O futuro da Europa
A nova ordem global não será fácil para a Europa e é bem possível que os europeus estejam entre as vítimas desta rivalidade. (...)

O futuro da Europa
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Asiáticos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2019-07-10 | Jornal Público
SUMÁRIO: A nova ordem global não será fácil para a Europa e é bem possível que os europeus estejam entre as vítimas desta rivalidade.
TEXTO: Amanhã é dia da Europa. E em Sibiu, na Roménia, os líderes europeus vão reunir-se numa cimeira para discutir, precisamente, o futuro da Europa. O tema não podia ser mais relevante. A construção europeia está paralisada desde a crise do Euro e dos refugiados, suspensa do “Brexit” e ameaçada, a leste, pelo revisionismo agressivo de Putin, a ocidente, pela erosão do vínculo transatlântico de Trump e minada, no seu interior, pelos populismos emergentes. Precisa, como de pão para a boca, de uma visão de futuro e de uma estratégia global. A Comissão Europeia apresentou um documento com um conjunto de recomendações que é suposto ser a agenda estratégica da União 2019-2024. Ou seja, as prioridades políticas para o futuro da Europa. Bem sei que a comissão não é o conselho e muito menos os líderes europeus, mas as recomendações espelham o estado da União. E resumem-se, basicamente, a cinco: uma Europa protectiva, que não é mais que o aprofundamento das políticas de segurança e defesa a que junta uma gestão “proactiva” das migrações; uma Europa competitiva, que é, no fundo, a conclusão da união económica e monetária; uma Europa justa, que é a reafirmação do modelo social europeu; uma Europa sustentável, que passa por um modelo económico amigo do ambiente, contra a mudança climática; e, finalmente, uma Europa influente capaz de “liderar no mundo através de um forte apoio a uma ordem global multilateral com as Nações Unidas no seu centro”. Tudo isto é, certamente, importante. Mas não é, com certeza, estratégico. Tudo isto se parece mais com os problemas do passado do que com uma visão de futuro. Mais, tudo isto é pensado a olhar para dentro, quando a Europa precisa, mais do que nunca, de olhar para fora. E quando olha para fora não compreende nem o seu lugar nem o mundo que aí vem. A UE parece cada vez menos uma potência global e o mundo que aí vem não é, certamente, o da ladainha do “multilateralismo efectivo”. Não sabemos ainda se a eleição de Trump marcará o fim do “século americano” e a subida ao poder de Xi Jinping o princípio do “século do pacífico”. Mas uma coisa sabemos, o mundo da globalização trouxe a emergência de uma nova rivalidade entre os EUA e a China e são estas duas potências que vão disputar a liderança da ordem internacional. Ora, nesse novo mundo a Europa não definiu, ainda, nem o seu lugar nem a sua estratégia. No plano comercial, a guerra entre os EUA e a China não tem fim à vista. As negociações para um acordo comercial estão num impasse e os sinais de escalada não param. Os efeitos económicos sobre a Europa já começaram: depois da ameaça de Trump de um novo aumento de tarifas, as bolsas europeias abriram em queda. No plano tecnológico, a guerra digital não tem melhores perspectivas. A luta pela hegemonia da tecnologia 5G, a liderança nas telecomunicações, big data e inteligência artificial, levaram os EUA a excluir a tecnológica chinesa Huawei do seu mercado. Nunca o provaram, mas invocam as relações entre a empresa e o Estado chinês e a possibilidade de espionagem. E lançaram uma ofensiva diplomática para pressionar os aliados europeus a fazer o mesmo. Mas a rivalidade não se fica por aí. A “nova rota da seda” lançada pelo governo chinês constitui um gigantesco programa global de investimentos em infra-estruturas, transportes e comunicações com um objectivo claro: através do poder económico estabelecer a sua esfera de influência geopolítica. Está em África, no Médio Oriente, na Ásia Central e, sem cerimónias, entrou em força na Europa e, como é sabido, em Portugal. Os EUA já declararam a “nova rota da seda” uma ameaça à segurança nacional americana. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. A nova ordem global não será fácil para a Europa e é bem possível que os europeus estejam entre as vítimas desta rivalidade. Americanos e chineses vão pressionar a UE a escolher. Precisamente, a escolha que os europeus não querem fazer. Porque têm interesses económicos de ambos os lados e a escolha significa sempre perder alguma coisa. Mas chegados aqui, valerá a pena dizer que a escolha vai muito para além da economia. É política. Porque esta é uma rivalidade pela hegemonia mundial e atrás do comércio, da tecnologia e da “rota da seda” virá depois a construção de uma alternativa política. Entre um sistema de partido único e controle digital das massas e outro que, com mais ou menos ameaças ao Estado de Direito, será sempre uma Democracia. É por isso que a UE precisa de uma estratégia global, autónoma e de acordo com os seus interesses e os seus valores.
REFERÊNCIAS:
Entidades EUA UE
Rússia e China vetam na ONU resolução contra Síria, Turquia vai aplicar sanções
A Turquia anunciou esta quarta-feira que vai impôr unilateralmente sanções à Síria, apesar de a Rússia e a China terem chumbado uma resolução no Conselho de Segurança da ONU nesse sentido. (...)

Rússia e China vetam na ONU resolução contra Síria, Turquia vai aplicar sanções
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Asiáticos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2011-10-05 | Jornal Público
SUMÁRIO: A Turquia anunciou esta quarta-feira que vai impôr unilateralmente sanções à Síria, apesar de a Rússia e a China terem chumbado uma resolução no Conselho de Segurança da ONU nesse sentido.
TEXTO: “O veto não pode impedir sanções”, disse o primeiro-ministro turco, Recep Erdogan, durante uma visita à África do Sul. “Vamos implementá-las”, disse Erdogan citado pela Reuetrs, avançando que serão anunciadas nos próximos dias, quando visitar um dos campos de refugiados sírios na Turquia. A recomendação que esteve em votação no Conselho de Segurança na terça-feira à noite foi uma iniciativa da União Europeia. O texto foi bastante suavizado em relação à sua versão inicial, de forma a cativar os votos da Rússia e da China. Condenava o Presidente sírio, Bashar al-Assad, e pedia o fim do seu regime de 11 anos. Deixava em aberta a questã das sanções, mas sublinhava que estas seriam aplicadas caso Assad não mudasse de atitude. A França considerou esta versão do texto “insuficiente”. Mas, diz a AFP, aceitou-o em nome do consenso e depois de recusar a inclusão de uma frase, a pedido da Rússia, atribuindo a ambas as partes, Governo e manifestantes, a culpa pela violência síria. Porém, os dois países vetaram a resolução, oferecendo uma vitória diplomática a Assad e alentando-o, pelo menos a curto prazo, a prosseguir a sua estratégia de repressão dos protestos. O embaixador russo, Vitaly Churkin, disse que Moscovo se opôs à resolução porque a consequência da sua aprovação poderia ser uma intervenção militar ocidental idêntica à que ainda decorre na Líbia. Já o enviado da China, Li Baodong, explicou que o seu país é contra a “interferência nos assuntos internos” sírios. Em Paris, o ministro francês dos Negócios Estrangeiros, Alain Juppé, disse que terça-feira foi um “dia triste” para povo sírio e para o Conselho de Segurança. E deixou no ar a ideia de que o Ocidente poderá aplicar as suas prórpias sanções enquanto continuará a bater-se por um embargo chancelado pelas Nações Unidas. “Este veto não nos vai parar. Um veto não pode dar carta branca às autoridades sírias”, disse também o embaixador francês na ONU, Gerard Araud. Do lado americano, surgiram também indicações de que a orientação do Conselho de Segurança poderá ser contornada com iniciativas nacionais. A embaixadora dos Estados Unidos da América, Susan Rice, disse que o seu país está "escandalizado" pelo que se passa na Síria e que chegou o momento de serem adoptadas "sanções duras" contra Damasco. Assad conseguiu no passado manobrar de forma a manter o seu país apetecível para o Ocidente enquanto mantinha uma aliança estratégica com o Irão. A repressão das manifestações, com os militares e a artilharia pesada nas ruas a dispararem contra os cidadãos, mudou o paradigma sírio e Presidente ficou isolado. A Rússia e a China são os países que detém uma maior cota de concessões de exploração do petróleo sírio e, por isso e para travar a possível crescente influência do Ocidente no Médio Oriente, vetaram a recomendação e vetarão sanções. O embaixador russo, Vitaly Churkin, disse que Moscovo se opôs "firmemente" à resolução porque a consequência da aprovação poderia abrir caminho a uma intervenção militar idêntica à que ainda decorre na Líbia. Do lado chinês veio a explicação de que Pequim não aceita "interferências nos assuntos internos" sírios. A economia da Síria depende de existirem ou não sanções dirigidas ao seu pequeno mas vital sector petrolífero, controlado pela família Assad e pela pequena elite de governantes. No mês passado, a Síria proibiu as importações de forma a não delapidar a sua reserva de divisas. Mas na terça-feira essa proibição foi anulada devido a um aumento nos preços e à pressão dos empresários mais influentes, todos próximos de Bashar al-Assad.
REFERÊNCIAS:
Entidades ONU
Televisão norte-coreana mostra o corpo de Kim Jong-il
A televisão estatal norte-coreana mostrou hoje pela primeira vez o corpo do antigo líder da Coreia do Norte, que morreu no passado sábado mas cuja morte só ontem foi conhecida. (...)

Televisão norte-coreana mostra o corpo de Kim Jong-il
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Asiáticos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2011-12-20 | Jornal Público
SUMÁRIO: A televisão estatal norte-coreana mostrou hoje pela primeira vez o corpo do antigo líder da Coreia do Norte, que morreu no passado sábado mas cuja morte só ontem foi conhecida.
TEXTO: Nas imagens divulgadas pela televisão estatal podem ver-se diversos dirigentes do partido no poder e o seu filho e sucessor, Kim Jong-un, a prestarem homenagem ao cadáver no Palácio de Kumsusan, em Pyongyang. Jong-il, que dirigia com mão de ferro a Coreia do Norte há 17 anos, repousa num caixão com uma tampa transparente e está vestido com o habitual uniforme em caqui e rodeado de flores brancas e vermelhas. “O camarada Kim Jong-un (. . . ) visitou o corpo do camarada Kim Jong-il com representantes do seu partido, do governo e do Exército para exprimir as suas condolências e a sua mágoa”, avançou a agência oficial norte-coreana KCNA. O país entrou num período oficial de 11 dias de luto, com as bandeiras nacionais a meia haste em todas bases militares, fábricas e edifícios públicos. Entretanto, a secretária de Estado norte-americana, Hillary Clinton, declarou estar “profundamente inquieta pelo bem-estar do povo norte-coreano”. “Os nossos pensamentos e as nossas preces estão com eles nestes tempos difíceis”, acrescentou Clinton. Paralelamente, o governo da Coreia do Sul apresentou hoje as suas “condolências” ao povo da Coreia do Norte, acrescentando, porém, que não irá enviar qualquer representante oficial às cerimónias fúnebres do dirigente comunista, marcadas para o dia 28 de Dezembro. “O governo apresenta as suas condolências ao povo da Coreia do Norte”, declarou o ministro sul-coreano para a Reunificação, Yu Woo-Ik. “Não iremos enviar nenhuma delegação governamental, mas as famílias do antigo presidente Kim Dae-Jung e do antigo presidente do grupo Hyundai Chung Mong-Hun serão autorizadas a deslocar-se até ao Norte” para as exéquias fúnebres, acrescentou o mesmo governante. Entretanto o Presidente chinês Hu Jintao visitou a embaixada norte-coreana em Pequim para prestar as suas condolências. A China é o aliado mais próximo da Coreia do Norte e o seu maior parceiro de negócios. A China manteve igualmente conversas telefónicas com os EUA e com a Coreia do Sul sobre a importância de manter a segurança na península da Coreia. É considerado fundamental evitar uma luta pelo poder que possa trazer ainda mais instabilidade à região e que force milhares de refugiados a cruzar a fronteira para o sul. Notícia actualizada às 11h50
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Entidades EUA
Reino Unido junta-se aos EUA no aviso à Síria sobre recurso a armas químicas
O Reino Unido juntou-se aos Estados Unidos no aviso a Damasco de que um eventual uso de armas químicas por parte do regime de Bashar al-Assad contra a rebelião na Síria irá forçar Londres a “reavaliar a abordagem” ao conflito que assola o país há ano e meio. (...)

Reino Unido junta-se aos EUA no aviso à Síria sobre recurso a armas químicas
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Asiáticos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2012-08-23 | Jornal Público
SUMÁRIO: O Reino Unido juntou-se aos Estados Unidos no aviso a Damasco de que um eventual uso de armas químicas por parte do regime de Bashar al-Assad contra a rebelião na Síria irá forçar Londres a “reavaliar a abordagem” ao conflito que assola o país há ano e meio.
TEXTO: Este aviso surgiu após o primeiro-ministro britânico, David Cameron, ter conversado ao telefone com o Presidente norte-americano, Barack Obama, ainda ontem à noite – tendo ambos concordado que “o uso ou a ameaça de recurso a armas químicas é completamente inaceitável e obrigará” a essa reavaliação, segundo um porta-voz de Downing Street. Já no início desta semana Obama alertara que a posição dos Estados Unidos em relação à crise na Síria – de não intervenção militar no terreno – mudaria se Damasco ultrapassasse “a linha vermelha” do uso de armas químicas no combate à rebelião. Um relatório recente, que agrega informações dos serviços secretos turcos, de países árabes e ocidentais, estima que o arsenal de armas químicas da Síria ronda as mil toneladas, incluindo gás mostarda e gás sarin, armazenadas em 50 cidades do país. A CIA crê que o programa químico sírio está a ser desenvolvido há vários anos e que este armamento pode ser lançado por aviões, mísseis balísticos e rockets de artilharia. Para a China – que se tem mantido contra todas as possibilidades de uma intervenção militar internacional na Síria – o argumento das armas químicas está a ser usado pelas potências ocidentais como uma “desculpa” para justificar essa mesma intervenção. A agência noticiosa estatal chinesa Xinhua avaliou mesmo que os comentários de Obama foram “perigosamente irresponsáveis”, que vão agravar o conflito e reduzir as hipóteses de uma resolução política para a crise na Síria. Cameron e Obama mantiveram conversações ontem à noite também como o Presidente francês, François Hollande, em que debateram “a forma de reforçar o apoio que já está a ser dado à oposição” ao regime de Damasco e como “ajudar um potencial governo sírio de transição após a inevitável queda de Assad, segundo o porta-voz de Downing Street. Os três líderes debateram ainda a situação dos milhares de refugiados sírios. “O primeiro-ministro [britânico] sublinhou a necessidade de trabalhar com as Nações Unidas e frisou que tem que ser feito mais pela comunidade internacional para canalizar a ajuda humanitária através das nações Unidas”, precisou aquela fonte.
REFERÊNCIAS:
Étnia Árabes
Junta Militar da Birmânia declara vitória nas legislativas, com combates em pano de fundo
A Junta Militar que governa a Birmânia há mais de duas décadas sem eleições, declarou esta manhã ter vencido o sufrágio legislativo de domingo, com uns esmagadores 80 por cento dos votos, enquanto os combates no Este do país já forçaram mais de 20 mil pessoas a procurar refúgio na vizinha Tailândia. (...)

Junta Militar da Birmânia declara vitória nas legislativas, com combates em pano de fundo
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Asiáticos Pontuação: 2 | Sentimento -0.1
DATA: 2010-11-10 | Jornal Público
SUMÁRIO: A Junta Militar que governa a Birmânia há mais de duas décadas sem eleições, declarou esta manhã ter vencido o sufrágio legislativo de domingo, com uns esmagadores 80 por cento dos votos, enquanto os combates no Este do país já forçaram mais de 20 mil pessoas a procurar refúgio na vizinha Tailândia.
TEXTO: Registando uma participação em volta dos 70 por cento do eleitorado, um responsável do Partido da Solidariedade e do Desenvolvimento de União (USDP), criado há alguns meses pela junta para o sufrágio, afirmou terem ganho “cerca de 80 por cento dos votos, nas assembleias nacionais e regionais”. Desvalorizadas pela grande parte do mundo – se não mesmo criticas como umas eleições “fantoche” em algumas capitais ocidentais” – estas eleições foram porém elogiadas pela China, talvez o último aliado do regime militar da Birmânia na cena internacional. “[As eleições] constituíram um passo crucial na aplicação na Birmânia do seu mapa de marcha de sete pontos em direcção a um Governo saído das urnas. E assim são bem-vindas”, declarou o porta-voz do Ministério chinês dos Negócios Estrangeiros esta manhã. Na mesma comunicação foi ainda sublinhando que o escrutínio de domingo, tido como uma “etapa da democracia disciplinada”, se desenrolou “sem incidentes”. Por seu lado, o jornal estatal chinês, em editorial, elogiava o “avanço” que as eleições na Birmânia representaram e instava o Ocidente a encorajar esta “mudança” no regime. Entretanto, os combates que opõem os rebeldes da etnia karen e os militares forçaram mais de 15 mil aldeões a procurar refúgio cidade tailandesa de Mae Sot – já sobre populada há vários anos de refugiados birmaneses (mais de 100 mil pessoas) –, ao mesmo tempo que outros cinco mil atravessaram igualmente a fronteira mas mais 150 quilómetros para Sul. Testemunhas ouvidas pelas agências noticiosas reportam que os combates prosseguem na floresta em volta de Myawaddy, onde eclodiram na segunda-feira, um dia depois das eleições – desmentindo as declarações oficiais da junta militar de que hoje não era já registada qualquer violência na zona este do país, fronteiriça à Tailândia.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave violência chinês
Confrontos no Tibete terão provocado vários mortos
Várias pessoas morreram e dezenas ficaram feridas nos confrontos registados hoje no centro da capital tibetana, durante manifestações contra a administração chinesa. O Dalai Lama, líder espiritual do Tibete, diz estar muito preocupado com a violência em Lhasa e apela à China para se abster do recurso à força. “Sim, há vários mortos”, declarou um funcionário do centro de emergência médica de Lhasa, em declarações telefónicas à AFP. “Estamos muito ocupados com os feridos, pois temos aqui muitos”, acrescentou o mesmo funcionário que pediu para não ser identificado. A rádio Ásia Livre (RFA), citando testemunhas em Lh... (etc.)

Confrontos no Tibete terão provocado vários mortos
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Asiáticos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2008-03-14 | Jornal Público
TEXTO: Várias pessoas morreram e dezenas ficaram feridas nos confrontos registados hoje no centro da capital tibetana, durante manifestações contra a administração chinesa. O Dalai Lama, líder espiritual do Tibete, diz estar muito preocupado com a violência em Lhasa e apela à China para se abster do recurso à força. “Sim, há vários mortos”, declarou um funcionário do centro de emergência médica de Lhasa, em declarações telefónicas à AFP. “Estamos muito ocupados com os feridos, pois temos aqui muitos”, acrescentou o mesmo funcionário que pediu para não ser identificado. A rádio Ásia Livre (RFA), citando testemunhas em Lhasa, confirma pelo menos dois mortos durante os confrontos no centro histórico da cidade, onde começaram os primeiros incidentes, adiantando que a polícia abriu fogo sobre a multidão. Os manifestantes “saquearam lojas chinesas e a polícia disparou balas reais contra a multidão. Ninguém neste momento tem direito de se dirigir para a cidade”, adiantou uma fonte tibetana àquela rádio, sediada nos EUA. De acordo com a mesma fonte, os participantes nas manifestações, inicialmente pacíficas, atacaram edifícios associados à presença chinesa no Tibete, incendiando também carros e lojas. Estas são as maiores manifestações das últimas duas décadas contra a administração chinesa no Tibete, tendo vindo a sunbir de intensidade desde segunda-feira, tendo levado já levou dois monges a tentar o suicídio e as autoridades chinesas a cercar e encerrar mosteiros. Dalai Lama pede contençãoEsta manhã, numa declaração pública em Dharamsala, cidade indiana onde está há vários anos refugiado, o Dalai Lama manifestou-se “profundamente preocupado com a situação no Tibete”, depois de “manifestações pacíficas dos últimos dias em várias cidades” da região, sob administração chinesa. Os protestos de hoje “são a manifestação de um profundo ressentimento do povo tibetano em relação ao actual regime”, acrescentou o líder espiritual budista, Prémio Nobel da Paz em1989 pela sua dedicação não-violenta pela causa tibetana. O líder espiritual tibetano – acusado por Pequim de ser um dirigente separatista, apesar de este garantir que abdicou das exigências iniciais de independência – pediu aos responsáveis chineses “para renunciarem ao uso da força” para reprimir as manifestações e a “porem fim ao ressentimento persistente através do diálogo com o povo tibetano”. O mesmo apelo foi feito pelos líderes da União Europeia, reunidos hoje em Bruxelas. Num texto proposto pela presidência eslovena da UE e aprovado por unanimidade, os 27 “apelam à contenção” das forças chinesas e pede “a libertação de todas as pessoas detidas durante as manifestações”. Os protestos começaram na segunda-feira, o aniversário da entrada das tropas chinesas no Tibete em 1959, para esmagar uma revolta falhada contra a presença da China na região e na sequência a qual o Dalai Lama, líder religioso tibetano, partiu para o exílio na Índia. Desde então, dezenas de pessoas terão sido detidas, entre elas vários monges budistas.
REFERÊNCIAS:
Partidos LIVRE
Vencedor do Prémio Aga Khan de Arquitectura é anunciado esta sexta-feira em Lisboa
Vinte projectos espalhados pelo mundo, de um cemitério islâmico na Áustria a uma escola primária no Afeganistão, são candidatos a receber 760 mil euros (...)

Vencedor do Prémio Aga Khan de Arquitectura é anunciado esta sexta-feira em Lisboa
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Animais Pontuação: 2 Africanos Pontuação: 2 Asiáticos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2013-09-03 | Jornal Público
SUMÁRIO: Vinte projectos espalhados pelo mundo, de um cemitério islâmico na Áustria a uma escola primária no Afeganistão, são candidatos a receber 760 mil euros
TEXTO: O prémio Aga Khan de Arquitectura vai ser entregue na próxima sexta-feira, dia 6, em Lisboa, no Castelo de S. Jorge. Patrocinado pela Rede Aga Khan para o Desenvolvimento, o prémio é atribuído de três em três anos, tem uma dotação pecuniária de um milhão de dólares (cerca de 760 mil euros), e privilegia projectos de arquitectura que correspondam às “necessidades e aspirações” de sociedades nas quais os muçulmanos tenham “uma presença significativa”. Anunciada em Abril passado, a short list do prémio é bastante longa – inclui 20 candidatos – e abarca projectos construídos nos mais diversos pontos do globo, do Afeganistão à Áustria ou da China a Marrocos. A escolha é da responsabilidade de um júri internacional de nove elementos, nomeado por um comité de direcção ao qual cabe ainda actualizar regularmente os critérios de elegibilidade, atendendo às prioridades de cada momento. O crescente prestígio deste prémio internacional de arquitectura não se prende apenas com os avultados montantes envolvidos, mas com a filosofia em que assenta. Valorizando o planeamento urbanístico, a preservação de locais históricos ou a arquitectura paisagística, o prémio só pode ser atribuído a projectos não apenas concretizados no terreno, mas que tenham já alguns anos de utilização. E o impacto real dos edifícios na vida das pessoas que os habitam, ou que de alguma forma os utilizam, é tomado em consideração. Uma lógica que leva a que a constituição dos júris inclua especialistas de várias disciplinas, e não apenas arquitectos. O prestígio internacional alcançado pela arquitectura portuguesa, a importância da presença islâmica na história do país e a bem sucedida integração da comunidade muçulmana na sociedade portuguesa terão sido alguns dos motivos que levaram à escolha de Lisboa para a cerimónia de entrega desta 12ª edição do prémio, que será presidida por Cavaco Silva e na qual participarão o presidente da Câmara de Lisboa, António Costa, e o próprio Aga Khan. Quarto detentor deste título, o príncipe Karim – soberano sem território que reclama descender em linha directa do profeta Maomé – é ainda reconhecido como imã dos ismaelitas nizaritas, um ramo xiita que engloba cerca de 15 milhões de muçulmanos distribuídos por vários países. Na sessão de sexta-feira, marcada para as 20h30, será apresentado um novo selo de correio comemorativo do prémio, e inaugurar-se-á ainda uma exposição ilustrativa da influência islâmica em Portugal, organizada em colaboração com a Gulbenkian, que ficará no Castelo de S. Jorge até final de 2013. Vinte candidatosA short list do prémio para o ciclo 2011-2013 inclui projectos tão diferentes entre si como um ambicioso plano da arquitecta e antropóloga Salima Naji para a preservação de quatro locais com oásis sacralizados e de uso colectivo nas montanhas marroquinas do anti-Atlas, um complexo habitacional erguido numa aldeia de pescadores no Sri Lanka que fora devastada pelo tsunami em 2004 (do atelier Shigeru Ban Architects), ou o cemitério islâmico em Altach, na Áustria (atelier de Bernardo Bader), construído numa região com quase dez por cento de população muçulmana. O restauro do forte de Thula, no Iémen (arquitecto Abdullah Al-Hadrami, a reabilitação do forte de Nagaur, na Índia (arquitecto Minakshi Jain), a revitalização do centro histórico de Birzeit, na Palestina (Riwaq – Centro para a Conservação da Arquitectura), a reabilitação do bazar de Tabriz, no Irão (ICHTO East Azerbaijan Office) ou a reconstrução do campo de refugiados de Nahr el-Bared, no Líbano, promovido por uma agência das Nações Unidas, são outros projectos que chegaram à short list. Um bom exemplo de que a dimensão da obra não é necessariamente um factor significativo é o facto de a lista integrar um projecto de preservação, numa aldeia da Ilha das Flores, na Indonésia, de quatro casas cónicas de madeira e bambu, com telhados de palha, raras sobreviventes de uma antiquíssima técnica de construção. Coordenado por Rumah Asuh e Yori Antar, o projecto envolveu um grupo de jovens arquitectos indonésios, que trabalhou em ligação com a comunidade local, procurando reabilitar uma arte esquecida. Os restantes projectos que o júri irá analisar incluem um apartamento no Irão em cuja construção foram reutilizadas de sobras de pedras (Architecture by Collective Terrain), a sede do Instituto do Filme e Animação Kantana, na Tailândia (Bangkok Project Studio), uma escola primária em Herat, no Afeganistão (ateliers 2A+P/A e IaN+), construída em homenagem à jornalista italiana Maria Grazia Cutuli, assassinada no Afeganistão em 2001, uma outra escola primária em Kigali, no Ruanda (MASS Design Group), a sede do liceu francês Charles De Gaulle em Damasco, na Síria (Lion Associés, Dagher Hanna & Partners), a torre Met, em Banguecoque, na Tailândia (WOHA Architects), o Centro de Cirurgia Cardíaca Salam, no Sudão (Studio Tamassociati), o Centro de Interpretação do Mapungubwe, no Limpopo, África do Sul (Peter Rich Architects), um local com gravuras rupestres que é património de humanidade, o Museu de Papel Artesanal em Gaoligong, na China (Trace Architecture Office), a Academia de Futebol Mohammed VI, em Salé, Marrocos (Groupe 3 Architectes) e, também em Marrocos, a ponte Hassan II (Marc Mimran Architecture), que liga Rabat e Salé. Um dos nove membros do júri que irá decidir qual destes projectos irá receber um milhão de dólares é o arquitecto britânico (Dar es Salaam, 1966), David Adjaye, que tem um projecto para Lisboa, o Centro Cultural Africano, África. cont, e é um dos arquitectos mais conhecidos da sua geração. Os restantes jurados são Howayda al-Harithy, presidente do Departamento de Arquitecura e Design da Universidade Americana de Beirute e especialista na história da arquitectura islâmica, o botânico, geógrafo e paisagista francês Michel Desvigne, colaborador de arquitectos como Norman Foster, Rem Koolhaas ou Renzo Piano, o sociólogo e politólogo Mahmood Mamdani, autor de obras sobre a história do colonialismo, Kamil Merican, director executivo do atelier Group Design Partnership, que venceu o Prémio Aga Khan para a Arquitectura em 2007 com o projecto da Universidade de Tecnologia Petronas, na Malásia, a arquitecta japonesa Toshiko Mori, o arquitecto chinês Wang Shu (Prémio Pritzker, 2012), a artista plástica paquistanesa Shahzia Sikander, radicada em Nova Iorque, e o arquitecto turco Murat Tabanlioglu, cujo atelier projectou o mais alto arranha-céus de Istambul, a torre Safira, e também o primeiro museu de arte moderna do país.
