Coreia do Norte: Hyeonseo Lee fugiu do "melhor país do mundo"
É uma dissidente atípica, Hyeonseo Lee, uma norte-coreana de 37 anos. Saiu do seu país por curiosidade adolescente e já não pôde regressar. Foi imigrante ilegal, refugiada. Viveu anos com uma profunda crise de identidade. "Mas finalmente encontrei-me, a fazer o que faço e como norte-coreana." (...)

Coreia do Norte: Hyeonseo Lee fugiu do "melhor país do mundo"
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 2 Migrantes Pontuação: 9 Refugiados Pontuação: 9 | Sentimento 1.0
DATA: 2015-10-12 | Jornal Público
SUMÁRIO: É uma dissidente atípica, Hyeonseo Lee, uma norte-coreana de 37 anos. Saiu do seu país por curiosidade adolescente e já não pôde regressar. Foi imigrante ilegal, refugiada. Viveu anos com uma profunda crise de identidade. "Mas finalmente encontrei-me, a fazer o que faço e como norte-coreana."
TEXTO: Há uma fotografia no livro A mulher com sete nomes que parece ter sido tirada nos anos de 1930 ou 40. A preto e branco, mostra uma mulher com uma criança de três anos às costas, embrulhada num cobertor de franjas. Foi tirada no estúdio de um fotógrafo por volta de 1984, na Coreia do Norte. Devemos vê-la, antes de começarmos a ler. Ajuda no exercício de visualizar os lugares e as cenas, o ambiente e a sociedade onde Hyeonseo Lee viveu a primeira das suas três vidas. Era uma vida feliz, conta a autora, que escreveu uma autobiografia que parece um livro de História, um testemunho político que se lê como um romance. Ela chamou "memória" ao texto que publicou para contar como abandonou, sem querer e sem perceber o que estava a fazer, um dos países mais opacos do mundo. O livro tem por subtítulo História de uma refugiada da Coreia do Norte (ed. Planeta) porque foi isso que começou por ser. "Para sermos um dissidente temos que ter consciência do lugar onde estamos e eu já tinha começado a perceber algumas coisas, mas tinha vivido toda a minha vida a pensar que vivia no melhor país do mundo. Pensávamos que éramos os melhores do mundo, os mais felizes dos seres humanos. Eu nem sequer sabia que vivia numa ditadura. Quando se vive como na Coreia do Norte, fechados, não sabemos a situação em que estamos", disse Lee na entrevista que deu ao PÚBLICO em Lisboa, onde veio divulgar o livro e fazer o seu trabalho de activista que explica/denuncia a Coreia do Norte. "A imagem que nos davam é que fora da Coreia do Norte todos eram mendigos, nem tinham sapatos". Em 1997, quando aos 17 anos atravessou o rio Yalu junto à sua cidade de Hyesan e entrou no território chinês, moveu-a a curiosidade, não a crítica, a rejeição. Queria passear no outro lado, que nas imagens da televisão chinesa que via às escondidas em casa lhe parecia vibrante e diferente do que lhe tinham ensinado na escola. Tinha nos planos regressar, uns dias depois, mas não pôde ser. "O que aprendi sobre a China na televisão não tinha nada a ver com o que contavam. A China parecia melhor, e eu comecei, ingenuamente, a pensar passar a fronteira, sem saber que ia mudar a minha vida". Começou por ser uma desertora, diz, a consciência de dissidente e de activista contra o regime de Pyongyang formou-a depois, quando percebeu o logro. "Na Coreia do Norte, a doutrinação começa logo no primeiro dia" de escola, diz no livro. Pelo que conta, começa no primeiro dia de vida. Paninhos para limpar os Kim"Toda a vida familiar, desde comer, socializar e dormir, se desenrolava sob as fotografias [do Grande Líder Kim Il-sung e do Querido Líder Kim Jong-il]. Cuidar das fotografias era o principal dever de cada família. (. . . ) Desde tenra idade que comecei a ajudar a minha mãe a limpá-las. Usávamos um pano especial, fornecido pelo Governo, que não podia ser utilizado para limpar qualquer outra coisa. (. . . ) Mais ou menos uma vez por mês, uma equipa de funcionários que calçava luvas brancas entrava em todas as casas do bloco para inspeccionar os retratos. Se no seu relatório constassem que uma família não os tinha limpo como devia ser, a família corria o risco de ser presa". O livro de Lee, retalhado em múltiplos capítulos, divide-se em três grandes partes — nascer e crescer na Coreia do Norte, a vida de uma imigrante ilegal na China, o percurso até à actual condição de refugiada na Coreia do Sul; três vidas, portanto. A primeira parte é a mais suculenta, porque relatos em primeira mão sobre a vida quotidiana no Norte são raros. Testemunhos de dissidentes não são inéditos — perseguições, prisões, torturas —, mas Lee abre a porta de um país que estamos habituados a olhar como estranho e de onde, volta e meia, surgem histórias que parecem irreais, como os paninhos de limpar o pó aos retratos dos Kim. "As pessoas perguntam se aquilo é mesmo assim. É pior. Mas as pessoas, os norte-coreanos, não sabem o que se passa porque não conhecem o conceito de opressão". "Há coisas que não podemos saber se são verdade. Mas temos, por exemplo, a certeza de que Kim Jong-un [o actual líder] mandou matar o tio e outras pessoas do seu círculo mais próximo", diz a autora, que considera este Kim, o terceiro da História da Coreia do Norte, o mais descontrolado e errático. "O avô dele era um ditador terrível", diz do fundador do regime. Kim Jong-il, o filho deste e pai do actual líder, foi um desastre para o povo e para o país, considera. Quando Hyeonseo Lee saiu da Coreia do Norte, estava Kim Jong-il no poder. O filho, Kim Jong-un, sucedeu-lhe quando morreu, em 2011. Por uns instantes, os norte-coreanos que vivem fora do seu país esperaram do novo Kim, que estudou no estrangeiro e podia ser um homem moderno, outra espécie de governação. Hyeonseo Lee diz que o percurso que o líder está a fazer — "está a matar toda a gente que lhe desagrada ou que procura alguma mudança, os generais" — pode custar-lhe caro. Talvez a vida. Acredita que Kim Jong-un é incapaz de mudar, de reformar, de melhorar a vida dos norte-coreanos, e que o regime não resistirá muitos mais anos — este será o último dos Kim, acredita, e com ele desaparecerá um país chamado Coreia do Norte. "Acredito na reunificação e acredito que os que fugiram, como eu, terão um papel importante na reconstrução do país. Quero voltar. Ali é o meu lugar".
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave escola humanos filho mulher ajuda homem criança espécie chinês imigrante ilegal
Vaga de centenas de imigrantes ilegais transborda em Melilla e Ceuta
As cidades enclave espanholas em Marrocos estão a enfrentar uma enorme vaga de imigração, por vezes com cenas violência. (...)

Vaga de centenas de imigrantes ilegais transborda em Melilla e Ceuta
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 2 Migrantes Pontuação: 21 | Sentimento -0.5
DATA: 2013-09-17 | Jornal Público
SUMÁRIO: As cidades enclave espanholas em Marrocos estão a enfrentar uma enorme vaga de imigração, por vezes com cenas violência.
TEXTO: Cerca de 300 imigrantes deitaram abaixo a rede que separa a fronteira entre Marrocos e Espanha em Melilla esta manhã. Perto de 100 conseguiram passar, no que é o segundo assalto violento à passagem para território espanhol numa semana. Em Ceuta, houve também uma chegada maciça, a nado, à praia de Tarajal. Foi pelas 6h30 que os imigrantes arrancaram completamente a rede de 6, 10 metros de altura, na zona entre o posto fronteiriço do Bairro Chinês e o Aeroporto de Melilla autónoma, noticiou a agência EFE. Agiram “com grande violência”, segundo a agência EFE, que cita a Delegação do Governo em Melilla, lançando objectos contra as forças de segurança. Há seis feridos entre os agentes da fronteira e um imigrante, com uma fractura numa perna, e danos materiais. Durante duas horas, a Guarda Civil tentou conter esta pequena invasão, usando até um helicóptero, relata o El País, mas os imigrantes dispararam a correr em várias direcções dentro da cidade, pelo que as autoridades continuam ainda à sua procura. Há notícias de avistamentos nos bosques do monte Gurugú. Quando forem detidos, serão depois acolhidos no centro de estadia temporária. Em Ceuta, 91 imigrantes tinham sido detidos pela polícia, depois de terem passado a fronteira de Tarajal, num grupo que as autoridades estimam ter sido de 350 pessoas, adianta a agência noticiosa Europa Press. Mas, neste caso, a entrada ter-se-á feito a nado. Muitos foram interceptados pela polícia fronteiriça marroquina. A última entrada maciça na praia do Tarajal deu-se a 2 de Setembro, e nesta participaram cerca de 80 imigrantes, dos quais 33 conseguiram chegar a Ceuta. Segundo a Delegação do Governo em Ceuta, a pressão migratória sobre esta cidade autónoma duplicou este ano: foram interceptados 874 imigrantes ilegais entre Janeiro e Agosto, face a 393 no mesmo período do ano passado. A 12 de Setembro, a fronteira de Ceuta foi alvo de um assalto de contornos violentos: um veículo todo-o-terreno com 14 imigrantes ilegais a bordo irrompeu pelas 3h00 da madrugada a toda a velocidade e sem parar pelos postos fronteiriços de ambos os países, separados por cerca de 200 metros. Um polícia marroquino foi atropelado e ficou ferido com gravidade, mas os ocupantes do carro acabaram por ser detidos. O condutor do carro era natural de Ceuta. Este método de conduzir um carro a alta velocidade sem parar para introduzir imigrantes ilegais é comum em Melilla, mas não em Ceuta, diz o El País. Em Ceuta não havia nenhum caso assim há sete anos.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave violência chinês imigrante assalto
Integração social de imigrantes já atingiu 31 mil destinatários
Centro Nacional de Apoio ao Imigrante e programa Escolhas beneficiam de fundos comunitários e promovem aproximação aos imigrantes. (...)

Integração social de imigrantes já atingiu 31 mil destinatários
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 2 Migrantes Pontuação: 16 | Sentimento 0.033
DATA: 2010-10-17 | Jornal Público
SUMÁRIO: Centro Nacional de Apoio ao Imigrante e programa Escolhas beneficiam de fundos comunitários e promovem aproximação aos imigrantes.
TEXTO: Raj Kuner Malla é um dos muitos imigrantes em Portugal que beneficiaram da ajuda do Centro Nacional de Apoio ao Imigrante (CNAI). O nepalês partiu do seu país em 2004 na esperança de melhorar o futuro. O CNAI respondeu às suas necessidades. "Era muito difícil estar aqui sem documentos, precisava de informação", disse o imigrante. O centro conseguiu a sua legalização. "Aqui a vida é melhor!"Dezenas de pessoas passam, diariamente, por uma situação similar à de Raj. As caras nos corredores do CNAI nunca são as mesmas, mas as questões que ali levam os imigrantes traduzem os mesmos problemas: dificuldade nos processos de integração e procura de respostas. Aqui, os 31 mil beneficiários dos apoios do Programa Operacional Potencial Humano (POPH) deixam de ser números. Ganham forma e história. Natural da Ucrânia, Nataliia Nikitina também recorre ao centro. Está em Portugal há quase dois anos. No início foi muito difícil encontrar "orientação". O CNAI demorou apenas "um mês a tratar dos papéis necessários". "Tinha tentado resolver tudo sozinha, mas é muito difícil. No CNAI eles compreendem-nos. Trabalham muito bem. "O CNAI, dependente do Alto Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural (ACIDI), pretende responder às necessidades destes "novos" habitantes do país. Financiado pelo POPH, este espaço é, de acordo com a alta-comissária Rosário Farmhouse (na foto), da maior importância nas políticas de integração. O atendimento na língua materna facilita "a comunicação e o relacionamento entre as pessoas". Para Lina Wang, elemento chinês do centro, estar no CNAI permite lidar com uma realidade que "ajuda a crescer". Os cerca de 480 mil atendimentos desde o início da parceria entre o centro e o POPH representam uma "boa aposta", diz Bernardo Sousa, director do ACIDI. Na Associação Jardim Escola São João de Deus, na Amadora, também os números são casos reais. "É motivante ver os resultados. Saber que a intervenção possibilitou, por exemplo, a ida de jovens para a universidade é algo que nos deixa muito orgulhosos, " diz António Ponces de Carvalho, da direcção da associação. Através do programa Escolhas é possível "desenvolver actividades dedicadas aos jovens, como dança, ou cursos de informática. Eles sentem-se cativados pelas iniciativas e esta é a melhor forma de ocupar o tempo", diz. Opinião partilhada por Mabília Novais, da Associação de Solidariedade Social do Alto da Cova da Moura. "Existem contextos difíceis, de desemprego e incapacidades económicas, mas graças ao nosso apoio alguns desses problemas são superados", diz. O Escolhas, financiado pelo POPH e promovido pelo ACIDI, afirma-se como "um importante instrumento de mudança social. " Hoje, Raj Kuner Malla tem nacionalidade portuguesa, e o seu próprio restaurante no país. Após um ano de "papelada" trouxe para junto de si a mulher e duas filhas.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave escola imigração mulher ajuda social desemprego chinês imigrante
Imigrantes são mais mal pagos do que os portugueses
Estudo do Banco de Portugal revela também que mais de metade dos imigrantes está sob o regime de contrato a prazo. (...)

Imigrantes são mais mal pagos do que os portugueses
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 2 Migrantes Pontuação: 16 | Sentimento 0.049
DATA: 2010-12-21 | Jornal Público
SUMÁRIO: Estudo do Banco de Portugal revela também que mais de metade dos imigrantes está sob o regime de contrato a prazo.
TEXTO: Dos 150. 812 imigrantes a trabalhar em Portugal em 2008, 23, 5 por cento recebiam o salário mínimo, mais de metade tinha contratos a termo e em regra eram mais mal pagos do que os trabalhadores portugueses. Os resultados constam de um estudo elaborado pelas economistas do Banco de Portugal (BdP) Sónia Cabral e Cláudia Duarte, que, a partir da análise dos quadros de pessoal entre 2002 e 2008, tentaram perceber o que explica as diferenças salariais entre imigrantes e cidadãos nacionais. O estudo começa por revelar que, em 2002, o salário médio dos trabalhadores com nacionalidade portuguesa era 18, 2 por cento superior aos salários dos imigrantes, mas passados seis anos essa diferença salarial decresceu para 13, 3 por cento. Apesar da melhoria - influenciada sobretudo pela evolução positiva dos salários pagos aos trabalhadores vindos do Leste -, as autoras do estudo detectaram fortes diferenças na evolução dos salários de uns e de outros, influenciadas por factores como a idade, o género, a formação, o tipo de contrato e o sector de actividade. Desde logo, a percentagem de imigrantes com salário mínimo é mais elevada do que a dos naturais. Entre 2002 e 2008, em termos médios, 18, 6 por cento dos imigrantes recebiam salários muito próximos do mínimo, enquanto entre os trabalhadores portugueses essa percentagem não ultrapassava os 12, 1 por cento. Mas nem todos os imigrantes são afectados da mesma forma pelo gap salarial. Os imigrantes vindos da União Europeia, por exemplo, são os que têm a menor taxa de trabalhadores a receber salário mínimo, menos de 10 por cento. No pólo oposto surgem os chineses: dois em cada três recebiam o salário mínimo. As autoras do estudo alertam, contudo, que "a existência de um salário mínimo obrigatório funciona como um instrumento que limita a diferença salarial entre trabalhadores de nacionalidade portuguesa e imigrantes". É por isso que a diferença salarial entre imigrantes e nativos é praticamente inexistente na parte inferior da distribuição salarial. Fenómeno idêntico ocorre na parte superior da distribuição salarial, mas devido à formação académica dos trabalhadores: quando os imigrantes têm níveis educacionais superiores, acabam por ganhar mais do que os nativos. Outro dos factores que fazem com que os imigrantes tenham salários em média inferiores aos dos trabalhadores portugueses tem a ver com a forte incidência na população imigrante dos contratos a termo, vínculos que estão associados a salários mais baixos. As economistas do BdP chamam a atenção para o facto de 51, 7 por cento dos imigrantes terem contratos a termo, uma percentagem que contrasta com os 24, 6 por cento detectados entre os trabalhadores portugueses. O estudo faz ainda uma análise por sector e destaca a forma como os salários foram evoluindo ao longo de seis anos. No sector do comércio e retalho, os salários dos imigrantes tiveram uma taxa de crescimento média anual de 2, 6 por cento, inferior ao crescimento de 3, 6 por cento das remunerações dos trabalhadores portugueses. Mas não foi assim para todas as nacionalidades, uma análise mais fina permite concluir que os salários dos brasileiros, chineses e trabalhadores do Leste aumentaram a um ritmo superior (entre 4 e 4, 7 por cento) ao dos nativos. Já na construção os salários dos imigrantes tiveram uma evolução de 5, 8 por cento, superior ao aumento de 4, 8 por cento de que beneficiaram os portugueses. Mas enquanto os cabo-verdianos viram o seu salário aumentar muito abaixo da média, os imigrantes do Leste tiveram aumentos de 7, 5 por cento. No imobiliário e na hotelaria e restauração a evolução média dos salários fez-se a um ritmo semelhante para os imigrantes e para os portugueses.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave género estudo imigrante salário
Berlim à espera do urso (com surpresas ao virar da esquina)
Terminada uma das mais desinteressantes competições de que há memória na Berlinale, as opções são duas: ou ganha Kaurismäki e ficamos todos contentes ou há surpresa e ficamos todos de boca à banda. (...)

Berlim à espera do urso (com surpresas ao virar da esquina)
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 2 Homossexuais Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-02-18 | Jornal Público
SUMÁRIO: Terminada uma das mais desinteressantes competições de que há memória na Berlinale, as opções são duas: ou ganha Kaurismäki e ficamos todos contentes ou há surpresa e ficamos todos de boca à banda.
TEXTO: E, com Ana, Mon Amour, do romeno Calin Peter Netzer, encerra-se uma das mais desinteressantes competições berlinenses de que há memória. Já se antecipava isso de alguma maneira, mas a esperança é a última coisa a morrer, como se diz, sobretudo depois de três anos seguidos com óptimos filmes (como os 45 Anos de Andrew Haigh ou O Que Está por Vir de Mia Hansen-Love) e as surpresas aparecem de onde menos se espera. Este ano, por exemplo, a britânica Sally Potter, ela de Orlando (1992) e A Lição de Tango (1997), "redimiu-se" da desastrosa passagem em competição do contudo bem curioso Rage (2009) com The Party – uma sátira feroz da política moderna com um elenco de luxo encabeçado por Kristin Scott-Thomas, Patrícia Clarkson, Timothy Spall e Bruno Ganz que, sem ter convencido muita gente do seu valor enquanto filme de competição, foi acolhido com simpatia. A verdade, no entanto, é que saiu este ano a fava ao concurso de Berlim. Paul Verhoeven, em entrevistas à imprensa alemã, dizia que esperava filmes surpreendentes – ora, o filme mais bem recebido entre os 18 títulos a concurso, e aquele que é mais unanimemente visto como o candidato mais forte ao Urso de Ouro, é The Other Side of Hope, do finlandês Aki Kaurismäki. Que, sendo efectivamente um dos grandes filmes de Berlim 2017, não muda resolutamente nada no cinema de Kaurismäki – tal como On The Beach at Night Alone, outro dos melhores filmes do concurso, também não muda nada no cinema do coreano Hong Sang-soo. Berlim costumava ter pontaria para descobrir cineastas da América Latina – e Una Mujer Fantástica, do chileno Sebastián Lelio, é de facto um óptimo filme, mas Lelio já estivera há três anos na competição oficial do festival. (Com alguma sorte, Daniela Vega, a actriz transexual do filme, repete o prémio a Paulina García por Gloria, em 2013. ) E, do Brasil, Joaquim, do prolífero veterano pernambucano Marcelo Gomes (O Homem das Multidões, 2013), co-produção luso-brasileira, é um tiro ao lado. Esta exploração da radicalização de Joaquim José da Silva Xavier, aliás Tiradentes, um dos primeiros combatentes pela libertação do jugo colonial e a abolição da escravatura, tem uma excelente ideia: a de mostrar a evolução de Joaquim de funcionário colonial até revolucionário através de uma missão à selva amazónica inexplorada em busca de ouro – uma viagem ao "coração das trevas" que o muda para sempre. Júlio Machado é extraordinário no papel principal, mas não resgata Joaquim de uma peculiar e ensimesmada inércia, que não consegue nunca fazer o espectador sentir a insolação alucinada que atravessa a personagem. É inexplicável que tenha sido esta a escolha do comité de selecção em vez do bem mais interessante Vazante ou, mesmo, de qualquer um dos outros nove filmes brasileiros que passaram transversalmente às várias secções – e cujas equipas se reuniram numa carta aberta/manifesto contra a actual política cultural do governo de Michel Temer, a que se fez alusão no final da sessão oficial de estreia. Do Oriente – nos últimos anos alvo de especial atenção do certame, que este ano tinha no júri o chinês Wang Quan'an, vencedor em 2007 por Tuya's Marriage, e que dera em 2014 o Urso de Ouro ao chinês Carvão Negro, Gelo Fino – houve Hong Sang-soo, o desequilibrado thriller do japonês Sabu, Mr. Long, é a peculiaridade de Have a Nice Day, uma animação "tarantinesca" chinesa. A prata da casa também não primou pela desenvoltura: as opiniões dividiram-se sobre Wilde Maus, primeira realização do comediante austríaco Josef Hader, filme significativamente "tópico" (é a história de um crítico de música que é despedido do jornal onde trabalha e decide vingar-se do seu editor sobranceiro), e Helle Nächte, do habitualmente interessante Thomas Arslan (Ouro, 2013), é um discreto e enxutíssimo melodrama familiar sobre o reencontro entre um pai é um filho afastados – talvez demasiado discreto para o seu próprio bem, há que dizê-lo, já que o filme nunca se ergue acima de uma mediania reconfortante mas pouco ousada. O documentário de Andres Veiel sobre Joseph Beuys não entusiasmou grandemente; e nem a sobreexcelente Nina Hoss conseguiu evitar que Return to Montauk, de Volker Schlöndorff, adaptação de um romance de Max Frisch, fosse recebido com a mesma frieza e as mesmas críticas negativas de The Dinner, a solitária representação americana no concurso, dirigido pelo habitualmente estimável Oren Moverman. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. O que sobra, então? A estranheza onírica de On Body and Soul, regresso da húngara Ildiko Enyedi, vencedora da Câmara de Ouro de Cannes em 1989 após 15 anos sem fazer cinema, tem um quinhão de fãs que reconhecem nele um filme certamente ousado mesmo que não inteiramente conseguido – argumentos que também se aplicam a Colo, de Teresa Villaverde (que tem a mais-valia de ser um filme "de tema", coisa de que Berlim gosta muito), ao estranhíssimo mistério ecológico da polaca Agnieszka Holland Spoor, e a Ana, Mon Amour. Netzer é um candidato evidente no papel ao Urso de Ouro: o filme anterior, Mãe e Filho, foi o vencedor do festival de 2013, inscrevendo-se sem grandes problemas na actual "nova vaga romena". Mas Ana, Mon Amour é bicho diferente: uma espécie de versão psicanalítica, fragmentada, do tipo de amor possessivo paredes-meias com a loucura que Betty Blue (1986), de Jean-Jacques Beineix, tornou chique nos anos 1980. Reconhecemos nele todas as características que nos fazem gostar do cinema romeno – a excelência dos actores, a inteligência da encenação, a par de uma inteligência teórica que faz, aqui e ali, recordar as metáforas kiarostamianas de Corneliu Porumboiu. O problema de Ana, Mon Amour é que Netzer não controla o suficiente a desintegração narrativa do filme, que salta constantemente entre passado e futuro, realidade e pensamento, perdendo no processo um espectador que dá por si sem âncoras, sem pontos de referência e sem interesse. É pouco, é dramaticamente pouco para um festival que se deu ao luxo de "chutar" para as secções não-competitivas filmes francamente mais estimulantes como o magnífico The Lost City of Z, de James Gray, Vazante, de Daniela Thomas ou o esmagador documentário de Raoul Peck sobre James Baldwin, I Am Not Your Negro. Para não falar do constante desafio aos sentidos que é a programação do Fórum, onde este ano Filipa César brilhou muito alto com Spell Reel e Heinz Emigholz mostrou o seu monumental quarteto de documentários interligados (2+2=22 [The Alphabet], Bickels [Socialism], Streetscapes [Dialogues] e Dieste [Uruguay]), num total de seis horas de filme. Esta noite saber-se-á quem leva para caso o Urso de Ouro; a não ser que seja Kaurismäki, a surpresa estará certamente à espera.
REFERÊNCIAS:
Todos somos turistas
Lisboa e o mundo encontram-se na encruzilhada do turismo de massas. As cidades atractivas do séc. XXI existem entre paradoxos, na fronteira entre serem metrópoles de sucesso e vítimas dele. O holandês Marc Glaudemans dedica-se a pensar como é que se podem criar ambientes urbanos sustentáveis. (...)

Todos somos turistas
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 2 Homossexuais Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-09-24 | Jornal Público
SUMÁRIO: Lisboa e o mundo encontram-se na encruzilhada do turismo de massas. As cidades atractivas do séc. XXI existem entre paradoxos, na fronteira entre serem metrópoles de sucesso e vítimas dele. O holandês Marc Glaudemans dedica-se a pensar como é que se podem criar ambientes urbanos sustentáveis.
