Sector metalúrgico lança Metal Portugal para reforçar internacionalização
Ministro da Economia destaca capacidade exportadora do sector, que em 2014 exportou 13,8 mil milhões de euros. (...)

Sector metalúrgico lança Metal Portugal para reforçar internacionalização
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2015-05-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: Ministro da Economia destaca capacidade exportadora do sector, que em 2014 exportou 13,8 mil milhões de euros.
TEXTO: O sector metalúrgico e metalomecânico lançou esta quarta-feira a Metal Portugal, uma marca que pretende reforçar a notoriedade dos produtos nacionais, que em 2014 bateram o recorde em exportações, para cerca de 200 países. A marca, foi apresentada esta quarta-feira no Porto, em cerimónia que contou com a presença do ministro da Economia, Pires de Lima, que destacou a capacidade exportadora do sector, que depois de um aumento de 13% no ano passado, está a registar, nos primeiros dois meses do ano, um aumento de 15% nas vendas para o exterior. Entre 2010 e 2014, as exportações do sector aumentaram 30%, mas a manter-se o ritmo de crescimento de Janeiro e Fevereiro, o ministro estima que o crescimento possa atingir os 40% entre 2010 e 2015. Para o governante, o crescimento das exportações fica a dever-se ao mérito dos empresários, mas também à estabilidade governativa e a medidas concretas do actual executivo, como a simplificação de burocracias, garantias de factores competitivos e a oferta de previsibilidade fiscal. As última palavras de Pires de Lima foram uma resposta ao presidente da Associação dos Industriais Metalúrgicos Metalomecânicos e Afins de Portugal (AIMMAP), Aníbal Campos, que momentos antes tinha reclamado “condições mínimas de competitividade" semelhantes às das congéneres europeias. “A questão energética, o acesso ao financiamento e às matérias-primas, a estabilidade na política fiscal, bem como os transportes e a logística e a formação profissional eficaz, são hoje factores críticos para a nossa competitividade”, defendeu Aníbal Campos , acrescentando ainda que “ a política económica e industrial do país é pois tema central e que esperamos que esteja nas preocupações de quem nos governa e toma decisões”. A criação da Metal Portugal está inserida na estratégia de reforço da internacionalização do sector, que compete com o que melhor se faz a nível mundial, onde se destacam os gigantes alemães e asiáticos. Rafael Campos Pereira, vice-presidente da AIMMAP, explica que “era fundamental definir uma marca para acompanhar o posicionamento e o destaque que o sector tem ganho nos últimos anos”. E acrescenta que a Metal Portugal pretende cumprir esse objectivo, transmitindo o dinamismo, solidez, tecnologia e modernidade que caracterizam o metal português e pelos quais já somos reconhecidos”, explica Rafael Campos Pereira, vice-presidente da AIMMAP. Para o aumento das exportações tem contribuído a aposta do sector em inovação, visível no aumento crescente da produção de peças técnicas, que já representam um volume de negócios superior a seis mil milhões de euros, e a forte diversificação de mercados. O sector metalúrgico e metalomecânico representa cerca de 15 mil empresas e emprega 200 mil colaboradores, que trabalham em actividades tão diferentes como a metalurgia, a cutelaria e louça metálica, as máquinas e equipamentos, os produtos metálicos, os equipamentos de transporte e fabrico de peças técnicas utilizadas no sector automóvel, na aeronáutica e na indústria nuclear, entre outras.
REFERÊNCIAS:
Tempo Janeiro Fevereiro
Primeira “arte abstracta” feita por neandertais descoberta em Gibraltar
Parece um jogo do galo ainda por jogar. Mas ao que tudo indica, foi gravado na rocha por um neandertal, há pelo menos 39.000 anos, numa gruta em Gibraltar, na extremidade sul da Península Ibérica. (...)

Primeira “arte abstracta” feita por neandertais descoberta em Gibraltar
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.25
DATA: 2015-05-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: Parece um jogo do galo ainda por jogar. Mas ao que tudo indica, foi gravado na rocha por um neandertal, há pelo menos 39.000 anos, numa gruta em Gibraltar, na extremidade sul da Península Ibérica.
TEXTO: Uma equipa internacional de cientistas revela ter encontrado, pela primeira vez, uma gravura rupestre da autoria de um humano que não pertencia à nossa espécie – mais precisamente, de um neandertal. Para os autores, que publicaram os seus resultados esta segunda-feira na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), trata-se da primeira prova concreta de que os neandertais possuíam capacidades de raciocínio e de expressão abstractos que até agora eram considerados o exclusivo dos humanos modernos (nós). Clive Finlayson, do Museu de Gibraltar, juntamente com colegas de Gibraltar, Espanha, França, Reino Unido e Noruega, descobriram uma gravura que, ao que tudo indica, foi feita de forma intencional, mas não com fins utilitários, na gruta de Gorham, na costa mediterrânica (oriental) de Gibraltar, pequeno promontório rochoso situado na extremidade sul da Península Ibérica. Desde os anos 1950 que se sabe que esta gruta foi habitada pelos nossos “primos” humanos mais próximos, os neandertais, uma espécie de homem arcaico euroasiático que se extinguiu na Europa há uns 30. 000 anos. Este não é o primeiro indício a sugerir que as capacidades cognitivas dos neandertais têm sido subestimadas. Mas deita por terra um dos argumentos mais evocados para afirmar que os neandertais eram menos “sofisticados” do que os Homo sapiens: o facto de nunca ter sido encontrado qualquer exemplo claro de arte rupestre nos sítios arqueológicos outrora habitados pelos neandertais. Artista metódicoTambém não é o primeiro indício a sugerir que os neandertais podiam ser artistas das cavernas. Mas é a primeira vez, isso sim, salientam os autores, que é possível excluir as explicações alternativas para uma peça de arte rupestre. “A gravura da gruta de Gorham representa a primeira instância directamente demonstrável em que um padrão abstracto gravado, realizado com muito cuidado e sem fins utilitários [por neandertais] e cuja produção requereu acções prolongadas e focadas, é observado na rocha de uma gruta”, escrevem no seu artigo na PNAS. Até aqui, a arte das cavernas tem sido atribuída exclusivamente à nossa espécie, a dos humanos modernos, que chegou à Europa, vinda de África, há cerca de 40. 000 anos. Mas no caso da gravura de Gorham, uma eventual autoria da nossa espécie parece muito improvável. A gravura encontrava-se coberta por sedimentos onde já tinham sido desenterrados artefactos neandertais (em particular, ferramentas de pedra). E, mais importante ainda, explicam os autores, estes sedimentos permaneceram intocados, sem se misturarem com camadas mais recentes, durante 39. 000 anos – isto é, desde antes da chegada dos humanos modernos àquele recanto da Península Ibérica. A gravura propriamente dita, com uma área de uns 300 centímetros quadrados (15x20), encontra-se na parte mais funda da gruta, no centro de uma plataforma rochosa natural de um metro quadrado, a 40 centímetros do chão. É composta por várias linhas profundas entrecruzadas, à maneira de um jogo do galo, bem como de alguns sulcos transversais mais finos e curtos. Os cientistas fizeram dois tipos de análises. Por um lado, estudaram a composição geoquímica dos mineiras que cobrem a gravura e concluíram que a representação abstracta tinha sido criada antes da deposição desses sedimentos. Por outro, fizeram microfotografias das marcas de ferramenta presentes na gravura e compararam-nas com marcas que reconstuiram experimentalmente com várias ferramentas utilizadas pelos neandertais aplicadas ao mesmo tipo de rocha. E constataram, por exemplo, que as marcas não poderiam nunca ter sido produzidas acidentalmente aquando de actividades da vida quotidiana dos neandertais, tais como cortar a pele de porcos com uma ferramenta de pedra. “As incisões foram produzidas passando, de forma cuidadosa e repetida, uma ferramenta pontiaguda ou uma aresta cortante, sempre na mesma direcção”, escrevem ainda. Os autores estimaram ainda o número de vezes que o artista pré-histórico terá tido de bater na rocha para gravar a totalidade do seu padrão abstracto: no mínimo, 188 a 317, com uma única ferramenta, numa única sessão, mediante “um esforço e um controlo motor consideráveis”.
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Palavras-chave humanos homem espécie
China regista primeiro défice comercial em três anos
Importações superaram as vendas ao exterior em Fevereiro. (...)

China regista primeiro défice comercial em três anos
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.25
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Importações superaram as vendas ao exterior em Fevereiro.
TEXTO: As importações chinesas superaram em Fevereiro as exportações, pela primeira vez em três anos, revelam os dados oficiais publicados nesta quarta-feira. As compras ao exterior aumentaram 38, 1% e as exportações recuaram 1, 3% em comparação com o ano passado, conduzindo a um défice comercial de 9200 milhões de dólares (cerca de 8700 milhões de euros). Alguns analistas citados pela Reuters, atribuem estes resultados ao aumento dos preços das matérias-primas, mas a maioria considera que este défice está relacionado com as celebrações de ano novo, no final de Janeiro, afectando as operações portuárias e levando a que muitas empresas tivessem fechado por uma semana ou mais, abrangendo o início do mês de Fevereiro. Um dos economistas citados pela agência de notícias nota que todos os défices comerciais registados desde 2005 ocorreram no mês das celebrações do novo ano lunar ou nos meses próximos dos festejos. A China conta crescer 6, 5% este ano, objectivo que poderá ser ameaçado pelas medidas proteccionistas, prometidas por Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, um país muito importante para o comércio externo do gigante asiático.
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Étnia Asiático
Após quatro anos de Abenomics, o Japão ainda luta contra a deflação
Economia deu sinais recentes de reanimação. Será este um sinal de que a estratégia do primeiro-ministro Shinzo Abe está a resultar ou apenas mais uma falsa partida da economia nipónica? (...)

