustentabilidade. Hoje, a permacultura foca-se em regenerar os ecossistemas, as florestas, mas também em explorar como é que as pessoas podem trabalhar em conjunto de uma forma mais eficiente. ”O termo foi cunhado por David Holmgren e Bill Mollison, no final dos anos 70, para descrever um “sistema integrado, em evolução, de espécies de plantas e animais perenes ou que se auto-perpetuam, úteis ao homem”. Mas o conceito evoluiu e, hoje, Holmgren define-o como: “Paisagens conscientemente projectadas que imitam os padrões e relacionamentos encontrados na natureza, enquanto fornecem uma abundância de alimentos e energia para suprir as necessidades locais. As pessoas, os edifícios e a forma como se organizam são centrais para a permacultura. Assim, a visão de permacultura de agricultura permanente ou sustentável evoluiu para a de uma cultura permanente ou sustentável. ”Hélder nasceu em Cinfães, uma vila de Viseu banhada pelo rio Douro, no seio de uma família que vivia da agricultura há várias gerações. Ainda era novo quando migrou com os pais para Lisboa e desde cedo se debateu para entender se pertencia ao campo ou à cidade. Ainda tinha presentes “todas as recordações das dificuldades de viver no campo” e isso afastou-o momentaneamente da agricultura. Queria ser artista. E assim foi. Trabalhou como tatuador durante cerca de 10 anos, mas acabou por saturar-se: “Como artista, sentia todas as frustrações de estar fechado num lugar a desenhar e a ter de receber pessoas. A permacultura surgiu como uma resposta muito natural. No fundo, queria ser mais auto-suficiente, viver menos dependente de recursos externos. ”Então, começou a estudar. Tirou vários cursos relacionados com o tema, um deles com Bill Mollison, um dos criadores do conceito da permacultura, e fundou a Nova Escola de Permacultura, uma escola nómada que “foge aos velhos paradigmas do ensino” promovendo uma “educação alternativa, criativa e empoderadora”. O objectivo, diz, “é que os estudantes falem mais e partilhem o conhecimento que têm em vez de estarem a olhar para o mestre, professor ou guru, detentor de toda a sapiência”. A criação de uma rede de permacultura sul-americana mais dinâmica, que possa responder de maneira eficiente à desflorestação e à degradação das culturas tribais na floresta da Amazónia, é um dos mais recentes projectos da escola, que trabalha em colaboração com várias organizações não-governamentais. Desde 2012 que o projecto está de pé e Hélder tem viajado até lá quase todos os anos. A desflorestação é um problema eminente, comenta: “Nós pensamos que a Amazónia são florestas enormes, mas, na realidade, quando chegamos à selva percebemos que já é muito difícil encontrar árvores grandes. Foram todas cortadas. É preciso viajar milhares de quilómetros para encontrar uma árvore velha, um reflexo do que foi a selva um dia. A reflorestação que nós desenhámos tenta reproduzir os ecossistemas originais. Mas leva o seu tempo. Uma árvore que tem 200 ou 300 anos é muito difícil de substituir. O que fazemos é recuperar sementes de árvores em risco de extinção e tentar fazer reflorestação com estas espécies. ”Para isso, e para que de algum modo se proteja os grupos indígenas que lá vivem, a escola tem desenvolvido um grande trabalho de proximidade: “Temos um foco especial num grupo étnico, os Matsés, que vivem entre a Amazónia peruana e a brasileira — ou seja, bem dentro da floresta. Eles estão a gerir 500 mil hectares de floresta e nós estamos a ensinar-lhes como processar os produtos que colhem para depois introduzi-los no mercado internacional de produtos orgânicos e superalimentos da floresta, colhidos de forma sustentável e de baixo impacto por comunidades indígenas. ”Mas, na visão de Hélder, há um problema maior e comum que se levanta nos grupos indígenas da Amazónia: a perda de identidade. “Eles acham que são pessoas de segunda ou de terceira e muitos deles procuram ter um estilo de vida globalizado, igual a todos os ocidentais. Já não têm atracção pela sua cultura, acham que é uma coisa atrasada", revela. "Já não usam as vestes tradicionais, não falam a língua, têm vergonha dos seus hábitos. ”O que é uma pena, já que é na simplicidade da relação entre os indígenas e a natureza, independentemente dos locais onde as comunidades vivam, que Hélder encontra muitas das respostas para os problemas da sociedade ocidental: “Se tu fores ao Canadá, vais encontrar povos com paradigmas sociais muito semelhantes a indígenas da Amazónia ou dos Andes. E o que está por trás dessa identidade tem muito a ver com a conexão com a natureza e a forma como lidam com o espaço natural à volta deles. ”Hélder, que sempre se viu como “um revolucionário profissional”, está sempre atento ao aparecimento de ideias que explorem um novo sistema de vida. A sociocracia é uma das suas mais recentes paixões e é nesse conceito, adianta, que está o grande desafio da nossa civilização: “tomar decisões em conjunto e resolver os problemas de uma forma em que toda a gente sente que participa”. No último ano, andou pela América Latina, sob a alçada da Rede Internacional de Sociocracia e Parlamentos de Vizinhança e com o apoio da Organização das Nações Unidas, para desenvolver os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável: “Estamos a fomentar uma organização de bairro, em que as pessoas se encontram dentro da sua vizinhança para tomar decisões relativas a como melhorar a zona onde vivem. E também estamos a fazê-lo em escolas. ”Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Na Índia, conta o professor, já têm “mais de 140 milhões de pessoas a usar este modelo de governação”. Agora, estão a levar a ideia ao Peru (com uma pareceria com o Ministério da Educação), à Costa Rica, ao Panamá e ao México. Em Portugal, Hélder já esteve envolvido em vários projectos, como a criação da Quinta do Vale da Lama, em Lagos, que promove a permacultura e agricultura regenerativa. O professor realça que “somos um dos países onde a permacultura está presente na Europa”, mas acrescenta que “o grande desafio continua a ser encontrar formas de trabalharmos em rede e de nos organizarmos colectivamente”: “Os portugueses são pessoas bastante emocionais e o trabalhar em equipa de forma pragmática não é tão fácil para nós [risos]. ”Ainda assim, os passos seguintes do professor fazem-se em território nacional: em Outubro, a Nova Escola de Permacultura vai estar em São Miguel, Açores, com três cursos disponíveis (design em permacultura, sociocracia e bosques comestíveis). Uma breve paragem, porque ainda há muito mundo para descobrir.
REFERÊNCIAS: