“Se Lisboa só pudesse ter um museu, esse museu deveria ser o das descobertas”
Jared Diamond Viveu entre os últimos caçadores-recolectores do mundo e emociona-se com o fim iminente desse modo de vida. Defende que para perceber o mundo actual temos de recuar à pré-história e que há coisas a aprender com as sociedades tradicionais. Para este prestigiado académico, uma das vantagens históricas da Europa é a sua desunião. (...)

“Se Lisboa só pudesse ter um museu, esse museu deveria ser o das descobertas”
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 2 Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-11-30 | Jornal Público
SUMÁRIO: Jared Diamond Viveu entre os últimos caçadores-recolectores do mundo e emociona-se com o fim iminente desse modo de vida. Defende que para perceber o mundo actual temos de recuar à pré-história e que há coisas a aprender com as sociedades tradicionais. Para este prestigiado académico, uma das vantagens históricas da Europa é a sua desunião.
TEXTO: Jared Diamond não é um académico qualquer. Sereno, empático e de ar saudável, na sua presença sente-se como devem ter sido extraordinários os seus 81 anos, feitos há menos de uma semana. Durante décadas conviveu e fez amigos entre os membros das sociedades tradicionais das ilhas da Nova Guiné, que estão entre os últimos caçadores-recolectores do mundo, um modo de vida com seis milhões de anos, prestes a desaparecer. Quando estava nos “trintas” um novo-guineense chamado Yali fez-lhe uma pergunta: porque é que vocês brancos desenvolveram tantas coisas e as trouxeram para a Nova Guiné, mas nós, negros, tínhamos tão poucas coisas nossas? É uma pergunta avassaladora. Para a responder, não basta dizer que as várias sociedades humanas se desenvolveram de formas diferentes, que algumas chegaram à era espacial no século XX enquanto outras se mantiveram com tecnologia da Idade da Pedra até aos tempos modernos. É preciso tentar explicar porquê. Por exemplo, porque é que a agricultura e as ferramentas de metal apareceram em certos locais e não noutros? Estas são para Jared Diamond as razões últimas, necessárias para responder à pergunta de Yali. Duas décadas volvidas, e já muito depois da morte de Yali, publica um livro com a sua tentativa de resposta, Armas, Germes e Aço. Em três palavras, são estas as razões imediatas para que os europeus e os seus descendentes tenham dominado o mundo num piscar de olhos, de apenas cinco séculos. Mas Diamond tenta chegar às razões últimas, ou seja, aos acontecimentos e circunstâncias que após o fim da última Idade do Gelo fizeram com que as coisas tivessem sido assim. O livro valeu-lhe o prestigiado Prémio Pulitzer em 1998. Tem várias obras de divulgação científica publicadas, todas sucessos planetários. No mais recente “O mundo até ontem” mostra-se grato pelas vantagens da modernidade, mas diz-nos que podemos aprender algumas coisas com as sociedades tradicionais. Não imitá-las, apenas adoptar algumas soluções para problemas específicos que certas sociedades resolveram melhor do que nós. O pai era físico, a mãe linguista, professora e pianista. Jared é professor de Geografia na Universidade de Califórnia em Los Angeles (UCLA), mas ao longo da vida teve vários interesses e carreiras, sucessivas e em paralelo. Fisiologia, ornitologia, ecologia, história ambiental, entre outras. No final dirá que, apesar da importância da colaboração científica multidisciplinar, há uma vantagem em ter muito conhecimento num cérebro só. Veio a Portugal a convite da Fundação Francisco Manuel dos Santos para participar no encontro O Trabalho Dá Que Pensar. Resume aqui de modo dramático a sua resposta à pergunta de Yali, fazendo uso da arte da síntese, desenvolvida ao longo de décadas de contacto com jornalistas. Daí partimos para as descobertas portuguesas e respectiva proposta de criação de museu em Lisboa. Falamos ainda sobre as diferenças na educação, na avaliação de riscos e no envelhecimento, nas sociedades tradicionais e na nossa. E das vantagens e desvantagens da inteligência artificial. Pelo caminho, mandou-me deitar fora o saleiro. Algumas populações humanas permaneceram caçadoras-recolectoras até há pouco tempo. Outras evoluíram para formar sociedades muito complexas. Como é que as coisas aconteceram de maneira tão diferente?As diferenças entre as sociedades humanas modernas resultam de diferenças na geografia e biogeografia, ao longo dos últimos 10 mil anos. Em particular na disponibilidade de espécies animais e de plantas adequadas para domesticação, mais do que em diferenças entre as pessoas em si. Se entendi correctamente, não há mérito de uma sociedade particular por ter evoluído de uma certa maneira. Não há diferenças inatas nas populações, as diferenças estão nos seus ambientes?É verdade. Claro que há diferenças fisiológicas e noutros aspectos. Há razões pelas quais os europeus podem digerir leite e os aborígenes australianos não. Mas diferenças que contam para que algumas pessoas se tornem escritores, empresários e operários metalúrgicos, enquanto outros povos permaneceram caçadores-recolectores, diferenças genéticas nos cérebros, não há provas disso. Muitas pessoas procuram as raízes da desigualdade no mundo de hoje há 500 anos, quando os europeus chegaram à América. Mas no seu livro Armas, Germes e Aço argumenta que as raízes da desigualdade actual estão algures após o fim da última era glacial (há 13 mil anos) porque as sociedades evoluíram de maneira diferente a partir daí. Isso está correcto?É verdade. Se alguém me dissesse que todas as diferenças no mundo moderno começaram a surgir há 500 anos, eu diria: olhem para o estado do mundo em 3000 a. C. Na Ásia ocidental, e a começar no Sudeste europeu, já existiam ferramentas de metal, escrita e reis. Enquanto na Austrália havia apenas caçadores-recolectores. E nas Américas, no México e nos Andes, a agricultura estava só a começar. Se um extraterrestre, uma criatura verde de oito pernas da nebulosa de Andrómeda, tivesse visitado a Terra em 3000 a. C. e lhe pedissem para prever quem iria conquistar o mundo, o visitante faria uma aposta correcta. Claro que seriam aquelas pessoas da Ásia ocidental e os seus descendentes. As diferenças em 3000 a. C. eram já tão grandes que foram essas que produziram o mundo moderno. Escreve a palavra “descobertas” entre aspas, quando se refere às descobertas geográficas ibéricas no século XV. Porquê as aspas?Porque as descobertas geográficas no século XV foram descobertas dos europeus de coisas que eram conhecidas por outros povos há 40 mil anos! O primeiro europeu a descobrir a Austrália foi um holandês em 1606 [Willem Janszoon]. Esse holandês descobriu a Austrália? Não! Os aborígenes da Austrália viviam lá há 60 mil anos. Foram eles que descobriram a Austrália. As aspas significam: descobertas por europeus. O presidente da Câmara de Lisboa quer fazer um museu das descobertas. Algumas pessoas argumentam que a palavra “descoberta” esconde a escravidão e a colonização que se seguiram. Acha que devíamos ter um museu das descobertas em Lisboa?Claro que devíamos ter um museu das descobertas em Lisboa! Possivelmente, a coisa mais importante acerca de Portugal nos últimos 600 anos foram as grandes descobertas feitas por navegadores portugueses. É verdade que Vasco da Gama não descobriu a Índia. Descobriu o caminho marítimo para a Índia. E também não é verdade que um português tenha descoberto o Brasil, já havia um milhão de nativos americanos a viver no Brasil, mas um navegador português foi o primeiro europeu a chegar ao Brasil. E isso teve uma importância enorme para a história mundial, porque levou à colonização europeia do Novo Mundo. Se Lisboa só pudesse ter um museu e tivéssemos de demolir todos os outros, esse único museu deveria ser das descobertas. Mas teríamos de entender o que significa descobertas. Se escrevêssemos apenas uma página sobre Portugal num livro de história mundial, esse deveria ser o tema? Não o tráfico de escravos transatlântico?É verdade. Claro que a coisa mais importante acerca de Portugal na história mundial foi o seu papel na expansão europeia pelo mundo. E a expansão europeia no mundo significou muitas coisas, boas e más. Significou o tráfico de escravos transatlântico, o que é mau. Significou a importação de sementes do Novo Mundo para a Europa, o que foi bom para a Europa. Significou o desenvolvimento de sociedades agrícolas altamente produtivas na Argentina, o que é bom. Uma pessoa pode ser selectiva tanto positiva como negativamente. Se uma pessoa disser que a descoberta portuguesa do Novo Mundo foi a coisa mais maravilhosa dos últimos 600 anos. . . não, disparate! Resultou no tráfico de escravos transatlântico e na matança da maioria dos nativos americanos, o que é mau. Se quisermos dizer que a descoberta portuguesa do Novo Mundo foi inteiramente má. . . não, não foi! Muitas pessoas querem que a vida seja simples. Que seja tudo bom ou mau. Lamento, talvez a vida seja assim na nebulosa de Andrómeda, mas aqui na Terra o bom e o mau misturam-se!O que aconteceu quando os europeus se encontraram com os nativos americanos foi em grande parte inevitável?Infelizmente, sim. Ao longo da história humana quando povos mais poderosos encontraram povos menos poderosos, o resultado foi quase sempre a conquista, a expulsão, às vezes o extermínio dos povos menos poderosos. Foi apenas nos últimos 80 anos que começámos a ter excepções. Quando os europeus “descobriram” as ilhas da Nova Guiné, havia lá populações densas de milhões que viviam com tecnologia da Idade da Pedra. Quando os europeus chegaram, não os mataram todos porque em 1930 já não era considerado