Após quatro anos de Abenomics, o Japão ainda luta contra a deflação
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Economia deu sinais recentes de reanimação. Será este um sinal de que a estratégia do primeiro-ministro Shinzo Abe está a resultar ou apenas mais uma falsa partida da economia nipónica?
TEXTO: Na passada quinta-feira, o Japão terminou o dia com um PIB de 499 biliões de ienes. No dia a seguir, acordou com um PIB de 531 biliões. Este aumento repentino de 6, 3% na sua economia coloca o primeiro-ministro Shinzo Abe um pouco mais próximo do seu ambicioso objectivo de fazer do Japão uma economia de 600 biliões de ienes em 2020, mas a verdade é que, por agora, os motivos para festejos ainda não existem. Aquilo que aconteceu não foi mais do que um mero efeito estatístico, provocado pela aplicação de novos padrões das Nações Unidos para o cálculo do PIB. E aquilo que continua a ser real é que, ao fim de quatro anos de mandato, Abe ainda tem de provar que a sua política económica conhecida como Abenomics vai mesmo ser capaz de retirar a economia japonesa de décadas de crescimento lento e de constantes recaídas na deflação. Foi a 26 de Dezembro de 2012 que Shinzo Abe tomou posse e aquilo que o distinguia dos anteriores primeiros-ministros era a sua estratégia ambiciosa e agressiva contra a deflação. A ideia era a de que seria possível pôr a economia a crescer a um ritmo mais elevado e colocar a inflação outra vez em 2% se, em simultâneo, se fosse mais longe do que no passado na política monetária, na política orçamental e nas reformas estruturais. A estratégia produziu resultados rápidos. Com o banco central a baixar as taxas e a criar dinheiro a um ritmo nunca visto, o iene depreciou-se fortemente no mercado. Isso tornou as exportações japonesas mais competitivas, o que em conjunto com um novo esforço de investimento público, colocou a economia a crescer logo nos primeiros trimestres a seguir à implementação da política. O problema é que este entusiasmo inicial não foi suficiente para garantir que, de uma forma sustentável, o Japão abandonasse os comportamentos característicos de uma economia que caiu na deflação. Por exemplo, apesar do crescimento económico mais forte e da subida temporária da inflação, as expectativas em relação ao futuro pouco mudaram e as empresas continuaram a oferecer aumentos salariais muito moderados e os consumidores não correram para as lojas a consumir mais. Para além disso, o aumento do imposto sobre o consumo realizado pelo Governo – com o objectivo de garantir a sustentabilidade futura de uma dívida pública superior a 200% do PIB – provocou uma reacção negativa imediata da economia, que voltou a enfrentar um cenário de estagnação. Perante a ameaça de insucesso da Abenomics, a resposta foi continuar a persistir, adiando novos aumentos do imposto sobre o consumo, introduzindo novas medidas de estímulo monetário e convidando as empresas a aumentarem mais os salários. Agora, diz o governo nipónico e os economistas que defendem a estratégia seguida, a Abenomics pode entrar numa segunda fase, de sucesso mais duradouro. E há de facto alguns sinais de aceleração na economia. No segundo trimestre do ano , o Japão registou um crescimento de 2, 2% em termos anualizados, isto é, se crescesse todo o ano a este ritmo, a variação anual do PIB seria de 2, 2%. Tendo em conta o historial recente do Japão (menos de 1% em média nos últimos 20 anos), este é um resultado excepcionalmente alto. Mas será que é possível que se mantenha?Entre os apoiantes da estratégia de Abe, defende-se que sim, que aquilo que se está a assistir é ao resultado de uma segunda vaga de efeitos positivos da política expansionista do Estado e do banco central. Os mais pessimistas, no entanto, alertam que a aceleração se deveu essencialmente a um bom resultado das exportações, continuando-se a verificar uma preocupante debilidade no consumo das famílias e no investimento empresarial. E assinalam que na frente externa, o Japão pode vir a sair prejudicado por aquilo que pode vir a ser a política bem mais proteccionista da administração Trump, que já colocou por exemplo em causa o acordo comercial assinado entre os Estados Unidos e vários países asiáticos, incluindo o Japão. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Numa coisa todos concordam: o Japão passa agora por um teste decisivo da sua capacidade de vencer definitivamente a deflação. Esta semana, o governador do Banco do Japão, que começa a dar sinais de esgotamento dos seus instrumentos de política monetária, pediu às empresas japonesas que aumentem os seus investimentos, afirmando que a economia está numa fase “crítica” para emergir de décadas de deflação. E Shinzo Abe, para além de ter anunciado outro plano de investimentos, prepara-se para anunciar, através de um relatório assinado por especialistas, quais as reformas estruturais que pretende implementar. Todos estes sucessivos esforços para reanimar o ritmo de crescimento da economia japonesa, sujeita a todas as medidas extraordinárias possíveis nos últimos anos, tanto a nível monetário e orçamental, são a prova da dificuldade que uma economia pode ter para sair da deflação, assim que se deixa cair nesse tipo de armadilha. Um aviso que outras potências, como os Estados Unidos e a zona euro, não devem ignorar.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave consumo
O Maio de 68 à luz da História
As barricadas de Paris são uma paradoxal tradição revolucionária com raízes em séculos passados, mas nem sempre as revoluções conseguem organizar politicamente as ideias que as desencadeiam – e menos ainda triunfar no imediato. (...)

O Maio de 68 à luz da História
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.4
DATA: 2018-05-28 | Jornal Público
SUMÁRIO: As barricadas de Paris são uma paradoxal tradição revolucionária com raízes em séculos passados, mas nem sempre as revoluções conseguem organizar politicamente as ideias que as desencadeiam – e menos ainda triunfar no imediato.
TEXTO: Logo de manhã, os tipógrafos que se tinham visto subitamente desempregados pelo encerramento dos jornais da oposição espalharam-se pelas ruas de Paris como uma mancha de óleo e arrastaram consigo na contestação saturnina trabalhadores de outros ofícios, num crescendo de som e de fúria que abrangia as duas margens do Sena. Receoso pelas consequências deste movimento de massas espontâneo, o Governo mobilizou as suas “forças da ordem”. O avanço da gendarmerie viu-se, porém, dificultado pelas barricadas erguidas pelos cidadãos – com carros atravessados entre os prédios, velhos móveis arremessados das janelas, barricas roladas das caves, pedras arrancadas da calçada. O traçado sinuoso das ruas não permitia o recurso a tiro de canhão, e no que toca a espingardas as caçadeiras dos civis valiam tanto como as carabinas da guarda. No dia seguinte a bandeira dos sublevados flutuava já na Notre Dame e no Hôtel de Ville. Na batalha que se seguiu, travada com balas sincronizadas por descargas e arremesso de telhas de ardósia e pedras de basalto, triunfariam os insurrectos. Maio de 1968? De forma nenhuma: Julho de 1830. A História da França, e especialmente a de Paris, está cheia de revoluções politicamente triunfantes – o que não foi propriamente o caso da grande movimentação de massas de que se assinalam agora os 50 anos. Já lá iremos. Em 1830, quem fizesse o balanço dos anos mais recentes verificaria que o último rei Bourbon, Carlos X, e o seu antecessor Luís XVIII tinham reinado com toda a arrogância que lhes permitiam uma carta constitucional e um Parlamento de algum modo inovadores enquanto instituições, mas manifestamente insuficientes para satisfazer as aspirações populares e das próprias classes intermédias entre elas e os barões de chapéu alto. Em regime eleitoral censitário, numa população de cerca de 35 milhões de pessoas só uns escassos milhares de indivíduos do sexo masculino tinham o privilégio de poder ir depor o voto na urna. A Monarquia de Julho, fundada na revolução acima referida, cumpriria na sequência a tarefa de alfabetizar as massas ao tornar obrigatória a existência de escolas primárias em todas as aldeias, ao mesmo tempo que facilitaria os contactos comerciais e as trocas de ideias ao promover a reparação dos caminhos vicinais e – sobretudo – a construção das grandes linhas férreas radiais de Paris. Talvez por isso, talvez por o novo regime que recuperara a bandeira tricolor ter aberto os olhos e os caminhos às pessoas, apenas 18 anos depois dessas tanto físicas como emocionalmente tórridas jornadas de Julho em que a paralisante restauração bourbónica que se seguira ao derrube de Napoleão tinha dado lugar ao Governo do rei burguês Luís Filipe, o descontentamento voltaria a explodir em nova revolução civil e espontânea. Nos banquetes públicos promovidos pelos partidos anti-situacionistas eram angariados fundos e faziam-se inflamados discursos de propaganda em prol da reforma eleitoral e parlamentar que se afigurava necessária. A estas movimentações, o rei de cartola e o seu Governo de casaca respondiam que não haveria em França mais de 180 mil pessoas capazes de exercer o poder político, uma daquelas fórmulas que, verdadeiras ou não no momento em que são formuladas, justificam aos olhos das autoridades do momento todas as estagnações sociais por elas pretendidas. Um desses banquetes