TEXTO: Todos somos turistas. Mesmo os que não se sentem forçosamente identificados com aquilo a que chamamos turismo. “E é bom termos essa noção, para que não olhemos para os turistas como se fossem extraterrestres”, diz-nos por entre risos o holandês Marc Glaudemans. É o fundador e director do Stadslab European Urban Design Laboratory, um think tank internacional sem fins lucrativos e também laboratório de design urbano, que tem actuado ao nível do impacto do turismo massificado no espaço público, no desenvolvimento urbano e no dia-a-dia dos cidadãos das cidades europeias. “O turismo não pode ser eliminado, é qualquer coisa à qual nos temos de adaptar”, acrescenta, “mas pode ser gerido, regulado ou sustentado. ”É a sua segunda vez em Lisboa. Foi a associação Academia Cidadã, fundada por activistas que pertencem a diversos movimentos cívicos portugueses, em conformidade com a Câmara Municipal de Lisboa, que o desafiou a desenvolver um programa de Master Class — que decorrerá em Abril de 2016 — que contará com participantes internacionais e portugueses, abordando a gentrificação e o turismo de massas em Lisboa, no sentido de serem desenhadas estratégias partindo de um caso concreto, o bairro da Mouraria. A capital portuguesa, onde hoje circulam os tuc-tuc que se viam na Tailândia, constituiu, diz, um estudo de caso com interesse, ou não fosse uma das cidades europeias com maior crescimento turístico nos últimos anos — em 2014, cresceu cerca de 15, 4% face a 2013, segundo a Associação de Turismo de Lisboa. Segundo ele, nada de estrutural ainda foi colocado em causa, podendo aprender-se com os equívocos cometidos noutros territórios como Barcelona, ao mesmo tempo que Lisboa pode servir de embrião para outras cidades, num tempo histórico em que o turismo é uma das questões globais mais desafiantes. Encontramo-nos no Chiado, coração de Lisboa, e percebemos logo que está por dentro do contexto do que se passa na cidade. “Os sintomas repetem-se de cidade para cidade. Por norma começa com o regozijo de ver chegar turistas, depois advêm preocupação e mais tarde a reacção a esse estado de coisas. ”É isso, sim. Inicialmente existiu satisfação pelos proveitos económicos e orgulho pelo reconhecimento. Depois adveio a apreensão de quem vive na zona histórica, e também nas adjacentes, pelas perturbações que foram surgindo. No presente já se percebeu que alguma coisa terá de ser feita. Não há alarmismo. Mas existe o confronto com uma realidade nova, com tudo o que isso acarreta de conflito. Nos cafés, nas esplanadas, na rua, enfim, no espaço público, as marcas de hostilidade entre autóctones e forasteiros ainda são subtis, mas não é preciso ser vidente para antecipar que irão aumentar. Isso já se vislumbra nas expressões de enfado. Nas incompreensões. Nunca se falou tanto de turismo em Portugal como nos últimos anos. Durante muito tempo parecia ser um tema sazonal, ajustando-se aos meses de Verão no Algarve. Foi uma longa época em que o país se pensava a si próprio como destino de Verão. Com o fluxo dos últimos anos a atingir algumas cidades portuguesas — com relevo para Lisboa e Porto —, já não é assim. “A ideia sazonal morreu. Hoje temos de pensar o turismo como fenómeno de todo o ano”, diz Marc. “Existe uma amplificação temporal do uso turístico do espaço. O turismo já não é ocasional, é constante. Se se tornou global, o tempo turístico é agora total. ”A própria ideia de turismo mudou. Dizemos que estamos na era do turismo de massas, mas só se o pensarmos como algo possuído por uniformidade ao nível do tempo, dos lugares e das preferências, porque as ofertas são infindas, com uma variedade de lugares, paisagens e experiências à nossa espera. Assistimos a uma intensificação dos tipos de turismo conhecidos, a que não é estranha a revolução dos voos de baixo custo que amplificaram os utentes das companhias low cost. A multiplicação de tipos de turismo não tem fim: enológico, de sobrevivência, gastronómico, sexual, religioso, cultural, LGBT, de praia. O resultado é uma segmentação do mercado. Encontramos tantos destinos como potenciais segmentos de consumidores. O turismo actual não é de massas, embora seja mais massificado do que nunca, cumprindo-se a partir do consumo emocional de um certo lugar. “Enquanto turistas, sugamos a paisagem em função de ela nos devolver uma experiência, expor uma história ou garantir uma emoção. Por isso as cidades turísticas se vêm obrigadas a parecer-se com esse imaginário que o viajante espera encontrar. ”Às tantas, na nossa deambulação pelo Chiado, paramos ao fundo da Rua Garrett junto a uma dessas lojas de marca global que estão em qualquer parte do mundo. Quando se quer falar de homogeneização, recorre-se quase sempre a estes exemplos. Diz-se que as metrópoles perdem a sua identidade quando são tomadas por este tipo de lojas. “Em parte é verdade porque tendem a crescer de forma semelhante em todo o lado”, afirma Marc, “mas o segredo, como sempre, é conseguir equilíbrio entre este tipo de comércio global e o local. Neste caso, mantiveram a fachada do edifício, não é muito intrusivo, embora o que encontramos no interior seja o mesmo aqui ou em Roma. ”É verdade. Mas ao contrário do que se possa pensar, não são apenas os locais que apreciam este tipo de comércio. Os turistas, mesmo os que dizem estimar a diferença dos lugares que visitam, também não as perdem de vista. Apesar de tudo, tem de existir alguma familiaridade no ambiente que se visita. “Este tipo de pavimento, a calçada, os edifícios, as pessoas ou a comida, fazem parte do contexto português e são enaltecidos. Os turistas esperam de alguma forma encontrar essa identidade, mas ao mesmo tempo desejam o que têm em casa. O mesmo tipo de conforto, os seus cafés, a sua comida, as suas lojas. O turista gosta de sentir-se longe de casa, mas não muito longe. ”O turismo, já se percebeu, vive entre tensões não resolvidas. Não é uma questão portuguesa. Em todo o mundo se discute como criar ambientes urbanos coerentes e sustentáveis. Como preservar a herança urbana. Ou como fazer com que uma maioria de cidadãos possa beneficiar dessa indústria em vez de apenas alguns grupos privilegiados. “Isso é o que todas as cidades procuram: como preservar uma identidade genuína enquanto absorve um número elevado de turistas. É difícil por causa da própria natureza transformadora do turismo que, mesmo quando é predominantemente individual, pode ter um impacto maciço. Em princípio, o turismo 2. 0 ou 3. 0 — como o Airbnb ou plataformas online semelhantes — têm um impacto reduzido. Baseiam-se no que existe e em propriedades individuais. Mas as áreas onde predomina podem perder o seu carácter distintivo e tornarem-se ‘turistificadas’, ficando menos atractivas, não só para os turistas como para os locais. ”Como garantir, então, a sustentabilidade ambiental, social e cultural das cidades? O diagnóstico é conhecido: sobreocupação do espaço público. Homogeneização do comércio. Banalização da paisagem urbana. Habitantes a abandonar o centro. Aumento dos preços de arrendamento motivado pela procura do alojamento temporário. Proliferação de hostels e outras formas de alojamento que põem em risco a função residencial da população autóctone. Não é apenas a qualidade de vida dos residentes que é posta em causa, mas a sua capacidade de viver na área. Quando o interesse dos residentes é suplantado pelos benefícios negociais, muitas vezes o efeito é paradoxal, acabando na degeneração daquilo que era atraente para os visitantes: a atmosfera única da cultura local. Até agora, na maior parte das cidades, tem-se apostado, como reacção, em políticas de contenção, de restrição ou de deslocalização. Limitação do número de cruzeiros, construção de réplicas das atracções turísticas para deslocalizar a pressão dos visitantes, diversificação da oferta cultural de maneira a que não sejam apenas as zonas históricas a ser percorridas, limitação do número de noites permitidas de aluguer de casas privadas, controlo do número de visitantes ou regulação da utilização máxima do Airbnb, eis algumas das medidas tomadas nos últimos anos nos mais variados locais do globo. Numa das cidades onde o turismo tem tradição, Paris, os turistas são vistos como “cidadãos temporários” com direitos, mas também obrigações. Ainda assim, essas medidas não bastam. É preciso antecipar as mudanças, percebê-las na sua curva ascendente, para melhor as gerir. Essas políticas de antecipação “devem incluir planos de zoneamento e áreas de desenvolvimento integrado para que o equilíbrio do desenvolvimento urbano seja salvaguardado a longo prazo”, afirma Marc, apontando para a participação de todos nessa dinâmica. “O desenvolvimento destes instrumentos de planeamento são um processo de co-criação, no qual os actores públicos e privados e os cidadãos têm de trabalhar unidos para formular uma visão estratégia dos seus bairros. ”Num processo colaborativo deste género, o desenvolvimento equilibrado pode ser definido por todas as partes interessadas, a partir de uma base de valores e interesses compartilhados. “As acções individuais que conduzem à gentrificação ou à sobrecarga do turismo são racionais, mas o seu efeito de conjunto pode ser potencialmente negativo para toda a comunidade”, aponta Marc. “É por isso que um plano de desenvolvimento para uma determinada área deve ser apoiado no longo prazo, para que todos os actores possam ver cumpridas as suas aspirações. Pelo menos até um certo ponto. ”Durante muitos anos, a indústria do turismo não foi levada muito a sério. Era consensual, junto de governos, organismos