aceitável que os europeus exterminassem e expulsassem outros povos. Mas se os europeus tivessem descoberto as ilhas da Nova Guiné 80 anos antes, claro que os teriam matado ou expulsado a todos. Os comportamentos melhores são relativamente recentes. Isto não quer dizer que todos os comportamentos humanos nos últimos 80 anos foram bons. Podemos pensar em várias coisas que aconteceram na II Guerra Mundial que não foram boas. Deveria um chefe de Estado português pedir desculpa pelo papel do país no tráfico transatlântico de escravos?Caramba! Eu oiço esse argumento em relação à Austrália. Não estou familiarizado com os argumentos acerca de Portugal, mas devem ser sem dúvida semelhantes. Devem os australianos modernos pedir desculpa pelo que os europeus fizeram aos aborígenes australianos a partir de 1788, quando os britânicos colonizaram a Austrália? Eles mataram, infectaram com doenças e expulsaram das suas terras os aborígenes australianos. Devem os europeus modernos pedir desculpa pelo que os europeus de 1830, 1880 e 1920 fizeram? Um primeiro-ministro australiano chamado John Howard disse que os australianos modernos não devem pedir desculpa pelas coisas que os seus tetravós fizeram, mas sim pelas coisas que fazem hoje. Outros australianos acham que devem pedir desculpa por coisas que o seu povo, os seus antepassados, fizeram. É semelhante nos Estados Unidos. Devem os americanos brancos modernos pedir desculpa pela escravatura? Alguns americanos dizem que sim, outros dizem que foram os seus tetravós, como é que podem pedir desculpa pelo que eles fizeram? É um debate em aberto. A resposta para Portugal deve ser semelhante. Não foi você ou os seus colegas de escola que fizeram o tráfico transatlântico de escravos. Foram os vossos tetra-tetra-tetra-tetravôs. Sente-se responsável pelos actos deles?Pedir desculpa pela escravatura não é incompatível com o seu argumento de que as causas da desigualdade não são de há 500 anos, mas de há 10 mil anos? Pedir desculpa pela escravatura é pedir desculpa por algo na história recente, mas que não foi determinado pela história recente. Porque é que os europeus estabeleceram um comércio de escravos transatlântico? Porque é que os africanos não fizeram um comércio de escravos trans-mediterrânico, com africanos a escravizarem europeus? A razão para isso são armas, germes e aço; as origens precoces da domesticação de plantas e animais no Sudoeste asiático, porque havia lá muito mais espécies domesticáveis do que em África. Para além disso, é porque a Eurásia tem um eixo Este-Oeste [com latitudes e climas semelhantes], que permitiu que as sementes chinesas chegassem à Europa. Enquanto a África tem um eixo Norte-Sul [com grandes diferenças de latitudes e climas], por isso as sementes do Crescente Fértil nunca chegaram à África do Sul, até os holandeses navegarem até lá. É por causa da geografia e da biogeografia. É verdade. Por outro lado, essa é a razão última, mas as pessoas apesar disso têm responsabilidades morais. Se o povo A está numa posição de poder, hoje em dia nós dizemos que esse povo não deve usar esse poder para exterminar outro povo. Portugal é hoje mais rico e poderoso do que. . . o Congo. Se os portugueses fossem para o Congo e começassem a matar congoleses, devíamos dizer que a culpa não é dos portugueses, é porque tiraram partido da domesticabilidade do gado? Outros poderiam argumentar: sim, os portugueses tiraram partido da domesticação do gado, mas ainda assim têm responsabilidades morais quando decidem ir matar congoleses!No início do século XV, a China tinha capacidade técnica naval para atravessar o Pacífico e chegar à costa oeste dos Estados Unidos? Ou para alcançar a Europa?Por volta de 1432, sem dúvida que sim. Porque a China tinha uma série de frotas, com navios muito maiores do que os navios de Cristóvão Colombo. E eram frotas muito maiores, que a China enviou primeiro para a Indonésia, depois para a Índia, depois para a costa oriental de África. Parecia que as frotas chinesas estavam quase a dobrar o cabo da Boa Esperança e a chegar à Europa. Infelizmente para a China, houve uma mudança de imperador. O novo imperador disse: estas frotas são um enorme desperdício de dinheiro e trazem coisas inúteis para a China, que já tem tudo o que precisa. A China tinha certamente a capacidade tecnológica para chegar à Europa em 1432. E se tivesse assim escolhido teria também tido a capacidade técnica de chegar às Américas em 1432. Mas escolheu não o fazer. Foi a unidade política na China que deu vantagem à Europa? Cristóvão Colombo pediu a vários reis para financiar a sua viagem. Exactamente. Colombo primeiro pediu aos italianos, que disseram que não. Pediu aos franceses, não. Pediu ao rei de Espanha, não. Pediu aos portugueses, não. Pediu aos duques de Espanha, não. Finalmente pediu ao rei de Espanha, que disse está bem, leva estes dois barcos e vai. Na China, não havia seis hipóteses. Na altura não houve uma decisão centralizada que impedisse Colombo de fazer a viagem. Mas hoje há uma União Europeia. Pensa que a União Europeia pode minar esta vantagem histórica da Europa, de não ser politicamente unida?É um grande desafio para a União Europeia. Como é que se conseguem as vantagens da União Europeia, sem perder a vantagem histórica da desunião? Isto é debatido por historiadores, mas eu vejo, entre as vantagens históricas da Europa, a sua desunião. A Europa teve a sorte de ser, de facto, uma península a oeste do Crescente Fértil. Obteve a escrita, ferramentas de metal e agricultura a partir do Crescente Fértil. Mas a Europa era desunida. O que significa que existiam 200 príncipes que competiam uns com os outros. Se um príncipe tomasse uma má decisão. . . houve príncipes que aboliram as armas. E sabe o que aconteceu? Príncipes vizinhos, que não tinham abolido as armas, conquistaram esses principados. Quando um imperador na China tomava uma má decisão, tal como, não há mais navios oceânicos, não havia mais 199 príncipes chineses para dizer que mantinham os seus navios oceânicos. Eu vejo as vantagens históricas da Europa como a sua proximidade ao Sudoeste asiático, estar nas zonas temperadas, ter terras realmente férteis, chuva no Verão e ser politicamente desunida. Para a União Europeia, hoje, o desafio é ter as vantagens de um certo grau de união, preservando a vantagem histórica de desunião. Mas eu não me preocupo com isso, de todo. Parece-me que a Europa está a fazer um excelente trabalho na preservação da sua desunião!Viveu no seio de sociedades tradicionais, na Nova Guiné. Que impacto isso teve em si?Transformou a minha visão da vida em muitos aspectos. Comecei a visitar a Nova Guiné muito antes de ter tido filhos. Tinha quase 50 anos quando os meus filhos [gémeos] nasceram. Eles nasceram em 1987 e a minha primeira visita à Nova Guiné foi em 1964. Eu tinha vivido na Nova Guiné ao longo de 23 anos, quando tive filhos. O meu modelo de como tratar os meus filhos era como os nova-guineenses criavam os seus. Eu não tinha prestado atenção ao modo como os americanos criavam os filhos. Isso é um aspecto. Outro é a minha atitude em relação ao perigo, que é baseada naquilo que eu vi na Nova Guiné. A minha mulher fica exasperada com a minha reacção a qualquer perigo possível. Mas o meu percurso foi na Nova Guiné. E eu sei que se fizer uma coisa mil vezes e de cada vez há o risco de um em mil que corra mal, se a repetir mil vezes, vou acabar morto. Aprendi isso na Nova Guiné. Os europeus não aprendem isso. Diz no seu mais recente livro O Mundo até Ontem que devemos estar gratos pelas nossas sociedades modernas, mas também que podemos aprender e incorporar algumas coisas das sociedades tradicionais. Quais?Para além das duas que já falei [educação e avaliação de riscos], os hábitos alimentares. Tem um saleiro na sua mesa de jantar?Não. Mas uso um pouco de sal para cozinhar. Ok. Quando chegar a casa, deite fora o sal da sua cozinha. A comida já tem sal, não há razão para ter sal na cozinha. A escolha é sua. Se gostava de morrer de hipertensão aos 65, mantenha o sal na cozinha. Se gostava de morrer de cancro aos 103, deite fora o sal!A nossa biologia ainda não está totalmente adaptada ao nosso actual sistema de produção de alimentos? Biologicamente ainda estamos mais bem adaptados a uma dieta de caçadores-recolectores?Em alguns aspectos, sim. Os portugueses, tal como os americanos, morrem principalmente de doenças não contagiosas. Morrem de hipertensão, doenças cardíacas, diabetes, cancro. Dessas, certamente que os nova-guineenses nunca morrem de hipertensão, doenças cardíacas ou diabetes. Isso é por causa do seu estilo de vida. Eles não têm saleiros. É porque não comem tanto como nós. Não comem regularmente alimentos ricos em gordura, não fazem três grandes refeições por dia. Eles comem batatas-doces ao pequeno-almoço, almoço e jantar durante semanas. Depois matam uns porcos e empanturram-se, ficam mesmo gordos e depois voltam a comer as batatas-doces. Não é que eu esteja a dizer que deveríamos imitar o estilo de vida dos nova-guineenses. Eu não como batatas-doces em três refeições por dia. E estou contente por isso. Eu gosto de comer bem e tento regular a boa comida que como. E deitei fora os saleiros para, pelo menos, reduzir o risco de morrer de hipertensão ou AVC. Quanto tempo vivem em média os nova-guineenses que têm essa dieta?Até aos tempos modernos, até à medicina moderna chegar à Nova Guiné, a esperança média de vida dos nova-guineenses seria talvez de 50 anos. Isso é terrível. A razão pela qual a sua esperança de vida era de 50 anos não era porque eles morressem de diabetes, AVC ou doenças cardíacas. Eles morriam porque se matavam uns aos outros. Morriam de doenças infecciosas, que nós tratávamos em Portugal e nos Estados Unidos com antibióticos. Morriam em acidentes, na selva. Se caíam e partiam uma perna, não havia médicos nem hospitais. Morriam de fome. As causas de morte na Nova Guiné tradicional são causas que nós já eliminámos em grande parte. Agora que a Nova Guiné foi trazida para o mundo moderno, os nova-guineenses vivem mais, até depois dos 60. Mas também estão a ficar gordos, diabéticos e hipertensos. Disse que nas sociedades tradicionais da Nova Guiné muitos morriam de doenças infecciosas. Doenças locais ou vindas de fora?Eram doenças infecciosas tradicionais. As doenças infecciosas europeias foram levadas especialmente para as Américas. Mas como a Nova Guiné fica no extremo leste da Indonésia, que é perto da China, as doenças asiáticas foram provavelmente chegando à Nova Guiné. Por isso não houve uma grande mortandade de nova-guineenses com doenças europeias. Eles morriam principalmente de doenças tropicais, especialmente malária e dengue. E de aquilo que nós chamamos “doenças gastrointestinais”. Afirma que as sociedades ocidentais são das mais cruéis para os idosos. O que poderíamos aprender com as sociedades tradicionais em relação aos mais velhos?Muitas sociedades tradicionais proporcionam aos idosos uma vida mais satisfatória do que na Europa. E por outro lado tiram mais partido dos idosos. Os mais velhos têm experiência. Um septuagenário teve muito mais experiência de relações humanas. Claro que um septuagenário não tem mais experiência com isto [telemóvel] do que o meu filho de 30. O facto de eu ter 81 anos não me ajuda nada com isto, peço ajuda ao meu filho. Mas eu e a minha mulher temos muito mais experiência a lidar com pessoas, a tomar decisões e a gerir pessoas. Apenas porque vivemos mais. Isso é algo em que os idosos são bons. Em muitos ou na maioria dos aspectos eu vejo vantagens da vida na Europa quando comparada com a vida nos Estados Unidos. Mas um aspecto em que a vida na Europa é inequivocamente pior do que nos Estados Unidos é que na Europa, muitas vezes, a aposentação é obrigatória. Soube que na função pública, em Portugal, há uma idade de aposentação obrigatória. Se eu fosse o Presidente Kim Jong-un, da Coreia do Norte, e quisesse arruinar-vos, faria exactamente o que os europeus estão a fazer a si próprios. Uma lei de aposentação obrigatória para que deitem fora as vossas pessoas mais experientes. Era igual nos Estados Unidos, mas a aposentação obrigatória foi tornada ilegal há cerca de 30 anos. Pelo contrário, na Nova Guiné, é reconhecido que os mais velhos têm valor. Quando não havia escrita na Nova Guiné, os velhos eram repositórios de conhecimento. É normal na Nova Guiné, quando alguém quer saber alguma coisa, ir perguntar a um velho. Ou se quiser um conselho. Ainda há caçadores-recolectores?Sim. Na Nova Guiné, ainda há alguns grupos. Não muitos, mas ainda há alguns. Na bacia amazónica ainda há caçadores-recolectores e em África também há alguns grupos. Os hadza, da Tanzânia, alguns ainda são caçadores-recolectores. Entre o povo san, do Botswana e da Namíbia, havia caçadores-recolectores até há poucas décadas e provavelmente ainda existem alguns. Os inuítes, os esquimós no Árctico, alguns deles ainda vivem como caçadores-recolectores. Há futuro para os caçadores-recolectores ou eles serão gradualmente assimilados pelas sociedades modernas?Provavelmente, dentro de 20 anos não restarão nenhuns caçadores-recolectores em qualquer lugar do mundo. E isso é notável. Praticamente todos os humanos foram caçadores-recolectores durante os últimos seis milhões de anos. E isso significa que seis milhões de anos de história humana vão acabar nos próximos 20. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Os sistemas automáticos tornados possíveis pela inteligência artificial irão libertar os humanos para mais inovação e criatividade?Sim e não. A inteligência artificial irá tornar algumas tarefas inúteis. As máquinas serão capazes de executar essas tarefas. Por exemplo, os computadores. O meu doutoramento foi em fisiologia laboratorial. Nesses tempos, os computadores que usávamos para fazer modelos de como os nervos conduzem impulsos eléctricos eram muito primitivos e demoravam duas semanas a calcular um impulso nervoso. Hoje, o cálculo é feito imediatamente. Com os computadores, conseguimos fazer coisas muito rapidamente. Isso é maravilhoso. Mas também é terrível. Porque, se olharmos para os jovens, estima-se que as pessoas como os meus filhos passam 80% do seu tempo com aparelhos electrónicos com ecrãs. Passam muito pouco tempo a falar com pessoas, a olhar pessoas cara a cara. Se se passa muito pouco tempo cara a cara com pessoas, então não se aprende a ler os sinais, os ligeiros movimentos, a respiração, a linguagem corporal. Simplesmente não se entendem as pessoas tão bem. Acho que é um dos factores que contribuem para o comportamento cada vez mais rude e cruel nos Estados Unidos. Especialmente na política americana, mas é mais generalizado. É mais fácil escrevermos uma mensagem muito rude se virmos uma mensagem num ecrã. É mais difícil para mim olhar para si e dizer coisa terríveis sobre si do que se estiver as escrevê-las num ecrã. Vejo isto como um dos grandes inconvenientes da tecnologia moderna, incluindo a inteligência artificial. Quando a agricultura foi adoptada nalgumas sociedades, muitas pessoas ficaram livres para fazer outras coisas, já que nem todos precisavam de passar o tempo a procurar os seus próprios alimentos. Algumas puderam especializar-se na construção de ferramentas, outras tornaram-se soldados a tempo inteiro, políticos ou burocratas. Explica isto nos seus livros. A inteligência artificial, por libertar os humanos de certas tarefas (por exemplo, guiar carros), é semelhante à agricultura? Vê alguma semelhança entre as duas coisas?Eu vejo exactamente essa semelhança que acabou de mencionar. A agricultura criou novas oportunidades. A inteligência artificial e a tecnologia em geral criam também novas oportunidades. Mas não conheço nenhuma tecnologia que tenha trazido apenas coisas boas. A agricultura é um bom exemplo. Quando foi trazida para a Europa, foi muito marcante. Os primeiros agricultores ficaram cerca de 15 centímetros mais baixos do que os caçadores-recolectores a que sucederam. Inicialmente, a agricultura foi menos nutritiva e forneceu menos vitaminas. Os caçadores-recolectores que viviam em Portugal em 7000 a. C. eram bastante altos. Só depois da I Guerra Mundial é que os agricultores portugueses voltaram a ser tão altos como os caçadores-recolectores de Portugal de 7000 a. C. A chegada da agricultura também esteve associada a muitas novas doenças. A agricultura trouxe grandes benefícios, mas também grandes inconvenientes. Todas as tecnologias têm benefícios e inconvenientes. A inteligência artificial também tem benefícios, mas já está a trazer inconvenientes. Trabalhou em muitos campos, como antropologia, biologia, ornitologia, ecologia, história e geografia. Como vê a especialização actual na ciência, em que muitas vezes os investigadores estão focados apenas numa gama muito estreita de temas e técnicas?A especialização, tal como a agricultura e a inteligência artificial, tem benefícios e desvantagens. Consideremos a especialização da genética moderna. Com as modernas técnicas genéticas, podemos analisar o ADN de esqueletos de caçadores-recolectores portugueses de há 9000 anos. E podemos responder a perguntas acerca da pré-história que eram impossíveis de responder antes de termos estas novas técnicas, dos últimos sete anos. Essa é uma grande vantagem da especialização. A desvantagem da especialização é que é muito complicada e é preciso investir muito tempo a aprender estas técnicas genéticas modernas. Quem aprender estas técnicas, provavelmente, não terá muito tempo para estudar línguas, pintura, a música de Bach, os primeiros exploradores portugueses. Sabe menos. Em ciência, para se tirar conclusões, é preciso colaborar com outras pessoas. Mas há uma vantagem em ter muito conhecimento num cérebro só, em vez de em sete cérebros diferentes. A especialização, tal como a agricultura e a inteligência artificial, traz poder, mas também desvantagens. O que é que podemos fazer acerca disso? Podemos tentar minimizar as desvantagens, colaborando. Especialistas em genética a colaborar com linguistas e com arqueólogos, o que felizmente acontece cada vez mais. Os melhores especialistas sabem que não sabem outras coisas e que precisam de colaborar com pessoas que saibam.
REFERÊNCIAS:
Étnia Aborígenes Asiático
Risco de cancro nos testículos é elevado com marijuana e menor com cocaína
Um estudo publicado esta segunda-feira na revista Cancer, da Sociedade Americana de Cancro, confirma a relação entre o consumo recreativo de marijuana e um maior risco de desenvolver cancro nos testículos associando-a ainda a prognósticos mais graves. Os investigadores perceberam também que o mesmo risco é menor entre os consumidores de cocaína. (...)

Risco de cancro nos testículos é elevado com marijuana e menor com cocaína
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 2 Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.16
DATA: 2012-09-10 | Jornal Público
SUMÁRIO: Um estudo publicado esta segunda-feira na revista Cancer, da Sociedade Americana de Cancro, confirma a relação entre o consumo recreativo de marijuana e um maior risco de desenvolver cancro nos testículos associando-a ainda a prognósticos mais graves. Os investigadores perceberam também que o mesmo risco é menor entre os consumidores de cocaína.