da oposição, unindo socialistas e católicos, convocado numa gélida e chuvosa manhã de Fevereiro de 1848, seria proibido pelas autoridades. Tal como em 1830, não tardou que se erguessem barricadas entre os estaminets e as boulangeries, que os combates alastrassem pelas ruas e que os sublevados triunfassem, implantando, desta vez sob a poalha da neve, uma efémera II República destinada a não durar mais que quatro anos. Ao fim de três, um sobrinho de Napoleão, Louis Bonaparte, que se fizera eleger Presidente, desencadeava um golpe de Estado e impunha uma ditadura pessoal, que culminaria na sua proclamação como imperador. Dando razão aos que afirmam que os lances da História ocorrem da primeira vez como dramas e mais tarde se repetem como farsas, o II Império revelar-se-ia uma construção operática durante a qual a França se viu claramente ultrapassada nos rankings económicos da época pela Inglaterra vitoriana e pela Alemanha em construção sob a batuta de Bismarck. Por este tempo, já os teóricos de um socialismo anterior ao marxismo – como Saint-Simon, Louis-Auguste Blanqui ou Louis Blanc – clamavam num deserto de ironias e chistes, esforçando-se por desfraldar ao vento da compreensão pública o estandarte de uma sociedade economicamente mais justa, já que se a Grande Revolução de 1789 promovera a liberdade e a igualdade política, ao mesmo tempo extinguira as velhas corporações de mestres e aprendizes, deixando, assim, os operários mais frágeis e indefesos. Mas não haveria mais barricadas fáceis de defender como as de 1830 e 1848, nem mais marchas triunfantes e a peito aberto como a que culminara na tomada da Bastilha em 14 de Julho de 1789, pois foi nesse tempo que o barão Haussman, prefeito do Sena, rasgou, com o aplauso de Napoleão III, a vasta rede de boulevards que domina até hoje a paisagem urbana de Paris. Assim, quando o II Império se desmoronou fragorosamente nas cinzas da derrota francesa na guerra contra a Prússia, o povo de Paris, fundador de uma algo utópica e sempre referencial comuna, viu o seu ofício revolucionário seriamente dificultado pelas regras do urbanismo aplicadas à política. Em 1870, os esfomeados descendentes dos revolucionários de 1789, 1830 e 1848 resistiram ao cerco alemão alimentando-se de tradição combativa, de ratos dos esgotos e do vinho dos inexauríveis tonéis das caves, mas a desproporção de forças tornou-se patente quando as também eternas forças da ordem os atacaram e massacraram. A III República então inaugurada pela burguesia vencedora duraria sete décadas, até à invasão hitleriana de 1940. Décadas de querelas políticas internas, de guerra internacional, de conflitos sociais, de amanhãs que prometiam cantar, de reacção do pensamento económico e filosófico. Paris assistiria a novos combates de rua por altura do levantamento popular contra o domínio nazi, em 1944, conduzindo à libertação da cidade antes ainda da chegada das tropas aliadas, mas só 24 anos depois o vento do idealismo puro voltaria a soprar nos boulevards abertos por Haussman. Foi em Maio de 1868, quando uma alterosa vaga de contestação estudantil reacendeu a chama das antigas lutas. Mas estaria esta onda na mesma onda das suas antepassadas?Em boa verdade, a contestação juvenil da década de 1960 começara uns três anos antes de Maio de 1968 e falava inglês com sotaque americano. Os campi de algumas das principais universidades da fatia de continente que vai do Atlântico ao Pacífico vinham sendo, a partir de 1965, cenário de coloridos protestos contra a mobilização da juventude para combater na guerra do Vietname. Uma vaga contestação política enxertava-se nas raízes da beat generation de há uma dúzia de anos, os livros de Allen Ginsberg e Jack Kerouac renasciam para uma segunda vida e a esfumada neblina do movimento hippie anunciava um presente com amor e sem guerra plasmado num futuro tão eterno como devem, rigorosamente, ser todos os futuros. Não obstante a carga ideológica que se pretendia dar à Guerra Fria, acabara o tempo das campanhas patrióticas coreografadas com os acordes do Star Spangled Banner e encenadas sob o drapejar das stars and stripes. Milton Canniff, o velho, talentoso e patriótico autor de comics, nunca enviou Steve Canyon em missão aos países de Ngo Dinh Diem e Ho Chi Minh. Em contrapartida, Jane Fonda não tardaria a eletrizar a juventude dos colleges ao deslocar-se a Hanói e sentar-se no banquinho de uma peça de artilharia antiaérea norte-vietnamita, das mesmas que abatiam aviões da USAF com jovens americanos dentro. Mais tarde retractar-se-ia, mas os bélicos anos 60, durante os quais se popularizou o símbolo da paz de Bertrand Russell, não eram tempo em que houvesse tempo para respirar. Os velhos ódios fabricados ao jap, ao bear e ao chink das guerras do Pacífico e da Coreia era substituído pelo ódio espontâneo à Administração de Washington, proliferando os sit-ins de rejeição nos relvados da capital federal. A contestação interna à intervenção da América nos assuntos do Sueste Asiático depressa ultrapassou as fronteiras e voou sobre os mares. Na Alemanha encontrou um eco muito profundo. Passados 20 anos sobre o fim da II Guerra Mundial, um pacifismo talvez genuíno apoderara-se das mentalidades dos jovens, que ao mesmo tempo iam buscar ao fundo das arcas a velha mensagem do seu compatriota marxismo, ali guardada durante tantas décadas. Tal como na América e depois em França, confrontos com a polícia e mortes na rua pontuaram as discórdias, e o choque entre essa duas vagas entidades que se chamam contestação e ordem vigente foram o pano de fundo do grande teatro da segunda metade de uma década que permanece na memória colectiva como o tempo da contestação. O Maio de 68 francês seria o corolário dessa situação de confronto. Quando, na noite de dia 3, uma coorte policial uniformizada de couro e armada de longos bastões e enormes escudos prendeu meio milhar de estudantes que se manifestavam na Sorbonne, principiava, sem que ninguém ainda o suspeitasse, uma relativamente curta guerra civil que agitaria o hexágono e permaneceria até hoje, dentro e fora dos seus limites, como o símbolo de uma época. Guerra civil implica, porém, necessariamente, a existência de vencedores e vencidos, e o problema, neste caso, é não se saber quem ganhou nem quem perdeu. A aliança conjuntural, ou coexistência no tempo, de uma luta estudantil e de uma luta operária (esta, aliás, decorrente da primeira e não controlada pelos sindicatos) imprimiu um caráter muito próprio a uma “guerra de trincheiras” que viria a terminar de forma tão surpreendente e inesperada como a Grande Guerra propriamente dita – de súbito, num ai, com íntimas satisfações, mútuas recriminações, lágrimas de luto e de alegria. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. A direita “bem-pensante”, essa maioria silenciosa que o poder frequentemente invoca para legitimar as suas opções (e que, como expressão, fora cunhada nos EUA pela Administração Nixon para designar os que concordariam de boca calada com o envolvimento bélico na Indochina) ganharia, pela força do número, a “batalha” das ruas no dia 30, quando uma gigantesca manifestação de apoio a De Gaulle desceu os Campos Elísios e o general-Presidente convocou eleições legislativas antecipadas. Destas sairia um reforço do poder gaullista e a derrota clamorosa dos partidos Socialista e Comunista. A burguesia – para retomar, como já atrás se fez, uma palavra agora caída em desuso – teme sempre os movimentos bruscos, as vagas de fundo, os terramotos da História. E então quando se trata da burguesia francesa, esse sentimento é ainda mais forte. Escolarizada, ela não pode ignorar o que passou no seu país, na sua capital, em 1789, 1830, 1848 e 1871. A História é uma velhota que passa a vida a contar a mesma coisa, embora não necessariamente pelas mesmas palavras. Essas outras revoluções, enroscadas lá para trás no passado brumoso, triunfaram porque serviram a tal maioria silenciosa cujo silêncio é frequentemente feito de gritos. Eram revoluções uterinas, dores de parto, camadas sucessivas no palimpsesto do longo choque entre classes e interesses. Em Maio de 1968, porém, o modelo de sociedade parecia definido e só a utopia falava alto. Os estudantes, e depois os operários, não apresentaram uma alternativa sólida à forma de estruturar o tecido social. A poesia ganhou nas ruas, mas perdeu nas urnas por cansaço, insónia e falta de programa. Ninguém se pode alimentar apenas de açúcar. O Maio de 68 não foi uma revolução política – foi uma violenta explosão de lirismo, montra e bandeira de uma viragem de mentalidades importada de outras latitudes, em última análise o início da consagração da sociedade dita permissiva.
REFERÊNCIAS:
Entidades EUA
Aires Mateus: "O vazio é o centro da arquitectura"
A nova sede da EDP em Lisboa, que será oficialmente inaugurada para o ano, desenha-se a partir da sombra. Fizemos uma visita com o arquitecto Manuel Aires Mateus, num ano em que a sua obra no estrangeiro se consolida. (...)

Aires Mateus: "O vazio é o centro da arquitectura"
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento -0.17
DATA: 2018-07-20 | Jornal Público
SUMÁRIO: A nova sede da EDP em Lisboa, que será oficialmente inaugurada para o ano, desenha-se a partir da sombra. Fizemos uma visita com o arquitecto Manuel Aires Mateus, num ano em que a sua obra no estrangeiro se consolida.