internacionais e meios de comunicação que a energia, o petróleo, as finanças, a ciência, a agricultura e, vá lá, a cultura, eram vitais para o desenvolvimento económico. O turismo não entrava nas agendas dos poderosos. Hoje, segundo Marc, já não é assim. “É uma das indústrias mais relevantes em termos económicos. E não é como a indústria do petróleo, onde existem talvez dez grandes players. No turismo é tudo muito mais disperso, individual e democrático. ” Será verdade. Mas a competição entre destinos é também renhida. Hoje todas as cidades querem ser distintivas, únicas e aprazíveis. Segundo o secretário-geral da Organização Mundial do Turismo (OMT), o jordano Taleb Rifai, citado pelo El País, o mundo de hoje vive duas revoluções: “A tecnológica, que conecta o mundo virtualmente, e a das viagens, que nos conecta fisicamente. ” Em 2014, segundo essa organização dependente das Nações Unidas, 1138 milhões de turistas passaram pelo menos uma fronteira — o que significa que mais de um em cada sete habitantes do mundo realizou uma viagem internacional. Outro dado significativo: um em cada onze empregos no mundo foram criados graças ao turismo, embora também existam muitas vozes críticas a sugerir que esse tipo de ocupação é maioritariamente precário, de baixos salários e apoiado em contratos temporários. É inegável: o turismo gera receitas e por vezes reabilita zonas urbanas. Mas também pode contribuir para a diminuição da qualidade de vida local. Esta é a encruzilhada das cidades atractivas. Por vezes fica-se com a ideia de que a indústria do turismo tira vantagem do que a cidade e a comunidade têm para oferecer (hospitalidade, ruas, monumentos, equipamentos) mas os resultados económicos nunca revertem para o colectivo, apenas para privados. Para Marc, esta é uma verdade parcial. “Os turistas e as empresas da indústria pagam impostos específicos que podem acabar por beneficiar toda a comunidade se as autoridades municipais o souberem gastar sabiamente. Mas é verdade que esses instrumentos fiscais podem ser melhorados e adaptados para lidar com novos tipos de turismo, que nem sempre são abrangidos por sistemas fiscais desactualizados. A cidade de Amesterdão, por exemplo, fez um acordo com a Airbnb, em que um imposto de 5% é adicionado a todas as reservas feitas através desta plataforma. Esta é uma forma de criar condições de concorrência equitativas, não favorecendo um determinado tipo de turismo. Mas existem propostas mais radicais como as taxas de ingresso em Veneza ou as de alojamento. ” Recorde-se que, esta semana, ficou a saber-se que Câmara de Lisboa não vai, ao contrário do que estava previsto, começar a cobrar em Janeiro a Taxa Municipal Turística a quem chegar à cidade por via aérea ou marítima. Mas quem dormir num hotel da capital vai ter de pagar um euro por noite a partir do primeiro dia do próximo ano. Para Marc Glaudemans, o importante é “certificarmo-nos de que os benefícios do turismo são investidos de forma igualitária por toda a cidade e criadas as soluções para manter uma certa simetria”, mesmo as zonas que ficam fora dos circuitos turísticos. “Essas áreas não colhem benefícios, mas podem sentir os efeitos negativos, ao nível do congestionamento do tráfego ou porque os preços de serviços e bens aumentaram, por exemplo. ”Nesse sentido, o governo municipal deve criar condições para uma distribuição justa para evitar o aumento de desigualdades devido aos benefícios económicos do turismo. “Preferia encarar isso como uma oportunidade para as cidades que atraem um grande número de turistas e não como um problema. ”Na actualidade, já não é possível pensar nas questões do turismo a partir de um prisma local. Para o comprovar, Marc vai apontando para os imóveis que na Baixa ou Martim Moniz estão em obras, com anúncios de venda da parte de imobiliárias que operam no mercado internacional. “Este fenómeno é global”, reflecte. “Provavelmente, alguém em Londres acabará por comprar este edifício e daqui construirá um hotel. Este é um indicador de como o fluxo de capitais é global e de como a regeneração urbana não é um processo apenas local porque as partes interessadas são de diferentes origens e, na verdade, com interesses diversos. É necessário pensar nessas forças globais, e Lisboa, hoje, faz parte dessa comunidade mundial. ”Curiosamente, quando pensa em casos actuais de sucesso, ao nível das cidades que conseguem ter uma relação harmónica com o turismo, não lhe vêm à cabeça capitais. “As cidades secundárias talvez consigam um padrão de vida mais elevado para os seus cidadãos, na sua relação com o turismo, do que as capitais ou as zonas de atracção turística”, diz. “Haverá sempre excepções, mas quando penso em San Sebastian, no País Basco espanhol, vislumbro uma cidade costeira atractiva, que é acima de tudo um local para viver e trabalhar, integrando especificidades turísticas, como a gastronomia, o festival de cinema ou o surf na sua identidade. Lyon, em França, é outro exemplo de uma cidade que mantém a sua matriz, combinada com a realização de eventos de expressão internacional. As cidades que são conhecidas por acontecimentos sazonais específicos, em vez de serem destinos de todo o ano, talvez estejam mais preparadas para evitar a espiral negativa dos excessos turísticos. Mas não existem fórmulas perfeitas e as situações mudam rapidamente. ”É a pensar na forma como se podem administrar as contradições que são hoje uma constante do turismo global que Marc está em Lisboa. Nas ruas do bairro da Mouraria diz sentir que ali ainda se distinguem as relações de proximidade e há um estilo de vida humanizado. Mas não foi isso que o levou a escolher o bairro para centro da sua intervenção. “Escolhemos esta área porque há aqui muitos paquistaneses, indianos e chineses, ou seja, tem uma segunda camada para além de ser um bairro tradicional, o que lhe acrescenta complexidade. Em Barcelona, por exemplo, os bairros com estas características estão num acelerado processo de transformação e alguns perderam as suas características basilares. ”Um bairro é um ecossistema complexo. Não surpreende a tensão que se manifesta entre residentes e frequentadores ocasionais, entre comércio tradicional e novas actividades ou entre utilizadores diurnos e nocturnos. A harmonia é quase sempre instável. Mas é dessa conjugação de actuações, e da forma como os diferentes actores se relacionam entre si, que depende o equilíbrio. A coexistência nem sempre é fácil. Mas é possível. Exige-se actuação pública. Mas com pinças. Às vezes mais vale ser orientadora ou apenas reguladora, do que pró-activa. O Stadslab é parte da Universidade Fontys, na Holanda, e tem ajudado a introduzir modelos inovadores de governança urbana. Na Mouraria a ideia é semelhante. “A nossa acção vai no sentido de ajudar municípios e agentes privados a salvaguardarem um desenvolvimento urbano equilibrado. Portugal não está familiarizado com o desenvolvimento em área e acreditamos que este modelo de co-criação colaborativa pode ser benéfico aqui. ”A Master Class de Abril será supervisionada por especialistas internacionais mas os participantes serão uma mistura de profissionais locais e internacionais, entre trabalhadores municipais, arquitectos, urbanistas e organizações comunitárias. O objectivo é trabalhar durante dez dias com um grupo de 15 profissionais e manter uma relação interactiva com os cidadãos e as organizações locais. A apresentação final das ideias e recomendações ocorrerá num evento público. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Apesar das lojinhas de recordações, dos novos cafés e mercearias que prometem invariavelmente “produtos tipicamente portugueses” e de alguns sintomas de gentrificação na zona histórica, Marc é da opinião que o seu carácter se mantém. “Sente-se que a regeneração urbana ainda é orgânica, não é artificial, o que é bom. Vimos poucas transformações de grande escala irremediáveis. Está a acontecer uma transformação, mas é lenta e orgânica, o que é bom para a cidade, ao mesmo tempo que o seu caracter histórico pôde ser recriado porque alguns edifícios estavam muito degradados. ”Mas esse equilíbrio é instável. Tem que ser reavaliado a todo o momento. A indústria do turismo vive processos disruptivos muito rápidos. Por exemplo, em Nova Iorque, estima-se que 50% da oferta de Airbnb já não se encontra nas mãos dos habitantes, mas sim de empresas que se servem do serviço para escaparem às normas hoteleiras. São assim as cidades do século XXI, a viverem entre paradoxos: sendo sedutoras, mas sem quererem ser esmagadas pelo seu desejo, assumindo que o turismo pode ser voraz, mas não prescindindo dele, compreendendo que a fronteira entre ter sucesso e ser-se vítima dele é ténue.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave direitos cultura comunidade social consumo género estudo sexual lgbt
Um ataque para punir Assad, forçar o regime a negociar e avisar Teerão
Uma operação cirúrgica para mostrar a sírios e iranianos que os EUA falam a sério quando impõem "linhas vermelhas" pode não mudar o curso da guerra. Um guião para o que se desenha. (...)

Um ataque para punir Assad, forçar o regime a negociar e avisar Teerão
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 2 Homossexuais Pontuação: 6 | Sentimento 0.0
DATA: 2013-08-28 | Jornal Público
URL: https://arquivo.pt/wayback/20130828160314/http://www.publico.pt/j1743946
SUMÁRIO: Uma operação cirúrgica para mostrar a sírios e iranianos que os EUA falam a sério quando impõem "linhas vermelhas" pode não mudar o curso da guerra. Um guião para o que se desenha.