TEXTO: A associação entre o consumo de marijuana e o risco de cancro de testículo já era conhecida mas, desta vez, os investigadores alargaram o âmbito da análise aos efeitos provocados pelo uso recreativo de outras drogas, desde cogumelos, a LSD ou cocaína, entre outras. Os resultados do estudo destacam a confirmação da “culpa” da marijuana no aumento de casos desta neoplasia e alertam para o facto de esta relação de risco existir não só no uso recreativo mas também no terapêutico (medicinal). Para verificar a relação entre o consumo recreativo de drogas com o risco de cancro do testículo, o grupo de cientistas liderado por Victoria Cortessis da Universidade da Califórnia do Sul, em Los Angeles, examinou 163 jovens entre os 18 e os 35 anos, caucasianos, com diagnóstico positivo e compararam os resultados com o obtido com 292 homens saudáveis, da mesma faixa etária e também caucasianos. Os resultados obtidos mostram que os homens com historial de uso de marijuana, têm duas vezes mais probabilidade de desenvolver um dos subtipos de cancro dos testículos: não seminomas (considerados mais agressivos e que afectam sobretudo homens mais jovens) e neoplasias mistas. Porém, segundo o artigo, o risco é maior nos consumidores pouco frequentes (menos do que uma vez por semana) e há menos tempo (menos de dez anos). De acordo com estes dados, os investigadores sugerem que os potenciais efeitos negativos do consumo de Marijuana e dos seus derivados devam ser tidos em conta, não só quando é usada para fins recreativos, também nas situações em que o uso tem fins terapêuticos. O cancro dos testículos é o mais comum em homens entre os 15 e os 45 anos e, apesar de ser raro, representa 2% dos casos diagnosticados. Este tumor maligno, tem uma taxa de sucesso de cura que ronda os 95%, mas muitos sobreviventes ficam com sequelas como, por exemplo, doenças cardiovasculares. Trata-se de um cancro que afecta principalmente jovens que nasceram com um testículo não-descido (criptorquidia), mas os antecedentes familiares da doença e os problemas de fertilidade são também factores de risco. É um tipo de cancro praticamente inexistente em asiáticos e africanos. O artigo publicado na Cancer, nota que “a incidência tem vindo a aumentar ao longo das últimas décadas o que implica uma mudança na exposição a um ou mais riscos não genéticos”. A marijuana tem sido associada a múltiplos efeitos adversos no sistema reprodutivo, do impacto na qualidade do esperma à impotência e infertilidade. O seu principal componente químico é o tetrahidrocanabinol (THC), um princípio activo alucinogénio, cujos receptores no nosso corpo estão instalados no cérebro, no coração, nos testículos e no útero. Por outro lado, alguns estados americanos e países como a Holanda ou a Bélgica, usam esta planta pontualmente, para aliviar sintomas relacionados com o tratamento do cancro, tais como as náuseas e os vómitos causados pela quimioterapia. Em relação ao uso da cocaína são ainda necessários mais estudos para se poderem validar resultados, mas, pela primeira vez, os investigadores perceberam que os homens que tinham usado cocaína apresentavam um risco reduzido nestes subtipos de cancro. Embora ainda não se saiba como é que influencia o cancro dos testículos, os testes de laboratório com animais, mostram que esta droga destrói as células germinativas (a maioria destes tumores tem origem nestas células). “Se isto for válido também para os humanos então a “prevenção” tem um preço muito alto” refere Victoria Cortessis, citada num comunicado de imprensa da Wiley. “ Embora as células germinativas deixem de poder desenvolver cancro, se elas são as primeiras a ser destruídas a fertilidade seria prejudicada”, acrescenta a investigadora.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave homens humanos consumo doença estudo corpo
Ter um seleccionador estrangeiro nunca deu um título mundial
O Mundial do Brasil será o segundo da história do torneio com mais treinadores estrangeiros. A Alemanha é a nação mais representada, Portugal tem Paulo Bento, Fernando Santos e Carlos Queiroz. (...)

Ter um seleccionador estrangeiro nunca deu um título mundial
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 2 Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento -0.12
DATA: 2014-05-29 | Jornal Público
SUMÁRIO: O Mundial do Brasil será o segundo da história do torneio com mais treinadores estrangeiros. A Alemanha é a nação mais representada, Portugal tem Paulo Bento, Fernando Santos e Carlos Queiroz.
TEXTO: O primeiro Mundial de futebol, realizado em 1930, no Uruguai, nem sequer tinha representantes de todos os continentes. A Espanha, por exemplo, não foi uma das quatro selecções europeias presentes entre os 13 participantes, mas esteve representada por dois treinadores: o catalão Juan Luque de Serrallonga, responsável técnico do México, e o madrileno Francisco Bru, que orientou o Peru. Foram dois dos cinco pioneiros estrangeiros no primeiro Campeonato do Mundo, seleccionadores que orientaram equipas de países dos quais não eram nacionais. Mas há um dado histórico que as selecções participantes no Mundial do Brasil terão de ter em consideração. Desde o uruguaio Alberto Suppici, em 1930, até ao espanhol Vicente del Bosque em 2010, nunca nenhuma selecção se sagrou campeã mundial sendo orientada por um seleccionador de outra nacionalidade. Nunca houve um Mundial que não tivesse treinadores estrangeiros. No Brasil, estarão representadas 19 nacionalidades nos bancos das 32 selecções. Catorze dos técnicos do Mundial brasileiro serão estrangeiros. São mais três em relação ao que foi disputado no Mundial de há quatro anos, na África do Sul, mas não é um recorde na história do torneio. Europa domina nos técnicosEm 2006, foram 16 em 32 selecções e o Brasil foi o país mais representado, com cinco técnicos. Para além de Carlos Alberto Parreira, na altura de regresso ao banco brasileiro depois do título conquistado em 1994, o Brasil tinha ainda Luiz Felipe Scolari (Portugal), Marcos Paquetá (Arábia Saudita), Zico (Japão) e Alexandre Guimarães (Costa Rica). Em 2014, apenas Scolari, de regresso ao banco da “canarinha”, representa os treinadores brasileiros, sendo que a nacionalidade dominante é a alemã, com quatro representantes. A Alemanha nunca teve um seleccionador que não fosse alemão e, no Brasil, vai continuar a ter Joachim Löw no banco para mais uma tentativa de conquistar o seu primeiro título mundial desde a reunificação, em Outubro de 1990 — nesse ano a RFA tinha sido campeã. Um antigo seleccionador alemão também estará em prova, Jurgen Klinsmann, mas como treinador dos EUA, enquanto Ottmar Hitzfeld repete a presença no Mundial como técnico da Suíça. Quanto a Volker Finke, o mais velho dos quatro (66 anos), vai fazer, como treinador dos Camarões, o seu primeiro Campeonato do Mundo. Logo a seguir à Alemanha, surgem quatro países com três treinadores: Argentina, Colômbia, Itália e Portugal, sendo que a Colômbia é treinada por um argentino, José Pekerman. Em termos de continentes, domina a Europa, com 19 representantes, seguido da América do Sul (8), mais dois de África e América do Norte, Central e Caraíbas. Tal como a Ásia, a Oceânia tem apenas um representante, o técnico da Austrália Ange Postecoglou, que não nasceu no país. Nasceu em Atenas, capital da Grécia, e chegou com cinco anos à Austrália, país por quem foi internacional. Das 13 selecções europeias, apenas três não são treinadas por nacionais do seu país: Rússia (Fabio Capello), Grécia (Fernando Santos) e Suíça (Ottmar Hitzfeld). Já metade das seis selecções sul-americanas tem nacionais de outros países no seu comando, mas dentro do mesmo continente. Os argentinos Pekerman e Jorge Sampaoli treinam, respectivamente, Colômbia e Chile, enquanto o colombiano Reinaldo Rueda comanda o Equador. Quanto aos quatro representantes da CONCACAF, apenas o mexicano Miguel Herrera treina a selecção do país onde nasceu. Das cinco selecções africanas, apenas duas têm treinadores naturais do país, o nigeriano Stephen Keshi e o ganês Akwasi Appiah. As restantes três (Argélia, Camarões e Costa do Marfim) têm técnicos europeus. As selecções asiáticas também têm uma predilecção por treinadores do “velho continente”. O único técnico asiático deste mundial é o sul-coreano Hong Myung-Bo, enquanto o Irão foi buscar o português (Carlos Queiroz) e o Japão tem o italiano (Alberto Zaccheroni).
REFERÊNCIAS:
Entidades EUA
Fábio Capello será o decano dos seleccionadores no Brasil
Alemães lideram a lista de treinadores no Mundial, com cinco representantes. Portugueses, argentinos, colombianos e italianos vão orientar três selecções. (...)

Fábio Capello será o decano dos seleccionadores no Brasil
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DATA: 2014-06-03 | Jornal Público
SUMÁRIO: Alemães lideram a lista de treinadores no Mundial, com cinco representantes. Portugueses, argentinos, colombianos e italianos vão orientar três selecções.
TEXTO: Juntos somam 18 nacionalidades e variam entre os 42 e os 67 anos. Defendem diferentes filosofias futebolísticas e propostas tácticas, mas apenas um irá levantar o troféu no dia 13 de Julho, em pleno Maracanã. São os 32 seleccionadores que vão iniciar a maratona do Mundial de 2014 com maior ou menor efusividade no banco. A Alemanha, com cinco representantes, é o país em destaque no Brasil na componente técnica, mas Portugal, com três, é igualmente uma referência na competição, partilhando a segunda posição deste ranking com a Argentina, Colômbia e Itália. A idade terá peso nesta prova, com 13 dos treinadores presentes a ultrapassarem a barreira dos 60 anos. Já abaixo dos 50 anos, serão apenas nove. Fabio Capello será o decano do certame, com 67 anos, e fará 68 ainda no decorrer da fase de grupos (no dia 18 de Junho, um dia depois de defrontar a Coreia do Sul). Nada que incomode a federação russa que já prolongou o vínculo com o treinador até 2018, ano em que festejará umas respeitáveis 72 primaveras. No extremo oposto, surge o francês Sabri Lamouchi, com 42 anos. O seleccionador da Costa do Marfim será o caçula deste Mundial, mas apenas por escassos 25 dias em relação ao alemão Niko Kovac. Paulo Bento surge no último patamar deste pódio, com 44 anos. Já Capello, é secundado pelo uruguaio Óscar Tabárez, com menos três meses que o italiano. Segue-se o inglês Roy Hodgson, com 66 anos. Ao nível da experiência acumulada em mundiais, Luis Felipe Scolari e Tabárez são imbatíveis. Os dois vão participar no terceiro campeonato das suas carreiras, com o seleccionador brasileiro a contar com o título de 2002 no seu currículo ao serviço da “canarinha”. Já com Portugal, alcançou um meritório quarto lugar em 2006, na Alemanha. Mais fiel ao seu país, foi o veterano treinador uruguaio, que já liderou a equipa nacional em duas outras fases finais: 1990 (oitavos-de-final) e 2010 (4. º lugar). Para além de Scolari, estará no Brasil apenas mais um treinador campeão mundial: o espanhol Vicente del Bosque, actual detentor do título. Os dois são fortes candidatos a somar o segundo troféu ao seu palmarés nesta prova. No total, serão 13 os técnicos com experiência em campeonatos do mundo, mas a maioria (19) será estreante na competição. Entre os portugueses, Carlos Queiroz é o único que já disputou uma outra fase final, em 2010, na África do Sul, com a selecção nacional. A Europa será, de longe, o continente mais destacado ao nível de treinadores em matéria de quantidade, com 20 representantes. Segue-se a América do Sul, com nove, África, com dois, e a Ásia com apenas um. No que diz respeito às nacionalidades dos seleccionadores, o Campeonato do Mundo do Brasil terá 18 diferentes para 32 selecções. Aliás, até aos dias de hoje, em todos os Mundiais houve seleccionadores a treinar selecções que não eram as “suas”. Mas também é verdade que nunca nenhuma selecção se sagrou campeã mundial sendo orientada por um seleccionador de outra nacionalidade. Se olharmos para os continentes, das 13 selecções europeias, apenas quatro não são treinadas por nacionais do seu país: Rússia (Fabio Capello), Grécia (Fernando Santos), Suíça (Ottmar Hitzfeld) e Croácia (Niko Kovac), embora este último caso seja especial, pois Kovac nasceu em Berlim, na Alemanha, mas tem raízes croatas, tendo mesmo optado por alinhar ao serviço desta selecção, ainda que tenha passado quase toda a sua carreira futebolística no seu país Natal. Já metade das seis selecções sul-americanas têm nacionais de outros países no seu comando, mas dentro do mesmo continente. Quanto aos quatro representantes da CONCACAF, apenas o mexicano Miguel Herrera treina a selecção do país onde nasceu e apenas duas selecções africanas têm treinadores naturais do país. Já nas selecções asiáticas apenas uma tem à sua frente um técnico asiático.