REFERÊNCIAS:
Étnia Africano
A pediatra que se tornou uma best-seller mundial
A americana Nadia Hashimi foi buscar as suas origens afegãs para os seus livros. Acabou por se descobrir a si própria. (...)

A pediatra que se tornou uma best-seller mundial
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 Asiáticos Pontuação: 2 Migrantes Pontuação: 11 | Sentimento 1.0
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: A americana Nadia Hashimi foi buscar as suas origens afegãs para os seus livros. Acabou por se descobrir a si própria.
TEXTO: Nadia Hashimi, uma pediatra de Potomac, no estado de Maryland, tornou-se romancista quase por acaso. Já tinha planeado a sua vida de médica quando, em 2009, ela e o marido, Amin Amini, um neurocirurgião, foram de férias para a ilha grega de Naxos. Amini gostava de ficar na praia, a conversar, mas Hashimi estava concentrada nas suas leituras de Verão, que incluíam Joyce Carol Oates. O marido sugeriu-lhe que, já que lia tantos livros, o melhor era começar a escrevê-los. Ela nunca tinha pensado nisso, conta, mas a origem afegã do casal era um material possível para explorar. Hashimi nasceu nos Estados Unidos há 37 anos, filha de pais afegãos. O marido, de 42, nasceu no Afeganistão, de onde partiu aos 17 anos, precisamente quando a ocupação soviética chegou ao fim. As suas vidas reflectem as de muitos novos cidadãos americanos cujas experiências tantas vezes geram controvérsia no debate americano: será que estes estranhos pertencem aqui?Aqueles que lançam essa pergunta desconhecem a vida e a cultura das pessoas que chegam ao país legal ou ilegalmente, e que podem acabar, por exemplo, como empregados domésticos, num dos extremos, ou neurocirurgiões, no outro. Quando estava na Grécia, Hashimi começou a olhar à sua volta. Nessa altura, o país era um destino para os refugiados da guerra no Afeganistão, entre outros, e muitos deles chegavam sem nada. Decidiu escrever sobre a experiência de emigração e começou o seu primeiro romance quando estava grávida do primeiro filho. Escreveu entre turnos nas urgências do Children’s National Medical Center em Washington. Queria acabar a história antes do nascimento do bebé, e conseguiu. A escrita surgiu naturalmente. Ou por outra, sentiu que a história já estava dentro de si, só à espera do momento para sair. “E depois googlei: ‘Como encontrar um agente literário’”, recorda. “Obrigada, Google!” Enviou sinopses ou capítulos do que seria When the Moon is Low a vários agentes. Helen Heller ligou-lhe, precisamente quando estava em trabalho de parto. “Não consegui atender”, diz Hashimi. “Por isso ela voltou a ligar e eu disse ao meu marido: ‘Por favor, liga a esta mulher porque não quero que ela pense que estou a ignorá-la’. ”E assim, ao mesmo tempo que nascia o filho, em 2010, nascia também uma ligação que resultaria numa escritora best-seller internacional, com dois romances já publicados e um terceiro a caminho, todos passados no Afeganistão — um país que Hashimi visitou durante apenas duas semanas, pouco depois da queda dos taliban, mas de que ouvira falar durante toda a sua vida. “Ela tinha tudo o que eu achava necessário”, diz Heller. “Fez com que eu me preocupasse com as personagens. ”Hashimi escreveu um segundo livro, que seria o primeiro a ser publicado, por William Morrow: The Pearl that Broke its Shell. É um absorvente “e maravilhoso romance de estreia”, escreveu-se no Washington Post. “Um relato lírico e pungente de vidas silenciadas”, considerou a Kirkus Review. Publicado no ano passado, teve mais de 18 edições nos EUA e no estrangeiro. The Pearl. . . conta a história de Rahima, uma jovem que, porque os pais não tiveram rapazes, teve de se vestir e viver como um menino até chegar à puberdade. Este hábito — conhecido como basha posh — permite-lhe liberdades com as quais uma rapariga afegã nem sonharia. A história é intercalada com a da sua trisavó, que um século antes se vestia à homem. When the Moon is Low foi editado este Verão. Fala de uma mulher que se torna adulta, casa e constitui família no Afeganistão, exactamente no momento em que os taliban tomam o poder. O romance segue-a, e a Saleem, o seu filho adolescente, na sua fuga, em viagens separadas, para o Irão, depois para a Turquia, de seguida para a Europa, numa tentativa desesperada de refazer a vida em Inglaterra. Hashimi é uma tradutora cultural, diz uma amiga, a escritora afegano-americana Fariba Nawa. “As pessoas não sabem nada sobre as mulheres afegãs. A escrita de Nadia lança uma luz porque ela vem de lá. ”Os livros chegam numa altura em que o futuro do Afeganistão é uma incógnita após 14 anos de guerra. Hashimi não é particularmente optimista quanto às mulheres conseguirem manter os direitos duramente conquistados durante a ocupação dos aliados ocidentais. As forças fundamentalistas taliban lutam arduamente para reconquistar o poder e voltarão a impor restrições às mulheres e raparigas, limitando a sua possibilidade de trabalhar e estudar. A infiltração recente das forças do Estado Islâmico complicou o já de si instável ambiente político. Entretanto, o caos instalado nos territórios islâmicos desencadeou uma emigração de refugiados em massa, que procuram segurança na Europa. As personagens de When the Moon is Low bem podiam ser sírias, iraquianas, libanesas. Qualquer um dos muitos milhões que estão à mercê das atrocidades. Numa altura em que centenas de milhares abandonam a Síria e que as imagens gritantes daqueles que não sobrevivem à viagem são partilhadas em todo o mundo, a história da família de emigrantes de When the Moon is Low é ainda mais pungente e contundente. Por isso, de certa forma, o romance reflecte tanto o passado como o presente — acontecimentos familiares recorrentes que atingiram Hashimi e o marido, apesar de terem tido muito mais sorte do que as personagens do livro. Os pais de Hashimi conheceram-se no início da década de 1970 quando estudavam na Universidade de Cabul. Viviam num Afeganistão sem parecenças com o país que é hoje. Na capital, as mulheres vestiam roupas ocidentais, os jovens iam ao cinema e ouviam música. Foi antes dos taliban, antes da imposição da burqa. Era um tempo de relativa calma, mas com pouco emprego, e por isso o pai foi para a América na esperança de encontrar uma vida melhor. Em Nova Iorque, partilhou o apartamento