TEXTO: Estamos no Boqueirão dos Ferreiros, na Rua D. Luís I, a olhar para nova sede da EDP. Na zona ribeirinha, a toponímia de Lisboa ainda guarda a memória destes antigos canais de água que entravam por Lisboa dentro. Com a sua geometria precisa, é como se os boqueirões se tivessem levantado e transformado em lâminas para construir as torres do novo edifício da EDP. Há esse gesto fundador, explica o arquitecto Manuel Aires Mateus, que saiu da relação da morfologia da cidade com o rio. Mas a procura de transparência continuou como uma das ideias principais deste projecto que começou a ser desenhado em 2008. Depois, é como se uma só linha ganhasse vida e conseguisse, de uma forma obsessiva, desenhar todo o edifício. Subisse até ao cimo para proteger a cobertura, descesse para sombrear a praça, voltasse a subir, mais fina ou mais grossa. Algumas semanas depois da visita à sede, encontramo-nos no atelier de Manuel Aires Marteus, em Campo de Ourique, numa semana cheia de entrevistas por causa do concurso internacional que acabou de ganhar como o seu irmão Francisco para a construção de dois museus em Lausanne, na Suíça, onde competiram com vinte equipas, entre os quais três prémios Pritzker. É mais uma etapa na afirmação e internacionalização do atelier Aires Mateus, que ora trabalham juntos, ora trabalham separados, mas na maior parte dos trabalhos grandes optam por uma assinatura conjunta. “Nós representamos na arquitectura aquilo que é arquitectónico, não representamos coisas que são literárias, ou imagéticas”, responde quando lhe perguntamos pelo sorriso que a imprensa suíça viu, literalmente, no seu projecto. Já usarem a imagem de uma casa para indicar o lugar da entrada num edifício, como fizeram na Faculdade de Arquitectura de Tournai, na Bélgica, outro concurso que ganharam nos últimos anos, é possível. “Estamos a usar o preconceito que cada um de nós tem, entendido como a cultura de cada um de nós, ao serviço da ampliação da própria ideia. ” Pode ser também uma loggia, coisa mais erudita, como fizeram na sede da EDP. Mas quando "falamos de arquitectura falamos de vida, não estamos a falar de imagem". O espaço, o vazio, é o centro da arquitectura, e o vazio é também aquilo que espera pela vida. Essa liberdade de manipular os programas com uma grande calma foi uma coisa que aprendemos nas casas e passámos a estender a outros projectos. Estamos interessados em compreender um programa com uma visão mais larga, mais distanteO edifício da EDP, que é uma obra importante na cidade, surge com uma aparência muito diferente conforme o sítio de onde o vemos. Um pouco imaterial, quase difuso, visto da Ponte 25 de Abril; mais monumental, representativo, quando passamos de carro na avenida 24 de Julho; numa escala mais doméstica, com a vivência da praça, na rua D. Luís; ou ainda como duas simples torres na vista do miradouro de Santa Catarina. O que é que foi mais determinante?O edifício pode ler-se a várias escalas, mas procura sempre ser claro na relação com a cidade. Queríamos desenhar uma forma clara, mas sempre imaginámos que o edifício devia variar no movimento. À medida que circulamos vamos vendo vários edifícios. [O edifício] move-se connosco. Começa numa localização material mas apoia-se também numa materialidade histórica. Não é uma materialidade só deste lugar ou só deste tempo. Ela parte da implantação dos boqueirões, perpendiculares ao rio, apoia-se nesta ideia, muito táctil, de transparência na relação da cidade com o rio. Do rio vinha sempre tudo, vinha o sustento, vinha o perigo, vinham os barcos. Essa transparência vê-se muito claramente no Bairro Alto, é muito óbvia na Lisboa pombalina. De alguma maneira vem atravessando a cidade e chega à nossa legislação, ao ponto de em Lisboa haver legislação contra edifícios paralelos ao rio, que cubram a frente de rio. Portanto, há uma ideia cultural na cidade de ligação entre território e a sua origem. O rio é a origem da cidade, e essa ligação é sempre muito importante. O mais determinante foi essa experiência a partir do rio? O edifício desenha-se na relação da morfologia da cidade com o rio. Isso é o primeiro gesto fundador. Quando se constrói um edifício desta escala numa frente de rio, se ele fosse desenhado de uma outra forma teria um impacto negativo para a cidade. Ele parte exactamente de uma necessidade de subtileza na relação entre a cidade e o rio. A cidade não pode perder camadas de leitura, quer na escala do rio para a cidade, quer na da cidade para o rio. Quando olha para a margem do rio, e não estamos a falar do edifício da EDP, vê essa generosidade a pensar a cidade. Ou colocando a pergunta de outra maneira: tem havido oportunidades para pensar a cidade na sua relação com o rio? Não houve muitas e reagimos negativamente às que foram feitas. Aqueles edifícios do Ministério da Educação, que são aquela grande frente na Avenida 24 de Julho, constituem exactamente uma espécie de apagar de uma relação muito delicada que a cidade sempre teve com o rio. O problema em relação a outras épocas históricas, em que íamos construindo e somando níveis de leitura, é que hoje construimos a uma escala brutal. Por isso, qualquer intervenção pode fazer perigar essas relações mais delicadas. Felizmente, ainda não houve muitas intervenções de grande escala na borda de água. Nós fazemos aquelas palas, que, no fundo, são estrutura, são infra-estrutura, são protecção e são, no fim, o desenho, a imagem do edifício. Desenhamo-las partindo de um grau de necessidade de sombraO que estamos a fazer é um grande edifício mas não é uma catedral, não tem esse sentido. É um edifício que continua a cidade, que se abre numa praça para uso do peão. O edifício em várias escalas procura uma espécie de ligeireza. Procura a grande transparência à escala cidade-rio; levanta-se do chão naqueles dois lados da praça. Com um ponto de partida funcional procura ligeireza na sua materialidade. Qual é o significado de um edifício como a sede da EDP? Não é uma catedral mas tem uma relevância simbólica, qual é o seu significado?Desde o princípio que sabemos que estamos a fazer um edifício que tem uma natural necessidade de representação na cidade. Assumimos que o edifício tinha que aprisionar a cidade de alguma maneira. O edifício é de uma grande transparência mas também sabemos que gera um campo de forças numa escala maior — o enorme volume de ar que contém dentro. É evidente que oferece à cidade a primeira praça sombreada, ao mesmo tempo que passa a ser parte da cidade. Há uma troca aqui, entre ideia de representação e ideia de generosidade. Uma das coisas de que gosto no edifício é que nunca se falou na necessidade de descrever a sua função. O edifício descreve-se a si próprio como lugar da cidade. Parece dizer “apesar da minha importância sou parte da cidade e não uma excepção”. O que é que vos foi pedido que o edifício veiculasse em termos de mensagem ambiental e como é que trabalharam isso, sendo a EDP uma empresa do sector da energia?A EDP queria um edifício que tivesse todas as performances energéticas, todos os certificados. Há uma lado didático e simbólico muito interessante em relação à energia e que nos foi pedido desde o princípio. É um edifício que naturalmente investiu nessa performance. Isso é invisível, basicamente. Além disso, houve alguma necessidade quer do cliente quer vossa de figurarem (ou não) essa ligação?Quando abriu este concurso não havia muitas regras. Porquê? Como era uma zona sujeita a um plano de pormenor, podíamos desenhar as próprias regras e inserir o projecto a partir daí. A EDP falava obviamente em empresa, em representação, mas também falava em transparência como uma ideia de actuação e de eficácia. Percebemos duas coisas desde o princípio e que têm a ver com a necessidade de transparência entre a encosta e o rio, os grandes espaços teriam sempre que estar enterrados. Os grande foyers, os auditórios, as grandes salas de reunião estavam da cota térrea para baixo. Depois, também é evidente que estamos a desenhar um edifício de escritórios, que tem que poder mudar e variar programaticamente de uma forma muito clara. Isto obriga-nos a desenhar um sistema e não um edifício que tem um programa finito. Um sistema para ter toda a sua flexibilidade obriga a ter muito vidro — a modelação de um escritório é uma janela de 1, 2 metros em 1, 2 metros. Mas, em Portugal, essa transparência significa a necessidade de um sistema de protecção do vidro. O desenho do edifício é o desenho da sombra do edifício. Nós fazemos aquelas palas, que, no fundo, são estrutura, são infra-estrutura, são protecção e são, no fim, o desenho, a imagem do edifício. Desenhamo-las partindo de um grau de necessidade de sombra: o duplo pé direito tem uma pala maior; quando há um terraço atrás há uma pala menor; ou em baixo as palas são um pouco mais pequenas, porque as zonas estão permanentemente em sombra. Depois o resto compõe-se como um desenho. O edifício é uma estrutura em aço e vidro revestido com os elementos em betão que trabalham a sombra. Porque é que os sombreadores se tornaram uma ideia tão importante de projecto? Mesmo quando se abrem os terraços, as loggias, os sombreadores continuam presentes. É quase uma ideia de perturbar o sistema com as variações sucessivas que o elemento sombra apresenta. Concorda com isso?É curioso porque é uma regra de tal maneira rígida que dizemos que uma só linha sobe, protege a cobertura, desce, sombreia a praça, volta a subir. . . Este elemento acaba por fazer tudo e depois confronta-se com as suas próprias limitações. Por exemplo, como é que se entra? Isso acaba por ir gerando as variações e os pontos de interesse, de excepção. Começamos com uma coisa quase funcional mas é evidente que de funcional transforma-se numa ideia poética em relação à imagem do edifício. Na EDP, é especialmente original que nos espaços interiores os mesmos temas estejam presentes. Esta ideia que fala com a cidade também fala com quem está a trabalhar. Isso é muito claro para nós. Quando falamos de arquitectura falamos de vida, não estamos a falar de imagem. E a vida para nós tem a ver com essa ideia de uma grande transparência, que significa uma identidade para a vivência do próprio edifício. Não há uma imagem que nós habitamos. Não há nenhuma vantagem em se estar bem no meio de uma classe que está mal. A nossa condição como arquitectos não se altera connosco sozinhos, tem que se alterar colectivamenteOs últimos anos têm sido pródigos na ideia imagética, porque a arquitectura se desloca da sua base fundamental e se agarra a outra relação do tempo com a cidade. São estratégias que vêm de uma relação com mundos distantes do nosso, quer historicamente do americano, quer mais recentemente dos mundos asiáticos. Obviamente, a ideia é não ter uma base e criar identidades muito fortes para com elas ir estabelecendo uma nova identidade para os lugares. Na cidade europeia, os arquitectos terão que ter o cuidado de preservar a nossa herança. Não podemos entrar na competição da imagem e temos que compreender que nexos de continuidade podemos estabelecer. Nós não estamos a criar novo, isto é uma coisa muito importante. As pessoas já mudaram para o edifício, como é que elas descrevem essa vivência?A vivência no edifício foi exactamente aquilo que gostaríamos. Por exemplo, o uso