REFERÊNCIAS:
Étnia Asiático
“África é a última fronteira do capitalismo”
Atravessar fronteiras físicas e disciplinares é uma vocação de Achille Mbembe. A temática da passagem e do movimento é, aliás, uma chave para a sua compreensão da história e da cultura africanas. A sua perspectiva sobre o passado, o presente e o futuro de África implica ao mesmo tempo traçar uma genealogia da modernidade europeia, das categorias do pensamento que ela construiu, da racionalidade e da historicidade da figura do negro. (...)

“África é a última fronteira do capitalismo”
MINORIA(S): Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 10 Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-12-31 | Jornal Público
SUMÁRIO: Atravessar fronteiras físicas e disciplinares é uma vocação de Achille Mbembe. A temática da passagem e do movimento é, aliás, uma chave para a sua compreensão da história e da cultura africanas. A sua perspectiva sobre o passado, o presente e o futuro de África implica ao mesmo tempo traçar uma genealogia da modernidade europeia, das categorias do pensamento que ela construiu, da racionalidade e da historicidade da figura do negro.
TEXTO: Achille Mbembe esteve em Portugal, em Outubro, para uma conferência na Culturgest que tinha por título Para Um Mundo Sem Fronteiras. A questão da fronteira é fundamental na obra deste teórico africano, nascido nos Camarões, em 1957, com doutoramento em Ciência Política feito em Paris (na Sorbonne), professor na Universidade de Witwatersrand, em Joanesburgo, África do Sul, e também em Harvard, nos Estados Unidos. A sua obra, objecto de um enorme reconhecimento internacional e traduzida em todo o mundo, compreende livros tão importantes como Crítica da Razão Negra, Políticas da Inimizade (estes dois traduzidos em português e editados pela Antígona) e De la Postcolonie. Essai sur l’imagination politique dans l’Afrique contemporaine. As elaborações teóricas de Mbembe atravessam várias fronteiras disciplinares: são obra de filosofia, mas também de antropologia, de história, de ciência política, de crítica e teoria da cultura. O seu conceito de “pós-colónia”, que é simultaneamente um tempo específico e uma formação particular do poder, contribuiu certamente para acentuar uma ideia que nesta entrevista Mbembe classifica como um equívoco e explica porquê: a de que se inscreveria no campo, muito heterogéneo, dos estudos pós-coloniais. Em Crítica da Razão Negra, ele mostra que “o negro”, enquanto figura construída pela Europa, não pode ser pensado senão fazendo uma genealogia da modernidade, da racionalidade moderna (daí a referência à crítica kantiana), do universalismo e da dinâmica do capitalismo. A “razão negra” surge assim como a sombra do Iluminismo, a sua parte obscura sem a qual ele não pode ser completamente compreendido. Tentando explicar a racionalidade que inventou um “sujeito de raça”, isto é, um sujeito do qual não se sabe qual é a parte humana e qual é a parte animal, Mbembe faz explodir do interior o conceito de “raça”. Nesse livro, encontramos logo no início esta afirmação: “A Europa já não constitui o centro de gravidade do mundo. Ora é dessa perda de centralidade, da “autoprovincialização” da Europa como acontecimento fundamental — diz Mbembe — que se devem retirar conclusões para o continente africano. A África, nesta nova reconfiguração geopolítica do mundo, os desafios que ela tem pela frente para se tornar o seu próprio centro e para dissolver as fronteiras internas que interiorizou contra a sua própria cultura do movimento: eis um dos seus temas importantes. Mbembe fornece-nos assim um olhar sobre a história cultural de África, sobre os seus atributos e as suas possibilidades, numa perspectiva teórica. Na sua conferência, na Culturgest, falou da questão das fronteiras, desse paradoxo em que vivemos hoje: a tecnologia apaga as fronteiras, mas são criados condicionamentos cada vez mais fortes para as atravessar. Creio que vivemos, de facto, à escala planetária, um paradoxo. A época é a da conexão, graças aos avanços tecnológicos do nosso tempo, mas também por toda a espécie de trocas económicas e transacções monetárias, incluindo o fluxo de ideias e de imagens que irrigam hoje as sociedades do planeta. Mas tudo isso é acompanhado por um aumento das dificuldades que experimentam certos sectores da população em movimentar-se. Parece-me que há, à escala mundial, uma redistribuição completamente desigual da capacidade de circular, de se estabelecer onde se quer. E, portanto, tendo em conta a evolução do mundo, as evoluções demográficas, ecológicas e militares que se anunciam no horizonte, tenho a impressão de que um dos grandes desafios do século XXI será efectivamente o governo das mobilidades humanas. Esta questão, por agora, é mal colocada porque é posta unicamente em termos securitários. Uma parte do meu trabalho consiste em explorar as maneiras como se poderia colocá-la de outra maneira, na perspectiva de um mundo comum, a partilhar, sendo essa partilha a própria condição da sua sobrevivência. Essas restrições da mobilidade atingem de maneira muito forte o continente africano. Os africanos não são bem-vindos em nenhuma parte do mundo. . . Na história moderna, desde o século XV até hoje, os africanos sempre estiveram sujeitos a constrangimentos para se movimentarem. É sem dúvida o único povo do mundo que foi reduzido a esta condição durante tanto tempo. Sempre que tiveram de se movimentar, não o fizeram em liberdade, foi porque estavam forçados a isso: o comércio da escravatura atlântica, as corveias na época colonial e hoje o espaço colossal de mais de 50 Estados que, em média, têm cada um deles quatro ou cinco fronteiras. Essas fronteiras internas foram construídas pelo colonizador?Sim, são fronteiras herdadas da colonização que, logo a seguir às independências, foram ratificadas e consideradas inalteráveis pelos Estados independentes. . . Em suma, África interiorizou a categoria de fronteira, tal como ela foi criada na Europa. É de facto uma categoria que não corresponde a quase nada na história e na cultura dessas sociedades. Nas sociedades africanas pré-coloniais, o movimento, a circulação, é a condição de princípio de toda as dimensões da sociedade: as culturas, as religiões, os sistemas matrimoniais, os sistemas comerciais, tudo isso era o produto do movimento. O movimento precede o espaço, o território. É o movimento que fabrica o espaço. É completamente diferente da concepção europeia, em que o espaço vem antes do movimento. Em África é o contrário. Portanto, no paradigma africano pré-colonial das relações entre o espaço e o movimento, as fronteiras não existem porque a fronteira é o que bloqueia, por definição, a circulação do fluxo vital. A vida está no movimento, não está necessariamente no espaço. Se ela se traduz em espaço, é através do modo como o espaço é apreendido num movimento. Trata-se, portanto, de duas filosofias completamente opostas. Deste ponto de vista, a filosofia africana do movimento, pré-colonial, assemelha-se a uma lógica própria do mundo digital, em que, no fundo, se trata de pôr em conexão, em rede, e não de categorizar, de classificar, de hierarquizar e limitar o movimento. Disse também, na sua conferência, que África é a última fronteira do capitalismo. É como se fosse um laboratório moderno?É a última fronteira do capitalismo, no sentido objectivo das coisas, no sentido em que o regime capitalista se universalizou e não há hoje praticamente nenhuma sociedade que lhe escape, mesmo as sociedades nominalmente comunistas, com a excepção da Coreia do Norte. É um regime cujo fim é o de não ter limites. Ora, é em África que encontramos hoje as últimas jazidas de quase todos os recursos de que precisa o capitalismo para funcionar no futuro. E também os recursos demográficos, na medida em que até ao final do século uma pessoa em cada três ou quatro virá de África. E os recursos minerais, botânicos, os recursos das espécies vivas, orgânicas e vegetais. É a única parte do mundo que não foi ainda completamente capturada pela lógica da exploração infinita. É por isso que digo que é a última fronteira do capitalismo. Disse, numa entrevista, há alguns anos, que vai chegar o tempo da África. Eis uma proposição muito esperançosa, optimista. Continua a acreditar nela?Absolutamente. Quando nos inscrevemos num ciclo histórico longo, numa perspectiva de longa duração, é evidente que esse tempo da África está à nossa frente. Porque o curso histórico das outras regiões do mundo terá atingido os seus limites. Vê-se isso hoje já na Europa. Em larga medida, a Europa faz parte muito mais do passado do mundo do que do seu futuro, do qual ela não será a locomotiva. Ela já não pensa noutra coisa senão em dobrar-se sobre si própria e defender o que foi, na impossibilidade de projectar o que vai ser. A categoria do futuro desapareceu do seu horizonte. Desapareceu até do seu vocabulário. Os Estados Unidos estão mergulhados numa crise muito séria. Vemos muito bem os seus efeitos no sistema de governo, na erosão do seu modelo de democracia liberal. Também aí há um desejo de recuo em relação ao mundo, que se manifesta na guerra comercial, no fantasma das fronteiras e dos muros, no enorme medo que se apoderou de uma parte da sua população branca. Neste cenário, é claro que a Ásia está em plena ascensão, a China em particular, e sabemos que ela sabe calcular o tempo em função de uma duração quase milenar. Creio que uma grande parte do futuro da África irá jogar-se na China, nas relações que a África irá construir com a China. Não há aí o perigo de se reproduzir uma nova relação segundo um modelo neocolonial?Sim, há um perigo em toda a relação geoestratégica porque se trata sempre de uma relação de poder e não de uma relação justa. Não é uma questão de caridade, é uma questão de interesse e uma relação de antagonismo. Tratar-se-á, para África, de construir de maneira inteligente esse antagonismo com a China, para que ele seja produtivo e sirva os seus interesses a longo prazo. Podemos então colocar por agora bastantes questões. Podemos, por