TEXTO: Os cenários estão preparados e já há alguns porta-aviões no lugar. Barack Obama já terá decidido que vai dar a ordem, mas não necessariamente qual das opções escolherá. Os riscos de agir não desapareceram - o Presidente recordou sexta-feira que os Estados Unidos "não podem resolver o que é um complexo problema sectário na Síria". Mas, de repente, os riscos de não intervir parecem maiores. O uso de armas químicas em grande escala vem somar-se ao envolvimento do Irão (e do Hezbollah) na guerra. "Pela primeira vez, em mais de dois anos, a urgência não se sente só na Síria, chegou a Washington, Londres e Paris", escreve na Foreign Policy Gayle Tzemach Lemmon. A opção mais provável, avança o jornal Washington Post citando "altos responsáveis da Administração", passa por "um ataque militar limitado no âmbito e na duração", pensado para funcionar "como punição pelo uso de armas químicas pela Síria e como dissuasor, evitando que os Estados Unidos se envolvam mais profundamente na guerra civil do país". O que Obama está a considerar, resume o New York Times, é "uma lista de acções para "travar e minar" a capacidade de Assad lançar armas químicas". Limitar riscos e custos, baixar as expectativas em relação aos objectivos, parece ser a mensagem. Já se sabia que o envio de soldados para o terreno não se colocava; Washington e Londres garantem que provocar uma mudança de regime também não está em discussão. Para os EUA - e ao contrário do que aconteceu na Líbia, desta vez os primeiros disparos serão norte-americanos - três factores vão determinar o calendário desse ataque: as provas da culpabilidade de Assad na morte de centenas de sírios têm de ser reunidas; as consultas com os aliados e com o Congresso terão de ser concluídas, e é preciso determinar uma justificação à luz da lei internacional. As provasNinguém nega que foram usadas armas químicas contra várias localidades nos arredores de Damasco. Organizações internacionais confirmaram que gases tóxicos afectaram 3600 pessoas (Médicos Sem Fronteiras), matando centenas. Norte-americanos, britânicos, franceses, turcos e a Liga Árabe, todos já disseram que é o regime de Bashar al-Assad que está por trás dos ataques. O seu arsenal químico é real e significativo - nem o regime o esconde - e grandes quantidades destes agentes estão numa forma militarizada, prontos a serem usados em bombas lançadas de aviões ou ogivas colocadas em mísseis. Como é que se sabe que foi Assad a usá-los? A resposta pode ser mais simples do que parece: todos os serviços secretos activos na região vigiam de perto essas armas, que permanecem sob controlo do Governo. O regime, ao contrário dos rebeldes, tem os meios para as lançar. Saber é diferente de provar, o escrutínio será grande e reunir provas suficientes talvez demore uns dias. Os inspectores da ONU continuam hoje as suas visitas aos locais atingidos, mas como sublinhou o secretário de Estado norte-americano, John Kerry, a investigação vai permitir saber o que foi usado - não quem usou. A legalidadeBritânicos e turcos já disseram que terá de ser encontrada uma solução à margem do Conselho de Segurança, onde se sabe que a Rússia (e provavelmente a China) usará o seu direito de veto. Na Líbia, russos e chineses abstiveram-se, abrindo caminho à autorização da ONU para uma intervenção que, no papel, visava proteger Bengasi e, na prática, serviu para derrubar Muammar Khadafi. A Administração Obama está à procura de precedentes no Kosovo de 1999, quando Bill Clinton usou o apoio da NATO e a necessidade de proteger um grande número de civis para lançar ataques contra a Sérvia. Entretanto, a ONU aprovou a "responsabilidade para proteger" (François Hollande admite que pode ser usada na Síria). Foi esta norma que serviu como justificação para a operação na Líbia. Cada vez mais peritos em conflitos e lei internacional estão convencidos que será invocada a violação da Convenção das Armas Químicas por parte de Assad. A Síria não é signatária, mas isso não será um obstáculo. "Quando um princípio é geralmente aceite, torna-se parte do que chamamos lei consuetudinária internacional, que vincula tanto os estados como um tratado", diz ao Guardian Mark Reiff, perito em ética dos conflitos. Se em causa, como parece, estiver um cenário de "retaliação", David Bosco, da Universidade Americana de Washington, defende que a "doutrina permite que uma parte viole a lei internacional em resposta à clara violação da lei internacional cometida pela outra parte". Operação cirúrgicaUm "ataque punitivo", escreve Bosco no blogue Multilateralist da revista Foreign Policy, "não implica um compromisso para derrotar o regime [de Assad], não sugere um desejo de apoiar os opositores, não compromete os governos ocidentais com o fim de todos os abusos no conflito sírio nem com a reconstrução do Estado pós-conflito". O tal ataque muito limitado descrito pelo Washington Post, que reduz os riscos e os custos para os envolvidos, pode ser também mais fácil de justificar do ponto de vista da lei, sustenta Bosco. "A mensagem para o regime é simples, directa e limitada, se usas estas armas terríveis pagas um preço". "Esta norma internacional não pode ser violada sem consequências", disse Kerry na segunda-feira. "Penso que deve ser cirúrgico. Deve ser uma resposta ao que aconteceu com os químicos", defendeu à NBC Bob Corker, o mais importante republicano no Comité de Relações Externas do Senado. Os alvosTanto o Post como o New York Times escrevem que os alvos mais prováveis deste ataque cirúrgico não são os locais onde estão armazenadas as armas químicas, muitos e dispersos (Damasco, Palmira, Goms, Alepo, Latakia, Masyat. . . ). Em vez disso, explicaram ao Times responsáveis do Pentágono, os alvos serão as unidades militares que estarão por trás dos ataques químicos, os mísseis e a artilharia que serviu para os lançar e os quartéis que supervisionaram a operação. Os alvos iniciais estão a ser escolhidos a partir de uma lista de menos de 50. Em Istambul, o líder da Coligação Nacional Síria, Ahmad Jarba, entregou ontem aos enviados dos "Amigos da Síria", uma lista de dez propostas de alvo, incluindo o Aeroporto Militar de Mezze, nos subúrbios ocidentais de Damasco, a base de Qutaifa (usada para lançamento de mísseis), no norte da capital, e o complexo que abriga a 4ª Divisão Mecanizada, a unidade de elite lidera por Maher al-Assad, irmão de Bashar, e formada quase só por alauitas (o ramo do xiismo da família no poder). A oposição responsabiliza a 155ª brigada desta divisão pelo ataque em Ghutta. Mais ataques limitadosUma primeira vaga de ataques deverá ser seguida por uma pausa para avaliar os danos infligidos e a resposta do regime. A Síria tem defesas anti-aéreas respeitáveis, pelo que os alvos dos ataques terão de ser inspeccionados por satélites ou por aparelhos de vigilância aérea. Enfraquecer o regime sem o derrubar é o objectivo dos que, dentro da Administração, defendem várias vagas de ataques e não apenas um "ataque punitivo" que não duraria mais de dois dias. Neste caso, os ataques visariam mais capacidades militares (Força Aérea) e unidades das Shabiha, a temida milícia do regime, acusada de abusos dos direitos humanos, e até palácios presidenciais. Os meiosEm qualquer das opções em cima da mesa, os ataques seriam lançados a partir de navios de guerra norte-americanos ou de aviões que não entrariam no espaço aéreo sírio. Neste momento, os EUA têm quatro contratorpedeiros (USS Mahan, USS Barry, USS Gravely, USS Ramage) que transportam mísseis de cruzeiro no Mediterrâneo - entre eles, levam mísseis 430 Tomahawks com um alcance de até 2400 quilómetros. O porta-aviões USS Harry S Truman deixou o Mediterrâneo no dia 18 e está no Mar Vermelho. A Força Aérea dos EUA também pode recorrer aos bombardeiros B-2 estacionados no Missouri, que podem atacar alvos no Médio Oriente com apenas uma paragem para reabastecer, e ainda a vários a F-16 espalhados em bases da região (na Jordânia, por exemplo). Os britânicos mantêm um submarino de ataque no Mediterrâneo, enquanto o porta-aviões francês Charles de Gaulle está de novo operacional, e a três dias de distância da Síria. Os franceses também têm aviões Rafale e Mirage nos Emirados Árabes Unidos. As bases dos EUA na Turquia (Incirlik e Esmirna) e a base da Força Aérea britânica em Chipre (Akrotiri) são os pontos de lançamento mais prováveis para uma ofensiva. Os objectivosNum cenário mais restrito, o objectivo será impedir Assad de voltar a usar armas químicas contra os sírios. Alguns na Casa Branca defendem que é inútil lançar uma intervenção se esta não visar dobrar o regime ao ponto de o convencer a negociar (deixando cair Assad). Ao mesmo tempo, uma acção serviria para assinalar aos iranianos (e às suas ambições nucleares) que as "linhas vermelhas" traçadas em Washington são para levar a sério. "Se alegados ataques [com armas de destruição maciça] são permitidos até em grande escala, a credibilidade de Washington vai sofrer", escreve Gayle Tzemach Lemmon, do think tank Council on Foreign Relations. Ontem, a oposição fez saber que recebeu um aviso em duas partes: o ataque vai acontecer daqui a dias; preparem-se para negociar a paz e entrar num governo de transição logo depois. "Se a Rússia acreditar que pode ser evitado um vazio de poder, vai mostrar mais interesse em conversar sobre a paz", diz a analista do Council. "Como a Casa Branca repetiu na segunda-feira, o conflito só vai acabar com uma solução política. "
REFERÊNCIAS:
Entidades ONU EUA NATO
Batman vs. Super-Homem, ou a crítica vs. os fãs – e a tristeza de Ben Affleck
O blockbuster é "o Donald Trump dos filmes de comics" e a maior estreia mundial de super-heróis – em Portugal, é a segunda estreia do ano. A crítica e os fãs estão outra vez distantes e Affleck já é um meme. (...)

Batman vs. Super-Homem, ou a crítica vs. os fãs – e a tristeza de Ben Affleck
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 2 Homossexuais Pontuação: 2 | Sentimento 0.0
DATA: 2017-01-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: O blockbuster é "o Donald Trump dos filmes de comics" e a maior estreia mundial de super-heróis – em Portugal, é a segunda estreia do ano. A crítica e os fãs estão outra vez distantes e Affleck já é um meme.