intensivo dos terraços e das zonas informais. Vinha de reflexões que tínhamos feito para outros projectos. Apesar de sermos muitos a trabalhar, interessa-nos a ideia de cada pessoa ser uma. Todas as pessoas têm acesso aos terraços?Todas as pessoas têm acesso aos terraços. É evidente que há ali uns terraços mais representativos, os da presidência. Mas o espírito do terraço é exactamente a zona de valorização do próprio colaborador da EDP. Hoje em dia toda a gente trabalha com computadores portáteis, por isso podem agarrar no seu e ir trabalhar para o terraço. O impacto sobre a vista do miradouro de Santa Catarina tem sido o aspecto mais polémico? Imaginamos que isso tenha sido uma preocupação, como é que trabalharam a questão?Desde o princípio foi uma das representações obrigatórias da cidade: o que se vê do miradouro de Santa Catarina. Se olharmos hoje para o miradouro, o maior impacto é dado por um velho edifício da EDP, que vai ser demolido de acordo com o plano e que bloqueia a vista entre as duas torres. Não são tanto as torres, que têm um impacto bastante arrumado. Vai mesmo ser demolido?Vai. O resultado no miradouro de Santa Catarina está entre o desejo e a verdadeira transparência. Visto de Santa Catarina há um efeito inesperado, que é a visível falta de qualidade dos edifícios de escritórios que estão à volta. O que é a qualidade na arquitectura da cidade? Cada vez que se constrói um edifício novo parecem existir polémicas. E bem. Não acho que as polémicas em torno da arquitectura sejam erradas. Tenderemos sempre a uma cada vez maior participação da população na arquitectura da cidade. É evidente que não podemos cair nos exageros da utilização dessa discussão em prol de posições que não têm a ver com o caso, nomeadamente políticas. A cidade tem que ter este corpo de crítica. A cidade tem assistido à sobreposição de elementos não muito qualificados. Substitui-os sempre por elementos piores. Por isso a reacção do “é novo, vai piorar” acho que é natural. É que a arquitectura tem um problema como actividade, espelha exactamente aquilo que é. Quando a cidade se apresenta sem qualidade, sem ambição, o resultado acaba por ser muito evidente. Penso que isso parte muitas vezes da falta de qualidade da própria ideia de promoção, quer pública, quer privada. Por que é que em Lisboa não temos a tradição da afirmação da qualidade da arquitectura através das sedes das empresas, pegando nessa ideia de falta de ambição? A EDP pode ser um exemplo?Penso que sim. Estamos num momento em que culturalmente começamos a perceber este facto. As grandes empresas estão hoje a fazer a sua representação física de uma forma muito clara. Em Portugal, se calhar é aquilo que estávamos a falar há pouco, é a incompreensão sobre o papel da arquitectura. A arquitectura também tem que responder a esse papel, à necessidade de representação de todos os sectores da sociedade. Está garantido que a praça vai ser um lugar público?Sim, é claramente para ganhar uma dimensão pública. Aliás, abrirá lá um restaurante, há uma loja EDP, um pequeno comércio de apoio. Tal como no projecto da Mesquita de Bordéus, esta praça também se constrói com parte do edifício que se levanta do chão. O que é que esteve na base da configuração das entradas da praça?A marcação vertical entre os apoios é 1, 20 metros. Decidimos desde o princípio que não entraríamos no edifício à escala do edifício mas da cidade, do desenho. É quase uma coisa orgânica que se levanta. Sim, levantamos de um lado, e na diagonal, levantamos do outro. Essas elevações ligam o piso térreo ao piso 1 de um lado e doutro. Mais do que tudo é para deixar entrar a cidade através da escala da praça. Uma coisa que temos em muitos projectos é facilitar a maneira como uma pessoa entra psicologicamente num edifício. Ali continuamos o espaço público mas uma vez debaixo da praça está-se no domínio da EDP. Torna-se fluído entrar na EDP. É essa ideia de gradação, a pessoa não tem propriamente uma porta, não há um fora e um dentro. Isso parece ser um novo filão do vosso trabalho, a ideia de trabalhar entre espessuras. Em trabalhos mais antigos a ideia da espessura aparecia como uma homenagem à parede, à profundidade. Agora em trabalhos como a mesquita ou os museus em Lausanne, há uma ideia de espaço entre espessuras. É exactamente o que estava a descrever, nem dentro nem fora. Essa é uma ideia que alimenta o vosso trabalho neste momento?Interessa-nos muito, e isso é uma coisa que debatemos há muito tempo, esta maneira como os edifícios podem ir procurar a cidade e de que forma a cidade se prolonga nos próprios edifícios. A primeira vez que tivemos uma discussão muito clara sobre isto foi no projecto para o centro de artes de Sines. Na EDP há uma ideia de representação mas também há uma ideia muito clara de chamar as pessoas para dentro do edifício. Mas voltando atrás ainda é a espessura ou substituiria por outro termo ou conceito?Quando falávamos de espessura falávamos sempre da ideia de espaço como central. Porquê? Diziamos que um espaço é definido pelo seu limite. Nós desenhamos o limite não para o desenhar como espessura, como estética, mas para desenhar a centralidade que é o espaço. Nós hoje fazemos o mesmo, nestes dois casos, de Bordéus e de Lausanne, é muito evidente que há ali um similitude, não geométrica porque são muito diferentes, mas do ponto de partida, da tensão entre dois elementos para gerar o espaço central. Mas estamos se calhar a desenhar o mesmo, a criar limites que nos permitem colocar o espaço no centro do problema. Daí também essa ideia da monomaterialidade do espaço, um pouco para que estes sejam claramente definidos. O vazio ou o espaço é o centro da arquitectura, mas o vazio é também aquilo que espera pela vida. Numa entrevista recente à RTP disse que a imprensa suíça tinha visto um sorriso nessa fenda. Qual é a vossa relação com a figuração?São coisas muito diferentes. Na RTP disse que a imprensa suíça viu um sorriso, nunca me ocorreria ver um sorriso. Mas citou-o. . . Não criamos esse tipo de imagens que não são arquitectónicas, mas elas existem, resultam, podem ser vistas. E naturalmente a imprensa também tem o seu papel, de mediação com o público. Para nós é muito importante que um resultado como esse possa facilitar essa mediação. Foi muito simpático a primeira página de um jornal em Lausanne dizer: "um sorriso para Lausanne". Na faculdade de arquitectura em Tournai, na Bélgica, o que estamos a usar são linguagens que apelam a vocabulários comuns. Estamos a usar o preconceito que cada um de nós tem, entendido como a cultura de cada um, ao serviço da ampliação da própria ideia. O Ferran Adrià falou muito bem disto: dizia que cozinhava com o sabor que as pessoas iam sentir na boca mas também sabendo o parti pris que tinham quando olhavam para cada uma das coisas. Esse parti pris e o sabor real é que ampliavam as possibilidades de sabor. Nós muitas vezes usamos coisas que são arquetipais, que pertencem a um vocabulário de alguma maneira muito comum, ou coisas populares, como a casa, a porta, mas também coisas eruditas, como o frontão, a loggia, que podem ser revistas ampliando a percepção de pertença e de beleza daquilo que se está a ver. Ali o que é evidente que está representado é a casa. Nós representamos na arquitectura aquilo que é arquitectónico, não representamos coisas que são literárias, ou imagéticas. Voltando a Lausanne acha que podemos sintetizar o edifício como dois museus que se empilham um em cima do outro?A sobreposição é um resultado e não um ponto de partida do projecto. Partimos de um sítio real, de um sítio ideal, que é a sua pré-figuração no futuro, mas não quisemos reduzir aquilo a 1+1 museu e decidimos que o centro do projecto era a tensão entre os dois museus. Depois, claramente um deles necessitava de luz natural, o de design, e um não podia ter luz natural. Essas condições acabaram por os empilhar. Está a arriscar mais agora no seu trabalho com o programa dos museus de Lausanne?A manipulação do programa é aquilo em que o projecto é mais forte. Temos cada vez mais claro que trabalhamos na pergunta. Há perguntas em que o cerne é o lugar, outras o programa, outras ainda uma combinação de tudo. Também decidimos desde o princípio que faríamos um programa muito encaixado na terra. O primeiro edifício que é construído tem uma grande interferência com os habitantes e o nosso devia ter uma muito pequena. Mas na verdade é depois o programa que é central. Começamos por fazer projectos grandes e complexos, apanhámos aquele boom da Europa. Depois com a crise, que foi muito útil para nós, voltámos a fazer só casas, que têm uma coisa maravilhosa: um programa muito forte, que todos conhecemos muito bem, mas muito manipulável. Essa liberdade de manipular os programas com uma grande calma foi em certa medida uma coisa que aprendemos nas casas e passámos a querer estender a outros projectos. De facto, estamos muito interessados em compreender um programa com uma visão mais larga, mais distante. Qual é a expectativa em relação à qualidade construtiva suíça?É muito alta. Conhecemos bem a ambição, é muito exigente, e lá há muitos meios. Qual é o valor por metro quadrado e qual é a diferença em trabalhar assim?Mais de seis mil euros por metro quadrado. Em Portugal estamos habituados a trabalhar com mil. A EDP talvez seja 1500. Mas na Suíça são preços realistas, tal como o prazo. O Rem Koolhaas falava nisso, quando lhe deram a Casa da Música e a Biblioteca de Seattle. Deram-lhe um orçamento realista mas apertado em Seattle, que teve que cumprir, deram-lhe um completamente irrealista na Casa da Música e fez o que quis. Como é que vivem neste momento os ateliers portugueses, como é que vive o seu atelier? Há uma retoma da construção?Se estamos a falar de qualidade estão muito bem, se estamos a falar de trabalho continuam com dificuldades. O trabalho perdeu muito valor, dada a crise, e essa realidade tem que ser invertida. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Mas no caso do atelier Aires Mateus podemos falar de um contraciclo?Quando começou a crise amarrámo-nos todos uns aos outros no atelier. Fomos todos para o quadro, porque é uma loucura as pessoas trabalharem na incerteza. Era melhor explodirmos todos juntos, que era o que pensávamos que ia acontecer. Nunca me lamentei. Neste últimos tempos, independentemente das encomendas internacionais, começou a haver para nós algum trabalho. Não é um trabalho que se divide por todos, que tenha um valor democrático, essa concentração do trabalho é outro tipo de sinal de crise. Mas há uma retoma?Não havia uma grua na cidade e agora há muitas. Retoma há, mas é complicado dizer que é verdadeira para os arquitectos. É crucial que a sociedade a vários níveis perceba o valor do trabalho e a necessidade de oferecer condições para que esse trabalho seja bem desenvolvido. As pessoas continuam muito aflitas. Não há nenhuma vantagem em se estar bem no meio de uma classe que está mal. A nossa condição como arquitectos não se altera connosco sozinhos, tem que se alterar colectivamente. Nova sede da EDP: a síntese de um enigma
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave cultura campo concentração educação espécie doméstica corpo
Uma comédia pessoal
Master of None regressa ao Netflix para uma segunda temporada. (...)