exemplo, pensar que África, para já, ainda não compreendeu o que é que está em jogo, a longo prazo. E não conseguiu, com a China, sair da lógica de uma relação de extracção. O drama de África, na longa duração, foi a sua incapacidade para aproveitar o melhor da sua população e o melhor do seu trabalho e o melhor das suas riquezas. E porque é que isso acontece?A questão é essa: porque é que ela não foi capaz de criar as condições que lhe permitiriam tirar proveito de tudo isso? Houve a exploração do melhor da sua população, dos mais jovens, dos que estavam na idade de trabalhar, do século XV ao século XIX, nas Américas. Retirou-se do subsolo as riquezas minerais, e uma grande parte dos melhores africanos não estão em África, estão noutro sítio, nos Estados Unidos, em França, etc. O grande enigma de África é este. A resposta à questão de saber porque é que África não foi capaz de guardar para si o melhor das suas riquezas e da sua população é complexa. Se quiser beneficiar do facto de o mundo pender agora para a Ásia, será necessário aproveitar de outra maneira as suas capacidades. Mas por agora não é o que se está a passar: a China chega, extrai as riquezas e vai-se embora. Não é assim que África vai conseguir uma relação benéfica com a China. Um dos seus livros chama-se, no original francês, De la potscolonie. E o senhor é conhecido como uma das vozes mais prestigiadas e autorizadas nesse domínio dos estudos pós-coloniais. Não, não é verdade, eu não pratico a teoria pós-colonial. Já o disse muitas vezes, mas ninguém me quer ouvir. A “postcolonie”, que dá o título a esse meu livro, não é a mesma coisa que a teoria pós-colonial. Não me oponho de modo nenhum à teoria pós-colonial, não faço como alguns que não compreendem nada desta questão, mas que se opõem ao que não compreendem, mas não me reivindico dessa herança intelectual. Em De la postcolonie, a questão não é da nossa relação com o outro, a nossa relação com o Ocidente, aquilo que constitui o coração da teoria pós-colonial. A teoria pós-colonial tenta pensar no plano literário, histórico, político, etc, a relação que terá existido entre as sociedades antigamente colonizadas e as potências coloniais. O projecto dos estudos pós-coloniais consiste em procurar o sentido do mundo que foi o produto desse encontro, da sua complexidade e da sua actualidade no tempo contemporâneo. É um projecto absolutamente necessário. Eu, o que faço com a “postcolonie” é fazer incidir a interrogação sobre si próprio, não sobre a relação com o outro. Trata-se do juízo sobre si próprio, enquanto na teoria pós-colonial toda a compreensão de si se faz em relação ao outro. Em De la postocolonie, a questão é a do processo de si sobre si próprio; o eu perante o seu próprio tribunal e não perante o tribunal do outro. E não pensa que esse pensamento muito auto-reflexivo é uma maneira muito ocidental de pensar? A Europa cultivou de maneira obsessiva o pensamento sobre si própria. Sim e não. Evidentemente, nós somos herdeiros do Ocidente, e não sou eu que me vou pôr a negar essa herança, faço parte dela e partilho-a. E creio que a força das pessoas que vêm de África advém das suas múltiplas genealogias. Enquanto muitos dos meus colegas, na América e na Europa, só conhecem a sua tradição. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Um dos seus livros chama-se Crítica da Razão Negra. O título remete para Kant, para a razão crítica, muito europeia, muito ocidental. Utiliza os instrumentos da razão crítica sem complexos. . . Sim. É preciso deixar de ser complexado em relação a uma herança que nos formou, mas que em contrapartida nós contribuímos para ela. Se pretendemos que há uma dose de universalidade no pensamento europeu, somos nós que lhe concedemos essa hipótese de sair das suas fronteiras e não deve haver nenhuma vergonha, do meu ponto de vista, em assumir isso. E também nenhuma vergonha em ir aos recursos críticos internos da Europa, já que o que distingue a Europa das outras regiões do mundo é que Europa desenvolveu e refinou as técnicas de autocrítica. Ela produziu os elementos que lhe permitem criticar-se a si própria. Mas também há fabulosas tradições africanas de auto-análise que não utilizam as mesmas técnicas que a tradição europeia, que se baseiam noutras formas de metafísica. Uma grande parte da metafísica ocidental são metafísicas do ser, são questões de ontologia. Boa parte das metafísicas africanas pré-coloniais é metafísica da relação, as grandes interrogações partem da categoria da relação. Daí que a auto-reflexividade proceda de maneira diferente. Procede, por exemplo, pelas técnicas de adivinhação, que são uma maneira de introspecção, mas pela mediação dos objectos. Porque se considera que o universo não é hierárquico, não é uma questão de verticalidade e de horizontalidade, considera-se que o universo é reticular. E, se o universo é reticular, isso quer dizer que o eu só acede a si pela mediação estrutural e permanentemente ambígua de alguém, de outro ser vivo. É a isto que a Europa chamou “animismo”. E quando nomeia o animismo é como se falasse de si mesma e não conseguisse sair da tautologia, das suas próprias categorias. Tudo o que disse supõe também uma outra concepção da técnica, da instrumentalidade. Evidentemente. Nós não aspiramos a ser os mestres da Terra. Partilhamos a Terra com outras entidades, que são todas vivas, não há entidades mortas porque mesmo as entidades mortas referem-se de algum modo a uma capacidade de agir, embora um agir de maneira diferente das entidades vivas. Tudo é capaz de agir, capaz de ser mobilizado em modalidades de acção diferentes. E, portanto, por princípio, a capacidade de agir é partilhada com os antepassados, com a Natureza, com a atmosfera, com as forças naturais, as tempestades, etc. Assim, se se quiser viver bem e por muito tempo é necessário aprender a coexistir com tudo, orgânico, o natural, o humano, nãohumano. É o que muitos descobrem, hoje, com a noção de Antropoceno. Os filósofos descobrem que aquilo que eles chamavam “animismo”, falando dos outros, é no fundo a condição de sobrevivência do nosso planeta. Se queremos hoje salvarmo-nos, não podemos continuar a contentar-nos com um só arquivo, é necessário ir aos arquivos do mundo inteiro. Esse é um grande desafio. Está a sugerir que a Europa está encerrada no seu arquivo?Sim, e o seu próprio arquivo não lhe permite resolver os grandes enigmas do nosso tempo, tem de sair desse fechamento num arquivo único, ter em conta de que existem outros. Por isso é que reivindico a ideia de um pensamento-mundo, que é forçosamente um pensamento da travessia e não um pensamento pós-colonial. Só um pensamento da travessia é que se pode alimentar nos arquivos do mundo, só ele pode sentir-se em casa na tradição europeia, na tradição africana, na tradição asiática. Evidentemente, isso comporta enormes riscos, mas é preciso assumi-los como parte integrante do próprio acto de pensar. Porque pensar sem riscos não quer dizer nada. E por aqui se vê que não sou um teórico pós-colonial.
REFERÊNCIAS:
Étnia Africano
China treina cães para detectar tráfico de espécies selvagens
Projecto tenta travar o crescente movimento ilegal de marfim, cornos de rinocerontes, partes de tigres e até de animais vivos. (...)

China treina cães para detectar tráfico de espécies selvagens
MINORIA(S): Animais Pontuação: 17 Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2013-08-08 | Jornal Público
SUMÁRIO: Projecto tenta travar o crescente movimento ilegal de marfim, cornos de rinocerontes, partes de tigres e até de animais vivos.
TEXTO: Cães farejadores de drogas é o que não falta em aeroportos internacionais. Mas cães que farejam outros animais escondidos em malas, nisto provavelmente a China está a ser pioneira. São três labradores, treinados especificamente para ajudar no combate ao tráfico ilegal de espécies selvagens. No final de Julho, passaram com sucesso pelo seu exame final, detectando peças de marfim, ossos de tigres, cornos de rinocerontes e até tartarugas vivas nas esteiras de bagagens de um aeroporto, num contentor e numa centro dos correios. É o resultado de uma parceria das autoridades chinesas e da organização não-governamental Traffic, com o apoio da WWF. O país-alvo não foi escolhido por acaso. A China é um destino privilegiado do tráfico ilegal de espécies selvagens, recebendo animais ou partes de animais sobretudo do Sul e Sudeste asiático. Segundo a Traffic, entre 2000 e 2012, as autoridades chinesas fizeram apreensões de ossos, patas, carcaças, peles e exemplares vivos de tigres equivalentes a 156 animais. O marfim entra no país seja em grandes carregamentos em contentores, seja trazido nas malas de turistas, no seu regresso ao país. “A China está a fazer mais apreensões de marfim do que qualquer outro país do mundo neste momento”, disse ao PÚBLICO Richard Thomas, porta-voz da Traffic. “São quase duas por dia, sem contar com as centenas de chineses que são identificados noutros países com marfim ilegal”. Em muitas apreensões, há vários itens proibidos juntos. Na quarta-feira, as autoridades de Hong Kong confiscaram um lote de 1120 presas de elefante, 13 cornos de rinoceronte e cinco peles de leopardo, avaliados em cerca de quatro milhões de euros. “A utilização de cães farejadores é uma nova abordagem para detectar o contrabando de espécies selvagens e irá aumentar a eficácia na linha de frente do nosso trabalho”, afirma o chefe do programa agora lançado pelo Departamento Anti-Contrabando dos serviços alfandegários chineses, Jun Tan, citado num comunicado da Traffic. O programa está a atrair o interesse de países próximos, como o Butão, Índia, Laos, Nepal, Vietnam e Rússia. Em meados de Junho, as autoridades chinesas encontraram 213 patas de urso numa carrinha proveniente da Rússia. A Traffic está a cooperar com a China desde 2011 neste projecto. Os três labradores, mais os seus treinadores, serão os primeiros a serem posicionados em postos de fronteira, na província de Yunnan - que é uma das principais portas de entrada do contrabando de espécies selvagens.