TEXTO: A crítica não gostou de Batman vs. Super-Homem, Ben Affleck está triste com isso num vídeo popularíssimo e o filme continua a arrebanhar centenas de milhões nas bilheteiras. Nos últimos dias, é esta a história em torno da estreia de um dos grandes blockbusters do ano – contam-se espingardas no fosso entre a crítica e o público, a Internet brinca e as máquinas registadoras continuam a tinir. Este “é o Donald Trump dos filmes de BD” ou “uma tempestade perfeita” que envolve o ponta-de-lança de uma batalha entre estúdios?Ben Affleck, o actor que depois de ter ganho um Óscar de Melhor Filme foi trucidado pela Internet quando foi anunciado como o novo Batman, ouve o jornalista falar sobre as más críticas de Batman vs. Super-Homem. Henry Cavill, o Super-Homem, reage com um discurso que nem ouvimos porque Simon e Garfunkel começam a interpretar The sound of silence enquanto a câmara se aproxima de Affleck, silencioso e pesaroso, e que no final da resposta do seu co-protagonista só diz: “Concordo”. Nas primeiras 48h de vida da paródia do utilizador Sabconth à entrevista do Yahoo UK, o vídeo foi visto mais de um milhão de vezes. À hora de publicação desta notícia ultrapassa os 18 milhões de visualizações e já gerou versões infindas com outras músicas (como Atmosphere, dos Joy Division) ou com Affleck ladeado por colegas super-heróis muito mais felizes – Capitão América, Deadpool…Este último é responsável pela melhor estreia de 2016 em Portugal: um título tido como o antifilme de super-heróis que chamou aos cinemas 112 mil espectadores, segundo dados do Instituto do Cinema e do Audiovisual (ICA). Batman vs. Super-Homem fica-lhe pouco atrás, na segunda posição, com 100 mil espectadores de acordo com a mesma fonte oficial (a NOS, a sua distribuidora, reclamou segunda-feira para o filme o título de “melhor fim-de-semana de abertura de sempre de um filme de super-heróis” – contudo, os 20 mil espectadores que divulga a mais em relação aos números do ICA incluem a estreia em Portugal mas também as de Angola e Moçambique). No mundo inteiro, e até domingo, o filme tinha já arrecadado 378 milhões de euros. É a maior estreia mundial de sempre na bilheteira de um filme de super-heróis. Batman vs. Super-Homem é o “tipo de filme”, diz o crítico de cinema do PÚBLICO Jorge Mourinha, “que não está tão dependente de uma aprovação da crítica para fazer sucesso”. Está acompanhado por inúmeros êxitos de bilheteira mais ou menos recentes, dos Crepúsculos aos Transformers, passando pelo quarto Indiana Jones ou pelo terceiro Homem-Aranha e mesmo pelo mais antigo Ghost Rider, que não foram elogiados pelos críticos nem particularmente reconhecidos pelo público que vota em sites como o Rotten Tomatoes. Uma das críticas mais citadas é a de A. O. Scott no New York Times. Um homem que não gostou de Os Vingadores de Joss Whedon, uma adaptação bastante mais elogiada, mas que teve como amor de infância e empatia de adulto Star Wars, e que considera que o filme é como “as alegações iniciais de um julgamento muito longo”; “Snyder usa significantes de importância sem ter nada de importante para dizer”; “o entretenimento é mais um subproduto do que o objectivo”. Já na Variety, Ramin Setoodeh escreve, na tal alegoria em que Batman vs. Super-Homem é o Trump deste tipo de filmes, “que não há má imprensa que impeça um candidato fracturante de se tornar uma história de sucesso imparável” (na imprensa americana, as referências a Trump, o candidato a candidato republicano à Casa Branca que apesar de ser alvo de muitas críticas e de casos nos média continua a parecer dar voz ao descontentamento público, são muitas sobre o contexto deste caso). E o crítico e fã de comics Alex Abad-Santos considerou no Vox que o filme “é um crime contra quem gosta de comics”. O crescendo de crispação entre o que o público considera – e paga para ver – e o que a crítica defende tem-se agravado. No Metacritic, o agregador de críticas de profissionais e votos do público, a média da imprensa é de 44 (mista) contra 7, 4 dos espectadores (favorável), respectivamente; no Rotten Tomatoes, só 28% dos críticos gostaram, contra 72% do público. No caso de Star Wars: Despertar da Força, e a avaliar pelas mesmas plataformas, a crítica gostou mesmo mais do filme do que os fãs, e com percentagens muito elevadas. O homem-morcego e o homem de Krypton serão então só o mais recente exemplo da “guerra cultural entre a imprensa e o público”, como diz Setoodeh?A photo posted by Jason Momoa (@prideofgypsies) on Mar 27, 2016 at 4:38am PDTJason Momoa, o próximo Aquaman, sugeriu que era “hipócrita” criticar filmes destes quando não se é um fanboy. Mas nos sites de fãs ou especializados no universo dos comics e dos super-heróis as notícias sobre o tema também são seguidas de comentários com acusações de “haters” ou de parcialidade. Como recorda o Guardian, há fãs que acusam os críticos de estarem a soldo da Marvel Studios (da Disney). O filão dos super-heróis é tão rentável que se tornou numa luta corporativa. “A Warner está há anos a tentar erguer uma barreira contra a Marvel [Studios] e este filme tem o peso de ser a pedra basilar dessa estratégia”, contextualiza ainda Jorge Mourinha sobre a transferência para o cinema da rivalidade de papel entre a Marvel (X-Men, Quarteto Fantástico, Vingadores, Demolidor, Jessica Jones), comprada pela Disney, e a DC Comics (Aquaman, Flash, Arrow, Gotham), cujos direitos cinematográficos estão com a Warner. A polémica surge numa “tempestade perfeita”, diz o crítico português, criada também pelos “observadores que querem que estes filmes sejam levados a sério” (na esteira, no caso da Warner, dos Batman intelectualizados de Christopher Nolan), e por uma “indústria que quer o público do entretenimento descartável sem abdicar do público mais adulto”. Ainda assim, o responsável pela distribuição na Warner, Jeff Goldstein, disse aos jornalistas que o filme “não se leva a sério”. A isto junta-se a “obsessão pelos números – os filmes medem-se mais pelo dinheiro que fazem do que pela sua qualidade”, aponta Jorge Mourinha. Nesse campo, o filme parece ter um desafio à altura dos superpoderes dos seus protagonistas. Foi a quinta maior estreia de sempre nos EUA, mas a Variety noticia que o filme terá custado 250 milhões de dólares a fazer e mais 150 milhões a promover, pelo que terá de recuperar o investimento com receitas de bilheteira (e vendas de direitos televisivos, home video ou merchandising) acima dos 400 milhões, com o número de 800 milhões a ser mencionado pela revista especializada. Para Michael Cavna, crítico de BD e ilustrador, tudo se resume a “branding”, escreveu no Washington Post. “Hollywood é brilhante a vender-nos um nome que já reconhecemos. Uma familiaridade calorosa pode calar muita crítica. " Ou, nas palavras do analista do sector Paul Dergarabedian, “as críticas não importam. O Batsuit e a capa do Super-Homem são feitos de teflon”. No primeiro fim-de-semana, os fãs dos comics ou dos anteriores filmes das personagens são uma espécie de garantia nas salas. Batman e Super-Homem são uma marca, como os remakes são a recuperação de nomes que reconhecemos, ou as sequelas e os spin-offs. O embate entre ambos, além de ser uma história de culto nos comics, é um convite à ida ao cinema. Depois do pico da estreia, os bilhetes destes filmes continuam a vender-se a quem quer ir ver o mais recente filme de efeitos especiais e aventuras – os espectadores gostarão mais ou menos, mas se os números dos primeiros dias em Portugal são de top, Batman vs. Super-Homem: O Despertar da Justiça estreou-se em 122 salas e no mesmo período fez menos espectadores do que Deadpool, que estava em apenas 64 salas, assinala o Cinemax da RTP. E se a estreia mundial foi fulgurante, a Forbes já cita números que podem ser preocupantes para o futuro, monetariamente falando, do filme: fracos resultados no importante mercado chinês e, sobretudo, a maior quebra de sempre (55%) de um filme de super-heróis entre as sessões de sexta-feira, as primeiras, e as de domingo. Houve a Páscoa, sim, mas a queda nos números “aponta para a infeliz probabilidade de, fora os fãs da DC Comics, os públicos norte-americanos não gostarem muito do filme”, arrisca a revista, que num outro artigo cita fontes anónimas do sector que falam em boas vendas de bilhetes para visionamentos repetidos. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Segunda-feira foi um dia bom para o filme, apesar de também em queda, e os analistas consideram que Batman vs. Super-Homem vai continuar a ter sucesso. “As boas críticas sustentam um filme” na “quarta ou quinta semana", como descreve o analista de bilheteiras Jeff Bock, e elas são uma raridade. O efeito do passa-palavra pode determinar quão grande será o desfasamento entre os números, as críticas e as opiniões dos fãs nesta história. Notícia corrigida às 7h44 de 30 de Março: Quarteto Fantástico pertence à Marvel e não à DC
REFERÊNCIAS:
O que une os jogadores patológicos? Começaram a carreira a ganhar
Comparação entre jogadores patológicos que preferem o online, e os que apostam sobretudo nos casinos e bingos reais mostra que os primeiros atingem a fase da dependência cerca de dez anos antes dos segundos. (...)