Uma comédia pessoal
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-09-18 | Jornal Público
SUMÁRIO: Master of None regressa ao Netflix para uma segunda temporada.
TEXTO: Há sempre qualquer coisa de pessoal nas séries de comédia que são da autoria dos seus protagonistas. Seinfeld, a comédia sobre nada, tinha qualquer coisa da vida de Jerry Seinfeld (e de Larry David, que iria mostrar as suas manias em Curb your Enthusiasm), Louie é Louis C. K. em todo o seu esplendor neurótico, Atlanta é um retrato semiautobiográfico de Donald Glover. Aziz Ansari foi um pouco mais longe em Master of None, a comédia do Netflix cuja segunda temporada de dez episódios estará disponível no serviço de streaming a partir de 12 de Maio. Aquele actor frustrado é ele próprio com um nome diferente (Dev). Ansari é um actor norte-americano, nascido nos EUA, de origem indiana, e muito do que tem sido a sua carreira na comédia incorpora a sua herança asiática, desde Parks and Recreation (um empregado municipal) aos vários espectáculos de stand up (também disponíveis no Netflix). Master of None é sobre um actor trintão a tentar sobreviver em Nova Iorque, entre uma sucessão de desastres amorosos, o que quase se pode considerar um subgénero televisivo, mas Ansari dá-lhe o tal toque pessoal. Ele é um actor que tem de lidar com a falta de papéis decentes para indianos, reduzidos nesta industria a estereótipos. (Ansari faz uma inversão do que costuma ser habitual, tem na série um amigo branco “tipo”). Master of None reflecte também muito dos gostos pessoais de Ansari, música (dos 1980s de Human League ao indie rock dos Beach House) e comida – é o desejo de aprender a cozinhar pasta que muda a acção de Nova Iorque para Itália na segunda temporada, algo que o próprio actor também fez. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. O que Ansari fez resultou. Foi um sucesso de público, de crítica e ganhou muitos prémios, entre eles o Emmy para melhor série de comédia em 2016 – Ansari estava triplamente nomeado, como actor, realizador e argumentista. Para dar um toque ainda mais pessoal, Ansari escolheu os próprios pais, que nasceram na Índia e não são actores profissionais, para desempenharem os mesmos papéis na série – na vida real o pai é gastroenterologista, a mãe trabalha num consultório. Foi pelos seus pais muçulmanos que escreveu um artigo de opinião no New York Times em Junho de 2016 sobre o então candidato presidencial Donald Trump. "Por causa de Trump e de outros como ele a cuspirem o discurso do ódio, a descriminação está a atingir outros níveis. É visceral e assustador [. . . ]. Tenho medo pela minha família. Isto não faz sentido nenhum. "
REFERÊNCIAS:
Entidades EUA
Nepal: A aldeia onde só chegou a ajuda de dois portugueses
Com o grosso das operações de resgate concentradas no Vale de Katmandu, Phaskot, tal como a maioria das localidades rurais no Nepal, estava entregue a si própria. Lara e Marco ficaram para ajudar os irmãos Rikesh e Anil. (...)

Nepal: A aldeia onde só chegou a ajuda de dois portugueses
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Com o grosso das operações de resgate concentradas no Vale de Katmandu, Phaskot, tal como a maioria das localidades rurais no Nepal, estava entregue a si própria. Lara e Marco ficaram para ajudar os irmãos Rikesh e Anil.
TEXTO: Dia 25 de Abril. Por volta do meio-dia, Lara Nogueira e Marco Nunes almoçam nas imediações do lago Phewa, uma das zonas turísticas mais populares de Pokhara, a segunda cidade do Nepal, quando o chão começa a tremer. Estão ambos em terreno descoberto e os únicos edifícios em volta eram cabanas de palha. Ao início nem se apercebem muito bem do que se havia passado. No Nepal, os terramotos são frequentes. Mas os habitantes locais percebem que o sismo que se sentira não era um tremor habitual. O epicentro aconteceu em Ghorka, a meio do caminho entre aquela cidade e Katmandu, sensivelmente 80 quilómetros de parte a parte. Pokhara escapa praticamente ilesa, tal como Lara e Marco. “Começámos a ver que os locais estavam assustadíssimos, de olhos arregalados e com as crianças ao colo”, explica Lara à Revista 2, por telefone. “Nessa altura os turistas estavam mais calmos do que os próprios nepaleses. Depois percebemos o porquê. Eles não sentiam um sismo tão grande há 80 anos. Os mais velhos eram crianças, nem se lembram. Ou seja, das pessoas de lá, nunca ninguém tinha vivido um terramoto daquela dimensão. Nos dias que se seguiram vieram dormir para a rua. Estavam cheios de medo. ”A história de Lara e Marco começa em Portugal, a 8500 quilómetros de distância. Marco terminava o mestrado em Ciências Cognitivas e Lara, arquitecta paisagista, acabara há dois anos o mestrado em Engenharia Agronónima. Lara trabalhava num projecto de reabilitação social no hospital Júlio de Matos, o Tiliascoop, e Marco na Biovilla, uma cooperativa de turismo e agricultura sustentáveis. Mas, de resto, as perspectivas de trabalho não eram muito felizes. Ele, 31 anos, e ela, 32, decidiram abandonar os empregos, sair do país e viajar. Havia alguma coisa nas poupanças e, depois de semanas de planeamento, o casal partiu. Viajaram pela Índia durante um mês antes de entrar no país vizinho. Nepal, 8 de Abril. Marco e Lara viajaram de cidade em cidade até chegarem à capital, Katmandu. É lá que conhecem dois irmãos nepaleses, Rikesh e Anil Thapa. São ambos naturais de Phaskot, uma pequena aldeia com cerca de 300 habitantes a três horas de viagem de Katmandu, para leste, que sobrevive sobretudo à base da agricultura e da criação de gado. Marco e Lara planeavam passar apenas uma noite na casa deles, mas acabam por ficar quase seis. Partem depois para oeste, por onde planeavam entrar novamente na Índia, mas mantêm-se em contacto com os dois irmãos. Ao cabo de duas semanas chegam a Pokhara. No dia seguinte, o terramoto explode com um impacto mortal. Ninguém o poderia prever com exactidão, embora já há muito se esperasse um sismo de grandes dimensões no país. O Nepal está acima da linha por onde a placa tectónica da Índia se vai enterrando sob a placa euroasiática, numa tremenda progressão de 45 milímetros por ano. É, por isso, uma das zonas com o maior risco sísmico do mundo e calcula-se que um grande terramoto atinja o Nepal a cada 75 anos. O último já se passara há pouco mais de 80, em 1934, com 8, 3 pontos de magnitude. Um quarto de Katmandu ficou então destruído e morreram entre 10 e 12 mil pessoas. A aritmética deu uma folga de pouco mais de cinco anos ao país. Pokhara é uma fracção da devastação causada pelo sismo. Passadas três semanas, as autoridades nepalesas contaram já mais de oito mil mortos e cerca de 19 mil feridos em todo o país. O sismo atingiu com severidade o Vale de Katmandu, a zona com maior densidade populacional, e, sobretudo, as zonas rurais nas montanhas, onde aldeias inteiras ficaram devastadas pelo abalo e pelas mais de cem réplicas que se sentiram desde então. As estradas foram bloqueadas com deslizes de terra e escombros. Milhares de pessoas ficaram completamente isoladas nas suas aldeias, sem socorro para os feridos, comida, água e abrigo. O Governo do Nepal percebeu imediatamente que não dispunha de meios para lidar com o desastre e pediu ajuda à comunidade internacional. Depois do terramoto, Pokhara ficou numa situação de relativa normalidade. Lara e Marco pensam em Rikesh e Anil e na sua aldeia. Tentam contactá-los no próprio dia, mas as ligações telefónicas estavam em baixo. Só no dia seguinte conseguem falar com Rikesh, o irmão mais velho. Estão a salvo. A sua casa em Katmandu ficou com algumas fendas, nada de muito grave, mas confirma-se o pior para Phaskot. Rikesh pinta então a Lara e Marco o retrato que, passadas quase duas semanas, contará à Revista 2, por telefone, num inglês sofrido do qual pouco, muito pouco, passava pelas falhas de rede. “Nada restou da minha casa. Até as fundações desapareceram. Tudo caiu numa fracção de segundo: a nossa casa, o nosso gado, as nossas colheitas. As pessoas mais novas estão à chuva, nos campos, à procura das colheitas que não ficaram destruídas. É muito, muito difícil. Perdemos tudo. ”Não houve mortos em Phaskot, apesar de a maioria das casas terem desabado. Das cerca de 100 habitações na aldeia, 70 caíram. Eram as casas das famílias mais pobres, construídas da maneira tradicional, com pedra, madeira e barro. Mas mesmo sem mortos ou feridos graves, Phaskot teria agora de abrigar mais de uma centena de desalojados, com falta de comida, água potável e sem materiais para construir acampamentos. Com o grosso das operações de resgate concentradas no Vale de Katmandu, Phaskot, tal como a maioria das localidades rurais no Nepal, estava entregue a si própria. Face ao apelo de Rikesh, Lara e Marco decidem ficar no Nepal e ajudar a aldeia. A vontade inicial era ir imediatamente para Phaskot e, uma vez lá, contribuir para os trabalhos de reconstrução. Mas cedo se apercebem de que não teriam dinheiro suficiente para comprar materiais, comida e os medicamentos de que a aldeia precisava. Havia ainda uma agravante: os seus vistos de turistas perderiam a validade no dia 8 de Maio. Teriam de esperar até esse dia para renovarem as autorizações e para isso teriam de ir para a fronteira com a Índia, no Sul. E isso significaria que, ao longo desses dias, a população de Phaskot ficaria sem apoio. Tal como Rikesh fizera com eles, Lara e Marco lançam um apelo aos seus amigos. Através do Facebook pedem dinheiro para ajudar a aldeia. Em pouco mais de duas horas, conseguem 300 euros. No dia seguinte eram já quase mil. Depois, as contribuições começam a cair. Como explica, a mensagem deve ter chegado por enquanto apenas “aos amigos e aos amigos dos amigos” – o apelo mantém-se, contudo, e Lara continua a aceitar doações através do seu Número de Identificação Bancária: 0035 0736 00010 8982007 3. 