REFERÊNCIAS:
Palavras, expressões e algumas irritações: Mediterrâneo
Nos últimos anos, este mar azul, de águas muito salinas e temperaturas amenas, tem sido notícia não pela geografia física, mas pela geografia humana. Em rigor, desumana. (...)

Palavras, expressões e algumas irritações: Mediterrâneo
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 7 Asiáticos Pontuação: 6 Migrantes Pontuação: 5 Refugiados Pontuação: 5 | Sentimento 0.0
DATA: 2018-06-21 | Jornal Público
SUMÁRIO: Nos últimos anos, este mar azul, de águas muito salinas e temperaturas amenas, tem sido notícia não pela geografia física, mas pela geografia humana. Em rigor, desumana.
TEXTO: Escreve um dicionário comum sobre “Mediterrâneo”: “Mar que banha a Europa e os continentes africano e asiático. ” Descreve ainda: “Que se situa entre terras, continentes. ”A enciclopédia geográfica é mais rigorosa, como se esperaria: “Mar intercontinental, situado entre a Europa meridional o Norte de África e o Sudoeste da Ásia. Pelo Ocidente comunica com o Atlântico, através do estreito de Gibraltar, e por Este, através do canal do Suez, com o Índico. A sua extensão (2. 505. 000km2), o seu tráfego e a sua história tornaram-no um dos mares mais importantes do globo. ”Nos últimos anos, este mar azul, de águas muito salinas e temperaturas amenas, tem sido notícia não pela geografia física, mas pela geografia humana. Em rigor, desumana. De tal modo que nasceu uma organização de nome SOS Mediterrâneo. As mais recentes envolvem as 629 pessoas a bordo do Aquarius, que ficarão a salvo (do mar). Mas não faltam histórias dramáticas, que transformaram o Mediterrâneo num imenso cemitério. E assim vai continuar, como alertou a directora-geral da SOS Mediterrâneo, Sophie Beau: “É a ausência de meios cruciais para salvar vidas e são novas vítimas que acontecem debaixo dos nossos olhos, são mortes anunciadas. ” E questionava: “Enquanto o Aquarius vai fazer 1500 quilómetros para desembarcar os migrantes em Valência, o que se passa na zona de naufrágio?”Dizia recear “um grande vazio ao largo da costa líbia, onde todos os dias dezenas de pessoas tentam atravessar em embarcações improvisadas”. Na terça-feira, 41 náufragos foram socorridos e pelo menos 12 pessoas morreram. Notícia de dia 3 de Junho: “De acordo com a Organização Internacional para as Migrações (OIM), desde o início de 2018 e até 30 de Maio chegaram à Europa 32 mil migrantes por via marítima. Cerca de 660 morreram ao tentar atravessar o Mediterrâneo. Em 2017, chegaram 70. 870 pessoas por mar e 1724 morreram na travessia. ”Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Título no mesmo dia: “Ilhas de sonho no Mediterrâneo para ir de férias aqui ao lado. ”Como bem reflectiu Jorge Almeida Fernandes, no artigo “Quando faltam as ‘boas notícias’”, “vivemos uma época em que domina a incerteza, bem resumida na expressão ‘já não entendo este mundo’”. É exactamente isso. A rubrica Palavras, expressões e algumas irritações encontra-se publicada no P2, caderno de domingo do PÚBLICO
REFERÊNCIAS:
Étnia Africano Asiático
ERSE quer evitar que Galp exija aos consumidores devolução de 150 milhões
Regulador defende descida dos preços do gás natural e quer criar solução que impeça Galp de recuperar nas tarifas o montante da contribuição extraordinária. (...)

ERSE quer evitar que Galp exija aos consumidores devolução de 150 milhões
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 7 Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento 0.2
DATA: 2015-05-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: Regulador defende descida dos preços do gás natural e quer criar solução que impeça Galp de recuperar nas tarifas o montante da contribuição extraordinária.
TEXTO: A Entidade Reguladora para os Serviços Energéticos (ERSE) quer garantir que mesmo que a Galp conteste em tribunal a taxa extraordinária de 150 milhões de euros aplicada aos seus contratos de importação de gás natural, e ganhe, os consumidores não vão ser obrigados a devolver futuramente esta quantia nas suas facturas mensais. A contribuição extraordinária de 50 milhões de euros anuais a aplicar à Galp até 2017 foi anunciada pelo Governo em Janeiro e aprovada na Assembleia da República na semana passada. Com ela, o ministro da Energia quer que as tarifas de gás natural desçam entre 3% a 5% para os consumidores domésticos e industriais (que concentram a fatia de leão do consumo de gás) já a partir de Abril, quando a ERSE efectuar a próxima revisão tarifária. “Certamente que nós, no dia 15 de Abril, iremos apresentar a nossa proposta de tarifas e, nesse momento, iremos também explicitar a metodologia que iremos adoptar para que essa possibilidade, a de que haja desvios associados à aplicação dessa lei, não possa existir”, disse Vitor Santos esta quinta-feira, à margem de um encontro com a imprensa para apresentar novas iniciativas no âmbito da defesa dos consumidores. “Vamos apresentar uma solução que blinde essa situação e que não crie ónus para mais tarde”, garantiu o regulador a propósito da possibilidade de a Galp recorrer a tribunal para ser ressarcida e ser-lhe dada razão. Escusou-se, no entanto, a adiantar mais detalhes. “Faz todo o sentido que haja partilha de benefícios relativamente à venda dos excedentes desses contratos”, disse Vítor Santos, lembrando que essa já tinha sido a posição defendida pela entidade reguladora em 2006, quando o mercado do gás foi reestruturado e a actividade de transporte passou para a REN, ficando a Galp com a distribuição e a comercialização. Nessa ocasião, a empresa conseguiu manter na sua esfera os contratos de aprovisionamento de longo prazo com a Argélia e a Nigéria, os chamados contratos take or pay. “Em 2006, chegámos a publicar regulamentos que defendiam esse perspectiva, depois houve a publicação de um decreto-lei e a modificação de um contrato de concessão que contrariou essa posição”, lembrou Vítor Santos. Face aos diplomas publicados pelo então ministro da Economia, Manuel Pinho, a ERSE (à data presidida por Jorge Vasconcelos) foi forçada a alterar os seus regulamentos, mas a posição actual "mantém-se a mesma que em 2006", assegurou o actual presidente. Esta posição foi, aliás, defendida num parecer enviado pela ERSE à Assembleia da República no processo de aprovação da proposta do Governo. Sobre o montante em cima da mesa (50 milhões por ano, a pagar em três anos, até 30 de Maio) o presidente da ERSE reconheceu que “são valores que assentam em estimativas e é sempre possível chegar a diferentes cenários para essas situações”. Mas o que “é importante para esta matéria é que, tendo havido de facto venda de excedentes e não tendo os consumidores beneficiados dessa situação, que de alguma maneira o possam ser”. Daí que a ERSE considere que os 150 milhões de euros são “um valor de referência que parece aceitável”. “Estamos absolutamente de acordo com o processo de partilha de benefícios”, reafirmou o regulador. Os contratos take or pay implicam que a Galp compre as quantidades pré-estabelecidas aos seus fornecedores, mesmo que não tenha procura. Quando o consumo de gás em Portugal começou a diminuir, a empresa liderada por Ferreira de Oliveira desviou estes excedentes para os mercados asiáticos, onde a procura aumentava, enquanto os preços subiam nos mercados internacionais. É nas mais-valias geradas neste processo que o Governo (e o regulador) vêem os benefícios que a Galp não partilhou com os consumidores, pelos contratos que assinou enquanto ainda era a incumbente. No diploma que incluiu estes contratos de longo prazo na lista de activos sob os quais incide a contribuição extraordinária sobre o sector energético (CESE), refere-se que a Galp só será compensada com os chamados ajustamentos tarifários positivos (os montantes que a empresa tem direito a receber a cada revisão trimestral das tarifas para acautelar desvios de mercado) se pagar a CESE. O direito de receber, através das tarifas de gás natural, o montante dos ajustamentos tarifários referentes a anos anteriores, definidos para efeitos de sustentabilidade de mercados e dos encargos financeiros associados devidos à entidade titular da licença de comercialização de último recurso grossista de gás natural […] fica condicionado ao pagamento integral” da CESE, diz o documento. Na sua proposta de lei, o Governo recordava que a extensão da CESE aos contratos de gás reconhecia "as condições vantajosas inerentes à atribuição, pelo Estado, do título que habilita [à Galp] o exercício da actividade em causa e, logo, da detenção dos mencionados contratos e os benefícios daí decorrentes”.
REFERÊNCIAS:
População estrangeira volta a aumentar após seis anos em queda
Há cada vez mais cidadãos de países da União Europeia e cada vez menos brasileiros e africanos com autorização de residência no país. SEF emitiu no ano passado quase 45 mil novos títulos de residência para estrangeiros. (...)

População estrangeira volta a aumentar após seis anos em queda
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 5 Migrantes Pontuação: 11 Asiáticos Pontuação: 6 | Sentimento -0.12
DATA: 2017-07-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Há cada vez mais cidadãos de países da União Europeia e cada vez menos brasileiros e africanos com autorização de residência no país. SEF emitiu no ano passado quase 45 mil novos títulos de residência para estrangeiros.