O que une os jogadores patológicos? Começaram a carreira a ganhar
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 2 Ciganos Pontuação: 6 | Sentimento 0.8
DATA: 2015-05-01 | Jornal Público
SUMÁRIO: Comparação entre jogadores patológicos que preferem o online, e os que apostam sobretudo nos casinos e bingos reais mostra que os primeiros atingem a fase da dependência cerca de dez anos antes dos segundos.
TEXTO: São sobretudo homens. Com a excepção do poker, preferem jogos mais solitários, como as slot machines, a banca francesa, ou ainda as apostas desportivas, muitas vezes feitas à medida que decorre um jogo de futebol, por exemplo. Quantos golos vão ser marcados? Quem vai marcar o golo seguinte? Quem vai fazer falta?Tudo é motivo de aposta em tempo real nos sites da especialidade. Mas há mais características comuns aos chamados jogadores patológicos, prefiram eles os tradicionais casinos e bingos ou o computador. Desde logo, esta: entre 50% e 60% dos que participaram num estudo nacional contaram que ganharam prémios significativos nas primeiras vezes que apostaram. Já entre os chamados jogadores recreativos, sem sintomas de dependência, a percentagem dos que relatam ter tido ganhos dignos de nota nas suas primeiras experiências ronda os 14%. No jogo, a tão famosa “sorte de principiante” pode ser, afinal, uma espécie de maldição?“É um sinal de alerta para as pessoas que têm uma predisposição para a adição. É mesmo um preditor de problemas, porque o que fica registado de forma muito intensa do ponto de vista emocional é o ‘isto dá’. E se juntarmos isto aos traços clássicos de personalidade do jogador, que são a iniciativa, a grandiosidade, a vontade de poder, o ‘isto dá’ é ‘eu sou melhor do que os outros’, ‘eu sou especial e diferente’”, explica o psicólogo Pedro Filipe Hubert, que defendeu no mês passado uma tese de doutoramento onde traça o perfil dos “jogadores patológicos online e offline”. Prossegue Pedro Hubert: “Tive um paciente que era espanhol e ele contava que na Andaluzia havia uma praga cigana que era esta: ‘Espero que vás ao casino e ganhes. ’ Era uma praga, é revelador. ”Perto de 1800 pessoas responderam a diferentes tipos de questionários: um para jogadores online outro para jogadores offline, conforme o seu modo preferencial de apostar. O questionário foi colocado num site criado para o efeito. O projecto de investigação foi divulgado em jornais, revistas e televisão. Quem aderisse receberia, depois de devidamente preenchido o questionário, um diagnóstico rápido: em que fase está? Recreativa, abusiva ou patológica? Uma espécie de recompensa pelo esforço. Foram validados inquéritos de 1599 participantes, entre os 16 e os 80 anos. Destes, 26, 7% dos jogadores que jogam preferencialmente em espaços físicos, os chamados jogadores offline, foram considerados patológicos. O mesmo aconteceu com 17, 8% dos jogadores online, os que usam mais os jogos virtuais. Há um estádio intermédio, antes de se chegar ao comportamento patológico: são os chamados jogadores abusivos, “ou seja, em risco de dependência”. E quase metade dos 1600 inquiridos apresentam características que os colocam nesse estádio, o que preocupa o investigador. Jogadores recreativos, apenas 30, 1%. Pedro Hubert sublinha que este é o primeiro estudo no país que identifica e compara “os diversos elementos referentes a estas populações”. O que permitirá, desde logo, traçar melhores estratégias de prevenção. A amostra, alerta, não é contudo representativa dos jogadores portugueses em geral. “Porém, pretendeu-se alcançar a representatividade da população de jogadores patológicos em Portugal pela grande dimensão” do grupo de participantes. O Governo prepara-se para dar esta semana luz verde à nova lei do jogo online, em Conselho de Ministros. A Inspecção de Jogos do Turismo de Portugal e a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa passarão a ter acesso a uma base de dados onde constam informações pessoais (como a idade e o número de contribuinte) de quem se regista nos sites online e de quem faça apostas em locais físicos. Além disso, a publicidade aos jogos é permitida, mas com mais limitações para proteger os menores e os grupos mais vulneráveis. O valor do dinheiroAlgumas conclusões do estudo de Pedro Hubert: os jogadores patológicos offline são mais velhos (média de 40 anos), os online mais jovens (média de 30). Os primeiros, mais do que os segundos (32% contra 25%), dizem já ter tido um diagnóstico de depressão. E o mesmo se passa quando se pergunta se já tiveram problemas com a justiça (10, 6% dos patológicos offline e 3, 5% do patológicos online dizem que sim). Em ambos os grupos, as tentativas de suicídio são elevadas (8% relatam já ter tentado pôr termo à vida). E o consumo de outras substâncias (álcool, drogas e tabaco), sendo, em geral, mais baixo do que o verificado em estudos feitos com jogadores noutros países, é mais elevado nos jogadores dependentes offline, o que estará relacionado com a “carreira mais longa de jogo”.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave homens lei suicídio consumo estudo espécie
António Pescada vence Grande Prémio de Tradução por O Duplo e O Arquipélago Gulag
Obras de Dostoievski e de Soljenitsin foram publicadas, respectivamente, pela Relógio d'Água e pela Sextante. (...)

António Pescada vence Grande Prémio de Tradução por O Duplo e O Arquipélago Gulag
MINORIA(S): Asiáticos Pontuação: 2 Animais Pontuação: 9 | Sentimento 0.4
DATA: 2018-10-26 | Jornal Público
SUMÁRIO: Obras de Dostoievski e de Soljenitsin foram publicadas, respectivamente, pela Relógio d'Água e pela Sextante.
TEXTO: António Pescada é o vencedor do Grande Prémio de Tradução, por O Duplo, de Fiódor Dostoievski, e O Arquipélago Gulag, de Alexander Soljenitsin, que traduziu a partir do original russo, anunciou esta sexta-feira a Associação Portuguesa de Tradutores (APT). A versão portuguesa de O Duplo, traduzida por António Pescada, encontra-se editada pela Relógio d'Água, enquanto O Arquipélago Gulag pertence à Sextante, chancela do grupo Porto Editora. De acordo com a APT, foram ainda atribuídas menções honrosas a Maria Lúcia Lima, pela tradução de Escutai as Nossas Derrotas, do francês Laurent Gaudé, editado pela Porto Editora, e a Tiago Nabais, pela tradução do chinês de Crónica de um Vendedor de Sangue, da autoria de Yu Hua, editado em Portugal pela Relógio d'Água. O vencedor do Grande Prémio, António Pescada, nascido em Albufeira, em 1938, viveu cinco anos em Moscovo, onde estudou língua e literatura russas. Tradutor de francês, inglês e russo, tornou-se um dos nomes mais respeitados da tradução em Portugal, onde traduziu outros autores clássicos russos como Tolstoi, Boris Pasternak, Ivan Turgenev e Mikhail Bulgakov. Em 1995, foi galardoado com o Grande Prémio de Tradução do P. E. N. Club, pela tradução do francês de A Bela do Senhor, de Albert Cohen. O Duplo, que nesta edição da Relógio d'Água tem 200 páginas e está publicado na colecção Clássicos para Leitores de Hoje, foi originalmente publicado em 1846, quando Dostoievski contava apenas 24 anos, poucos meses após a publicação do seu primeiro romance, Gente Pobre. Trata-se da história de um funcionário público obcecado pela existência de um colega, réplica de si próprio, que lhe usurpa a identidade, acabando por levá-lo à insanidade mental e à ruptura com a sociedade, um romance no qual já é possível encontrar as inquietações do autor. A afirmação da liberdade individual contra instituições e normas existentes é o centro da obra, na qual sobressai também a compaixão pela condição dos humilhados, outro tema recorrente em Dostoievski. O Arquipélago Gulag, de Soljenitsin, foi originalmente escrito clandestinamente entre 1958 e 1967, com a ajuda do testemunho de 227 sobreviventes dos campos do Gulag, tendo o seu manuscrito sido descoberto pelo KGB em 1973, na sequência da prisão de uma colaboradora do autor, que o dactilografava. Subscreva gratuitamente as newsletters e receba o melhor da actualidade e os trabalhos mais profundos do Público. Na sequência disso, Soljenitsin, que tinha sido galardoado com o Prémio Nobel em 1970, decide publicar o livro no exterior: uma primeira edição em russo aparece em Paris, ainda em 1973, a que se segue, no ano seguinte, uma edição francesa. Com quase 600 páginas, esta edição da Sextante, no âmbito do projecto de edição em língua portuguesa das principais obras do autor, é a versão abreviada, num só volume, preparada por Soljenitsin e por sua mulher, Natália, com o objectivo de tornar mais acessível este livro aos leitores estrangeiros e a novos leitores. Através do Grande Prémio de Tradução Literária, a APT e a Sociedade Portuguesa de Autores (SPA) procuram destacar a tradução como exercício de autoria em literatura, e dar ao tradutor "o lugar que merece no mundo da cultura nacional e internacional". Instituído pela APT, com o patrocínio da SPA, o prémio, que tem um valor monetário de 2500 euros, vai ser entregue a António Pescada no dia 31 de Outubro, numa cerimónia que decorrerá na Sala-Galeria Carlos Paredes da SPA, e contará com um apontamento musical por Carlos Alberto Moniz.
REFERÊNCIAS:
Palavras-chave cultura mulher prisão ajuda chinês