5 de Maio. Marco e Lara vão a Lumbini, uma das principais cidades de peregrinação budista no Nepal, a apenas 20 quilómetros da fronteira com a Índia, para renovar o visto. É lá que a Revista 2 fala pela primeira vez com o casal, a poucos dias de viajarem para a aldeia de Rikesh e Anil. Desde então, os contactos são diários. Com Lara e Marco, ou com Rikesh, que viajara para Phaskot imediatamente depois do terramoto. No dia seguinte, a 48 horas do início da viagem, Lara explica as suas expectativas. “Estou ansiosa. Acho que vai ser duro. Há cinco anos houve um terramoto no Haiti e ainda estão a reconstruir. Mas quanto mais ajuda [houver], mais fácil será para eles. Estamos cheios de vontade de ajudar. ” O plano do casal português é passar três meses em Phaskot e auxiliar no que for possível. Enquanto Lara e Marco esperavam pelos seus vistos, Rikesh enfrenta com Phaskot o isolamento em que caíram as zonas rurais no Nepal depois do terramoto. Rikesh só consegue comprar comida, água e medicamentos para a aldeia quando recebe a primeira transferência enviada por Lara e Marco, ainda em Lumbini: cerca de 500 euros que permitiram dar sustento à aldeia por alguns dias. O resto dos materiais e mantimentos serão comprados em Katmandu quando Lara e Marco voltarem do Sul. Foi a primeira vez que a aldeia recebeu algum tipo de ajuda depois do sismo. Viesse ela do Governo ou de uma organização humanitária. Apenas uma excepção: no dia que se seguiu ao terramoto, o exército nepalês surgiu na aldeia com uma tenda, uma apenas, para oferecer a quem perdera a sua casa e dormia na rua. Mesmo quem não perdera a sua casa optava então por dormir ao relento com o receio de que uma réplica forte acontecesse durante a noite. Uma tenda não chegava para todos. Nem perto disso. Revoltados, os habitantes de Phaskot recusaram a única ajuda que o Governo do Nepal lhes oferecera. Mesmo com o apoio de dezenas de países e organizações humanitárias, há milhares de pessoas no Nepal que não têm acesso a socorro. É um dos países mais pobres da Ásia e há décadas que vive em clima de instabilidade política e social. Atravessou uma década de guerra civil que terminou apenas em 2006, cujas marcas ainda se fazem sentir na organização política do país. Desde 2008, por exemplo, que o país tem uma Assembleia Constituinte sectária que até ao momento foi incapaz de aprovar uma nova Constituição. O Governo mobilizou a polícia e a quase todo o seu exército de 100 mil efectivos para ajudarem com as operações de resgate. Mas isso não tem impedido a população nepalesa de protestar contra o executivo e de o acusar de estar a fazer pouco. Esse sentimento de revolta é palpável em Phaskot, “há treze dias sem comida ou sem tendas disponíveis. Há seis dias que chove continuamente sem termos um telhado sobre as nossas cabeças”, conta Rikesh à Revista 2 numa altura em que Marco e Lara estão já em viagem para Katmandu. “Ninguém nos ajuda”, prossegue, “toda a gente diz que nos vai ajudar, a Cruz Vermelha, blá, blá, blá”. “Aposto que a Cruz Vermelha nunca foi às pessoas que precisavam de ajuda e que o dinheiro vai todo para as pessoas que têm poder no Governo, ou para quem trabalha nas organizações. ”9 de Maio. Lara e Marco chegam a Katmandu. Encontram-se com Rikesh e Anil na capital para comprarem comida, água e materiais para construírem tendas. Arrendam uma carrinha de caixa aberta e partem para Phaskot. À chegada à aldeia, a população quer saber de onde vêm os estrangeiros. Ou, melhor, quer assegurar-se de que não fazem parte do Governo. Dizem a Rikesh, segundo o que ele contará depois aos dois portugueses: “Se são teus amigos, podem ficar. Mas não chamem o Governo. ” Distribuem a ajuda. Segundo as suas contas, deve dar para 35 famílias durante 15 dias. Não se podem comprar mantimentos em grande quantidade. O período das monções está prestes a chegar e há o risco de a água se infiltrar pelas tendas rudimentares e apodrecer os alimentos. Pelos olhos de Lara e Marco, Phaskot é uma aldeia dividida entre velhos e novos, pobres e menos pobres, mas em que sobre todos pende o presságio das monções. A prioridade é, por isso, melhorar os rudimentares abrigos de pano e bambu que a população construiu antes da chegada de novos materiais. Usam-se agora troncos e placas de zinco para ajudar com o isolamento da água. Estas placas de metal são o material mais procurado no momento, diz-nos Marco, e, se não fossem as doações, os habitantes de Phaskot não teriam dinheiro para as comprar. Servirão para se alargar alguns dos galinheiros que sobreviveram e assim alojar as dezenas dos que não têm tecto. Não há outra alternativa. Quem tinha mais dinheiro construiu casas com tijolo e cimento, mas não recebe lá nenhum dos desalojados. “Parece-me a mim que quem está bem não vê nenhuma necessidade de estar pior”, diz Marco. O casal português está a viver num dos três acampamentos, divididos intuitivamente por grupos que já se conheciam. Marco e Lara estão com os familiares de Rikesh e com mais sete outras famílias. Quando chegaram, não sabiam o que esperar. As pessoas são amigáveis e de confiança, diz Marco, mas o desastre deixou muitos deles sem vontade. Quando atende o telefone, no seu terceiro dia em Phaskot, tinha acabado de deixar a casa do tio de Rikesh, onde tentavam recuperar algumas coisas dos destroços. Enquanto o faziam, o tio começou a chorar. “Há dois sentimentos evidentes. Encontram-se na rua pessoas com o olhar perdido. O Rikesh diz que os mais velhos preferiam ter morrido. É com os mais novos que está tudo a andar, mas não há muitos como eles. ”Entre Junho e Agosto choverá quase todos os dias e nada garante que mesmo os abrigos que estão agora a ser construídos sobrevivam. Marco acredita que não e a população da aldeia parece partilhar das suas dúvidas. A água, que entretanto tem chegado à aldeia através de uma nascente — é depois fervida e bebida como chá — vai tornar-se um problema grave com as chuvas. As doenças respiratórias vão alastrar-se e as latrinas improvisadas vão ficar a descoberto. Não se sabe quem sobreviverá às monções de entre os mais velhos e os cerca de 10 bebés com menos de um ano de idade. Marco resume: “A esperança deles é sobreviverem às monções para depois reconstruirem as suas casas”. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Em Phaskot sobrevive-se. Sobreviveu-se ao primeiro e fez-se o mesmo com o segundo grande terramoto. No dia 12 de Maio, uma poderosa réplica de 7, 3 pontos de magnitude explodiu por entre as mesmas placas que vagarosamente se vão deslizando, cumprindo ano a ano os seus costumados cinco centímetros continentais. Na quinta-feira contavam-se mais 80 mortos, mas as contas não eram ainda definitivas. Phaskot escapou novamente à mortandade. Marco e Lara estavam numa cidade a algumas horas de viagem de Phaskot. Compravam material para distribuir pela aldeia quando a réplica se deu. Escaparam novamente sem ferimentos e, numa questão de minutos, viram as ruas da cidade encherem-se de lonas e bambus. O medo surgira novamente. Regressaram a Phaskot, mas não foi medo que viram. “Apesar de terem perdido tudo, agora sentem que a vida tem muito valor. No acampamento em que estamos este novo abalo desencadeou uma celebração da vida com direito a arroz doce”, conta Lara à 2. As casas periclitantes e as quase caídas caíram agora por completo. Mais ou menos 10, segundo Rikesh. Quanto a Governo e organizações humanitárias, parecem ainda não ter reencontrado o caminho para Phaskot desde que lá foram oferecer uma tenda e que de lá voltaram com ela ainda nos braços.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave guerra ajuda mantimentos comunidade social medo alimentos humanitária
Cientistas: há 50% de hipóteses de as máquinas superarem os humanos no trabalho em 2061
Inquérito a especialistas de inteligência artificial mostra que a comunidade científica acredita que dentro de 120 anos as máquinas farão todos os trabalhos humanos na perfeição. (...)