TEXTO: Depois de seis anos de reduções sucessivas, o número de estrangeiros residentes em Portugal voltou a aumentar em 2016. Há cada vez mais cidadãos de países da União Europeia e cada vez menos brasileiros e africanos com autorização de residência no país. Esta inversão da tendência de decréscimo de residentes estrangeiros — que se verificava desde 2010 — é destacada no Relatório de Imigração, Fronteiras e Asilo 2016 do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), que vai ser apresentado nesta segunda-feira em Lisboa e que dá conta também do significativo aumento dos pedidos de asilo verificado no ano passado. Em 2016, e tendo em conta o fluxo de entradas e saídas de imigrantes, a estrutura das dez nacionalidades mais representativas no mapa dos estrangeiros residentes em Portugal alterou-se. Os franceses saltaram para o top-10 de nacionalidades com maior peso, devido ao acréscimo no número de autorizações de residência (mais 33%), ao mesmo tempo que os britânicos passaram a ser a sexta nacionalidade mais relevante, suplantando já os angolanos residentes em Portugal. No final do ano havia 19. 384 cidadãos britânicos a residir cá. A alteração da lista das 10 principais nacionalidades residentes no país está relacionada com as aquisições de nacionalidade portuguesa de cidadãos extracomunitários, explica ainda o SEF no relatório. Apesar de a nacionalidade brasileira continuar a ser, de longe, a mais representativa desta lista (81. 251 residentes, no final do ano passado), o número de cidadãos brasileiros com autorização de residência voltou a diminuir no ano passado, como já estava a acontecer desde 2011. Os dados que constam do relatório anual do SEF permitem, aliás, ter uma ideia do ritmo acelerado desta espécie de debandada: no período entre 2010 e 2016, são menos 38. 111 a residir em Portugal. Agora, a seguir aos brasileiros, que representam um quinto do total, na lista dos principais residentes surgem os cabo-verdianos, os ucranianos e os romenos. No quinto lugar aparecem os chineses. Os franceses figuram em nono lugar, já à frente dos espanhóis. Ao mesmo tempo que os pedidos de nacionalidade aumentaram, a emissão de novos títulos de residência disparou. Em 2016 foram emitidos quase 45 mil novos títulos de residência, o que representa um crescimento de 24% face a 2015. Este aumento é explicado em boa parte pelo "acréscimo de autorizações para trabalho subordinado", mas igualmente pelo crescimento do número de nacionais da União Europeia que escolheram vir viver para cá. É óbvio o interesse crescente de Portugal como morada para cidadãos de vários países da União Europeia. São dois os principais "factores de atractividade" a justificar este aumento de residentes, segundo o SEF. Por um lado, a percepção de Portugal como país seguro e, por outro, as vantagens fiscais decorrentes do regime para o residente não habitual — somos cada vez mais procurados por reformados de vários países, graças ao regime fiscal para residentes não habituais. A União Europeia, sintetiza o SEF, “foi a zona geográfica que mais sustentou o crescimento dos estrangeiros residentes em Portugal, juntamente com as nacionalidades oriundas do continente asiático, embora com uma expressão quantitativa bastante menor”. "Depois dos anos da crise económica e financeira, parece que Portugal está de novo a atrair mais imigrantes", comenta a presidente da Associação Portuguesa de Demografia, Maria Filomena Mendes, que, sem conhecer ainda o relatório do SEF, especula que é possível que se esteja a desenhar um "novo perfil de imigrante" em Portugal. O aumento dos residentes estrangeiros, nota, é sempre um fenómeno que contribui para compensar, ainda que em pequena escala, o decréscimo populacional que há anos afecta Portugal. O que resta saber é qual a estrutura etária destes novos residentes. No passado recente, a imigração revelou-se fulcral para atenuar a quebra da natalidade em Portugal, porque os imigrantes têm, em média, mais filhos do que os portugueses, lembra a especialista, que diz que é preciso aguardar mais algum tempo para ver se a tendência persiste. Dos quase 400 mil estrangeiros residentes em Portugal, quase metade escolheram o distrito de Lisboa como morada e mais de 63 mil concentram-se no de Faro. Setúbal é o terceiro distrito com mais estrangeiros residentes (36. 175) e só a seguir surge o Porto, com mais de 24 mil. Quase todos os distritos do litoral e do interior registaram um acréscimo no número de imigrantes no ano passado. As excepções são Setúbal (menos 2, 2%), Lisboa (menos 0, 2%) e Vila Real e Viseu (ambos com uma redução de 0, 1%). O SEF adianta ainda que o investimento total no âmbito do regime especial de autorização de residência para actividade de investimento — os chamados vistos gold — suplantou os 874 milhões de uros, 787 milhões dos quais relativos a operações de aquisições de imóveis. No ano passado foram aprovados 1414 processos deste tipo, mas apenas foi concedido um visto gold para a criação de, pelo menos, dez postos de trabalho. Os beneficiários dos vistos gold em 2016 foram sobretudo chineses (848), brasileiros (142) e sul-africanos (62). Os pedidos de asilo voltaram a aumentar no ano passado, à semelhança do que já tinha acontecido em 2015. No ano passado, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) recebeu 1469 pedidos de protecção internacional, mais 64% do que no ano anterior, “o maior número de pedidos nos últimos 15 anos”, lê-se no Relatório Imigração, Fronteiras e Asilo. Do total de pedidos recebidos ao longo do ano passado, 428 foram apresentados por sírios, 117 por iraquianos e, no conjunto dos cidadãos africanos, o destaque vai para nacionais da Eritreia (248). Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. O SEF adianta ainda que no ano passado concedeu 267 autorizações de residência por razões humanitárias, quase o dobro do ano anterior. Do total de pedidos de asilo, quase 1200 foram formulados no território nacional e 271 foram apresentados nos postos de fronteira. O SEF lembra que, “no âmbito da resposta à crise migratória na Europa”, até ao final do ano passado Portugal recebeu e acolheu 781 requerentes de protecção internacional provenientes de Itália e da Grécia.
REFERÊNCIAS:
Entidades SEF
Há mais mulheres protagonistas de grandes filmes – mulheres brancas
Mad Max, Hunger Games, Star Wars, Cinquenta Sombras ou Descarrilada: em 2015 houve mais filmes de sucesso com mulheres nos papéis principais. Mas quanto menos branca, menos tempo de antena, revela estudo. (...)

Há mais mulheres protagonistas de grandes filmes – mulheres brancas
MINORIA(S): Africanos Pontuação: 5 Asiáticos Pontuação: 6 Mulheres Pontuação: 17 | Sentimento 0.433
DATA: 2017-06-02 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20170602172045/https://www.publico.pt/1722967
SUMÁRIO: Mad Max, Hunger Games, Star Wars, Cinquenta Sombras ou Descarrilada: em 2015 houve mais filmes de sucesso com mulheres nos papéis principais. Mas quanto menos branca, menos tempo de antena, revela estudo.
TEXTO: “Os números estão decididamente a ir na direcção certa” é uma frase que Martha M. Lauzen, responsável pelo estudo anual que contabiliza o número de actrizes com papéis nos filmes mais vistos dos EUA, não diz muitas vezes. Mas em 2015, segundo o Center for the Study of Women in Television and Film, houve mais 10% de protagonistas no feminino do que em 2014. Contudo, e como denota anualmente o estudo mas este ano está a ser mais notado, as actrizes negras, asiáticas ou hispânicas não têm números tão positivos. Em 2015, o ano de Charlize Theron em Mad Max: Estrada da Fúria, de Jennifer Lawrence no final de Hunger Games, de Daisy Ridley em Star Wars: Despertar da Força ou de Amy Schumer ser Descarrilada, as actrizes tiveram 22% dos papéis principais nos 110 filmes mais rentáveis – uma melhoria em relação aos 12% de 2014, “um ano excepcionalmente mau”, como escreve Lauzen no relatório. Desdobrando as contas para papéis de personagens mais relevantes e personagens com falas, as actrizes conseguiram 34% e 33%, respectivamente, desses lugares em 2015. Um ano de recuperação nas bilheteiras dos EUA – e de Portugal, que em 2015 conseguiu 14, 5 milhões de espectadores, mais 20% do que em 2014 – e que teve muitos filmes protagonizados por mulheres entre os mais vistos – no top 10 português estão As Cinquenta Sombras de Grey, Star Wars e Hunger Games; nos EUA repetem-se os dois últimos blockbusters nos dez mais vistos, entrando ainda em cena Cinderella. Os dados sobre o protagonismo das actrizes são números historicamente elevados – só em 2002 se tinha registado uma proporção aproximadamente tão alta, 18% de protagonistas mulheres nos filmes mais populares. “Não é claro se 2015 foi uma espécie de anomalia ou se isto é o princípio de uma tendência mais a longo-prazo”, diz Lauzen, citada pela Variety. Contudo, estes números em crescimento são ainda profundamente deficitários. Significam que, em 110 filmes, 78% dos papéis mais importantes foram para homens. E a análise do Centro mostra que as histórias se preocupavam mais em identificar a profissão ou mostrar o seu exercício no caso de uma personagem masculina do que no de uma feminina, proporção que se inverte no que toca ao estado civil das personagens de mulheres, mais relevante do que nos papéis de homens. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. A outra nuance negativa que permanece quase inalterada tem a ver com as percentagens de mulheres não brancas a trabalhar como actrizes nestes filmes e, assinala a responsável pelo estudo e pelo centro da Universidade de San Diego que o organiza, com o facto de “as mulheres não brancas terem menos probabilidade do que as brancas de serem personagens principais”. Do universo analisado, 27% das actrizes negras, latinas, asiáticas ou de outras etnias que não a caucasiana tiveram papéis importantes, sendo que entre as brancas essa percentagem sobe para os 38%. Estes dados vêm engrossar a polémica em torno da diversidade racial – ou falta dela – em Hollywood, o mais importante mercado cinematográfico do mundo, e corroborar que entre as mulheres que trabalham na indústria existe um padrão de subrepresentação também na alínea étnica. Em cem filmes norte-americanos, houve 13% personagens de mulheres negras, 4% de mulheres latinas e 3% de mulheres asiáticas. Como já vem sendo evidenciado por estes estudos e pelos seus congéneres europeus, quando as equipas responsáveis pelos filmes são encabeçadas por mulheres, os projectos tendem a empregar mais mulheres. Em 2015, 9% dos filmes mais rentáveis foram liderados por uma realizadora (um aumento de 2% em relação a 2014) e nos filmes com uma mulher realizadora e/ou argumentista o projecto tende a ser equilibrado, com 50% de mulheres protagonistas – num filme dirigido por profissionais masculinos a percentagem de actrizes com papel principal é de 13%.
REFERÊNCIAS:
Entidades EUA