com outros emigrantes, fazendo turnos para ocupar a única cama que havia. A mãe foi para a Europa estudar Engenharia antes de ir ter com o futuro marido. Casaram-se na câmara municipal e a seguir foram a um restaurante chinês. A mãe de Nadia tirou um mestrado, mas nunca conseguiu usá-lo devido a complicações com vistos e autorizações de trabalho; o pai abandonou os estudos de Engenharia Aeronáutica para tentar encontrar emprego. Trabalhavam em restaurantes, até o pai conseguir poupar dinheiro para comprar um franchise de um restaurante de frangos. Viria a ser dono de vários estabelecimentos desses. Nadia nasceu em 1977. Ela e o irmão mais novo tiveram uma infância típica de subúrbios em New Jersey e no Norte do estado de Nova Iorque, com aulas de ballet, natação e carpool. Falavam inglês em casa por conveniência — os pais trabalhavam e o inglês era a língua da babysitter. Insistiam na importância de uma boa aprendizagem. Hashimi conheceu Amini numa conferência, quando frequentava a Suny Downstate College of Medicine. Ele tinha deixado o Afeganistão e feito uma passagem pela Europa. O pai, um general do Exército afegão durante o domínio soviético, conseguiu, através de conhecimentos, tirar a família de Cabul. Depois de terminarem a especialidade, casaram-se, a 4 de Julho de 2008, num casamento tipicamente afegão. “Era um casamento mediano para os padrões afegãos”, diz Hashimi rindo, recordando a festa com mais de 200 convidados. Hoje, vivem numa grande casa num bairro de classe alta em Potomac, com dois filhos e uma filha. Hashimi acabou por aprender farsi, a língua dos pais, que fala ocasionalmente com o marido quando querem que os filhos não percebam o que estão a dizer. Recentemente, Hashimi senta-se, de manhã, na sua sala de estar decorada a bege e dourados. Está com o cabelo solto, a dar-lhe pelos ombros, sorri frequentemente e do outro lado vêm os gritos persistentes de um papagaio africano cinzento chamado Nickel. O pássaro sabe dizer os nomes dos seus três filhos — está grávida do quarto. Agora passa a maior parte do tempo em casa, concentrada na escrita, com a publicação do seu terceiro livro prevista para o próximo ano. Ocasionalmente ainda faz turnos nas urgências do hospital. Por cima do sofá está um grande quadro com um poema escrito à mão chamado Children of Adam, do poeta persa do século XIII Sa’adi. Foi Amini quem o escreveu. “O poema diz que fazemos todos parte da humanidade, estamos interligados, e que aquilo que afecta um de nós afecta-nos a todos”, diz Hashimi. “É algo em que acredito — algo que, espero, seja expresso através da minha escrita também. ”As sobrancelhas perfeitamente arqueadas levantam-se quando recorda que a casa dos pais era um ponto de encontro de muitos amigos e familiares afegãos. Na casa de New Jersey havia sempre gente por todo o lado — pessoas que passavam lá o fim-de-semana em vez de regressarem para Nova Iorque no final de um dia de piqueniques e convívio. Mas como era a vida no Afeganistão? Em 2002, com os taliban derrubados [pelos Estados Unidos], era possível ir lá saber. E foi o que fez, na companhia dos pais. “Não fui lá porque queria escrever um livro. Fui lá porque queria pisar aquela terra”, conta. Hashimi descreve a sua viagem como um momento de descoberta e não de regresso a casa. Ela e a mãe nem sabiam que tipo de lenços usar para tapar a cabeça de forma a não darem nas vistas. Quando os familiares as foram buscar ao aeroporto ficaram atónitos com os hijabs apertados das visitantes, muito diferentes dos lenços simples e soltos usados pelas mulheres locais. Hashimi sempre pensou nos pais como emigrantes, como afegãos de Cabul, por isso ficou surpreendida, ao andar pelas ruas de terra batida à procura de vestígios das casas que costumavam conhecer, que bastava um esgar para as suas roupas para as pessoas dizerem: “As estrangeiras chegaram. ”Nos anos que se seguiram à partida, a família tornou-se estrangeira na sua própria terra. “Havia sem dúvida este tipo de separação: as pessoas de fora e as pessoas que viveram lá durante a guerra e que nunca saíram”, conta. “Sobreviveram a tanto e a nossa experiência foi tão diferente. Aquilo fez-me pensar nos meus pais: ‘Afinal, onde é a terra deles?’. ”Foram visitar a casa da família do pai. Ainda viviam lá dois dos seus irmãos — cada um ocupou um andar, com a mulher e os filhos. Mas o ambiente familiar da infância sofreu uma transformação quase surreal durante os 30 anos que passaram na América: a mãe conseguiu localizar a antiga casa da sua família, identificando-a pelo corrimão que sobrava de umas escadas. A estrutura solitária, abandonada, era tudo o que restava na rua inteira. Tudo o resto tinha sido reduzido a pó. Uma segunda casa de família recuperou uma nova vida quando um dos primos se mudou para lá. Para Hashimi, foi um momento “arrepiante” quando ela e a mãe foram à cave da casa onde os avós maternos viveram e começaram a vasculhar os caixotes que ali estavam. Lá dentro, encontrou o seu antigo eu, que a olhava fixamente. Era um retrato tirado quando andava no segundo ano da escola. Os pais tinham enviado muitas cartas e fotografias à família. “Foi como uma cápsula do tempo de tudo o que se passou até ali”, conta. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. A jovem estudante de Medicina tinha percorrido 11 mil quilómetros para chegar a uma cave poeirenta à procura de fogachos da vida dos outros e acabou por encontrar um bocadinho dela própria. A escolha dos pais de emigrar significou que Hashimi teve uma vida totalmente diferente da que teria se não tivesse sido assim. Mas o Afeganistão tinha ficado com ela, à espera de emergir. Exclusivo PÚBLICO/The Washington Post
REFERÊNCIAS:
Entidades EUA
Complexo do Alemão: O poder já não é paralelo
Daiana casou entre tanques. Eduardo vendeu pão entre tiros. Thiago treina para as Olimpíadas. E toda a gente vê o que nunca vira: o Estado no Complexo do Alemão. (...)

Complexo do Alemão: O poder já não é paralelo
MINORIA(S): Refugiados Pontuação: 6 Africanos Pontuação: 2 Mulheres Pontuação: 2 Asiáticos Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2010-12-05 | Jornal Público
SUMÁRIO: Daiana casou entre tanques. Eduardo vendeu pão entre tiros. Thiago treina para as Olimpíadas. E toda a gente vê o que nunca vira: o Estado no Complexo do Alemão.