Cientistas: há 50% de hipóteses de as máquinas superarem os humanos no trabalho em 2061
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-07-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Inquérito a especialistas de inteligência artificial mostra que a comunidade científica acredita que dentro de 120 anos as máquinas farão todos os trabalhos humanos na perfeição.
TEXTO: Daqui a sete anos as máquinas vão traduzir melhor do que profissionais humanos, daqui a cerca de 30 poderão escrever romances e realizar cirurgias complexas, e dentro 120 anos farão qualquer tipo de trabalho na perfeição. Os números são de um inquérito global a 352 especialistas de inteligência artificial em todo o mundo, realizado pelas universidades de Oxford e Yale ao longo de 2016. As conclusões, que já tinham sido parcialmente divulgadas em Maio, foram publicadas nesta quinta-feira. O objectivo era avaliar quanto tempo falta para se atingir a "inteligência artificial de alto nivel", que é definida no relatório como "o momento em que as máquinas conseguem desempenhar qualquer tarefa, sem ajuda, de forma melhor e mais barata que os trabalhadores humanos". Em média, os investigadores inquiridos acreditam que há 50% de hipóteses de a inteligência artificial ultrapassar a inteligência humana em todas as tarefas nos próximos 45 anos e de automatizar todos os trabalhos nos próximos 120 anos. Quem trabalha na área prevê que ao longo da próxima década, além da conquista da tradução, as máquinas consigam transcrever discursos na perfeição, recriar qualquer tipo de edifício em peças Lego, e realizar um trabalho académico ao nível do ensino secundário. Já um romance literário complexo – ao nível dos bestsellers do New York Times – será possível daqui a 32 anos, acreditam os inquiridos. É algo que algumas máquinas já começam a conseguir fazer: em 2016, o livro Konpyuta ga shosetsu wo kaku hi (japonês para O dia em que um computador escreveu um romance inteiro) chegou à segunda ronda de uma competição nacional de leitura no Japão. No total, o inquérito foi enviado a 1634 investigadores. Apenas 21% responderam. O questionário incluia perguntas de resposta aberta e fechada, com os autores a perguntarem especificamente quantos anos faltaria para as máquinas serem capazes de traduzir e dobrar roupa melhor do que um ser humano, e de serem capzes de desempenhar profissões como a de condutor de pesados, cirurgião, caixa numa loja, ou investigador de inteligência artificial. Além de vencer os humanos em funções intelectuais, os robôs também vão dominar a nível físico. Apesar da dificuldade em construir robôs bípedes, os académicos prevêem que daqui a 12 anos estas máquinas já existam e sejam mais rápidas que os atletas de topo em pequenas corridas até cinco quilómetros. Já a condução autónoma de camiões deve ser possível até 2027, o trabalho em lojas, até 2031, e o trabalho cirúrgico, até 2053. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Estas funções já começam a ser observadas em algumas máquinas. No final do ano passado, um camião de cerveja da Uber conduziu sozinho por autoestradas e, este ano, o software do Google para jogar Go – um milenar e complexo jogo de tabuleiro – ganhou uma partida frente àquele que é considerado o melhor jogador humano do mundo. Contudo, os especialistas têm opiniões diferentes sobre o tempo que vai demorar até se alcançar a automação total. Em média, os investigadores asiáticos (a viver dentro ou fora do continente) estimam que demore apenas 104 anos, enquanto para os europeus e norte-americanos a previsão é de 130 anos e 168 anos respectivamente. Apesar destas divergências, os inquiridos concordam que a evolução da inteligência artificial terá um impacto positivo. Apenas 10% acreditam que existirão efeitos negativos a longo prazo, embora 45% achem que se deve investir mais dinheiro em estudos para minimizar os riscos e o impacto da nova tecnologia. É preciso, porém, algum cepticismo quanto aos números apresentados. A revista de tecnologia do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), nos EUA, comenta uma versão inicial do estudo de Yale e Oxford com o aviso de que previsões que ultrapassam os 40 anos (como a capacidade das máquinas substituirem cirurgiões de topo) devem ser interpretadas com algumas reservas porque o período é equivalente à vida profissional de muitas pessoas. Ou seja, as alterações não vão afectar quem está actualmente no mercado de trabalho.
REFERÊNCIAS:
Óscar conquistou para Bragança um "Prémio Nobel da Gastronomia"
As reacções dos novos chefs galardoados com estrelas Michelin passam por duas palavras-chave: orgulho e reconhecimento. (...)

Óscar conquistou para Bragança um "Prémio Nobel da Gastronomia"
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-11-30 | Jornal Público
SUMÁRIO: As reacções dos novos chefs galardoados com estrelas Michelin passam por duas palavras-chave: orgulho e reconhecimento.
TEXTO: O chef Óscar Gonçalves não faz a coisa por menos: o seu Restaurante G, em Bragança, conquistou "um Prémio Nobel da Gastronomia". Já depois de ter ficado a saber que levará para o Nordeste do país uma estrela Michelin, mostrou-se muito orgulhoso com o feito que alcançou. "Sinto muito orgulho na minha mãe e no meu pai, no meu irmão, que me ensinaram muito no percurso que tracei, e também numa região. " "O Norte está a ficar desertificado" e o facto de Óscar e a família se terem mantido sempre na região de Bragança - os pais são donos do restaurante Geadas, uma referência local - mostra que ainda há esperança. "Nós ficámos sempre e conseguimos atingir um objectivo, um Prémio Nobel da Gastronomia. E agora pusemos a nossa cidade no mapa por boas razões. "Vindo de "uma família de restauradores" - "eu e o meu irmão nascemos no meio dos tachos, das panelas e dos clientes" -, Óscar Gonçalves pratica agora uma cozinha que obedece ao mote "eat and drink local". "Trabalhamos com produtos locais e sazonais e bebemos do que é a gastronomia de Trás-os-Montes. "É também de orgulho que fala António Loureiro. "Minhoto como sou, estou muito orgulhoso por levar a estrela para Guimarães. E imensamente agradecido, aos clientes, fornecedores e a toda a minha equipa", comentou o chef d'A Cozinha. Já Pedro Almeida assume que o galardão conquistado pelo seu restaurante Midori, no Hotel Penha Longa, em Sintra, tem um significado especial por ser a primeira estrela atribuída a um restaurante asiático em Portugal. Mas também por ser o reconhecimento de que é possível “fazer coisas diferentes daquilo que é a cozinha tradicional [portuguesa] com a mesma qualidade com que são feitas lá fora”. E não recusa a possibilidade de conquistar mais estrelas no futuro. “Ainda temos potencial para chegar mais longe do que isto”, defendeu o chef em declarações à Fugas à margem do evento, assumindo o desejo de “chegar às três estrelas”. Aberto há 25 anos, o Midori atravessou uma grande mudança em 2017, que Pedro Almeida apelida de terceira geração. “A segunda geração mudou o Midori de um restaurante 90% tradicional para um restaurante com muitas influências do mundo. Quando nós achámos que tínhamos massa crítica criativa e uma equipa que conseguisse transformar o restaurante numa coisa ainda melhor, resolvemos transformá-lo numa coisa mais pequenina, com uma cozinha muito mais atenta ao pormenor, muito mais nossa, única e criativa. ” O novo Midori – que representou uma clara aposta na corrida às estrelas Michelin – tem uma sala bastante mais pequena (80 metros quadrados, sete mesas, num total de 18 lugares), permitindo que as atenções se concentrem nos pratos e na encenação em torno do serviço. Ao falar do percurso profissional, Pedro Almeida recordou o casal Paulo Morais e Ana Lins, com quem encontrou “este chamamento para o japonês” e que diz terem-lhe ensinado “quase tudo” o que hoje sabe sobre a cozinha japonesa. Henrique Sá Pessoa, que conquistou a sua segunda estrela para o Alma, confessa que começou a ouvir “alguns boatos” ao início da tarde desta quarta-feira. “Mas já no passado houve boatos que não se concretizaram, por isso tentei manter a calma e gerir essa expectativa, vir para a gala tranquilo. ” Quando chegou houve quem quisesse dar-lhe os parabéns, mas o chef do Alma acredita que “enquanto não tiver o bordado no casaco", não tem nada. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Os boatos acabariam por se concretizar e o Alma conquistou a segunda estrela. “Fico obviamente muito contente, sobretudo por todo o grupo de trabalho que está por trás”, diz. Não sabe exactamente, mas pensa que terá tido umas três ou quatro visitas de inspectores ao longo do ano. “Sei que para a segunda estrela são necessárias no mínimo três visitas. ” Aconteceu rapidamente, reconhece, mas lembra que antes do novo Alma, no Chiado, houve um trabalho do Alma ainda em Santos que também contribuiu para o resultado final. Para já não quer ainda pensar numa terceira estrela para o seu restaurante, mas mostra-se convicto de que no próximo ano algum dos restaurantes portugueses que já têm duas estrelas conquistará a terceira, “sobretudo o Hans [Neuner, do Ocean, Vila Vita Parc] e o Avillez [Belcanto]”. “O bonito do momento que estamos a viver na gastronomia portuguesa é que estamos a evoluir muito. Tenho a certeza que os que têm uma estrela estão mais perto da segunda e os que têm duas estão mais perto da terceira do que de perder alguma. ”
REFERÊNCIAS:
Étnia Asiático