TEXTO: A vantagem de Mozart é morar no Complexo do Alemão. Mozart, claro, é um brasileiro, e quando o PÚBLICO pára o táxi dele na rua e fala no Alemão, ele vira a cara radiante. Isto acontece ao fim de uma hora em que a rádio-táxis ainda não conseguiu um condutor que aceite ir lá. Todo o Rio de Janeiro dos postais é Zona Sul. O Complexo do Alemão fica na Zona Norte. Não é nada difícil chegar lá de táxi se forem três da tarde e não houver engarrafamento na via rápida que sai do centro: demora 40 minutos, custa 20 euros. Mas o Alemão está a emergir da mais fulminante operação que o Rio já viu, e ninguém a deu como terminada. Ainda há buscas (homens, droga, armas) a que alguma imprensa chama "caça". A atmosfera é volátil, e portanto ainda há medo. Não Mozart, claro. "Essa operação foi excelente. A minha casa até valorizou. " Casa-casa, junto à entrada principal do Alemão. Saiu barata por estar na linha de tiro. "Agora bala perdida vai acabar porque a polícia vai permanecer e eles vão colocar UPP. "UPP - Unidade de Polícia Pacificadora - é a sigla que nos últimos dois anos mudou uma parte do Rio. Não a maior parte, mas uma parte crescente. A polícia tomou vários morros da Zona Sul, o que foi empurrando o tráfico ainda mais para a Zona Norte e inchou o Complexo do Alemão. Complexo por ser um complexo de favelas, aliás, de comunidades. "Já não diz favela", avisa Mozart. "Os moradores não gostam. A palavra é comunidade. "Nas comunidades do Complexo o poder verdadeiro era o Comando Vermelho, um gang com origens na prisão da Ilha Grande (estado do Rio de Janeiro), quando presos políticos politizaram presos comuns, há mais de 30 anos. Mas a recente onda de arrastões e carros incendiados que deixou a Zona Sul em pânico precipitou a queda do Comando Vermelho no Alemão. O poder oficial avançou com tudo. Já se sabia que ia acontecer, mas aconteceu agora e assim porque era preciso responder, e responder certo. O mundo estava olhando, em 2014 há Copa do Mundo, em 2016 Olimpíadas. O poder paralelo transbordara. "Quem provocou essa queima de carros foram eles, a ordem partiu daqui de dentro", diz Mozart, apontando o amontoado que é o Alemão, barracos de tijolo e cimento entre morros. Num dos morros sobressai um teleférico, quase pronto. A seus pés, fábricas velhas e igrejas novas (Igreja Cristo Rei - o Poder Pentecostal). Ao longo da via rápida, um canal de esgoto. O primeiro soldado aparece junto à antiga fábrica da Coca-Cola. É aí que os militares estão acampados, com as suas rações de combate. O trânsito flui, o soldado vai mandando avançar, não há controle de identidade. Quarteirões cheios de habitação social novinha em folha, com painéis do Governo Federal ("Conjunto Habitacional Jardim das Palmeiras"). Anúncios de clínicas e Bolsa Família. Um esforço de mostrar trabalho. Mas quando o PÚBLICO se despede de Mozart na Itararé, última rua asfaltada por onde passam carros, a primeira coisa que vê, morro acima, é um cartaz a dizer: "Sras Autoridades, Socorro. Convivemos com muito lixo, ratos e caramujos africanos. Pedimos obras nesta rua. " Os caramujos africanos são uns caracóis gigantes que transmitem doenças e se reproduzem velozmente. Todos (quase) contentesA principal entrada do Alemão é a Joaquim Queirós, uma rua sem trânsito um pouco caótica, daquelas onde tanto se vendem mangas como mochilas do chinês, e a gente se senta em degraus partidos ou caixas voltadas ao contrário, e fica na conversa. Podia ser um campo de refugiados no Líbano, mas com raparigas de alcinhas e bebés ao colo, e rapazes com nomes de rapariga tatuados nos braços, e todo o mundo chinelando no pó. O que todo o mundo vai dizer é que "antes" - ou seja, há uma semana - os traficantes gingavam por aqui, bem armados. E agora o que se vê é o Estado numa azáfama.
REFERÊNCIAS:
Na solidão, o lugar onde tudo começa
Durante 72 dias, Wang Bing encurralou-se num hospital psiquiátrico e ali deixou a sua câmara perder a liberdade. Til Madness Do Us Part está a concurso no DocLisboa. Algo de curioso acontece a meio do mais recente filme de Wang Bing, Til Madness Do Us Part, que concorre neste DocLisboa (sessões a 30 de Outubro e 2 de Novembro): torna-se evidente que são os pacientes do hospital psiquiátrico que mandam, literalmente, ali. À medida que o realizador chinês nascido em 1967 segue os internados nas suas rotinas, é um percurso físico que se cumpre: alternando entre os acanhados quartos onde se encaixam até seis ao mesmo... (etc.)

Na solidão, o lugar onde tudo começa
MINORIA(S): Mulheres Pontuação: 2 Asiáticos Pontuação: 2 Homossexuais Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2016-06-07 | Jornal Público
TEXTO: Durante 72 dias, Wang Bing encurralou-se num hospital psiquiátrico e ali deixou a sua câmara perder a liberdade. Til Madness Do Us Part está a concurso no DocLisboa. Algo de curioso acontece a meio do mais recente filme de Wang Bing, Til Madness Do Us Part, que concorre neste DocLisboa (sessões a 30 de Outubro e 2 de Novembro): torna-se evidente que são os pacientes do hospital psiquiátrico que mandam, literalmente, ali. À medida que o realizador chinês nascido em 1967 segue os internados nas suas rotinas, é um percurso físico que se cumpre: alternando entre os acanhados quartos onde se encaixam até seis ao mesmo tempo, e uma sala com televisão, eles movimentam-se num único piso com vista para um pátio a que não têm acesso. Por isso, andam e correm em círculos ao longo de todo o filme, e rapidamente se tornam perceptíveis as razões da sua "loucura". Til Madness Do Us Part é, muito claramente, tanto um documentário acerca do sistema como um filme sobre a liberdade. A câmara de Bing quase se torna também prisioneira, acedendo (uma raridade) a uma incrível variedade de pacientes, daqueles que efectivamente precisam de tratamento até simples desordeiros apanhados e fechados aqui. Tirando duas situações, o filme, de quase quatro horas, mantém-se encurralado com eles. Neste edifício austero, as condições de vida têm um terrível efeito de nivelamento - apenas um comportamento verdadeiramente excêntrico pode diferenciar. Por isso, Til Madness Do Us Part entrega-se ao sentimento de resignação que perpassa as pesadas limitações do espaço e o comportamento passivo dos residentes, que raramente se empenham em alguma actividade e parecem passar a maior parte do tempo, seja dia ou seja noite, a tentar dormir. Enquanto assistia ao filme, estava a pensar se, no seu lugar, me sentiria culpada por poder livremente entrar e sair, levando comigo uma câmara que em parte permite que ali penetre o mundo exterior mas que continua a não permitir aos doentes serem livres. Parece que é ainda causar-lhes mais dor. . . Durante os primeiros dias de filmagens, realmente senti-me culpado, da forma que acabou de descrever. Senti que estava ainda a juntar mais sofrimento com a minha câmara, e sempre que me ia embora. Eles sabiam que eu era um homem livre, e que tinha algum dinheiro. Por isso, comecei a comprar-lhes coisas de que eles precisavam, cigarros, cerveja, qualquer coisa para comer. Penso que isso terá ajudado, porque após algumas semanas eles começaram a confiar em mim. Fizeram-lhe muitas perguntas acerca do mundo exterior?Não, poucos o fizeram, e mesmo esses eram apenas os que estavam internados por um período curto. Continuavam a preocupar-se com o que se passava no "exterior". Os internados por períodos longos não me perguntaram nada. Nem sequer por que razão os estava a filmar?Não. O que acha que isso significa? Que já tinham desistido?Não posso ter a certeza, mas penso que mostra que são pessoas práticas. É uma forma de lidar com uma situação que não podem alterar. Questionarem-se apenas os levaria a ficarem loucos. Ou a ficarem ainda mais loucos. De facto, alguns deles até dizem "aqui fica-se maluco", mas se não estivessem lá estariam bastante sãos. . . Em alguns casos isso é certamente verdade. Mas a maioria deles está realmente doente, e a ser tratada. Há coisas que não mostra - médicos e especialistas a darem explicações, por exemplo. Nunca foi minha intenção incluí-los, mas quando começámos a filmar tornou-se uma simples decisão prática: os médicos e os enfermeiros estavam num piso acima dos doentes, e no piso abaixo havia uma enfermaria para mulheres que eu também não queria mostrar. Então aquilo que parecia quer uma decisão formal - seguir os pacientes apenas num piso que tem a forma de um quadrado e que em determinado momento se transforma literalmente num "círculo" em que eles correm, loucos e prisioneiros - não foi afinal consciente?Não [risos]. Como é que descobriu este hospital?Demorámos muito tempo a encontrar um que nos permitisse filmar. E a ideia para o filme surgiu-me quando estava a editar West of the Tracks, há alguns anos. Esse filme passa-se na zona de Shenyang, uma área afastada de Beijing, que era quase só um campo vazio com três prédios. Um dia, fui efectivamente ver o que eram esses edifícios, e afinal cada prédio estava cheio de pessoas. Percebi que eram hospitais psiquiátricos. Decidi visitar um, que é o deste filme, mas no início não me permitiam filmar, por isso escrevi um argumento para uma longa-metragem de ficção. Voltei em 2009 e muitas das pessoas que eu conhecera já tinham morrido - algumas tinham estado internadas 20, 20 anos. Pedi a um amigo para falar com os responsáveis, e, depois de muitos outros amigos terem falado e pedido a outros amigos, finalmente consegui começar a filmar lá. Começou a filmar West of the Tracks no final da década de 90, e o filme saiu em 2003. É um documentário épico sobre a destruição de uma zona da cintura industrial em decadência, e também se relaciona com os posteriores Crude Oil (2008) e Coal, Money (2010). Mais tarde, com Man with no Name, em 2009, ou Three Sisters, em 2012, passou para outros temas, como o isolamento e a solidão, que surgem agora neste filme. Concorda?West of the Tracks aconteceu basicamente porque eu já conhecia a zona industrial de Tiexi muito bem. Quando era estudante universitário em Shenyang ia lá muitas vezes ao fim-de-semana tirar fotografias. As suas fábricas, os seus trabalhadores e os seus moradores - tudo se me tornou muito familiar. Por outro lado, havia um sentimento de desolação que me recordava a zona de Tiexi, uma noção de que a História que costumava ser importante para nós estava em lento declínio, dissolvendo-se perante os nossos olhos. A História está sempre ligada ao indivíduo, é claro, e por isso sim, concordo, também estou interessado em focar-me no indivíduo, não apenas no contexto histórico explícito, mas também no presente - que, obviamente, determina a História a cada momento. A solidão e o isolamento são as formas mais básicas de estar, e é aí que para mim tudo começa. Podemos olhar para estes filmes chineses sem as suas ligações a esse passado?Quando os filmes chegaram à China, foram como uma semente lançada ao solo. Os chineses não receberam o cinema como a chegada de uma nova civilização, nem o consideraram como sendo outra forma cultural, era mais como um brinquedo para os ricos. Mas o cinema chinês passou por muitas metamorfoses ao longo dos tempos, integrando influências de filmes norte-americanos, europeus e japoneses. Actualmente, segundo as fórmulas convencionais, caracterizar-se-ia este período como "cinema de esquerda". Mas, do meu ponto de vista, dificilmente poderá ser definido dessa maneira. O cinema que se desenvolveu em Xangai antes de 1949 constituiu o mais brilhante período da história cinematográfica da China. Vendo esses filmes atentamente, consegue-se detectar uma mistura de ideologias por trás, longe das versões oficiais dos livros. Para nós já devia ser fácil abordar esse período com um olhar calmo e objectivo, pois trata-se de uma questão histórica. Para mim, existem três factores em jogo nos filmes desse período. Há as obras influenciadas pelo movimento comunista internacional; depois há as produções comerciais e baseadas em estrelas, seguindo os modelos de Hollywood; finalmente, existem as baseadas na própria tradição intelectual da China. Alguns filmes parecem ser vanguarda urbana, e alguns têm vestígios de realismo francês ou italiano. De facto, a maioria é uma mistura, o que é uma coisa positiva, creio eu. O que havia no hospital psiquiátrico deste filme que lhe interessou enquanto ideia?Os funcionários, os médicos demonstram uma tal falta de esperança, uma tal impotência. . . O trabalho deles é organizar e melhorar o tratamento dos doentes, e sentem muitas dificuldades em fazê-lo Ao mesmo tempo, também sentem que os doentes têm uma vida muito difícil. Ao estar lá, ao filmar lá, ao passar tempo com os médicos e com a restante equipa, percebe-se que eles não estão a tratar mal aquelas pessoas. Mas não têm qualquer forma de alterar as condições em que lá se vive. Fiquei com a sensação de que não havia espaços privados no hospital. Todos estão à vista de todos e todos têm acesso a todos. Comer, dormir, ir à casa de banho, nada lá se faz em privado. É verdade. Devido a essa falta de privacidade, parece haver um nível de ternura e de contacto humano, tanto heterossexual como homossexual, que se aproxima do sexo. Mas as pessoas lá podem manter relações sexuais, ou têm de manter as distâncias, por causa da vigilância da comunidade?O ambiente é muito diferente: o que nos restringe a nós não se aplica. Lá não existem limites. Por isso, a sexualidade é bastante normal. As pessoas não pensam nisso como algo que mereça reflexões morais. Pensam mais em termos das suas necessidades. Há pessoas que dormem juntas, e dormem juntas durante anos a fio. A câmara rapidamente começa a parecer um membro da comunidade. Como se estivesse a seguir as pessoas, mas, como todos os outros, apenas a olhar para elas. Sim, assim sentimo-nos como se fôssemos um deles. Estamos lá. Éramos apenas dois, eu e o operador de câmara, e por vezes era apenas um de nós a filmar. Como é que impediu os doentes de representarem para a câmara, ou essa questão nunca se colocou?Nos primeiros três dias, sim. Mas depois nunca mais houve nada disso. Como é que decidiu o que devia filmar? Sentava-se numa sala durante algum tempo à espera que algo acontecesse, ou circulava por ali à procura de coisas para gravar?Como só tínhamos acesso muito limitado, estávamos basicamente sempre a filmar, e escolhíamos as pessoas ao acaso. Estivemos no local durante 72 dias, filmámos em 60, 15 deles no exterior. No total, tivemos 250 horas de gravação - isso foi importante, porque sabíamos que apenas conseguiríamos fazer este filme na sala de montagem, e para isso precisávamos da maior quantidade possível de material. Precisávamos mesmo de entrar nas personalidades das pessoas. Muitas vezes a câmara está fixa, simplesmente filmando naquele take o que quer que estivesse a acontecer. Foi uma forma de conseguir não chamar a atenção dos pacientes?Foi uma forma de criar alguma liberdade para eles naquele espaço, sim. Podem utilizar-se várias técnicas: grande plano ou plano aberto; câmara à vista ou escondida; representação consciente ou reacção espontânea. Mas isso são questões sem importância. A chave está na nossa escolha. O que é realmente importante é estabelecer uma relação entre o objecto do filme e a audiência. É a câmara que cria essa ligação. A sua compreensão da liberdade alterou-se com este filme?Mostrou-me de novo que qualquer pessoa, não interessa se culpada ou demente, merece algum grau de liberdade. Aquele "mudo", o homem que não fala, na realidade consegue falar, só que escolheu não o fazer. Descobri isso um dia quando estava sentado ao pé dele, apenas para estabelecer alguma ligação. Eu não tinha a certeza se todos eles sabiam o que é a liberdade ou o que estão a perder por estarem lá dentro. Mas aquilo mostrou-me que ele percebia o que era a liberdade e ficou com ela. Tradução de Eurico Monchique
REFERÊNCIAS:
Partidos LIVRE